Há poesia até quando o poeta olha em torno e só vislumbra o vazio

Entrevista - Vânia Diniz no MúsicaPoética em BsB ::

Vânia Diniz em recital de poesia

Paulo Peres
Poemas & Canções

A humanista, pesquisadora, escritora e poeta carioca Vânia Moreira Diniz revela sensações e segredos diante do “Vazio”.

VAZIO
Vânia Moreira Diniz

Contemplo a minha volta e nada vejo
não enxergo,
tudo parece um grande mistério e rezo,
sem entender os segredos que preservo,
e conservo,
dentro do meu coração tão vazio.
Não encontro ressonância e me distancio,
não acho a real certeza e me afasto,
não vejo a luz que direciona e me aparto,
como se nada conhecesse e me arredo.

Sinto a leveza, tento pegar e não consigo,
pressinto a bondade e me aproximo,
não alcanço a sua extensão e choro,
e procuro o ideal que já não creio.
As cores não são do extenso universo,
as dores perduram e triste lamento,
a frieza que se esconde no retiro
de ilusões em que me escondo.

Não quero sentir a saudade do encontro,
das lembranças ocultas atrás do muro,
do sonho sempre e sempre revivido
e do passado que se foi no escuro.

Só a nostalgia perene eu vislumbro,
sensação de terna loucura e vazio,
efusões sepultadas no reencontro,
coração para sempre machucado.
Ando, e me concentro,
caminho,
o passo é lento,
inseguro
e encontro o vazio.

Um poema revolucionário de Tobias Barreto, exigindo o fim da escravidão

Livro: Tobias Barreto - Paulo Dantas | Estante Virtual

Tobias Barreto, grande poeta sergipano

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jurista, filósofo, crítico e poeta Tobias Barreto de Meneses (1839-1889), no poema “A Escravidão”, questiona a estrutura escravagista do regime monárquico, opondo-lhe a República e a Abolição.

Na primeira estrofe do poema procede a uma reflexão filosófica profunda acerca da Divindade dogmática como instituição mantenedora das desigualdades sociais e conivente com a exploração do homem pelo homem. Enquanto que, nos dois últimos versos do poema, encontramos um eu-lírico cético e questionador de todos os dogmas religiosos e que não se furta a apontar as falhas Divinas: “Nesta hora a mocidade / Corrige o erro de Deus”.

A ESCRAVIDÃO
Tobias Barreto

Se Deus é quem deixa o mundo
Sob o peso que o oprime,
Se ele consente esse crime,
Que se chama a escravidão,
Para fazer homens livres,
Para arrancá-los do abismo,
Existe um patriotismo
Maior que a religião.

Se não lhe importa o escravo
Que a seus pés queixas deponha,
Cobrindo assim de vergonha
A face dos anjos seus,
Em seu delírio inefável,
Praticando a caridade,
Nesta hora a mocidade
Corrige o erro de Deus!…

Na noite vazia, uma desesperada canção de amor criada por Nelson Motta

Frases de Nelson Motta | Citações e frases famosas

Nelson Motta, um supercompositor

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, escritor, roteirista, produtor musical, poeta e compositor paulista Nelson Cândido Motta Filho expõe seu drama amoroso através de uma “Noite Vazia”, na qual vagou pelas ruas da cidade até o dia amanhecer. Esta música faz parte do LP da trilha sonora da novela O Grito, gravado em 1975, pela Som Livre.

NOITE VAZIA
Nelson Motta

Pela cidade deserta
Todas as portas fechadas
Pela rua que amanhece
Pelas luzes que se apagam
O que mais posso fazer
Com quem mais posso falar

E como posso viver, cantar
O que mais posso esperar
Se amanhã é outro dia
Sem manhã e sem você

Thiago de Mello jamais aprendeu a lição de aceitar as injustiças sociais

Imagem

Thiago de Mello, grande poeta do Amazonas

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, tradutor e poeta amazonense Amadeu Thiago de Mello (1926-2022), no poema “Não Aprendo a Lição”, mostra como é difícil conviver no mundo feroz dos homens, frente ao poder que se alimenta da fome dos injustiçados.

