Não interessa o resultado da guerra, a Rússia perdeu a Ucrânia para sempre

Após dois anos de guerra na Ucrânia, o mundo é um lugar mais perigoso? -  YouTube

Reprodução da BandNews

Demétrio Magnoli
O Globo

Antes do 24 de fevereiro de 2022, os estadistas ocidentais que foram a Moscou para dissuadir Putin de invadir a Ucrânia sentaram-se na ponta de uma mesa interminável, como suplicantes diante de um czar. Celso Amorim sentou-se na mesma posição humilhante em março de 2023, quando transmitiu a solidariedade de Lula a um ditador com ordem de prisão emitida pelo Tribunal Penal Internacional.

Tucker Carlson teve tratamento distinto. No Kremlin, há pouco, entrevistou Putin separado apenas por uma intimista mesinha de centro. Não era jornalismo, mas propaganda política.

EM DUAS PARTES – Carlson, ex-âncora da Fox News, notório arauto da direita nacionalista dos Estados Unidos, exercitou o esporte da desinformação inteligente. A entrevista, com mais de duas horas, deveria ser editada em duas partes. Uma delas destina-se ao Partido Republicano, ao Congresso dos Estados Unidos e à base social de Trump. Na outra, controlada por Putin, o líder russo fala a sua própria audiência — ao nacionalismo grão-russo.

O segmento dirigido ao público externo é ritmado por previsíveis perguntas de Carlson, que embutem as respostas desejadas. A “operação militar especial” russa é uma ação defensiva provocada pelo “Ocidente coletivo”. A expansão da Otan ameaçava a integridade e a segurança russas.

A revolução popular de 2014 que derrubou o governo russófilo da Ucrânia teria sido um golpe de Estado tramado pelos Estados Unidos. A Ucrânia foi “nazificada” para servir como aríete contra a Rússia.

EUA ISOLADOS – Há pouco, num comício, Trump declarou que renegaria o artigo 5º do Tratado da Otan, em que está inscrito o compromisso de defesa mútua entre os Estados Unidos e seus aliados. Prometeu, ainda, erguer um “domo de ferro” de mísseis antimísseis para proteger os Estados Unidos de ataques balísticos. Uma superpotência isolada num casulo militar, uma política internacional baseada em esferas de influência, o abandono da Ucrânia — eis a receita estratégica do candidato republicano. É em nome dela que Carlson sentou-se à mesa íntima de Putin.

Na passagem mais curiosa, Putin sugere que, desde o fim da Guerra Fria, as agências de inteligência dos Estados Unidos sabotaram as oportunidades de aproximação estratégica com a Rússia ensaiada pelos chefes dos dois Estados.

MORTE DE NAVALNY – A entrevista ocorreu dias antes da eliminação, na prisão, de Alexei Navalny. Sem corar, diante de um ditador célebre pelas sistemáticas mortes “misteriosas” de seus críticos, Carlson aprova alegremente a tese de que os Estados Unidos são governados por forças diabólicas ocultas.

Faz sentido: em sua campanha de retorno à Casa Branca, Trump exibe-se como o condottieri do povo em combate contra o “Estado profundo”.

A esquerda lulista gostará dessa parte da entrevista tanto quanto a extrema direita bolsonarista. Lá, encontram-se as alegações protocolares usadas no Brasil, pelas duas torcidas uniformizadas, para justificar a guerra imperial russa.

VERDADEIRAS RAZÕES – O segmento dirigido ao público russo abrange uma confissão espontânea das motivações verdadeiras da invasão. Durante os primeiros 25 minutos, Putin oferece a Carlson uma aula completa sobre a História russa, tal como narrada pelos cavaleiros da Grande Rússia.

A Ucrânia não é uma nação legítima, mas o berço da Rússia eterna. A separação da Ucrânia, nascida de erros imperdoáveis dos bolcheviques, é uma violação cultural e religiosa abominável. A guerra restaura uma verdade sagrada estabelecida no século IX.

Esse segundo palanque, em que Putin fala para os seus, é contraindicado para a esquerda lulista. Mas não fará mal nenhum à direita bolsonarista, que tende a acreditar em verdades eternas e nações naturais.

OUTRAS VERDADES – Na encenação propagandística, nem tudo é desinformação. Putin registra, agudamente, que as sanções à Rússia fracassaram e que o uso do dólar como arma de guerra tem efeitos negativos de longo prazo para os Estados Unidos.

Igualmente, constata que não é realista o objetivo de impor uma derrota militar estratégica à Rússia.

