Morto há 20 anos, Brizola liderou resistência armada e evitou golpe em 1961

O ex governador Fluminense Leonel Brizola durante festa da Força Sindical , na praça campo de Bagateli, zona norte de São Paulo, em comemoração ao dia do trabalhador. São Paulo SP 01.05.2003 BRASIL Foto: Caio Guatelli/Folha Imagem

Se Brizola tivesse sido presidente, teríamos um Brasil melhor

Ricardo Westin
Folha

Leonel Brizola ostentava um currículo invejável. No Rio Grande do Sul, foi prefeito de Porto Alegre, deputado estadual, deputado federal e governador. No Rio de Janeiro, deputado federal e duas vezes governador. Ele disputou a Presidência em duas ocasiões e se candidatou a vice-presidente uma vez. Criou um partido que existe até hoje, o PDT.

Brizola fez parte da vida pública brasileira em toda a segunda metade do século 20. O currículo só não foi mais extenso porque passou os primeiros 15 anos da ditadura militar no exílio.

VOZ INDIGNADA – Faz 20 anos que o Brasil perdeu a voz indignada e combativa de Brizola. Vítima de enfarte, ele morreu em 21 de junho de 2004, aos 82 anos de idade.

O episódio que o levou aos livros de história foi a Campanha da Legalidade, em 1961. Não fosse essa iniciativa de Brizola, é provável que João Goulart, o Jango, jamais tivesse chegado à Presidência.

Logo após a renúncia do presidente Jânio Quadros, os chefes das Forças Armadas vetaram a posse de Jango, o vice, por considerá-lo excessivamente de esquerda e aliado dos comunistas. Governador gaúcho, Brizola deflagrou em Porto Alegre uma reação armada, a Campanha da Legalidade, que garantiu a posse do vice, impedindo o golpe de Estado.

ATITUDE DESASSOMBRADA – Documentos da época guardados hoje no Arquivo do Senado confirmam o papel central de Brizola. Num discurso, o senador Lima Teixeira (PTB-BA) resumiu: “Leonel Brizola, numa das horas mais difíceis para a nacionalidade, deu-nos um exemplo edificante com a sua atitude desassombrada. Só não enveredamos pelo caminho errôneo das soluções extralegais graças a esse ilustre governador”.

Brizola era casado com Neusa Goulart, irmã de Jango. Os dois políticos gaúchos pertenciam ao PTB, sigla ligada aos trabalhadores urbanos e aos sindicatos.

Diante do veto dos comandantes militares a Jango, Brizola se entrincheirou no Palácio Piratini, sede do governo do Rio Grande do Sul. De lá, num estúdio de rádio, fez pronunciamentos transmitidos em todo o Brasil convocando a população a não permitir a quebra da legalidade.

DISSE BRIZOLA – O Arquivo do Senado conserva um dos discursos: “Meus amigos do Rio Grande do Sul! Venham para a frente deste palácio, numa demonstração de protesto contra essa loucura. Venham. Poderei ser morto. Não importa. Ficará o nosso protesto, lavando a honra desta nação”.

Ao fim de uma semana de crise, Brizola teve sucesso. Os militares resolveram aceitar Jango, mas com uma condição: que ele não tivesse plenos poderes.

Um grupo de políticos, então, articulou a adoção do parlamentarismo. Jango seria, sim, presidente, mas a maior parcela do poder ficaria nas mãos de um primeiro-ministro.

SEM CONCESSÕES – Para Brizola, contudo, o desfecho não foi plenamente satisfatório. Ele defendia que Jango tomasse posse sem fazer concessões. O novo presidente, conciliador, topou o parlamentarismo.

Os militares não ficaram apaziguados. Unidos a empresários e políticos de direita, eles voltaram a conspirar em 1963, depois que a população, num plebiscito, optou por retomar o presidencialismo e conferir plenos poderes a Jango.

Esse grupo não via com bons olhos as chamadas reformas de base. Entre os projetos prometidos pelo presidente, estava a reforma agrária.

Nesse tempo, Brizola já sonhava ser presidente da República e concorreu a deputado federal pelo estado da Guanabara. Ele entendia que teria mais projeção nacional sendo representante dos cariocas na Câmara, e não dos gaúchos. Foi o deputado mais votado do Brasil.

