Sem recursos e armas, a Ucrânia entra em desespero e Biden finge que pode intervir

Rússia ataca a Ucrânia; explosões são ouvidas em várias cidades | CNN Brasil

Rússia ataca várias cidades ucranianas, ao mesmo tempo

Deu no Poder360

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, afirmou na 6ª feira (29.dez.2023) que o país pode participar ativamente da guerra entre a Rússia e a Ucrânia caso Vladimir Putin siga com ataques de larga escala contra a nação vizinha. Biden sugere que EUA podem intervir diretamente na Ucrânia e diz que os norte-americanos não podem decepcionar os ucranianos.

“Quando se permite que ditadores e autocratas atuem na Europa ignorando as regras, aumenta o risco de os Estados Unidos serem atraídos diretamente [no conflito]“, escreveu Biden.

MAIOR ATAQUE – Segundo o presidente norte-americano, a ofensiva russa realizada na 6ª feira (29.dez) foi “o maior ataque aéreo desde o início da guerra”. De acordo com autoridades ucranianas, ao menos 30 pessoas morreram e pelo menos outras 150 ficaram feridas depois que a Rússia lançou cerca de 158 mísseis e drones contra a capital Kiev, Odessa, Kharkiv, Dnipro, Lviv e Zaporizhzhia.

“A Rússia nos atingiu com quase tudo que tem em seu arsenal”, disse o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. A ofensiva atingiu uma maternidade, centros comerciais e áreas residenciais na Ucrânia.

“É um duro lembrete ao mundo de que, depois de quase 2 anos desta guerra devastadora, o objetivo de Putin permanece inalterado. Ele procura destruir a Ucrânia e subjugar o seu povo. Ele deve ser parado”, declarou Biden.

APELO AO CONGRESSO – O norte-americano também sinalizou que, a menos que o Congresso tome “medidas urgentes” em 2024, os EUA não conseguirão manter o envio de recursos e equipamentos militares à Ucrânia.

“O Congresso deve se prontificar e agir sem mais demora”, afirmou o presidente. “Não podemos decepcionar a Ucrânia. A história julgará severamente aqueles que não responderem ao chamado da liberdade”, disse.

O Congresso dos EUA travou a aprovação de um pacote de US$ 61 bilhões em assistência à Ucrânia. Antes de liberar a verba, congressistas querem que o presidente Biden autorize o aumento de recursos para o combate à entrada de imigrantes pela fronteira com o México.

FALTAM DÓLARES – Desde o início do conflito entre a Rússia e a Ucrânia, o governo dos EUA já enviou mais de US$ 75 bilhões a Kiev, incluindo apoio humanitário, financeiro e militar.

O Pentágono tem atualmente US$ 4,4 bilhões disponíveis para fornecer armas diretamente a Kiev a partir do estoque do Departamento de Defesa norte-americano, segundo o porta-voz Garron Garn. No entanto, a transferência dessas armas está limitada pela necessidade de financiamento para repor os estoques nacionais, que estão quase esgotados.

O Orçamento de Segurança de Emergência proposto por Biden, em discussão no Capitólio, é de US$ 111 bilhões. Esse suplemento contemplaria mais de US$ 60 bilhões em ajuda para a Ucrânia, mais de US$ 14 bilhões para Israel, além de financiamento para Taiwan.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Já era esperado. Como a prioridade dos EUA é e sempre foi apoiar Israel, os norte-americanos têm de cortar as verbas para a Ucrânia e Taiwan, facilitando a vida dos russos e chineses. O presidente ucraniano Zelensky está desesperado, mas a fonte vem secando e os EUA jamais irão participar da guerra. Biden está apenas blefando. Se os Estados Unidos reduzirem a ajuda à Ucrânia, os países europeus farão o mesmo e a guerra será vencida por Putin. (C.N.)

Lula imita Bolsonaro e tem mais medidas provisórias caducadas do que aprovadas

Lula está prestes a cometer um grande erro, ao pretender imitar práticas de  Bolsonaro - Blog do B.Silva

Charge do Amarildo (Arquivo Google)

Gabriel Hirabahasi
Estadão

O presidente Lula da Silva (PT) deve encerrar seu primeiro ano de mandato com mais medidas provisórias que perderam validade do que aprovadas no Congresso Nacional. Desde 2003, quando o petista tomou posse para seu primeiro mandato, apenas em 2019 e 2020, com Jair Bolsonaro, e em 2023, o presidente da República fechou o ano com menos MPs aprovadas do que caducadas. Neste último caso, porém, a proporção é bem maior.

Levantamento do Broadcast/Estadão mostra que, até o dia 20 de dezembro, Lula viu 20 medidas provisórias perderem a validade e apenas sete serem aprovadas pelo Congresso Nacional.

COM BOLSONARO – Em 2020, 54 MPs assinadas pelo então presidente Bolsonaro perderam validade antes que fossem analisadas pelo Congresso. Outras 53 foram aprovadas pelos parlamentares e sancionadas pelo chefe do Executivo. Em 2019, a proporção foi semelhante: 23 medidas provisórias caducaram antes de serem votadas e 22 foram aprovadas.

Em todos os outros anos (de 2003 a 2018 e de 2021 a 2022), os presidentes da República conseguiram aprovar mais MPs no Congresso, mesmo com bases parlamentares frágeis em alguns momentos.

O baixo número de MPs que tiveram o aval dos parlamentares neste primeiro ano do terceiro mandato de Lula se explica pela disputa no Legislativo em torno do rito de tramitação das medidas provisórias.

TRAMITAÇÃO – Pela Constituição, as medidas provisórias têm de ser analisadas por comissões mistas, para somente então serem encaminhadas primeiro à Câmara e depois ao Senado. As relatorias nos colegiados mistos são alternadas: uma MP é relatada por um deputado e a seguinte, por um senador, visando dar equilíbrio de protagonismo às duas Casas.

A escolha do relator na comissão mista é importante porque empodera o parlamentar definido para negociar com o governo e com seus pares.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e líderes da Câmara próximos a ele se recusaram a indicar integrantes de diversas comissões mistas. Lira também avisou o governo que não pautaria algumas MPs para votação no plenário da Câmara, orientando que as propostas fossem reencaminhadas como projetos de lei.

MUITOS ENTRAVES – Diversas proposições passaram por esse entrave no Congresso. A MP que tratava da tributação de offshores, por exemplo, teve de ser enviada novamente ao Congresso no formato de projeto de lei. O mesmo ocorreu com a proposta que retomava o voto de qualidade no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf).

O efeito prático foi que o governo perdeu tempo de debate dos assuntos e teve de lidar com o desgaste de negociar com líderes da Câmara e do Senado em relação aos temas. Para evitar desgastes, principalmente com Lira, em quase todas as oportunidades o Palácio do Planalto preferiu atender aos pedidos e enviar os projetos ao Legislativo.

Uma das únicas vezes em que o governo bateu o pé e insistiu na tramitação de uma medida provisória foi com a mudança nas subvenções do ICMS, aprovada no Senado no último dia 20 e enviada à sanção presidencial. O motivo: como a regra de tributação foi instituída por meio de medida provisória, não teria de passar por um período de “quarentena” antes de entrar em vigência. Se fosse aprovada por meio de um projeto de lei, só valeria a partir de abril – e o governo perderia a nova arrecadação nos primeiros meses de 2024.

Crise entre STF e Congresso é causada pela bancada bolsonarista, alega Barroso

Derrotamos o bolsonarismo': Barroso diz ter se referido ao 'extremismo golpista' em ato da UNE – Justiça – CartaCapital

Barroso repete que o Supremo salvou a democracia

Constança Rezende
Folha

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, avalia que os embates com o Poder Legislativo também são reflexo da onda bolsonarista que tomou o Congresso nas últimas eleições, com apoio de um ex-presidente que elegeu a corte “como o seu principal inimigo”.

Em entrevista à Folha, Barroso afirma que, durante quatro anos, “houve um presidente da República que elegeu o Supremo como seu adversário” e que essa linhagem política tem muitos representantes no Parlamento.

MAIOR BANCADA – O PL, partido de Jair Bolsonaro, chegou a 99 deputados nas eleições de 2022, formando a maior bancada eleita na Câmara nos últimos 24 anos e conseguiu ocupar 14 cadeiras no Senado Federal.

“É natural que estes parlamentares queiram corresponder às expectativas dos seus eleitores que acham que o Supremo é parte do problema”, disse Barroso.

“O ex-presidente atacava o tribunal e ofendia seus integrantes com um nível de incivilidade muito grande. Em qualquer parte do mundo, isso seria apavorante”, acrescenta, afirmando também que tal comportamento “foi relativamente tolerado por um grande contingente de eleitores que se identificaram com aquela linguagem e atitude”.

PAUTA ANTI-STF – Apesar disso, o ministro afirma discordar do termo “pautas anti-STF”, usado para definir as propostas analisadas pelo Congresso que podem reduzir as atribuições de seus integrantes.