NÃO APRENDO A LIÇÃO
Thiago de Mello

A lição de conviver,
senão de sobreviver
no mundo feroz dos homens,
me ensina que não convém
permitir que o tempo injusto
e a vida iníqua me impeçam
de dormir tranquilamente.
Pois sucede que não durmo.

Frente à verdade ferida
pelos guardiães da injustiça,
ao escárnio da opulência
e o poderio dourado
cujo esplendor se alimenta
da fome dos humilhados,
o melhor é acostumar-se,
o mundo foi sempre assim.
Contudo, não me acostumo.

A lição persiste sábia:
convém cabeça, cuidado,
que as engrenagens esmagam
o sonho que não se submete.
E que a razão prevaleça
vigilante e não conceda
espaços para a emoção.
Perante a vida ofendida
não vale a indignação.
Complexas são as causas
do desamparo do povo.
Mas não aprendo a lição.
Concedo que me comovo.

“Senhora Liberdade”, uma canção de amor que virou hino nas Diretas Já

A Arte Negra De Wilson Moreira E Nei LopesA Arte Negra De Wilson Moreira E Nei LopesPaulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, escritor, cantor e compositor carioca Nei Brás Lopes, em parceria com Wilson Moreira, na letra de “Senhora Liberdade”, postula a sua soltura, visto que o crime por ele cometido foi se apaixonar intensamente. Vale ressaltar que, esse samba de duplo sentido virou hino na campanha das diretas e faz parte do LP A Arte Negra de Wilson Moreira & Nei Lopes lançado, em 1980, pela EMI-Odeon.

SENHORA LIBERDADE

Wilson Moreira e Nei Lopes

Abre as asas sobre mim
Oh senhora liberdade
Eu fui condenado
Sem merecimento
Por um sentimento
Por uma paixão
Violenta emoção
Pois amar foi meu delito
Mas foi um sonho tão bonito
Hoje estou no fim
Senhora liberdade abre as asas sobre mim

Um amor mágico, intenso e perfeito, nas asas da poesia de Thais Beija-Flor

Casal de namorados opta por não fazer sexo antes do casamento e fica 2 anos sem se beijar

Ilustração reproduzida do Arquivo Google

Paulo Peres
Poemas & Canções

A poeta paulista Thais Silva Francisco, pseudônimo Thais Beija-flor, no poema “A Sinfonia das Horas”, procura e encontra o tempo certo para o amor.

A SINFONIA DAS HORAS
Thais Beija-Flor

Na sinfonia das horas
Nosso Amor encontra o tempo certo.
Brincamos com os ponteiros
Acertamos nossos minutos
Nos amamos sem pensar nas horas.

As horas são nossas amigas.
Vez ou outra dão uma paradinha,
ou, se deixam somar ao nosso fuso horário
para que nosso tempo ganhe
um pouco mais de tempo,
pois as horas entendem que é Mágico
este momento de Amor!

É Mágico e Abençoado este Amor
que vive intensamente a pulsar
dentro do nosso peito
seja noite ou seja dia…aqui ou aí.

Nada importa se há distância
a separar nossos corpos,
pois nossas almas se encontram
em fração de segundos
se entrelaçam e nos fazem sentir este amor
sublimemente vivido!

Que horas são?
Não importa, meu amor querido,
Os ponteiros do nosso relógio se aquietaram
e ficarão assim pelo tempo necessário,
até que me ajudes a voltar a respirar
pois este amor paixão tirou-me o fôlego
e do teu ar estarei a precisar…

Ah!… Sinfonia das horas.
Cante ao Universo
esta nossa melodia de Amor!

A Terra e o Céu enfim em harmonia, na concepção criativa de Nando Cordel

Nando Cordel | Tudo Sobre | G1

Nando Cordel, grande compositor pernambucano

Paulo Peres
Poemas & Canções

O cantor, instrumentista e compositor pernambucano Fernando Manoel Correia, nome artístico Nando Cordel, na letra de “Terra e Céu”, ostenta um cotidiano diferente do que vivemos nas grandes cidades.

