Decisão de Barroso não levou em conta a obrigatoriedade de haver “fato determinado”

Assista à entrevista com o ministro Luís Roberto Barroso neste domingo | Poder360

Barroso transformou em determinado um fato genérico

Jorge Béja

A decisão individual do ministro Barroso determinando que o presidente do Senado instaure a CPI que 1/3 dos senadores pediram fosse aberta, não é decisão que seja primorosa sob o aspecto jurídico-constitucional. E aqui não vai uma análise, ainda que breve, de um partidário ou não partidário do presidente Jair Bolsonaro. Nada disso, A análise é exclusivamente juridica e objetiva. Nada mais do que isso.

Barroso, numa só decisão usurpou e subtraiu do presidente do Senado poderes que somente a ele pertencem, a saber:

  1. o poder de admitir ou não o requerimento para abertura da CPI, poder de triagem, portanto;
  2. o direito-poder de analisar se todos os requisitos necessários à abertura da CPI foram cumpridos e comprovados pelos senadores requerentes;
  3. a confirmação da demonstração e a também comprovação do Fato Determinado;
  4. o momento oportuno para o presidente do Senado decidir a respeito, visto que a Constituição Federal não estabelece prazo para tanto.

Assim, numa canetada só Barroso se imbuiu deste poder e decidiu ordenando que a CPI fosse instaurada.

RAPIDEZ EXCESSIVA – Foi uma decisão açodada. Por que não intimou, primeiro, o presidente do Senado para prestar as informações a respeito da queixa que a petição do Mandado de Segurança descrevia? Esse era o caminho razoável e equilibrado, mormente em respeito ao outro Poder.

No tocante ao Fato Determinado, Barroso escreveu na sua liminar, referindo-se à petição do Mandado de Segurança, que “houve indicação de fato determinado a ser apurado (“as ações e omissões do Governo Federal no enfrentamento da pandemia da Covid-19 no Brasil e, em especial no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados”).

Este é o Fato Determinado que Barroso, usurpando o direito-poder exclusivo do presidente do Senado analisar, entendeu estar rigorosamente preenchido conforme estabelece a Constituição.

HÁ FATO DETERMINADO? – Não. Não está. Isto porque tal como posto e escrito pelos senadores, tanto não é Fato Determinado. Tanto é fato generalizado, abstrato, amplo, suscitando diversas e várias deduções.

Não apenas a jurisprudência quanto também a doutrina, que são fontes do Direito, dizem o que vem a ser Fato Determinando para a abertura de uma CPI.

A jurisprudência: “Conforme consta do artigo 58 § 3º da CF, não basta o requerimento de 1/3 da Casa Legislativa para que seja instaurada uma CPI para apurar fato determinado por prazo certo. O Fato Determinado configura-se como fato concreto e individualizado, não podendo atacar questões genéricas, como corrupção, responsabilidade governamental, política, econômica, etc..” ( TJMS, Apelação Cível nº 15345 MSeg, nº 2005.015345-4, publicado em 1.2.2006).

A doutrina: “Como imperativo de eficiência e a bem da preservação de direitos fundamentais, a Constituição determina que a CPI tenha por objetivo um fato determinado. Ficam impedidas devassas generalizadas. Se forem admissíveis investigações livres e indefinidas haveria o risco de se produzir um quadro de insegurança e de perigo para as liberdades fundamentais” ( Paulo Gustavo Branco, um dos mais conceituados constitucionalistas pátrios, Edição 2009, página 902).

FATO GENÉRICO E ABSTRATO – Como se vê, o fato determinado que o ministro Barroso viu presente e preenchido, é fato genérico e abstrato: “as ações e omissões do governo federal no enfrentamento… e o agravamento da crise sanitária no Amazonas…..”.

Tais premissas não constituem Fato Determinado, mas tópicos, assuntos, temas, para que sejam debatidos e demonstrados pela CPI, ao passo que a Constituição exige a prova pré-constituída do Fato Determinado.

Anuncia-se que na próxima quarta-feira o plenário do STF (os 11 ministros) vai examinar e ratificar ou não a liminar do ministro Barroso. Creio que mais importante seria cuidar da legalidade formal e material do pleito que culminou com a decisão de Barroso. Sim, porque de antemão, Barroso, no peito e na raça, como se dizia antigamente, fez as vezes do presidente do Senado. E a respeito do importante requisito do Fato Determinado, Barroso acolheu as abstrações apontadas pelos senadores.

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