Em novembro, o Senado aprovou uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que limita as decisões individuais de ministros do tribunal, após uma ofensiva encampada pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O senador também já defendeu a criação de mandato para ministros da corte.

Barroso diz ter uma relação muito boa com Pacheco, a quem chama de “uma liderança importante e extremamente civilizado e educado”, e com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Porém, diz que o Senado tem um conjunto de parlamentares que têm uma visão crítica severa do Supremo que, para ele, é injusta.

SIMBOLOGIA RUIM – “Ele [Pacheco], presidente de uma Casa, procura, em alguma medida, expressar o sentimento dominante naquela Casa. O que eu verbalizei mais uma vez é que mexer no Supremo, no ano em que foi invadido por golpistas antidemocráticos, é uma simbologia ruim”, afirma.

O presidente do STF diz que entende as circunstâncias da política e tem procurado convencer eleitores, e indiretamente aos seus representados, de que o Supremo não é parte do problema, mas da solução.

“O Supremo tem feito muito bem ao país. Na defesa da democracia, nós prestamos um serviço importante. Não acho que o STF acerta sempre. Como uma instituição humana, ele tem falhas. Num colegiado, pessoas têm ideias próprias, às vezes um de nós diverge de alguma linha que prevaleça, ninguém é dono da verdade”, disse.

IDEIA EQUIVOCADA – Para o magistrado, a principal alteração da PEC já foi acolhida espontaneamente pelo Supremo, a submissão ao plenário das medidas cautelares em ações diretas que envolvem atos dos outros Poderes. Por isso, segundo ele, o problema não é o seu conteúdo, mas a sua “simbologia e oportunidade de passar para a sociedade a ideia equivocada de que o Supremo tem algum problema”.

Ao ser questionado sobre a pesquisa divulgada neste mês pelo Datafolha, que apontou o crescimento da reprovação do STF pela população de 31% para 38%, Barroso disse que não se impressionou com o resultado.

Ele afirma que não se pode medir se o tribunal está prestando adequadamente o serviço que lhe cabe em pesquisa de opinião pública, mas se as instituições sobreviveram a tentativas de golpe contra a democracia o que, segundo o ministro, foi em grande parte graças ao Supremo.

DETER O POPULISMO – “Nós conseguimos deter o populismo autoritário, prestamos um serviço imprescindível ao país, que é a preservação da Constituição e da democracia”, afirma. “O Supremo cumpriu o seu papel. Opinião pública é um conceito um pouco volátil, ela varia e muda a opinião pública de lugar com frequência. Eu sou um sujeito que eu vivo para a história e não para o dia seguinte.”

Além disso, o magistrado diz que o Supremo decide as questões mais divisivas da sociedade brasileira e que “em alguma medida está sempre desagradando alguém”.

“Interpretar a Constituição, com independência e coragem moral, significa desagradar setores da sociedade, política ou economia. O juiz tem que ser bem analisado, senão vai sofrer muito com diferentes níveis de rejeição de grupos da sociedade”, afirma.

EXPLICAR MELHOR – Apesar disso, Barroso diz que o STF tem procurado se comunicar com a sociedade e explicar melhor suas decisões. Também afirma que, em nenhum momento, o Supremo impediu qualquer presidente de governar.

“Era uma narrativa falsa que, no entanto, criava animosidade porque o populismo autoritário precisa de inimigos. A democracia tem lugar para liberais, progressistas e conservadores, menos para quem não admite a democracia. Tenho procurado convencer as pessoas que o Supremo é indispensável na democracia.”

A raiva ao STF, segundo ele, vem de um processo histórico de desrespeito institucional e, também, de uma animosidade criada artificialmente nas redes sociais, produto de atuação de robôs. “Há uma motivação política de mobilização de bases radicais no discurso contra o Supremo”, afirma.

Charge do Zé Dassilva: Lembrancinha da vovó - NSC Total

Charge do Zé Dassilva (NSC Total)

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG –
Barroso é um cavalheiro, superpreparado, mas está fazendo uma avaliação errada. A História jamais vai aceitar essa farsa de “terroristas” desarmados querendo dar golpe militar. Essa decisão do Supremo, considerando “terrorista” quem apenas invadiu os palácios, é de um ridículo absoluto. Barroso deveria pensar sobre isso, ao invés de se vingar prendendo pessoas cujo principal crime foi acreditar em líderes políticos que não têm o menor caráter. (C.N.)

Não falta motivo para proibir reeleição de presidente, governador e prefeito

FHC faz um diagnóstico perfeito, mas indica um remédio insuficiente -  Flávio Chaves

Charge do Kacio (Metrópoles)

Mario Sabino
Metrópoles

A data mais funesta para o Brasil redemocratizado não é 8 de janeiro de 2023, como querem fazer crer. É 4 de junho de 1997. Naquele dia de 26 anos atrás, aprovou-se a emenda da reeleição para presidente da República, governadores e prefeitos.

A Constituição de 1988 havia descartado a reeleição para cargos no Executivo. Mais uma das nossas poucas decisões sábias que foram revogadas. Para permanecer no poder por mais um mandato, Fernando Henrique Cardoso comprou uma penca de parlamentares e fez aprovar a emenda constitucional que estabeleceu a estrovenga.

ERRO DE FHC – Fernando Henrique Cardoso sempre negou que tenha comprado a emenda da reeleição. Só faltava admitir. O ex-presidente diz que não comprou, nem precisava, porque a maioria da população e a maioria do Congresso temiam a vitória de Lula.

No terreno das admissões prováveis, ele reconheceu, em 2021, em artigo publicado em dois jornais, um paulista e um carioca, que errou quadradamente no principal. Escreveu Fernando Henrique Cardoso, em versão condensada:

“Cabe a mim um ‘mea culpa’. Permiti, e por fim aceitei, o instituto da reeleição. Sabia e continuo pensando assim, que um mandato de quatro anos é pouco para ‘fazer algo’. Tinha em mente o que acontece nos Estados Unidos. Visto de hoje, entretanto, imaginar que os presidentes não farão o impossível para ganhar a reeleição é ingenuidade.

CINCO ANOS – Devo reconhecer que historicamente foi um erro: se quatro anos são insuficientes e seis parecem ser muito tempo, em vez de pedir que no quarto ano o eleitorado dê um voto de tipo ‘plebiscitário’, seria preferível termos um mandato de cinco anos e ponto final.”

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, quer consertar esse erro histórico e discutir o fim da reeleição. De acordo com ele, o assunto será prioridade em 2024: “O fim da reeleição é algo que é um desejo muito forte dos senadores, nós vamos fazer audiências públicas, debater isso”.

A substituição da possibilidade da reeleição por um mandato de cinco anos é um toma lá dá cá. Essa história de que 4 anos é pouco é balela. Em 4 anos, dá perfeitamente para um presidente, um governador e um prefeito arrombarem os respectivos cofres públicos.

PODER ETERNO – Paguemos esse preço, tudo bem. Cinco anos são menos desastrosos do que oito ou 16 anos — se um presidente reeleito conseguir eleger um poste, esse será o tempo que ele permanecerá continuamente no poder. Mas não deveríamos abrir mão de impedir que, uma vez presidente, o sujeito possa voltar a sê-lo, a qualquer tempo. O mesmo deveria valer para os demais cargos do Executivo.

Rodrigo Pacheco defende o fim da reeleição para “acabar com o estado eleitoral permanente”. Um jornalista já resumiu o que isto significa:

A reeleição é o nascedouro dos nossos maiores problemas porque o governante eleito, não importa o sinal ideológico, passa a preocupar-se unicamente com ficar mais quatro anos no poder. Assim, deixa de tomar medidas antipáticas necessárias à nação e passa a trabalhar em regime de dedicação exclusiva para ser reeleito, principalmente a partir do segundo ano de governo”.

AVES DE RAPINA – “Torna-se candidato com mandato, avançando sobre o Orçamento como se fosse recurso de campanha. As aves de rapina do Congresso, obviamente, cobram um preço elevado por isso. Criam dificuldades para vender facilidades, na forma de obstruções sistemáticas em votações relevantes, CPIs e pedidos de impeachment. Depois de levar o seu quinhão de dinheiro público, aderem. O fisiologismo e o corolário dele, a corrupção, sempre existiram, mas o seu coágulo mortal, o Centrão, só cresceu a ponto de entupir as artéria da democracia graças à emenda que constitucionalizou a reeleição.”

Escrevi o trecho acima em 2019, antes de FHC arrepender-se. Está publicado no meu livro “Me Odeie Pelos Motivos Certos.” Mas estou longe de ser original. Se reeleição fosse boa coisa para o país, Jair Bolsonaro e Lula não teriam mentido que jamais buscariam reeleger-se.

Espero que Rodrigo Pacheco consiga levar adiante o fim da reeleição (seria a partir de 2030). A ruína causada pela PEC da reeleição é bem maior do que a de 8 de janeiro e está na origem do quebra-quebra bolsonarista. O meu princípio de realidade indica, contudo, que o Centrão cobrará mais caro para não mudar nada. Por que mudar o que está dando certo para ele e errado para o Brasil?