Mas, num ponto crucial, Putin sonha acordado. Ao contrário do que profetiza, a ferida aberta entre o povo russo e o ucraniano jamais cicatrizará. Seja qual for o desenlace da guerra, a Rússia perdeu a Ucrânia para sempre. Foi isso que ele fez.

10 thoughts on “Não interessa o resultado da guerra, a Rússia perdeu a Ucrânia para sempre

  1. A OTAN sabe que a Ucrânia jamais terá forças para vencer a Rússia, e que fatalmente um dia os russos
    dominarão todo o pais.
    Viram qual era a situação e passaram a economizar o seu próprio dinheiro, não enviando mais ajuda aos ucranianos.
    A União Europeia, já tem seus pobres para serem ajudados, ainda vai ter que socorrer a Ucrânia também empobrecida e em guerra com um vizinho bem mais forte? Os europeus já estão se acostumando com a ideia da Ucrânia voltar a ser russa, e que isso não trás nenhum prejuízo a eles.
    Os americanos também já sentiram no bolso o custo da “empreitada” e também resolveram tirar o cavalo da chuva.
    Só resta agora saber quando a Ucrânia ira capitular e onde o atual presidente solicitará asilo diplomático.

    • A MK vai perder ali e em Israel, de onde será retirada como “escória”, que “alçando prepostos” suborna e despatria meio mundo!
      Aguardemos……

  2. A Ucrania será desmembrada pois ela foi constituída por regiões da Rússia, Romênia, Polônia. Mais de 90% da população fala russo, o próprio Volodymyr Zelensky aprendeu a falar ucraniano quando se tornou adulto pois ele só falava russo. A Rússia vai ficar com os territórios de linhagem russa por questões culturais/histórias e principalmente para garantir que armas de longo alcance não atinjam o seu território. Muito provavelmente a Polônia e Romênia devem ficar com áreas que antes pertenciam e essas nações. A Ucrânia virou um Paraguai depois da guerra com Brasil, Argentina e Uruguai. Perdeu as regiões mais ricas e se tornou uma nação de maioria feminina com muitos mutilados de guerra.

    A entrevista de Putin foi interessante pois Putin falou diretamente para o público americano coisas que eles não estão acostumados a ouvir principalmente porque as notícias são controladas. A explosão de Nord Stream foi um ataque a soberania alemã, hoje a Alemanha mergulha em uma crise, deixando ela e a Europa sem condições de competir com a China. Alemanha compra o gás com preço 5 vezes mais caro, acharam que a guerra da Ucrânia iria quebrar a Rússia economicamente. O PIB da Rússia está crescendo, as forças armas russa se adaptam e mostram sua força para o mundo.

    Alexei Navalny era corrupto, não foi preso a toa e falar que ele era o maior opositor de Putin é ridículo. O cara mal tinha 2% das intenções de voto.

    https://www.youtube.com/watch?v=jD1QyL7e4Ow

    • A Europa compra petróleo russo . O navio chega na Índia vindo da Rússia e só troca a nota fiscal e o manifesto de carga . Esse Demétrio escrevendo merda na #globolixo

  3. O bunker e suas digitais:
    Nação neutra;
    Cofre forte da corrupção mundial,
    Com a idade de 9 anos, um filho recebe uma arma e passa a treinar tiro ao alvo!

  4. Demétrio Magnoli exercitando o que mais gosta de fazer:

    apresentar uma visão de mundo a la olavo do carilho – sem os palavrões do guru BROXAnarista.

  5. 1) O autor da matéria deve entender muito do líder dele, que é o último ex-presidente brasileiro…

    2) De política internacional ele precisa aprender mais…

    3) Quis dizer que a Rússia queria anexar a Ucrânia, quer nada…

    4) Na verdade, os russos só queriam dar uma lição, parece que conseguiram, mas, infelizmente, toda guerra tem muitos mortos, refugiados e vítimas inocentes…

  6. Senhor Demétrio Magnoli (O Globo) , esquecestes de mencionar que embora a Rússia tenha perdido boa parte da Ucrânia , os Ucranianos perderão muitos mais , ou seja , toda a Ucrânia devido ao loteamento da Ucrânia entre os envolvidos em sua guerra contra a Rússia , sem contar que em breve as faturas de cobrança da dita e tal ajuda ” financeira e bélica ” começarão a chegar tão logo termine a guerra , com o agravante de que os Ucranianos , se tornarão escravos dos países-membros da OTAN , envolvidos na guerra Rússia & Ucrânia , que já começaram a negociarem com a Rússia melhores condições para o fim da guerra , por estarem perdendo muito que o esperado e que os USA , não os compensarão em seus prejuízos mercantis .

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