TERRA E CÉU
Nando Cordel

Se o o boi soubesse da força que tem
Não puxava carroça
E a abelha, da dor da picada
Não roubavam seu mel
E a terra era terra
E o céu era o céu

Como era bom
Se toda semente crescesse
E a razão
Pudesse sempre dominar
E essa paz
Fosse que nem uma criança
Andasse solta
Feito a noite de luar

Se na inveja
Colocasse um cabresto
Na ambição
Colocasse um cortador
Na violência
Uma espora amolada
Deixasse a rédea
Solta na mão do amor
Não puxava carroça
Nem roubavam seu mel
E a terra era terra
E o céu era o céu

E o poeta percebe que as coisas são simples, quando as olhamos sem paixão…

Letralia, Tierra de Letras | TransLetralia | Nueve poetas brasileños  contemporáneos | Leo Lobos

Tanussi Cardoso, um poeta de bem com a vida

Paulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, jornalista, escrivão aposentado do Tribunal de Justiça (RJ), crítico literário, contista, letrista e poeta carioca Tanussi Cardoso, no poema “Substantivos”, explica que objetos e sentimentos são bem retratados quando vistos sem emoção.

SUBSTANTIVOS
Tanussi Cardoso

Faca é faca
Pão é pão
Fome é fome
Amor é amor

Estranho desígnio das coisas
De serem exatamente elas
Quando as olhamos sem paixão

Nas asas da poesia, a felicidade pode até vir através de um amor imaginário

A força do amor, na visão da poeta gaúcha

Paulo Peres
Poemas & Canções

A professora gaúcha graduada em educação física e poeta Simone Borba Pinheiro revela como pode se sentir feliz, mesmo que esta sensação venha através de um “Amor Imaginário”.

AMOR IMAGINÁRIO
Simone Pinheiro

É maravilhoso, quando manhã,
encontro seu sorriso sereno a meu lado,
e com seus beijos exploradores, me delicio,
e o amor se faz, ao cantar dos pássaros.
E assim, nosso dia começa,
com o café na cama, a seguir,
recheado de muito amor.

Quando você, para o trabalho sai,
com um ardente beijo nos despedimos,
e é como se o mundo, nesse momento, parasse,
pois apaixonados estamos, cegos de amor,
como no primeiro dia em que nos vimos,
naquele baile em que você,
para dançar me convidou, alegremente.

Vivo hoje esse amor assim, intensamente,
pois a Deus pertence o amanhã.
E ao final da tarde, quando para casa você volta,
trazendo nas mãos um bouquet de rosas,
vermelhas e perfumadas para mim,
não tenho dúvidas de que, esse amor,
apesar de ser imaginário, me faz feliz!…

Muitas vezes, a poesia surge quando o coração do poeta está destroçado…

Ah! Meu amor, se eu pudesse! Autora: Socorro Lima Dantas - ppt carregarPaulo Peres
Poemas & Canções
A advogada e poeta pernambucana Socorro Lima Dantas, ao criar “Assim é o Poeta…”, mostra que nem sempre a poesia surge do romantismo e dos momentos felizes da vida de cada um.

ASSIM É O POETA…
Socorro Lima Dantas

Mesmo com o coração em lágrimas,
o poeta vai escrevendo
para aquecer a sua dor,
relembrar os bons momentos,
arrancando-lhe do âmago os tormentos.

Ah, a alma do poeta!
tropeça, levanta, chora, lamenta,
recolhe os pedaços partidos
que a vida lhe espalhou…

Junta tudo de novo,
na esperança de reencontrar a felicidade,
que um dia lhe escapou.

Entenda a filosofia de vida que levou Martinho da Vila a fazer sucesso

Martinho da Vila marcará presença em uma conferência na UFS

Martinho explora a cadência do samba

Paulo Peres
Poemas & Canções

O escritor, cantor e compositor Martinho José Ferreira, o Martinho da Vila (Isabel), nascido em Duas Barras (RJ), expressa a sua “Filosofia de Vida”. Esse samba foi gravado por Martinho da Vila no CD Filosofia de Vida, O Pequeno Burguês, em 2010, pela MZA.