Jovens, que eram público quase cativo da esquerda, aderem à extrema direita 

Charge do JCaesar | VEJA

Charge do JCaesar | VEJA

Hélio Schwartsman
Folha

Os jovens estão ficando de direita? Depende. No Brasil, os mais jovens deram bem mais votos a Lula do que a Bolsonaro, mas, na vizinha Argentina, o apoio dos mais novos foi decisivo para eleger Milei. Nos EUA, a ala trumpista do Partido Republicano tem conseguido adeptos entre jovens negros e latinos, dois grupos demográficos que eram quase que hegemonicamente democratas.

Se olharmos para outros países, como França, Alemanha, Espanha, também encontraremos jovens entre os apoiadores de partidos de extrema direita, que vêm crescendo.

É UMA TENDÊNCIA – Não dá obviamente para dizer que a maioria dos jovens aderiu ao populismo de direita, mas, se considerarmos que esse era um público quase cativo da esquerda do pós-guerra para cá, a tendência é inquietante.

Há uma explicação comum para o fenômeno? As redes sociais, ao permitir que ovelhas que antes permaneciam desgarradas se encontrem, se influenciem e ganhem voz, decerto têm algo a ver com isso. Líderes da direita também parecem ter um talento especial para mobilizar pessoas pela internet.

Já entrando no terreno das especulações, eu arriscaria a hipótese de que, diante de certa fossilização da esquerda, que ficou mais moderada e mais institucional, a extrema direita é que passou a fazer as vezes de polo contestador e radical, características que costumam atrair os mais jovens, às vezes mais por razões estéticas do que propriamente políticas.

E A DEMOCRACIA – Já vimos esse filme antes. O futurismo de Filippo Marinetti, que surgiu nos primeiros anos do século 20 como um movimento vanguardista ligado às artes, logo se tornou uma linha auxiliar do fascismo de Mussolini.

O problema não é tanto que jovens votem na direita. A aceitação da ideia de democracia implica admitir a alternância do poder.

O que preocupa é que estejam escolhendo vertentes antissistema da direita, que negam os avanços institucionais e civilizacionais obtidos nas últimas décadas e séculos.

Lula e Pacheco fecham o ano em rota de colisão, adiando a crise para fevereiro

30/09/2023 - Duke | Folha

Charge do Duke (Folha)

Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense

A quinta-feira não foi de bom agouro para as relações entre o presidente Lula da Silva (PT) e o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em 2024, um ano eleitoral, ao menos simbolicamente. Embora a política se pareça com as nuvens, como diria o antigo político mineiro Magalhães Pinto — “você olha e ela está de um jeito; olha de novo e ela já mudou” —, pode ser até que tudo não passe de um jogo de cena, cada qual para sua plateia, mas o choque tem bases objetivas que devem ser levadas em conta.

No mesmo dia em que Pacheco promulgou o marco temporal e a nova lei de desoneração da folha de pagamento, cujos vetos presidenciais foram derrubados pelo Congresso, Lula sancionou a nova Lei dos Agrotóxicos, com novos vetos que restabelecem o poder do Ibama e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em relação ao Ministério da Agricultura.

BRIGA BOA – É mais uma queda de braços entre o Executivo e o Legislativo, na qual a bancada do agronegócio, com toda certeza, levará a melhor, em razão da correlação de forças no Congresso.

O PL do Veneno, como é chamado pelos ambientalistas, tramitou 24 anos no Congresso, antes de ser aprovado, em novembro. Os 14 vetos, segundo comunicado do governo, “vão garantir a adequada integração entre as necessidades produtivas, a tutela da saúde e o equilíbrio ambiental”. Será?

Para derrubá-los, os ruralistas precisarão apenas de maioria simples no Congresso, no qual o governo é minoritário em temas que envolvem interesses do agronegócio, da bancada da bala e dos evangélicos, a coalizão que elegeu e apoiou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), imbatível quando se une.

CLIMA TENSO – Isso vem ocorrendo com mais frequência do que se esperava, embora o governo Lula tenha conseguido algumas vitórias estratégicas no Congresso, como a reforma tributária, que precisa ser regulamentada no próximo ano.

A aprovação do Orçamento da União consolidou a perda de controle do governo sobre grande parcela das despesas discricionárias, aquelas que não são obrigatórias, como recursos para custeio e investimentos. As despesas obrigatórias são, principalmente, pagamento de pessoal e benefícios previdenciários. Sem a maior parte das verbas discricionárias, o governo não funcionaria.

Para completar, na sexta-feira o governo mandou para o Congresso a Medida Provisória da Reoneração, comprando uma briga direta com os parlamentares, que consideraram a decisão como “uma afronta”. Com isso, Lula e Haddad conseguiram colocar o Parlamento em pé de guerra, ao apunhalá-lo pelas costas em pleno recesso, que termina em fevereiro.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Governo e Congresso estão errados em suas posições intransigentes. Espera-se que os políticos esfriem a cabeça no recesso e se dediquem à arte do entendimento, sem a qual ninguém governa. O clima é o pior possível. (C.N.) 

Baixo nível do Congresso é assustador e querem adotar o semipresidencialsimo

O Congresso que é a Cara do Brasil: cúmplice da corrupção - O que é notícia  em Sergipe

Charge do Clayton (O Povo/CE)

Roberto Nascimento

Nos últimos 20 anos, pioramos muito nas escolhas dos políticos para nos representar. Aliás, se piorar mais do que isso aí, a vida da gente se tornará insuportável. As Bancadas da Bíblia e da Bala, junto com praticamente todo o PL, votam sempre contra o povo trabalhador.

Não deixam passar nenhum avanço social e ainda votam para tirar quase tudo que foi conquistado. Eles odeiam os direitos sociais e o escopo do famoso artigo 5º da Constituição.

HÁ REAÇÃO – Só falta eles trabalharem no ano que vem para refazer a Constituição. O presidente Boric, do Chile, tentou e não conseguiu, derrotado no plebiscito.

O povo vai até certo ponto. Quando as classes dirigentes exageram, a massa dá o troco. Estamos vendo isso na Argentina, onde é impressionante a reação contra as destrambelhadas medidas do governo Milei.

Aqui no Brasil, a atual geração piorou muito nas escolhas de seus representantes, no Senado, na Câmara, nas Assembleias e naa Câmaras dos Vereadores. Tanto, que venho dizendo que este é o pior Congresso de todos os tempos, superando o anterior, dos quatro anos a partir de 2018.

E VAI PIORAR… – Pelo andar da carruagem, os próximos, de 2024 e 2026, serão ainda piores. Como dizia Ulysses Guimarães, que foi profético: “Se você acha esse Congresso ruim, espere pelo próximo”. Acertou em cheio. Vai mesmo ser pior e com uma bancada bolsonarista expressiva. Não vão deixar ninguém governar com o semipresidencialismo. Pior para o Brasil, que eles querem ver rastejando na lama.

Tudo começa na Educação. Suas excelências fazem tudo para reduzir os recursos destinados ao MEC. Jogam pesado na ignorância do povo. O cabo de guerra deles, agora, é prejudicar o ministro da Educação, Camilo Santana.

Não querem votar a Reforma da Educação, no quesito tempo integral. Quanto mais tempo fora da escola, melhor para eles. Um absurdo contra os brasileiros pobres e da classe média. Basta citar os exemplos asiáticos – Japão, China, Coreia do Sul e Vietnã, que acaba de ultrapassar o Brazil em faturamento com exportações,

DARCY E BRIZOLA – Darcy Ribeiro jamais cansou de pedir tempo integral nas escolas. Entrou na História sua advertência: “Se não construirmos escolas, teremos de fazer mais presídios”.

O inovador projeto dos CIEPS foi boicotado por todos os partidos, até o PT e pasmem, parte do PDT, também. Quem bancava sozinho essa revolução educacional era Leonel Brizola. Infelizmente, não foi eleito presidente. E todo o sistema se voltou contra ele.

Agora, estamos experimentando o caos urbano, a violência nas ruas, roubos, furtos e mortes, porque negligenciamos nas políticas educacionais e de inclusão dos brasileiros mais pobres. Portanto, temos de continuar lutando pela educação, até o fim.

Dino deixa Justiça com transparência pior do que Moro, Mendonça e Torres

O ministro da Justiça, Flávio Dino, deixará a pasta como recordista de recusas de pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação (LAI)

Dino é democrata do tipo aparente: diz uma coisa e faz outra

Gabriel de Sousa
Estadão

O ministro da Justiça, Flávio Dino, deixará o Ministério da Justiça com um recorde em negativas de pedidos de acesso a informações públicas sob a alegação de sigilo de informações. Segundo o Painel da Controladoria Geral da União, a Justiça, sob a gestão do ministro do presidente Lula da Silva negou mais pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação desde que a legislação passou a vigorar em 2012, superando os ex-ministros Sérgio Moro, André Mendonça e Anderson Torres, do governo de Bolsonaro.

