Dora Kramer
Folha
Depois de se recusar a comentar o ato bolsonarista de 25 de fevereiro e deixar que a plateia vaiasse a jornalista que o perguntou a respeito, o presidente Luiz Inácio da Silva reconheceu a magnitude da manifestação: “Foi grande, é só ver a imagem”.
Ficasse por aí teria rendido, ainda que tardia, homenagem ao realismo. Mas não. Preferiu a via de um contraproducente combate a “essa gente” que, pontuou, estava lá para defender o golpe.
IMPRUDÊNCIA – Conclusão imprecisa —não se pesquisou quantos ali eram golpistas— e imprudente para quem se elegeu por ínfima margem e precisa atrair ao menos parte de toda gente brasileira se quiser ser reeleito.
O presidente poderia ter considerado a hipótese bastante provável de que naquele ato não houvesse apenas fanáticos, mas um contingente insatisfeito com o governo, passível de atração se suas demandas forem compreendidas.
Lula também não está com essa bola toda para ameaçar retaliar deputados que assinaram um inútil pedido de impeachment, muito menos para tratar com desprezo possíveis eleitores. Na cena do combate político, é ele quem tem a perder. Ou a ganhar, dependendo das escolhas feitas.
VALOR INTANGÍVEL – Ao inelegível Jair Bolsonaro, por enquanto, resta a liberdade. Conta com as fotografias da Paulista, cujo valor neste momento não é tangível. Pode vir a ser mensurado em votos se Lula não retomar o prometido conceito de frente ampla.
O petista fez isso lá atrás quando foi eleito porque as pessoas realmente quiseram ver na Presidência o signatário da Carta aos Brasileiros. Escolheram-no por gosto. Agora, da terceira vez, o fizeram por precisão. Faz toda diferença.
Em 2026 não haverá na urna um Bolsonaro a ser impedido de repetir ou pior, replicar, os desmandos. Continuará, no entanto, havendo um eleitorado por ora desgostoso com o rumo sectário da carruagem, mas que pode ser reincorporado se o presidente disponibilizar os ouvidos e abrir os olhos para os ditames da realidade à sua volta.