FILOSOFIA DE VIDA
Martinho da Vila

Meu destino eu moldei
Qualquer um pode moldar
Deixo o mundo me rumar
Para onde eu quero ir
Dor passada não me dói
E nem curto nostalgia
Eu só quero o que preciso
Pra viver meu dia a dia

Pra que reclamar de algo que não mereço
A minha razão é a fé que me guia
Nenhuma inveja me causa tropeço
Creio em Deus e na Virgem Maria
Encaro sem medo os problemas da vida
Não fico sentado de pernas pro ar
Não há contratempo sem uma saída
Pra quem leva a vida devagar

Meu destino eu moldei
Qualquer um pode moldar
Deixo o mundo me rumar
Para onde eu quero ir
Dor passada não me dói
E nem curto nostalgia
Eu só quero o que preciso
Pra viver meu dia a dia

Que o supérfluo
Nunca nos falte
Básico para
Quem tem carestia
Não quero mais do que eu necessito
Pra transmitir minha alegria

Versos bem-humorados de Rubem Braga, se definindo como “um poeta cristão”

A dor do amor tem de repente uma... Rubem Braga - PensadorPaulo Peres
Poemas & Canções

Considerado o maior cronista brasileiro desde Machado de Assis, o capixaba Rubem Braga (1913-1990), sempre afirmou que a poesia é necessária, tanto que escreveu vários poemas, entre eles, esse bem-humorado “Poeta Cristão”.

POETA CRISTÃO
Rubem Braga

A poesia anda mofina,
Mofina, mas não morreu.
Foi o anjo que morreu:
Anjo não se usa mais.
Ainda se usa estrela
Se usa estrela demais.

Poeta religioso
Mocinha não pode ler:
Pecará em pensamento,
Que o poeta gosta do Novo,
Mas pilha seus amoricos
É no Velho Testamento.

Ai, o Velho Testamento!
Eu também faço poema,
Ora essa, quem não faz:
Boto uma estrela na frente
E um pouco de mar atrás.

Boto Jesus de permeio
Que Deus, nos pratos de amor,
É um excelente recheio.
E isso bem posto e disposto
Me vou aos peitos da Amada:
Sulamita, Sulamita,
Por ti eu me rompo todo,
Sou cavalheiro cristão.
Minh’alma está garantida
Num rodapé do Tristão
E o corpo? O corpo é miséria,
Peguei doença, mas Jorge
de Lima dá injeção!

O badalo está chamando,
Bão-ba-la-lão.

Amada, não vai lá não!
Eu também tenho badalos –
Bão-ba-la-lão
Eu sou poeta cristão!

O amor passa, mas sempre deixa alguma recordação, afirmava Mário Lago

Mario Lago | Palavras interessantes, Frases espíritas, PalavrasPaulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, radialista, teatrólogo, ator, escritor, poeta e compositor carioca Mário Lago (1911-2002), na letra de “Enquanto Houver Saudade”, em parceria com Custódio Mesquita, não acredita que sua amada não sinta saudades do romance que tiveram. Essa valsa foi gravada por Orlando Silva, em 1938, pela RCA Victor.

ENQUANTO HOUVER SAUDADE
Custódio Mesquita e Mário Lago

Não posso acreditar
Que algumas vezes
Não lembres com vontade de chorar
Daqueles deliciosos quatro meses
Vividos sem sentir e sem pensar

Não posso acreditar
Que hoje não sintas
Saudade dessa história singular
Escrita com as mais suaves tintas
Que existem pra escrever o verbo amar

Enquanto houver saudade
Pensarás em mim
Pois a felicidade
Não se esquece assim
O amor passa mas deixa
Sempre a recordação
De um beijo ou de uma queixa
No coração

Na poesia de Ribeiro Couto, o drama da prostituta que precisa voltar para casa

Retratado por Vicente do Rego Monteiro

Retratado por Vicente do Rego Monteiro

Paulo Peres
Poemas & Canções

O magistrado, diplomata, jornalista, romancista, contista e poeta paulista Rui Ribeiro de Almeida Couto (1898-1963), da Academia Brasileira de Letras, no poema “Fado de Maria Serrana”, expõe o pedido da prostituta que trocou a vida serrana pela cidade grande.