A pasta de Dino justifica que a alta em pedidos negados se deve a requerimentos sobre investigações dos ataques de 8 de janeiro.

DIZ A LEGISLAÇÃO – A Lei de Acesso à Informação, conhecida como LAI, estabelece que cidadãos brasileiros tenham a garantia do acesso a dados públicos das esferas federal, estadual e municipal. O texto da lei, sancionada em 2011 pela então presidente Dilma Rousseff, considera informação sigilosa aquela que é imprescindível “para a segurança da sociedade e do Estado”.

Em 2023, o Ministério da Justiça negou 16,6% dos pedidos feitos via LAI. Quando o ministério estava sob a coordenação de Anderson Torres, entre março de 2021 e dezembro de 2022, 7,7% das demandas tiveram negativas por parte do Ministério da Justiça. Com André Mendonça, que antecedeu Torres e agora dividirá o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) com Dino, 12,2% dos pedidos não foram concedidos.

Já com Sérgio Moro, que foi ministro do início do governo de Bolsonaro até abril de 2020, foram negados apenas 6,7% dos pedidos feitos via LAI.

HISTÓRICO – A LAI passou a vigorar em maio de 2012, no governo de Dilma e, na gestão da petista, a Justiça deu negativas para 3,7% das solicitações. Ao longo de toda a gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB), a pasta não concedeu 3,5% das demandas.

Dos 16,6% dos pedidos feitos via LAI negados pelo ministério de Dino, 45,3% foram considerados pela pasta como informações sigilosas de acordo com “legislação específica” ou assegurados pela lei de 2011. Outras 9,72% das demandas tiveram concessão negada por se tratarem de dados pessoais e 5,67% não foram contempladas por serem “desproporcionais ou desarrazoados”.

Durante a gestão de Torres, 36,3% dos pedidos foram negados sob a alegação de sigilo. Já no comando de André Mendonça, o motivo foi usado em 38,5% das recusas. Perto do percentual de Dino, a Justiça na liderança de Moro usou esse pretexto em 41,5% das solicitações não concedidas.

TUDO ERRADO – De acordo com Júlia Rocha, coordenadora de Acesso à Informação e Transparência da Artigo 19, ONG que defende a ampliação do acesso à informação no mundo, o número elevado de recusas por parte da Justiça em 2023 é um contraponto à transparência que a LAI exige dos gestores públicos.

“Quando vemos um órgão que deveria garantir o correto andar da Justiça e da Segurança Pública negando tantas informações, já podemos pensar sobre qual é o comprometimento desse ministério específico com a causa e a pauta da transparência e também com as políticas de incentivo aos direitos”, afirmou.

Em nota enviada ao Estadão, o Ministério da Justiça afirmou que o alto número de recusas a pedidos de LAI neste ano se deve a solicitações relacionadas às investigações dos ataques antidemocráticos do 8 de janeiro. “Tais atos geraram a abertura de investigações policiais e outros procedimentos, razão de muitos pedidos que foram indeferidos”, disse.

CADEADO DE CHUMBO – O ministério sustenta que a Lei de Acesso à Informação foi “bem aplicada” pela pasta ao longo de 2023 e que dados que não foram repassados seguem legislações específicas.

“As informações que não foram repassadas via LAI estão cobertas pelo sigilo, cumprindo a legislação específica. Tal fato, como comprovam os dados da Controladoria-Geral da União, não refletiu em aumento no pedido de recursos no órgão”, afirmou.

No final de novembro, o Ministério da Justiça recebeu o prêmio “Cadeado de Chumbo 2023″, que escolheu as piores respostas de órgãos públicos a pedidos feitos via LAI. A escolha das instituições que desrespeitaram os princípios de transparência foi organizada pela Rede de Transparência e Participação Social e pelo Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Nada de novo. A boa intenção do governo Dilma resvalou agora para a vala comum da transparência governamental. Vivemos numa democracia moderna, do tipo virtual. Dizem que é democracia, mas parece ditadura. Pense sobre isso. (C.N.)

Somos todos uma coisa só, divididos por religiões arcaicas e líderes ineptos

Mesmo as estrelas, que parecem tão... Carl Sagan - PensadorJosé Antonio Perez

Chegamos à festa do Ano Novo, hora de olhar para a frente. O Natal, infelizmente, está a cada ano mais comercial e, portanto, menos reflexivo. Poucos se ligam nas palavras do Cristo, quando precisamos desesperadamente de menos individualismo e mais amor. As bombas continuam caindo e a fome só aumenta no mundo, apesar de toda a evolução tecnológica. Mas poucos refletem sobre isso e continuam discutindo temas obsoletos como o racismo.

Tenho ascendência europeia pelos dois lados e todos por aqui me consideram branco, mas para o Departamento de Imigração norte-americano sou identificado como “brown” (marrom).

SOMOS DIFERENTES – Cada um se vê de um jeito e cada um enxerga o outro de uma maneira diferente das demais. É da vida. mas uma coisa eu garanto – mesmo após milhões e milhões de anos de misturas raciais, o ser humano pode até ficar homogêneo, porém jamais verá o outro como vê a si próprio.

Sempre haverá alguns que se acharão melhores que os outros. Mesmo que a aparência e a cor da pele sejam iguais.

Deviam disseminar aos jovens os ensinamentos de cientistas como Carl Sagan, para entenderem o que é a vida e o que estamos fazendo por aqui. “O cosmos está dentro de nós. Somos feitos de matéria estelar. Somos uma forma de o universo conhecer a si mesmo”, dizia o genial Sagan.

UMA COISA SÓ – Desde a minúscula poeira até a maior estrela existente no universo, somos todos uma coisa só. Tudo está vivo, até mesmo as pedras, pois dentro dos átomos a vida se move o tempo todo. Assim, sou pela unidade da vida.

Fazemos parte de uma coisa só, deveríamos ser unidos pela educação primorosa, mas somos eternamente divididos por religiões primárias e políticos despreparados.

Dizem que “o voto é livre”, porém os sistemas político, eleitoral e partidário são totalmente disfuncionais e subversivos. Aqui no Brasil, as distorções começam nos partidos, na escolha dos candidatos e na liberação dos dinheiros públicos que financiam as campanhas. Tudo é centralizado nas mãos de alguns poucos. Mesmo assim, precisamos nos adaptar e ir em frente. Não há alternativa.

Um Feliz Ano Novo para todos.

Lula agora anuncia que ninguém acredita em Deus mais do que ele

Em carta aos evangélicos, Lula defende liberdade de culto

Lula busca un novo caminho para ganhar os votos evangélicos

Bruno Boghossian
Lula

Após resistência no ano de campanha, petistas tentam disputa nos campos da fé e dos cofres do governo. Nas últimas semanas, Lula fez duas referências aos evangélicos. Num ato do PT, o presidente reconheceu que a sigla tem dificuldade em se comunicar com o grupo.

Depois, num evento do governo, ele reclamou dos ataques da campanha e emendou: “Se tem um cara neste país que acredita em Deus, é este que está vos falando”.

USAR DINHEIRO – Conselheiros influentes de Lula sempre resistiram à ideia de disputar o eleitor evangélico no campo da fé. O argumento era que a esquerda jamais empunharia certas bandeiras conservadoras. Entrar nessa briga, portanto, evidenciaria uma diferença brutal de valores. O melhor, segundo esses auxiliares, seria fisgar o segmento pelo bolso.

O vínculo cristalizado desse eleitor com o bolsonarismo sugere que talvez não seja suficiente contar com uma melhora da economia. Há uma barreira anterior, ligada a um senso de pertencimento, que faz com que muitos evangélicos ainda vejam a esquerda como adversária.

Se Lula disser uma ou duas vezes que acredita em Deus, pouca coisa vai mudar. Mas a mensagem indica que o presidente busca um caminho diferente para falar com aquele eleitor. Também nas últimas semanas, o governo incluiu numa campanha publicitária um cantor gospel e uma personagem que dá “glória a Deus” quando recebe o Bolsa Família.

NAS PERIFERIAS – Outra iniciativa tem o objetivo de amenizar o domínio dos templos evangélicos nas periferias. O Ministério do Desenvolvimento Social passou a oferecer financiamento a projetos de combate à fome tocados pelas igrejas e começou a treinar seus integrantes para cadastrar beneficiários de programas sociais.

O governo quer evitar que a identificação dos evangélicos com a direita se torne definitiva. Pode haver espaço para reverter uma parte desse quadro.

Uma pesquisa recente do PoderData mostra que 52% dos evangélicos acha que o governo Lula é pior que o governo Bolsonaro, enquanto 30% consideram o petista melhor, e 15% veem os dois da mesma maneira. Em 2022, Bolsonaro teve 69% dos votos válidos no grupo.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Fica difícil competir com Lula. Além de ser a alma mais honesta, ninguém acredita em Deus mais do que ele. Diante dessas certezas divinas, a Igreja deveria se livrar logo dos intermediários e indicar Lula para novo Papa, pois Francisco está doente e precisa ser substituído. (C.N.)