REFORMAS DE BASE – Em 1964, no famoso discurso proferido diante da Central do Brasil, no Rio, Jango anunciou medidas para tirar do papel as reformas de base.

O deputado Brizola também discursou e, assumindo uma posição radical, defendeu a eleição imediata de uma Assembleia Constituinte para elaborar uma Constituição nova, que facilitasse a execução das reformas.

A fala de Brizola repercutiu no Senado. O senador Daniel Krieger (UDN-RS) o acusou de pregar uma revolução. Em sua defesa, saiu o senador Arthur Virgílio (PTB-AM): “Embora dê ênfase às teses que defende, nunca o ouvi pregar a revolução sangrenta. Ele prega o inconformismo. E também o faço. Estarei pregando a revolução?”.

JANGO É DERRUBADO – Duas semanas e meia depois, o golpe foi deflagrado e Jango, derrubado. Brizola se exilou no Uruguai. De lá, combateu a ditadura organizando guerrilhas com companheiros que haviam permanecido no Brasil. Fracassou.

De acordo com o historiador Américo Freire, não passa de bobagem a versão de que Brizola estava prestes a dar um golpe de Estado e foi impedido pelos militares.

“Brizola, de fato, pressionou Jango a adotar políticas sociais mais radicais, mas ele não tinha ascendência sobre o presidente. Era Jango que mandava, e seu perfil era conciliador. Eles discordavam em muitas coisas”, diz Freire, professor da Fundação Getulio Vargas e organizador do livro “A Razão Indignada: Leonel Brizola em Dois Tempos” (Editora Civilização Brasileira).

SEM CONSPIRAR – Ele prossegue: “Brizola estava, sim, interpelando a ordem institucional daquele momento, mas não conspirando para promover uma ruptura política”.

Brizola nasceu numa família pobre de Carazinho (RS) em 1922. Ele governou o estado entre 1959 e 1963. Entre os legados de seu mandato, ficaram muitas escolas públicas e um programa de reforma agrária.

Em 1961, o senador Guido Mondim (PRP-RS) citou num discurso que 2.000 escolas públicas haviam acabado ser inauguradas em seu estado num mesmo dia: “Realização do governador e engenheiro Leonel Brizola. Foram contratadas 12.370 professoras. Esperamos ver 1,3 milhão de crianças matriculadas em 1962. Portanto, nenhuma criança gaúcha sem escola”.

DEFESA DO PAÍS – Nacionalista, o governador denunciava os abusos cometidos pelo “capital estrangeiro” e determinou a encampação (apropriação) de duas empresas americanas que ofereceriam serviços de eletricidade e telefonia no estado.

O exilado Leonel Brizola só pôde retornar ao Brasil em 1979, após a Lei da Anistia. A ditadura sabia que ele não havia desistido do sonho de se tornar presidente da República. Para enfraquecê-lo, agiu para que ele não conseguisse recriar o PTB, dissolvido logo após o golpe de 1964.

SEM O PTB – O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) entregou o PTB à ex-deputada Ivete Vargas. Ela era ligada ao general Golbery do Couto e Silva, um dos nomes mais fortes da ditadura. A Brizola, então, restou criar o seu próprio partido, o PDT.

Uma das razões, aliás, para que a ditadura não ter permitido eleições diretas para presidente em 1985 foi o temor de que o vencedor fosse Leonel Brizola ou outro oposicionista tido como radical.

Brizola foi o único político a ser eleito governador de dois estados diferentes. Ele também esteve à frente do Rio de Janeiro de 1983 a 1987 e de 1991 a 1994.

PROJETO CIEP – No primeiro mandato, deu ênfase à educação. Sua grande vitrine foi o Centro Integrado de Educação Pública (Ciep). Projetados pelo arquiteto Oscar Niemeyer, os Cieps foram escolas públicas que ofereciam aulas o dia inteiro. Foi essa ação que deu início ao debate público no Brasil sobre o ensino integral.