FADO DE MARIA SERRANA
Ribeiro Couto

Se a memória não me engana,
Pediste-me um fado triste:
Triste Maria Serrana,
Por que tal fado pediste?

Na serra, a fonte e as ovelhas
Eram só os teus cuidados;
Tinhas as faces vermelhas,
Hoje tens lábios pintados.

Hoje de rica tens fama
E toda a cidade é tua;
Tens um homem que te chama
Ao canto de cada rua.

Mas ai! pudesses de novo
Tornar à serra, Maria!
Se não te perdoasse o povo,
A serra te perdoaria.

Lá te espera o mesmo monte,
E a casa junto ao caminho,
E a água da mesma fonte
Que diz teu nome baixinho.

Secos teus olhos de mágoa,
Se não tivessem mais pranto,
Choraria aquela água
Que já por ti chorou tanto.

A liberdade plena da vida dos ciganos, na inspirada poesia de Raul de Leôni

Veredas da Língua: RAUL DE LEONI - POEMASPaulo Peres
Poemas & Canções

O advogado e poeta Raul de Leôni (1895-1926), nascido em Petrópolis (RJ), expressa em versos a vida e os costumes dos ciganos. Detalhe: guzla é um tipo de rabeca cigana, de uma corda só.

CIGANOS
Raul de Leôni

Lá vêm os saltimbancos, às dezenas
Levantando a poeira das estradas.
Vêm gemendo bizarras cantilenas,
No tumulto das danças agitadas.

Vêm num rancho faminto e libertino,
Almas estranhas, seres erradios,
Que tem na vida um único destino,
O Destino das aves e dos rios.

Ir mundo a mundo é o único programa,
A disciplina única do bando;
O cigano não crê, erra, não ama,
Se sofre, a sua dor chora cantando.

Nunca pararam desde que nasceram.
São da Espanha, da Pérsia ou da Tartária?
Eles mesmos não sabem; esqueceram
A sua antiga pátria originária…

Quando passam, aldeias, vilarinhos
Maldizem suas almas indefesas,
E a alegria que espalham nos caminhos
É talvez um excesso de tristezas…

Quando acampam de noite, é no relento,
Que vão sonhar seu Sonho aventureiro;
Seu teto é o vácuo azul do Firmamento,
Lar? o lar do cigano é o mundo inteiro.

Às vezes, em vigílias ambulantes,
A noite em fora, entre canções dalmatas,
Vão seguindo ao luar, vão delirantes,
Alados no langor das serenatas.

Gemem guzlas e vibram castanholas,
E este rumor de errantes cavatinas
Lembra coisas das terras espanholas,
Nas saudades das terras levantinas.

E, então, seus vultos tredos envolvidos
Em vestes rotas, sórdidas, imundas.
Vão passando por ermos esquecidos,
Como um grupo de sombras vagabundas.

Lá vem os saltimbancos, às dezenas,
Levantando a poeira das estradas,
Vêm gemendo bizarras cantilenas,
No tumulto das danças agitadas.

Povo sem Fé, sem Deus e sem Bandeira!
Todos o temem como horrível gente,
Mas ele na existência aventureira,
Ri-se do medo alheio, indiferente.

E, livres como o Vento e a Luz volante,
Sob a aparência de Infelicidade,
Realizam, na sua vida errante,
O poema da eterna Liberdade.

Uma desesperada canção de amor, na criatividade do compositor Marcus Viana

Marcus Viana - Pantanal (DVD Trilhas, Mantras e Canções) - YouTube

Marcus Viana, um grande músico mineiro

Paulo Peres
Poemas & Canções

O produtor musical, instrumentista e compositor mineiro Marcus Viana, na letra de “Amor Selvagem”, mostra as transformações que podem ocorrer quando acontece um grande amor, uma paixão alucinante. A música faz parte do LP Pantanal, trilha sonora da novela, gravado em 1990 pela Bloch Discos.