Natal pode ser época de melancolia e há quem fique infeliz no fim do ano

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Ilustração reproduzida do Arquivo Google

João Pereira Coutinho
Folha

Às vezes penso que não sou rico porque não quero. Se tivesse vocação para os negócios, já teria inaugurado uma clínica só para receber os infelizes do Natal. Quem são eles? Não, não são os verdadeiros infelizes — gente sem teto, sem família, sem emprego, que se acumula em tendas imundas nas calçadas da cidade. Consigo vê-los, todos os dias, quando saio e regresso a casa.

E não, não são as populações massacradas pela guerra, pela violência, pela perseguição, para quem o Natal não passa de uma memória distante. Um luxo a que não se podem permitir. Os meus infelizes são os meus amigos, conhecidos, colegas, contemporâneos. Tudo gente de uma classe média fluente e afluente que, em fins de novembro, inícios de dezembro, entra em colapso com as “exigências” da quadra. Quais exigências? Estar com os outros. Estar com a família. Ofertar presentes. Receber.

COMO EPIDEMIA – O fenômeno é tão epidêmico que, todos os anos, mais ou menos por essa altura, a imprensa tem sempre algumas matérias sobre “como sobreviver ao Natal” —dicas de autoajuda, técnicas de meditação, às vezes fármacos de intensidade variada, para que o rebanho chegue a janeiro sem traumas.

Um amigo, usualmente são, vai longe: quando o fatídico dia 25 se aproxima, ele desaparece dos radares e faz questão de manter o celular desligado. Às vezes, viaja para o fim do mundo, só para não se confrontar com as nostalgias que a quadra sempre traz —amores perdidos, planos adiados, sonhos desfeitos. A vida que não se teve. A vida que tem. “É mais fácil assim”, diz ele, como se falasse de um cataclismo natural.

Todos conhecemos pessoas que têm medo de palhaços. “Coulrofobia”, eis o termo técnico. Mas medo do Papai Noel é um fenômeno só possível nas sociedades neuróticas em que vivemos. Será isto o “triunfo da terapêutica” de que falava o injustamente esquecido Philip Rieff (1922–2006)?

TRAVESSIA INÓSPITA – Talvez seja. Conta ele, no clássico “O Triunfo da Terapêutica”, que nossos antepassados tinham as mesmas inquietações e misérias que nos afligem. Mas a cultura tradicional, no sentido amplo do termo, acolhia e dava significado a essa travessia inóspita.

Philip Rieff não falava apenas da religião, embora ela fosse parte central da experiência humana e fonte de consolação. Falava da própria vida em comunidade, que exigia de cada um a capacidade de sair de si próprio para ter os outros em consideração. Só esse movimento exógeno satisfazia e realizava o ser.

O “triunfo da terapêutica”, com Freud e seguidores, quebrou esse movimento ao desmantelar a ordem tradicional que dava sentido à existência. O indivíduo passou a estar no centro do seu próprio drama existencial, sem o auxílio do velho patrimônio moral de outros tempos. Vantagens?

CAMINHAR SÓ – Algumas vantagens, sim. A valorização do bem-estar pessoal, a literacia dos sentimentos mais profundos, as mil possibilidades da autoexpressão — tudo isso são conquistas preciosas que ampliaram nosso conhecimento e revolucionaram as artes e as letras no século 20.

Mas a obsessão com o bem-estar, a intolerância aos sentimentos desconfortáveis e as frustrações da autoexpressão, que promete sempre mais do que entrega, confrontaram os contemporâneos com uma nova condição. Caminhar livremente, às vezes, também significa caminhar só.

Antigamente, vivia-se o Natal porque era o Natal, não nossos sentimentos perante ele, que importava. Hoje, sobrevive-se ao Natal porque as tribulações que projetamos na data são mais importantes do que a data.

NO ZOOLÓGICO – Para usar as palavras de Rieff, passamos da igreja para o zoológico, onde cada um está fechado na sua jaula. Lambendo as feridas, acrescento eu. É por isso que a minha clínica faria sucesso no tratamento do estresse natalino. Os infelizes seriam recebidos de braços abertos e teriam duas opções de tratamento.

A primeira, rápida e indolor, seria uma anestesia profunda até janeiro. Quando acordassem, teriam sido poupados às angústias intoleráveis.

A segunda opção, mais demorada, seria uma combinação de vinho, música, conversa e, para os mais ousados, humor e perdão. Qual delas você escolheria?

A fraude da raça! Censo retrata como as pessoas se veem ou querem ser vistas

Segundo IBGE, Mais de 53% da população brasileira hoje se diz preta ou  parda, porque será? | Jusbrasil

Reprodução do Arquivo Google

Demétrio Magnoli
Folha

O Censo de 2022 constatou que a parcela de pardos (45,3%) ultrapassou a de brancos (43,5%) e, ainda, que a de pretos atingiu 10,2%. Daí, a militância identitária, que inclui o “jornalismo identitário”, extraiu diversas conclusões – todas equivocadas.

1) “Oh! Que novidade histórica!”

Novidade nenhuma: continuidade de tendências verificadas desde o Censo 2000. Há um quarto de século aumenta a proporção de pardos e pretos, enquanto decresce a proporção de brancos.

2) “Agora sim, os brasileiros assumem sua verdadeira identidade.”

Só quem, no século 21, insiste em acreditar nas teorias do “racismo científico” do século 19 ousa mencionar uma “verdadeira” identidade racial. Raças humanas não existem. No plano racial, não há identidade “verdadeira” (ou “falsa”). No censo, as pessoas autodeclaram sua cor da pele. Dele, emana um retrato de como elas se veem – ou querem ser vistas.

3) “Finalmente, a maioria dos brasileiros decidiu declarar-se negra.”

Falso. Uma maioria relativa declarou-se parda – ou seja, misturada. Inexiste no Censo a categoria “negros”, de modo que ninguém declarou-se “negro”. A categoria é uma fabricação estatal-burocrática que soma arbitrariamente os que se descrevem como pardos e pretos. Foi inventada para ofuscar a mestiçagem brasileira, fabricando a imagem de uma nação bicolor. A militância quer que o Brasil seja EUA, ao menos no campo das políticas de raça.

4) “Vitória contra o racismo: os negros identificam-se como o que são de fato.”

Negativo: pardos não se identificam como “negros” (nem como “brancos”). A maioria relativa não cabe na nação bicolor estatal. O crescimento da parcela de pardos e de pretos é uma adaptação das pessoas às regras do jogo.

5) “O crescimento dos negros revela uma tomada de consciência.”

De certo modo, sim: há um cálculo racional em operação. Na metade inicial do século 20, incontáveis americanos negros de pele clara fizeram o “passing”, queimando seus documentos, enterrando o passado e convertendo-se em brancos. Era bem melhor ser branco num país organizado por leis de segregação racial. No Brasil de hoje, o “passing” inverso pode gerar benefícios materiais. As pessoas transitam para dentro da categoria estatal “negros” respondendo a incentivos oficiais (cotas nas universidades e no funcionalismo público) e privados (políticas de “diversidade racial” nas empresas).

POLÍTICAS RACIAIS – Os equívocos elencados não resultam de ignorância. A “maioria negra” cantada em prosa e verso funciona como plataforma para uma nova etapa das políticas raciais.

As políticas de raça têm 20 anos e as cotas raciais nacionais, 10. Fracassaram em seus objetivos alegados (que são distintos de seus objetivos verdadeiros). As desigualdades sociais persistem, assim como a ruína da escola pública. As polícias continuam a barbarizar as periferias e favelas. O encarceramento de pretos e pardos aumentou.

Mas, do ponto de vista da estratégia política, as discriminações efetivas não importam: na sua nova etapa, as políticas raciais destinam-se a facilitar o acesso a cargos no Judiciário, no Executivo e no Congresso para indivíduos da elite econômica e cultural que operam como ativistas identitários.

SERVE COMO ESCADA – O “racismo estrutural”, essa noção tão abrangente quanto difusa, serve como escada. Os pobres, em sua maioria pretos ou pardos, só entram no discurso como pretextos.

“Negros”, a categoria, funciona como arma de extermínio da mestiçagem. Nas políticas de raça, os pardos têm a função de configurar a aparência de uma “maioria negra”. Mas, na hora H, muitos deles são excluídos dos benefícios prometidos.

Ilustração mais recente: a nomeação do autodeclarado pardo Flávio Dino para o STF foi recebida com uma saraivada de críticas do ativismo identitário, que resolveu classificá-lo como branco. Pardos só são “negros” no mundo asséptico das estatísticas oficiais.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Detalhe curioso: o Estadão foi o único jornal a classificar Flávio Dino como “mais um negro no Supremo”. O ministro Nunes Marques também tem um pé na senzala, como dizia FHC, mas foi classificado como branco. (C.N.)

