Sebastio Nery
O homem a palavra. O mais circunstncia. A histria a palavra. O resto consequncia. Por isso a histria do homem a histria de sua palavra. a crnica de sua linguagem. o cotidiano do possvel dizer.
Na Grcia livre de Pricles, o discurso era a palavra. Na Judia oprimida do Cristo, o discurso era a parbula. Na Idade Mdia torturada de Galileu, o discurso era o silncio. O que a Bblia seno a fbula do povo judeu tiranizado sob os salgueiros da Babilnia? O que foi a tragdia grega seno a metfora da liberdade? E as fbulas do escravo Esopo, cordeiro respondendo ao inqurito do lobo? E Bernard Shaw roendo a empfia do imprio britnico?
PELO ATALHO – Menino de fazenda, cedo aprendi que quando a estrada no d caminho, toma-se o atalho. o jeito de dizer, pela boca dos outros, o tornado indizvel. O humor uma linguagem absolutamente sria, necessria, eterna. Desde o comeo dos tempos, sempre foi mais proibido proibir o humor.
Folclore no histria. a verso popular da histria. Folclore poltico no histria poltica. As histrias vo mudando na boca do povo como as nuvens mudam na boca do vento. Monteiro Lobato definiu exato: Folclore so as coisas que o povo sabe por boca, de um contar para o outro.
Se Maurice Latey diz que a histria o povo em ao, est pondo o folclore como categoria cientfica, crnica da vida comum, poema do dia a dia, o contar para o outro, o cantar dos medievais menestris.
PRIMEIRO LIVRO – Quando, em agosto de 1973, no auge do calar a boca nacional, lancei o Folclore Poltico n 1 no Clube dos Reprteres Polticos da Guanabara, com a presena de Jos Amrico de Almeida, Jos Maria Alkmin, Magalhes Pinto e mais de cinquenta colegas de jornalismo poltico, Jos Amrico com sua competente preciso de linguagem, colocou o livro nos termos preciso:
folclore. Nenhuma das histrias a meu respeito inteiramente exata, mas nenhuma inteiramente inexata, E so todas muito engaadas.
E Alkmin: Essas histrias do folclore poltico a gente nunca sabe quais so as verdadeiras e quais as inventadas. O povo vai contando e elas vo se modificando, se reproduzindo. Como os cogumelos. Quem que sabe quem a me do cogumelo?
A tiragem de 100 mil exemplares, em trs edies, provou inteiramente sua atualidade.
VALOR POLTICO – As histrias no so minhas. Recolhi-as, uma a uma, aqui e ali, no Pais inteiro, exatamente como me foram contadas. Mas tenho conscincia de seu valor poltico, antropolgico, sociolgico. Elas provam duas verdades verdadeiras, nestes dias de tanta verdade mentirosa.
1 A liderana histrica e permanente do homem poltico na vida nacional. No distrito, na cidade, no Estado, no Pas, sempre foi o poltico quem deu a palavra final. Da a histria das naes ser, antes de tudo, a histria de seus polticos, dos que carregam nas mos o sentimento do povo, sua representao e liderana.
2 O compromisso de dilogo e da liberdade no dia a dia da vida poltica brasileira. Os grandes personagens de nosso folclore poltico, e portanto de nossa poltica, so em geral homens bons, s vezes primrios, mas compreensivos, liberais, humanistas, sbios. A crnica do dio, da violncia, da truculncia, da tirania que tanto se v hoje por ai, no faz parte deste livro. Ela um grito, um gemido, um ai de exceo. No est no cotidiano de nosso viver.
Constatar isso j ver abertas as janelas do amanh.