AMOR SELVAGEM
Marcus Viana

Quando os corações dos puros amam
Cala a imensidão, o espaço
E a eternidade ergue seu véu

Todas coisas vivas se aquecem
Todos olhos se iluminam
Com a luz de um outro céu

Corações selvagens
Quando batem de paixão
Acordam toda a natureza
Fazem a vida renascer

Florestas que queimaram
Voltam a se vestir de verde e flor
E as fontes que secaram
Ressuscitam ribeirões

Corações selvagens
Quando ardem de paixão
Incendeiam a noite, o tempo
E cegam sóis

Estrelas são as lágrimas dos anjos
A chorar
Por não terem o corpo e a vida
E não saberem o que é amar

“Ah, se eu te pudesse fazer entender, sem teu amor eu não posso viver..”

Paulo Sérgio Valle lança autobiografia 'Contos e Letras' | O São Gonçalo

 

Paulo Peres
Poemas & Canções

Os irmãos cantores e compositores cariocas Paulo Sérgio Kostenbader Valle e Marcos Kostenbader Valle fizeram em parceria “Eu Preciso Aprender a Ser Só”, cuja melancólica letra expressa o sofrimento causado pelo desamor e, consequentemente, a necessidade de se aprender a viver sozinho. Essa música faz parte do LP O Compositor e o Cantor Marcos Valle lançado, em 1965, pela Odeon.

EU PRECISO APRENDER A SER SÓ
Paulo Sérgio Valle e Marcos Valle

Ah, se eu te pudesse fazer entender
Sem teu amor eu não posso viver
E sem nós dois o que resta sou eu
Eu assim tão só
E eu preciso aprender a ser só
Poder dormir sem sentir teu calor
E ver que foi só um sonho e passou

Ah, o amor
Quando é demais ao findar leva a paz
Me entreguei sem pensar
Que a saudade existe e se vem
É tão triste, vê
Meus olhos choram a falta dos teus
Esses olhos que foram tão meus
Por Deus entenda que assim eu não vivo
Eu morro pensando no nosso amor

Nas lembranças do Canindé, Rachel de Queiroz questiona a religiosidade do povo

Gosto de palavras na cara. De frases que... Rachel de Queiroz - PensadorPaulo Peres
Poemas & Canções

A romancista, contista, tradutora, jornalista e poeta cearense Rachel de Queiroz, (1910-2003) no poema “São Francisco do Canindé”, lembra uma época vivida, com certa ironia, tendo em vista que era muito jovem, metida num ambiente religioso.

A poeta mantém um certo distanciamento, narrando impessoalmente, perpassando certa irreverência com muita sutileza. Sabe-se que acabou assumindo seu ateísmo, ou o agnosticismo.

Dizem que uma vez foi interrogada sobre religião e teria confessado mais ou menos nestes termos: “Deus não me deu toda esta fé”…

SÃO FRANCISCO DE CANINDÉ
Rachel de Queiroz

Ele estava lá no céu,
junto de Nosso Senhor…
Mas um dia lembrou-se de vir cá
pra dentro daquela igreja,
pra cima daquele altar…

Ficou tão vistoso e rico
todo cercado de luz,
todo cercado de flor!
Amostrando as mãos feridas,
as rosas presas num laço,
e o pé chagado de roxo
que é mode a gente beijar…

E milagre?
Hoje só sofre quem quer…
—Tem bouba no pé?
E esipra?
Um catarrão incansado
lhe cerra a arca do peito?
— Por que é que não promete
a são Francisco das Chagas,
tão bom e tão milagroso,
uma perna de cera?
ou o dinheiro do legume
que você apurou depois das águas?

Veja o quarto dos milagres,
dava para um rio de cera.
E na galeria de uma banda,
aquele cofre:
só de prata de paroara
chegou pra o santo enricar!…

“Meu irmão me dê uma esmola
pela luz que Deus lhe deu!
Que já tive pra morrer
são Francisco me valeu
porque eu prometi a ele
tudo o que tinha de meu…
E dei o que prometi,
ao depois vim esmolar.”