Lula ficou entre o zero e o zero absoluto neste ano e terá resultado igual em 2024

Lula discursa durante cerimônia em que anunciou investimentos de bancos públicos nos Estados em 12 de dezembro

Ignorante, Lula diz que aumentar déficit incentiva crescimento

J.R. Guzzo
Estadão

Ao completar o primeiro ano de um governo que esteve entre o zero e o zero absoluto em matéria de produzir alguma coisa útil para o País e para os brasileiros, o presidente Lula se despede de 2023 mostrando a intenção de fazer mais do mesmo em 2024. A única ideia que orientou o governo nos últimos doze meses, e que parece resumir a soma total de suas capacidades, foi gastar com a máquina estatal, seus beneficiários e seus clientes.

“Gastar”, aí, significa consumir tudo o que o Estado arrecada dos brasileiros – e mais ainda. É a religião da era Lula-3. “Gasto é vida”, sobretudo gasto com nós mesmos e os nossos lençóis de linho egípcio. Não se produz nada; só se consome. Quem tem de produzir é a população. Tem de trabalhar, pagar imposto – foram 3 trilhões de reais em 2023 – e encher o nosso bucho. É a ideologia do parasita-raiz.

COMPRA DE VOTOS – Lula passou o ano inteiro fazendo uma coisa só: distribuir o dinheiro do Orçamento Federal para as “emendas parlamentares”. É o que eles chamam de “governabilidade”. Entrega-se o Erário público para a compra do apoio de deputados e senadores – que umas vezes vem e outras não vem, o que leva a pagar de novo e cada vez mais. É isso.

O resto da ação presidencial este ano foi passar 72 dias viajando para o exterior, através de 24 países diferentes, hotéis “padrão Dubai” e uma coleção sem precedentes de declarações cretinas. O tempo que sobrou ficou para comícios em circuito fechado (o presidente da República não pode sair à rua neste país), na presença e sob o aplauso das ministras e ministros que se especializam em não produzir nada, nunca – dos “indígenas”, das “mulheres”, dos “direitos humanos” e por aí afora.

PENSAMENTO ÚNICO – Lula, na sua versão atual, tem um pensamento só, e ele está errado. Diz todos os dias que o crescimento do Brasil depende do gasto público – acha que isso é “investimento”, e que quanto mais o governo gasta mais o País cresce. Déficit, segundo este tipo de entendimento, é uma exigência do progresso.

É objetivamente falso. Como diz o próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad: “De dez anos para cá, a gente fez 1 trilhão e 700 bilhões de reais de déficit e a economia não cresceu”. Xeque-mate, mas e daí?

Lula não está ligando a mínima para os fatos; não se dá sequer ao trabalho de acreditar naquilo que ele mesmo diz. Não lhe interessa que o déficit é só déficit, e que o “investimento” real não existe. O que conta para ele é a caneta que autoriza gasto do governo, e só isso.

DA PIOR MANEIRA – Não poderia haver uma maneira pior para o Brasil encerrar o ano, em termos de lógica e de intenções na economia, do que o acesso de neurastenia que Lula teve diante do último relatório bianual da OCDE sobre a economia brasileira.

A organização, que reúne os países mais prósperos do mundo e é reconhecida pela competência técnica de suas análises econômicas, disse que a dívida pública do Brasil neste momento pode levar à uma situação “claramente insustentável”.

Lula se declarou “irritado” com as realidades expostas pela OCDE e chamou a análise de “palpite” – como se ele tivesse alguma ideia do que está falando. É uma grosseria e, de novo, uma estupidez. O Brasil poderia começar a pensar em si mesmo como um país desenvolvido se conseguisse, um dia, ser admitido na OCDE. Lula acha ruim. Não abre mão de continuar no Terceiro Mundo.

Ministros do STF acham que a pressão contra eles tende a aumentar até 2026

Charge do Caio Gomez (Correio Braziliense)

Denise Rothenburg
Correio Braziliense

Em conversas para lá de reservadas, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) demonstram muita preocupação com as eleições de 2026. Embora os partidos sequer tenham passado pela eleição municipal de 2024, há o receio de que a renovação de dois terços do Senado leve a um aumento do grupo que deseja o impeachment de ministros da Suprema Corte ou que queira impor mais limites à atuação de seus magistrados.

Por isso, avisam alguns, a hora para tentar reforçar o lastro institucional para evitar que o trator atinja o STF é agora, nesses dois anos e meio que faltam até a próxima temporada de eleições para o Legislativo.

RECORDAR É VIVER – O ministro da Casa Civil, Rui Costa, conseguiu estancar a pressão para catapultá-lo do cargo. Pelo menos, por enquanto. A opinião, na frente ampla de Lula, é “quando encaixa a conversa, ele cumpre”.

Dentro do PT, o ato de 8 de janeiro servirá para começar o ano eleitoral de 2024 lembrando que os perigos para a democracia não acabaram. O ato, avaliam alguns, poderá, inclusive, ajudar a reforçar a polarização com os bolsonaristas.

Por falar em polarização, a aposta do PT é a de que a divisão política está mais viva do que nunca e serve aos dois lados da moeda. PL, PT e os maiores aliados de ambos tendem a reforçar essa cisão do país para conquistar espaço nas eleições unicipais.

MAIOR PRESSÃO – Da mesma forma que Lula agiu para evitar candidaturas de esquerda em 2022 a fim de tornar a opção desse campo, o presidente agirá, agora, em prol de Guilherme Boulos em São Paulo. Não será tão fácil, mas esses movimentos vão tomar conta do primeiro trimestre de 2024.

Se a legislação de combate às fake news estivesse aprovada e sancionada, casos de informações falsas, como o que levou à morte Jessica Canedo, poderiam ser punidos. Esse tema deve ser uma das prioridades para 2024.

Jessica foi encontrada morta na última sexta-feira, depois de falsos diálogos divulgados na internet, como se ela tivesse um romance com o humorista Whindersson Nunes. Foi atacada no esgoto das redes sociais e não conseguiu superar o turbilhão emocional.

PROTESE DE QUADRIL – A cirurgia que Lula fez no quadril para colocar uma prótese virou febre entre os políticos. Depois do presidente da República, foi a vez do líder do governo, José Guimarães (PT-CE). Agora, é o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) que se submeterá ao procedimento cirúrgico.

Na época da presidente Dilma Rousseff, a febre foi a dieta Ravenna. A então presidente levava até seus assessores para afinar a silhueta.

“Nunca mais tive problemas com as minhas taxas”. dizia, referindo-se a colesterol, glicose, triglicerídeos e por aí vai.

“Patafísica do poder” explica a existência de tantos personagens tóxicos na política

Prosecutor files case against Argentina's frontrunner Javier Milei days  before presidential election | AP News

O argentino Milei é um destaque entre os personagens

Muniz Sodré
Folha

Para quem estancou a queda da nação no abismo, são fracos neste fim de ano os índices de popularidade de Lula. Fracas também as explicações. A campanha governamental “O Brasil é um só povo”, recém-lançada, não desautoriza uma hipótese de natureza patafísica: existiriam dois Brasis.

No primeiro, real, Lula é legítimo presidente da República, com dezenas de milhões de seguidores. No segundo, irreal, o outro perdeu a eleição, mas ainda não lhe caiu a ficha nem a de seus aderentes, o que pavimenta o caminho patafísico dos absurdos.

EXPLICAÇÃO – Patafísica é a “ciência” das soluções imaginárias, uma invenção de literatos franceses para jogar criativamente com distorções da realidade. Nesse país distorcido por hipótese, sombra projetada sobre o real, o portador da caveira de burro nada em seco, o pão lhe caindo com leite condensado para baixo. Ainda assim, trafega nos índices e nas barricadas da direita. Aos contratempos: na posse de Milei, tentou bancar o papagaio de pirata numa foto de presidentes, foi por eles repelido. Um vexame, que não pareceu constrangê-lo.

Mas a hipótese deixa intocado o enigma dos personagens tóxicos na política: Bozo teratológico, Milei que diz ter “filhos de quatro patas”, Maduro em colóquio com passarinhos, Trump que prega abertamente a ditadura etc.

Nenhuma doutrina salvífica explica as bizarrices, apenas o traço comum de uma tirania prometida e, religiosamente, aguardada.

TIRANOS E ESCRAVOS – É que existe um laço íntimo, místico entre tiranos e escravos: “O grande segredo do regime monárquico consiste em enganar os homens, travestindo com o nome de religião o temor com que os mantém acorrentados; de maneira que lutam por sua servidão como se tratassem de sua salvação” (Espinosa, “Tratado Teológico-Político”).

Para o filósofo, isso se deve à paixão triste, “um complexo que reúne o infinito dos desejos, a perturbação da alma, a cupidez e a superstição”. O tirano, para triunfar, precisa da alma triste e vice-versa, pois o que os une é “o ódio à vida, o ressentimento contra a vida”.

ARROCHO TIRÂNICO” – A palavra tirania, obsoleta, retorna na afirmação da vice-presidente argentina de que é preciso um arrocho tirânico para repor nos eixos o seu país. É um toque sombrio e mais opressivo do que autocracia, com a qual os analistas políticos vestem as inclinações da ultradireita.

