Exército tenta esconder quem evitou prisão de parentes de militares

8JANBSB - Exército teve aval de Lula para vetar PM em acampamento na noite  de ataques golpistas - DefesaNet

Exército postou blindados para proteger os acampados

Francisco Leali
Estadão

A noite do 8 de Janeiro de 2023 ainda não terminou para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Prestes a completar dois anos desde a invasão e a depredação dos prédios do Congresso, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal, o Comando do Exército mantém em segredo a identidade de quem deu a ordem para pôr blindados no Quartel General naquela noite.

O gesto de força impediu que policiais entrassem no setor militar da capital federal para prender os responsáveis pelos atos extremistas.

BANHO DE SANGUE – Na época, os militares fizeram chegar ao presidente Lula que haveria risco de um “banho de sangue” caso a operação fosse à noite. A prisão ficou para o dia seguinte. O local era frequentado por parentes de oficiais, incluindo a mulher do ex-comandante do Exército, Villas Bôas.

Quando a prisão foi consumada, na manhã do dia 9 de janeiro, na lista de detidos não havia familiares do oficialato.

A voz de comando para levar os blindados para a rua na noite do dia 8 é informação que o Exército prefere não dar. Uma semana após os atos extremistas, foi enviado um requerimento ao Comando, por meio da Lei de Acesso à Informação, perguntando de quem partiu a ordem para uso dos blindados. A Força Militar se negou a dizer.

CGU AUTORIZA – Ainda em fevereiro de 2023, o caso foi parar na Controladoria Geral da União (CGU), instância a quem cabe deliberar sobre demandas de cidadãos que têm seus pedidos rejeitados pelos órgãos do governo federal.

A CGU levou nove meses para analisar o pedido, cujo autor era o jornalista Mateus Vargas. Decidiu que o Exército era obrigado a prestar a informação por ser de caráter público.

A LAI prevê punição para os casos em que ficar configurado violação da lei com deliberada recusa de dar acesso a informações. No dia 13 de novembro, o Comando respondeu. Mas não deu nome de ninguém.

SAIU PELA TANGENTE – “Com relação ao acampamento em frente do Quartel-General do Exército, em Brasília, verificou-se que as ações para cumprimento da decisão, naquela noite, poderiam trazer danos colaterais com elevado risco à integridade física das pessoas. Portanto, houve uma reunião emergencial com a participação do Ministro da Justiça e Segurança Pública, do Ministro da Defesa, do Chefe da Casa Civil, do Interventor nomeado do DF, do Comandante do Exército e do Comandante Militar do Planalto para avaliar as condições envolvidas na operação que daria cumprimento à determinação da Justiça. A decisão coordenada foi realizar a desocupação na manhã do dia seguinte, atendendo às determinações contidas no despacho do ministro relator do aludido Inquérito”, diz a resposta, que omite a informação.

Para não abrir detalhes da operação, o Exército informou que “depoimentos e documentos correlatos” foram repassados ao STF e que os dados estavam em sigilo.

VARGAS INSISTE – O autor do pedido, jornalista Mateus Vargas, registrou que a decisão da CGU não tinha sido cumprida já que não fora informado de quem partiu a ordem para usar blindados no QG. A Controladoria reavaliou o caso e deu razão ao demandante da informação.

“Considerando-se que não houve a disponibilização da informação, compreende-se que deve ser acatada a denúncia apresentada pelo requerente, para avaliar se a omissão na entrega das informações foi deliberada e para apurar eventual responsabilidade na condução do cumprimento da decisão, no processo ora em análise”, diz parecer da CGU.

No dia 29 de dezembro de 2023, a secretária nacional de Acesso à Informação, Ana Túlia de Macedo, assinou despacho com a seguinte decisão: “Determino a remessa dos autos ao Centro de Controle Interno do Exército – CCIEx, para que sejam adotadas as providências relativas à apuração de responsabilidade de quem deu causa ao não cumprimento da decisão da CGU, com direito de ampla defesa e de contraditório”.

ENGAVETADO – Apesar da deliberação, o processo ficou parado na própria CGU. E só voltou a andar no dia 7 de outubro de 2024, depois que o Estadão mapeou o caso de descumprimento de decisão pelo Exército e pediu informações sobre se havia sido feita ou não uma apuração para encontrar os responsáveis por violar as regras da Lei de Acesso à Informação.

Foi só então que a Controladoria mandou ofício ao general Richard Nunes, chefe do Estado Maior do Exército (EME), com a ordem de apuração de descumprimento de decisão da CGU.

No último dia 26 de dezembro, depois de se negar reiteradamente a esclarecer se cumpriu ou não a determinação da Controladoria, o Exército enviou cópia de um documento com seis páginas com resultado de uma “apuração sumária” sobre o caso.

ARQUIVADO – Como se tudo tivesse sido feito em apenas um dia, o documento assinado pelo coronel Marcus Porto de Oliveira, 2º subchefe do EME, reproduz todo o vai e vem do pedido sobre o caso e anota que a CGU ficou com o processo parado até o pedido do Estadão. O oficial alega que tudo foi feito como manda a lei e arquivou o caso também sumariamente.

No mesmo dia 26, apenas duas horas depois de o Exército enviar sua resposta, a CGU já tinha pronto um novo parecer que também arquivava o caso. Ainda que a decisão original obrigasse a Força Militar a revelar quem dera a ordem do uso de blindados na noite do dia 8 de janeiro de 2023, a Controladoria deu o assunto por encerrado.

A CGU seguiu entendimento de que não poderia abrir uma sindicância ela mesma, como ocorre com servidores civis. A informação sobre o oficial que mandou por blindados no QG não foi divulgada.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Grande matéria de Francisco Leali, coordenador da Sucursal do Estadão em Brasília. Comprova que o Exército oculta quem cometeu grave crime militar, ao evitar a prisão de parentes de oficiais que defendiam o golpe dentro do Quartel-General, o até então impenetrável Forte Apache. O texto exibe a importância da liberdade de imprensa. (C.N.)

7 thoughts on “Exército tenta esconder quem evitou prisão de parentes de militares

  1. Cá com meus botões conjecturo e ouso dizer:
    Tudo que foi omitido, escondido, DESLEMBRADO e blindado refere-se ao governo já empossado e se tal nome não vier à tona é por motivo de segurança à quem colaborou com a arapuca armada para os incautos que se envolveram no Evento de Falsas Bandeiras, a “Querência Geral”, para Estancar a Sangria!!

    • Tudo é um Parque de Divergentes Versões maior do que o Beto Carrero e do que os queridinhos parques de Orlando.

      Quem não fala a verdade só protege quem quer e só mostra o que lhe convém.

      Por isso a transparência estatal é tão rara, seletiva pelo poder e pelos interesses e frequentemente inutilizada.

      Por isso o jornalismo é tão incômodo quanto relevante e necessário.

  2. O grande problema das alucinações é que elas tem recidiva, elas voltam, como essa narrativa insana da direitona de que o 8/01 teria sido uma ação de contrainformação da inteligenzia lulista.

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