“Ah, meu irmão me socorra!
E queira Deus lhe livrar
de um dia lhe acontecer
fazer promessa e pagar…”

Nunca mais
que são Francisco quer voltar pró céu!…
Acha tão bom lá na igreja
no altar enfeitado!
Ou pelo tempo na festa
dar um passeio no andor!…
Tão bom no Canindé!…

Milton e Márcio Borges, no trem Vera Cruz, em busca de um amor perdido

Milron Nascimento e Márcio Borges na Homenagem à Fernando Brant -  Inhotim/MG/2015 | Cantores, Clube da esquina, Cantor brasileiro

Márcio Borges e Milton, grandes parceiros

Paulo Peres
Poemas & Canções

O escritor, diretor do Museu do Clube da Esquina e poeta mineiro Márcio Hilton Fragoso Borges é, sem dúvida, um dos melhores letristas do nosso cancioneiro popular, criador da expressão “os sonhos não envelhecem”.

A letra de “Vera Cruz” admite três interpretações, uma vez que, pode ser vista como a mulher amada, como a mulher-pátria ou uma composição ferroviária homônima que fazia o trajeto Belo Horizonte-Rio de Janeiro. A música “Vera Cruz” foi gravada por Milton Nascimento no LP Angelus, em 1993.

VERA CRUZ
Milton Nascimento e Márcio Borges

Hoje foi que a perdi
Mas onde já nem sei
Me levo para o mar
Em Vera me larguei
E deito nessa dor
Meu corpo sem lugar

Ah! Quisera esquecer
A moça que se foi
De nossa Vera Cruz
E o pranto que ficou
Da morte que sonhei
Nas coisas de um olhar

Ah! nos rios me larguei
Correndo sem parar
Buscava Vera Cruz
Nos campos e no mar
Mas ela se soltou
No longe se perdeu

Quero em outra mansidão
Um dia ancorar
E aos ventos me esquecer
Que ao vento me amarrei
E nele vou partir
Atrás de Vera Cruz

Ah! Quisera encontrar
A moça que se foi
No mar de Vera Cruz
E o pranto que ficou
Do norte que perdi
Nas coisas de um olhar

Uma toada de Pedro Nava para esconder o sofrimento dos brasileiros calados

Pedro Nava na Companhia das Letras | Autores e Livros

Pedro Nava, grande intelectual mineiro

Paulo Peres
Poemas & Canções

O médico, escritor e poeta mineiro Pedro da Silva Nava (1903-1984), no poema “Toadas Para Meu Irmão”, expressa a dor dos brasileiros calados.

TOADAS PARA MEU IRMÃO
Pedro Nava

Nem eu posso esconder
que esta noite fina assim
seja a mesma noite assu
que assombra Taquarassu!

Que seja a mesma noite densa
soturno enorme abajada
escondendo o sofrimento
dos brasileiros calados!

Mas fosse a noite maior
mais densa, mais abajada
mesmo assim seria fraca
e se deixaria varar
pela ternura que eu mando
voando com a força do vento

– Meu pensamento rasgando
o assombro da noite assu
vai velar sono cansado
dos brasileiros calados…

O sono tão sossegado
de um brasileiro cansado
dormindo na noite assu
que esmaga Taquarassu!

Da cidade outro poeta
quer a distância varar
pra ver o sono do irmão
seu descanso proteger!

Dorme teu sono José (…)

Meu pensamento voando
nesta noite fina assim
vai fugindo da cidade
desgarra sertão afora
pra vigiar bem de perto
o doce sono sossegado
dum brasileiro calado!

Te beijo de leve nos olhos
te beijo de leve na face
te beijo o cabelo inteirinho
te beijo no coração…

Brasileiro sossegado
dorme teu sono calado…

Dorme teu sono José…
E me perdoa, meu Mano
se eu não posso cantar
cantos mansos pro teu sono!

Quem me dera, mas não posso!
Pois na noite da cidade
Só de pensar no teu sono,
as veias ficaram doendo
O corpo todo sem jeito
fiquei esquisito, palavra!
Coração no peito calado…

Que dor nos nervos senti
de não ter voz pra falar
(o coração no peito calado)
de não ter choro pra chorar
de palavra não achar,
dor(i)da boa sincera
como aquela comovida
achada por Mário de Andrade
(aquela tão comovida)
que acalantou de São Paulo
o brasileiro do Acre…

Te beijo o cabelo inteirinho
te beijo no coração…

Descansa na noite mansa
descansa, Mano, descansa…