Mas tirano e autocrata rezam pela mesma cartilha da violência antidemocrática, atrativa para o sujeito do ressentimento, adulto ou jovem, que faz da estreiteza vingativa seu único afeto. Uma besta triste, de tocaia no pior. Não com volátil estado de ânimo, mas com tristeza como paixão profunda, afecção contagiosa da alma que faz cadeia com medo, inveja, ódio e crueldade.

É uma negação da alegria vital, da qual não dá conta nenhum psicologismo, nenhuma política. Talvez a patafísica, quem sabe?

Congresso reflete preferências do eleitor com mais precisão do que a Presidência

Charge reproduzida do Arquivo Google

Hélio Schwartsman
Folha

Quem representa melhor o Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou o Congresso Nacional, dominado pelo Centrão? Ambos têm a mesma legitimidade, que extraem do fato de terem sido os escolhidos pela população num processo eleitoral livre e limpo. Lula foi ungido para ocupar a chefia do Poder Executivo; deputados e senadores, para legislar.

Em regimes presidencialistas, nutrimos um certo fetiche pelo primeiro mandatário, parcialmente justificado pelo grande poder do cargo e por ser essa a disputa eleitoral mais simbólica e, portanto, a que mais mobiliza as atenções. E

VIVA O PARLAMENTO – Em termos de representatividade, contudo, não há como negar que o Parlamento traduz de forma muito mais precisa e granular as preferências da população. A principal razão para isso é matemática.

O presidente é apenas um, em alguma medida escolhido por voto negativo (rejeição ao adversário em vez de apoio explícito às suas ideias); já os parlamentares são 594, eleitos num sistema em que prepondera o voto proporcional que dá voz às mais diferentes tendências. Gostemos ou não, o Congresso é a cara do Brasil.

“Alto lá”, dirão progressistas. Faltam mulheres e negros no Parlamento, que diverge muito da estrutura demográfica do país.

O VOTO É LIVRE – É verdade, porém devemos observar que o eleitor não é chamado às urnas para gerar clones de si mesmo, mas para escolher alguém que, no seu entender e utilizando qualquer critério que deseje, o representará bem. Se ele quiser votar por linhas raciais, de gênero, religiosas ou estéticas, ótimo. Se não quiser, ótimo também, dado que o voto é livre.

A democracia não funciona porque produz líderes competentes que tomam decisões sábias, mas porque faz com que a troca do poder se dê por meios pacíficos e porque vem com um sistema de freios e contrapesos que não deixa que nenhum ator acumule poderes desproporcionais.

Isso o Centrão faz, mesmo que sua ganância seja moralmente incômoda.

No Ano Novo, devaneios são permitidos e podemos até “amar” o que desejarmos

Terra vista do espaço

Vistos de longe, a Terra, os mares e os montes, tudo é azul

Dorrit Harazim
O Globo

Não é que falte assunto de relevo neste final de ano — a Humanidade, mais uma vez, não caminhou rumo ao que dela era esperado. Ver a Terra como ela realmente é, um pálido e lindo ponto azul flutuando num eterno silêncio, deveria ter nos aproximado mais uns dos outros, estreitado nossa interdependência como passageiros de um mesmo mundo, confirmado a relação paradoxal entre distância espacial e proximidade emocional.

Não foi bem isso que ocorreu em 2023. Mas é justamente em período de início de férias, com festejos a todo vapor e desatenção geral típica de véspera de Natal, que devaneios são permitidos — ótima oportunidade para poder divagar sobre algo impalpável, evanescente e atemporal, apenas bonito: a cor azul e nossos estados d’alma.

A COR AZUL – Wassily Kandinsky, William Gass (“On being blue”), Carl Sagan, Goethe, Maggie Nelson (“The colour blue as a lens on memory and loneliness…”), Maria Popova e Leonardo da Vinci são apenas alguns dos pintores e naturalistas, escritores, pensadores ou poetas que se debruçaram sobre essa que é chamada de “a cor da mente emprestada ao corpo, a cor da consciência quando a acariciamos”.

Para a ensaísta americana Rebecca Solnit, autora de uma elegante reflexão sobre como encontrar a si mesmo no desconhecido (“Um guia para se perder”, Martins Fontes, 2022), a relação entre o azul, a melancolia e a solidão humanas está por toda parte onde há distância e desejo.

Percebido como azul nas suas bordas e profundezas quando observado no espaço sideral, nosso planetinha vai perdendo sua luz à medida que nos aproximamos dele. A cor dispersa-se entre as moléculas do ar, dispersa-se na água (incolor só quando rasa, azul quando o mar é profundo), dispersa-se no céu e na terra.

VENDO DE LONGE – “Há muitos anos que me emociono com o azul que está no limite do que se vê, aquela cor dos horizontes, das cadeias de montanhas remotas, de tudo o que está longe. A cor dessa distância é a cor de uma emoção, a cor da solidão e do desejo, a cor de lá visto daqui, a cor de onde você não está. É a cor de onde você nunca poderá ir.

Pois o azul não está no lugar a quilômetros de distância no horizonte, mas na distância atmosférica entre você e as montanhas”, escreveu Solnit para relacionar desejo e distância.

Tratamos o desejo como um problema a resolver, enquanto o que intriga a autora é algo distinto: e se, com um ligeiro ajuste de perspectiva, o desejo pudesse ser apreciado como uma sensação em seus próprios termos?

AMAR OS DESEJOS – Se conseguíssemos olhar para longe sem querer diminuir a distância, talvez pudéssemos dar conta de nossos desejos da mesma forma como amamos a beleza de um azul que nunca poderá ser alcançado.

“Algo desse anseio será apenas realocado pela proximidade, jamais apaziguado, assim como as montanhas deixam de ser azuis quando chegamos perto delas. O azul tingirá algum outro além. E nisso reside o mistério de por que as tragédias são sempre mais emocionantes que as comédias e de por que temos tanto prazer na tristeza de certas canções e histórias. Algo estará sempre fora do nosso alcance”, teoriza Solnit.

No mundo das espécies que vivem abaixo de nossa atmosfera avermelhada, o azul é raridade, assim como é inexistente um pigmento natural dessa cor.

QUEREMOS MAIS AZUL – Como não se surpreender com a escassez de alimentos azuis produzidos pela terra, quando abundam os vermelhos, amarelos, marrons ou verdejantes? Poucas são, também, as plantas que florescem em azul. E os raros pássaros e borboletas dotados de plumagem azulada devem esse privilégio a uma singular refração da luz em suas penas, de forma a cancelar qualquer raio que não seja azul.

Amamos contemplar o azul não porque ele vem até nós, mas porque ele nos leva longe, já observara Goethe em sua teoria de cor e emoção. Clarice Lispector concordaria. “O azul será uma cor em si, ou uma questão de distância? Ou uma questão de grande nostalgia? O inalcançável é sempre azul”, escreveu ela.

Se somos tantos a amar o azul, vale tentar o inalcançável — 2024 vem a galope.

É preciso notar que o mais absoluto tédio está reinando no mundo contemporâneo

Por trás da agitação e das diversões, o tédio se agiganta

Luiz Felipe Pondé
Folha

Suspeito que no coração do nosso mundo contemporâneo reina o mais absoluto tédio. Essa suspeita referente ao papel do tédio como motor de muitas das nossas ações tem vasta credencial na filosofia. Mas não irei tão longe. Ficarei no século 20.

Georges Bernanos (1888-1948) participa dessa linhagem filosófica, teológica e literária que teme o tédio como motor do pecado. A herança adâmica seria esse mesmo tédio que nos atravessa, ainda que tenhamos dificuldade de percebê-lo na imensa maioria das vezes. Penso mesmo que seja o tédio que mova essa coisa ridícula e típica dos nossos tempos chamada moda.

PADRE TEDIOSO – Num de seus clássicos, publicado no Brasil pela É Realizações, “Diário de um Pároco de Província”, há um padre como protagonista — muito comum na obra de Bernanos, que quase foi padre, mas percebeu, a tempo, que sua vocação era de escritor, para nossa sorte —, que bebe e se afoga junto com seus paroquianos no tédio que cobre a vila como uma manta de pó.

Nosso narrador protagonista descreve esse tédio como uma espécie de poeira que cobre nossos olhos e penetra nossa boca, mas que percebemos apenas quando o pó fica entre nossos dentes. Uma boca cheia de areia, que não se sabe de onde vem e que é invisível.

O tédio reina absoluto entre nós. Essa inquietação tipicamente contemporânea que leva rios de gente para filas infernais nos fins de semana em busca de lazer e relaxamento — isso mesmo, relaxamento! — geme em nosso estômago.

Mas, se temos tantas coisas a fazer, tantas coisas à nossa disposição, sendo que grande parte da humanidade nunca foi tão rica, por que tanto tédio? Por que inventar coisas para não sentir a pura passagem das horas?

CALOR QUE DERRETE – Ao mesmo tempo, Bernanos descreve num outro grande livro, também publicado pela É Realizações, que esse mal em nós funciona como uma espécie de calor que nos derrete. Assim, a vida acompanhada pela solidão do mal brilha como fogo ardente no seu “Sob o Sol de Satã”.