No segundo mandato no Rio de Janeiro, Brizola foi pioneiro em políticas públicas para a igualdade racial. Ele criou a Secretaria de Defesa e Promoção das Populações Negras e a confiou ao histórico militante Abdias Nascimento.

Numa audiência pública no Congresso Nacional no início dos anos 1980, o governador disse: “O Brasil não terá caminho fora de uma visão de democracia social. E, quando falamos em democracia social, falamos em socialismo, em liberdade, em busca de uma sociedade igualitária, mais justa”.

COM LULA – Ao longo das décadas de 1980 e 1990, Brizola disputou com Luiz Inácio Lula da Silva (PT) o posto de principal líder da esquerda no Brasil.

Na campanha presidencial de 1989, o gaúcho chegou a figurar nas pesquisas de intenção de voto como franco favorito. O senador Mário Maia (PDT-AC) comemorou: “O povo o identifica como o legítimo e único sucessor de Getúlio Vargas e Jango”.

O senador João Menezes (PFL-PA) ficou intranquilo: “Temos, de um lado, a extrema esquerda, com Lula e com Brizola, e de outro, a extrema direita, com Ronaldo Caiado. Precisamos encontrar um candidato que represente a garantia da família e, ao mesmo tempo, do trabalhador do campo”.

EM TERCEIRO – Brizola chegou em terceiro lugar, perdendo para Lula, por uma diferença mínima de votos, o direito de ir ao segundo turno com Fernando Collor.

Em 1994, buscou a Presidência novamente. Acabou em quinto. Em 1998, lançou-se candidato a vice-presidente na chapa encabeçada por Lula. Também não venceu. Fernando Henrique Cardoso ganhou as duas disputas.

Brizola se tornou herói nacional em 2015. O Senado e a Câmara aprovaram um projeto de lei que incluiu o político gaúcho no “Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria”.

GRANDE BRASILEIRO – Para o historiador Américo Freire, é importante que os brasileiros o conheçam:

“Em seu tempo, a figura de Brizola foi tão politizada que era difícil perceber o seu significado histórico. Hoje, com distanciamento, conseguimos enxergar tudo que ele fez, sempre indignado diante da realidade social, e entender que o poder público pode, sim, fazer diferente, criar coisas novas, adotar uma política centrada nos direitos humanos. Brizola comprova que o Brasil é inventivo e tem repertório para fazer as mudanças”.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Como diz José Antonio Perez, “que falta faz Brizola!”. (C.N.)

13 thoughts on “Morto há 20 anos, Brizola liderou resistência armada e evitou golpe em 1961

  1. Senhor jaco , seria uma ” vergonha ” para os ditos de direita ou esquerda , se confrontarem com Leonel Brizola num debate limpo , pois todos seriam massacrados por não terem preparo algum até hoje . haja vista o que fizeram com o engenheiro Bautista Vidal , quando num debate que deveria ser técnico , os irmão Mendonça de Barro e outros participantes do governo FHC , por não terem argumentos para justificarem as privatizações das empresas ” publicas e estatais ” , estratégicas e rentáveis a mando de FHC , apelaram para ridicularizarem e desrespeitarem o engenheiro convidado , ou seja , hoje o Brasil esta muito carente de pessoas e agentes públicos decentes , honestos e preparados , para um debate de alto nível .

  2. Diante de tudo isso, vejo Brizola como multilateral surfista de uma gradativa maré vermelha, hoje “melanciado e instalado destruidor. tsunami!

  3. Dar uma preguiça danada, mas vamos lá. Sou obrigado a ler todo esse artigo para constatar ao final que só pode ser escrito por um cara da foice. O maior feito de Brizola foi desmontar a fraude eletrônica da Proconsult esse foi seu maior feito na vida. E esses imbecis acham que o corrupto ladrao do nine foi eleito em eleições limpas transparentes. Ah país vagabundo.

    • Até VOCÊ, Schossland !

      VOCÊ NÃO É COMENTARISTA 1,99.

      Cadê sua cultura,seu conhecimento ?

      PS:
      Por favor,sejas imparcial.

      Os tigres Asiáticos deram um salto qualificado aplicando os projetos Educacional BRIZOLISTA.

      Alguma dúvida, só entrar em contato nos respectivos Ministérios das relações exteriores.

      OBS :
      A dita direta,jamais perdoará os dois mandatos que o povo fluminense outorgou ao ilustre Governador LEONEL DE MOURA BRIZOLA…

      • Adendos, em:
        Em sua ativa e “ponti-ficada” multilateralidade, “ser-vis” arregimentados, para tanto alçados, vem sendo sistematicamente “extraídos do meio=derrubados=desmoralizados=mortos=assassinados”, após suas missões em etapas, terem sido realizadas à contento, quando não premiados invariavelmente pela impunidade, por “anistias e indenizações”, ora pois e porque: ” “G. – Você quer dizer que os maçons têm de morrer nas mãos da revolução que tem sido provocada com a sua cooperação?

        R. – Exatamente. Você ter formulado uma verdade que é velada por um grande segredo. Eu sou um pedreiro, você já sabia sobre isso. Não é assim? Bem, vou dizer-lhe esta grande segredo, o que eles prometem divulgar para um pedreiro em um dos graus mais elevados, mas que não é revelado a ele, quer no 25, nem o 33, nem o 93, nem qualquer outro nível elevado de qualquer ritual. É claro que eu sei disso não como um maçom, mas como alguém que pertence a “Them” …

        G. – E o que é?

        R. – Toda organização maçônica tenta atingir e criar todos os pré-requisitos necessários para o triunfo da revolução comunista; este é o objectivo claro da maçonaria; é claro que tudo isso é feito sob vários pretextos; mas eles sempre escondem-se por trás de seu slogan agudos bem conhecido. (Liberdade, Igualdade, Fraternidade -. Transl) Você entende? Mas desde que a revolução comunista tem em mente a liquidação, como uma classe, de toda a burguesia, a destruição física de todos os governantes políticos burgueses, segue-se que o verdadeiro segredo da alvenaria é o suicídio de maçonaria como uma organização, e o suicídio físico de cada maçon mais importante. Você pode, é claro, entender que tal um fim, que está sendo preparado para cada pedreiro, merece plenamente o sigilo, decorativo e a inclusão de mais uma série whoie de segredos, com vista a esconder o real. Se um dia você vier a estar presente em algum revolução futuro, então não perca a oportunidade de observar os gestos de surpresa e a expressão de estupidez no rosto de algum maçom no momento em que ele percebe que ele deve morrer nas mãos do revolucionários. Como ele grita e quer que se deve valorizar seus serviços para a revolução! É uma visão em que se pode morrer … mas de riso.

        G. – E você ainda nega a estupidez inata da “burguesia”?

        R. – Eu nego-o na burguesia como classe, mas não em determinados sectores. A existência de manicômios não prova loucura universal. A Maçonaria é também um hospício, mas em liberdade.”
        https://www.facebook.com/share/p/1whaTG7QA8sQ7j6s/?mibextid=oFDknk

  4. Brizola e o “socialismo moreno”.
    Se tivesse ganhado tudo, hoje seríamos uma nação socialista e não teríamos tantos jornalistas comunistas.
    Os países socialistas não primam por ter uma grande imprensa livre e democrática.

  5. Meu caro Schossland, não poderia ser diferente.
    Sempre nos brindando com excelente texto.

    Apenas pequenas observações:
    Em qualquer instituições públicas, associações religiosas,etc ..
    Seja no executivo,legislativo, judiciário, encontraremos divergências,e punhados de oportunistas com as mais variadas máscaras.

    De outra banda,pelo jeito a Maçonaria no RS ,( bairrista), é diferente das demais.
    Camarada pra ser maçom,tem que ser boa cepa.
    Ter uma religião seja qual for: Cristã,batuqueiro, evangélico,etc…
    Só não aceita ATEU..
    comunista….

    Mas,o cerne da questão é o emblemático BRIZOLA,que nunca foi maçom e nem comunista, os desafetos colocam esse rótulo a fim de achincalhar esse grande homem público com larga visão.

    Por derradeiro, olhe e compare a capa das revistas VEJA e dos acervos dos jornais da década 70/80 dos governantes antes do Governo BRIZOLA.

    Schossland,estou adormecido….

    Boa noite…

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