São infinitos os mecanismos à disposição do tédio. A busca de inovação nos assola, assim como quem sofre de uma sede eterna que tem à sua volta apenas água salgada para beber. Quando pensamos na obsessão pela inovação, percebemos que ultrapassamos a simples escala de uma psicologia subjetiva para adentrarmos numa sociologia objetiva.

A tara pela inovação se inscreve na estrutura material da vida moderna, sem pena e sem solução. Sem remédio. Todos hão de inovar, sob pena de extinção. As famílias, as pessoas, as empresas, os governos, as igrejas, as religiões. A histeria que toma conta das formas inovadas de espiritualidade carrega em si essa face deformada pelo tédio.

AUTOAFIRMAÇÃO – Um dos modos mais antigos de enfrentamento infeliz desse tédio que nos consome é sua negação por meio da autoafirmação de nossa autossuficiência. O afeto que habita esse processo é o orgulho, grande causador de tantos pecados na tradição cristã. Assim como uma entidade que passa a noite a gritar dentro da escuridão, o delírio da autossuficiência se dissolve na agonia do seu oposto, a insuficiência.

Como dizia acima, a moda talvez seja uma das formas mais recentes desse tédio ancestral. Muita luz, muito barulho, muitos amores, muitas juras de se reinventar, muitos lugares a ir e a não ver em estando lá, muitas compras, muita diversão alucinada, tudo para que o tempo passe sem que passemos por ele. Como não ver que toda essa fúria de conteúdo produzido em toda parte é o tédio que se esconde sob a face de uma falsa inteligência?

Essa maldição é como uma úlcera que consome o estômago. As modas de comportamento, de alimentação, de emagrecimento, de auto exposição grassam entre nós sem que nenhuma graça seja pressentida a nossa volta. Ano sabático? Uma das últimas modas a jurar que vencerá o tédio. O mundo não está só consumido pelos combustíveis fósseis, mas também pelos nossos desejos. A busca do sucesso talvez seja, entre as modas, a que mais faz vítimas. Muitos acham que encontrarão a cura vivendo perto da natureza, mas esta, aos olhos dos homens, também é inundada pelo tédio da vida e da morte.

Congresso considera “afronta” o pacote de reoneração baixado por Lula e Haddad

Senador Efraim Filho: 'Reforma Tributária está amadurecida'

Senador Efraim Filho critica a postura de Fernando Haddad

Julia Chaib
Folha

Deputados e senadores manifestaram resistências ao pacote apresentado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) nesta quinta-feira (28) que prevê a reoneração gradual da folha de pagamentos. O senador Efraim Filho (União Brasil-PB) chamou de “afronta ao Congresso” a proposta, que foi baixada como medida provisória nesta-sexta-feira, assinada pelo presidente Lula e por Haddad.

Efraim foi o relator do projeto de desoneração da folha no Senado, que foi vetado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Posteriormente, o veto foi derrubado pelos parlamentares. “É uma afronta ao Congresso. É uma tentativa de impor uma agenda por meio de uma medida provisória numa matéria que o governo não teve votos suficientes no plenário. Não é por aí”, afirma.

DIZ O RELATOR – “Se o governo quer dialogar com propostas alternativas, o caminho seria um projeto de lei, não uma medida provisória, porque ela é uma imposição de agenda. Além de que traz um sentimento de insegurança jurídica para quem empreende e quem trabalha. Qual a regra que o trabalhador seguirá em 1º de janeiro?”, questiona.

O senador esperava que o governo voltasse atrás e apresentasse um projeto de lei, sob pena de ver a medida provisória derrubada pelo Congresso.

Integrantes do Planalto justificam a opção por medida provisória porque ela tem efeito tributário e, portanto, precisa ser apresentada no ano anterior ao início dos efeitos. O gabinete do ministro da Fazenda, inclusive, já procurou Efraim para marcar uma conversa no início de janeiro sobre o tema.

FORTE RESISTÊNCIA – A deputada Any Ortiz (Cidadania-RS), que relatou o projeto na Câmara dos Deputados, também avalia que a medida sofrerá forte resistência dos parlamentares.

“A edição dessa MP pelo governo está contrariando a vontade do Congresso que representa a totalidade dos brasileiros e ainda causando uma enorme insegurança jurídica”, diz.

“Certamente essa iniciativa sofrerá resistência não só dos setores econômicos, mas do Congresso Nacional, que se vê desrespeitado diante de uma decisão quase unânime.”

MAIS CRÍTICAS – O senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), presidente da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado, também apresentou ressalvas ao pacote baixado pelo presidente Lula.

“A MP de reoneração gradual da folha de pagamento anunciada pelo ministro Haddad causa insegurança jurídica ao país. É de se perguntar: passa a valer o quê? A medida provisória ou a lei que foi promulgada pelo Congresso Nacional? A economia precisa de regras claras”, disse.

O líder do PSB na Câmara, Felipe Carreras (PE), reclamou da falta do diálogo do governo antes de anunciar as medidas. Além da reoneração, a MP também deve prever mudanças na lei do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos) –que oferece benefícios para empresas aéreas e ligadas a entretenimento.

SEM CONVERSAS – Carreras foi autor da lei que criou o Perse, programa de apoio à cultura. “O Parlamento no novo governo do qual faço parte decidiu na MP manter o Perse, tanto a Câmara como o Senado. Você ser surpreendido às vésperas do final do ano com uma medida provisória que vai mexer nesse tema, ninguém ficou feliz, sem explicações, sem conversas.”

“Todo mundo foi pego de calça curta. O mesmo vale para a reoneração”, avaliou o deputado.

Haddad divulgo nesta quinta-feira as três novas medidas econômicas para evitar perda de arrecadação e reforçar o caixa da União no próximo ano. Entre elas, está a reoneração gradual da folha de pagamento por atividade. como alternativa à prorrogação do benefício integral até dezembro de 2027. A medida porvisória revogará a lei que renova a desoneração da folha promulgada nesta quinta pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG –
Como dizia Sérgio Porto, no “Samba do Afrodescendente com Necessidades Especiais” (antigo “Samba do Crioulo Doido”), o bode que deu vou te contar. O ministro Haddad está desesperado com as gastanças de Lula, que não é exemplo de nada. A desoneração foi uma burrice de Dilma que até hoje persiste. Mas a afoiteza de Haddad colocará tudo a perder. Era preciso chegar devagarinho, no diálogo. O Congresso não cederá um centímetro. Vai dar uma confusão danada, é mais uma briga de cachorro grande. (C.N.)

Lula e Bolsonaro frustram muitos eleitores, que hoje evitam participar da política

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Charge do Sponholz (sponholz.arq.br)

José Casado
Veja

É inevitável que Lula e Jair Bolsonaro tentem transformar as eleições municipais de 2024 numa vitrine daquilo que pretendem que seja a disputa pela presidência da República dois anos depois, em 2026. Faz parte do jogo. Líderes têm obrigação de ajudar seus partidos a eleger o maior número possível de prefeitos e de candidatos.

Com Lula e Bolsonaro há algo a mais, a interdependência. Um precisa do outro para abusar da gramática da mútua desqualificação, sem eufemismos. Ela modula a crispação das respectivas torcidas na banalização de conceitos como “comunismo” e “fascismo”.

DESERTO DE IDEIAS – Sua maior serventia, porém, é a de biombo para o deserto de ideias na política que está aí. A tese da “nacionalização” das disputas municipais é recorrente, qualquer que seja o governo, mas é surreal no confronto com o histórico eleitoral do período da redemocratização. Por uma razão elementar: as pessoas não moram na União nem no Estado, vivem nos municípios.

Jogos de poder em Brasília, da forma como Lula e Bolsonaro redesenham para 2024, têm estimulado, sim, descontentamento e distanciamento dos eleitores da política.

São eles que dizem, por exemplo, na mais recente pesquisa do Ipec (antigo Ibope) sobre democracia, com duas mil entrevistas em 127 municípios em setembro, que nada menos que 78% dos consultados declaram não ter “nenhuma vontade” de participar da vida política nas respectivas cidades.

REINA O DESÂNIMO – A frustração com a política e seus protagonistas cresce à medida em que declina o nível de renda familiar, medida em salários mínimos. Chega a 81% entre os mais pobres, sobreviventes em famílias com até um salário mínimo mensal (1 320 reais). Fica em 80% entre os que vivem com até dois salários mínimos.

As queixas sobre a incapacidade estatal em resolver problemas nos serviços essenciais de saúde, educação e segurança atravessam o tempo e governos, não importa quem esteja no poder.

É eloquente avaliação da atuação do governo Lula nessas áreas em 2023, na pesquisa do Ipec feita na primeira quinzena deste mês. Os eleitores seguem órfãos da promessa de democracia — uns mais que outros, até porque alguns são mais iguais que os demais. Sem renovação das ideias e das práticas será cada vez mais difícil atrai-los à política.