
Barroso e outros ministros participam da promiscuidade
Julia Chaib e Raphael Di Cunto
Folha
Empresários, lobistas, autoridades do governo, de tribunais e de agências reguladoras, governadores, deputados e senadores esvaziaram Brasília na última semana para uma série de eventos públicos, jantares e reuniões privadas em Nova York, em roteiro que ficou conhecido como “Brazil Week”.
A proposta era vender o Brasil para investidores, autoridades e empresários estrangeiros, embora a maioria dos eventos tenha reunido, majoritariamente, apenas brasileiros. Empresas como JBS, Banco Safra, BTG Pactual, XP Investimentos e Itaú organizaram encontros entre empresários e políticos.
OPORTUNIDADES – Esses encontros, de acordo com relatos, foram a oportunidade de empresários com interesses em medidas legislativas e regulatórias se aproximarem de políticos com poder decisório e levarem suas demandas. Também foi a chance de investidores terem contato com autoridades e discutirem temas como o patamar da taxa de juros e o que pensam os parlamentares sobre os projetos de cada setor.
A Gerdau, por exemplo, aproveitou um seminário que a tinha como patrocinadora para reclamar do que vê como lentidão do governo brasileiro para lidar com as tarifas impostas pelos Estados Unidos e ainda cobrar medidas contra a “competição desleal” de produtos chineses.
Uma das estrelas da Brazil Week foi o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que cancelou a agenda no Legislativo para participar dos seminários nos Estados Unidos. Ele, no entanto, só divulgou os compromissos em 1 dos 4 dias da viagem.
BARROSO E MOTTA – O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luís Roberto Barroso, também participou. Em uma dessas confraternizações, Motta antecipou a Barroso pessoalmente que entraria com recurso no STF contra a decisão da Primeira Turma da Corte de rejeitar a votação da Câmara para suspender a ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ).
Dois deputados contam que Motta recebeu o apoio de empresários no embate com o STF. Ouviram que o Congresso não pode se apequenar e que deve reafirmar suas prerrogativas.
Na segunda-feira (12), jantar promovido pelo grupo Esfera Brasil reuniu boa parte das autoridades que foram a Nova York. Num coquetel, encontraram-se parlamentares, empresários, governadores e o procurador-geral da República, Paulo Gonet.
PROMISCUIDADE – A reunião colocou no mesmo espaço figuras diretamente envolvidas na polêmica compra do Banco Master: os empresários Joesley e Wesley Batista (da JBS, PicPay e Banco Original), André Esteves, do BTG, e Paulo Henrique Costa, presidente do BRB. O presidente do Master, Daniel Vorcaro, foi aconselhado por empresários a não comparecer.
O ex-presidente Michel Temer (MDB), que foi convidado para eventos na cidade, não participou dos encontros em que estavam os Batistas.
Estavam lá também uma comitiva de deputados que acompanhou Motta, o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), o presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), Vital do Rêgo, o ministro Renan Filho (Transportes) e Dario Durigan (secretário-executivo do Ministério da Fazenda).
MAIS PRESENÇAS – Governadores também marcaram presença nos eventos, como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Ronaldo Caiado (União Brasil-GO), Ibaneis Rocha (MDB-DF), Renato Casagrande (PSB-ES), Eduardo Leite (PSD-RS), Raquel Lyra (PSD-PE) e Cláudio Castro (PL-RJ).
Todos, à exceção de Tarcísio, estiveram no fórum organizado pelo Lide no dia seguinte. O Governo do Rio de Janeiro foi um dos patrocinadores do evento. Na ocasião, Caiado e Leite se colocaram como pré-candidatos à Presidência.
Tarcísio de Freitas , um dos protagonistas da semana pela expectativa de que seja candidato a presidente, não foi a dois eventos para os quais seu nome estava anunciado: além do promovido pelo Lide, do ex-governador de São Paulo João Doria, não esteve no da revista Veja, que também ocorreu na terça (13).
MÁ COMPANHIA… – Aliados disseram que ele decidiu faltar ao evento da Veja por causa de um dos patrocinadores, a Refit, Refinaria de Petróleo de Manguinhos, controlada pelo empresário Ricardo Magro.
A refinaria foi a patrocinadora master da conferência, que também contou com dinheiro do Governo do Rio de Janeiro. O Fisco estadual cobra R$ 8,9 bilhões da refinaria, como mostrou o UOL. O Governo de São Paulo cobra R$ 9,5 bilhões. Procurada pela Folha, a empresa não se manifestou. Outros apoiadores do evento foram a JBS e a Cedae, companhia de saneamento do Rio de Janeiro.
No mesmo dia, a JBS promoveu um almoço no restaurante Fasano, que reuniu cerca de 200 pessoas. À noite, as autoridades se dividiram entre jantares do site Congresso em Foco, XP e Banco Safra.
ORGANIZAÇÃO GLOBO – Na quarta (16), as mesmas autoridades se reuniram em evento promovido pelos jornais O Globo e Valor Econômico, que, desta vez, teve a presença de Tarcísio.
Motta e Barroso também estiveram no evento. Depois das palestras, o deputado conversou com representantes da SpaceX, empresa de Elon Musk. O presidente da Câmara afirmou que os empresários americanos querem ampliar os investimentos no país.
Com Brasília esvaziada diante do cancelamento das sessões da Câmara e uma pauta fraca no Senado, outros grupos de parlamentares viajaram aos Estados Unidos.
OUTROS ENCONTROS – A bancada ruralista participou da Sugar Week, que reúne grandes empresas do setor sucroalcooleiro, e congressistas de direita conversaram com autoridades e instituições americanas, além de encontrarem o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que se licenciou do mandato para morar nos EUA alegando perseguição do STF.
Questionados sobre a razão de ir até Nova York para participar de eventos majoritariamente com a presença de brasileiros, Caiado, Castro e Leite disseram que é a oportunidade para vender seus estados e se apresentar a investidores estrangeiros.
A governadora Raquel Lyra disse, em nota, que cumpriu missão internacional, com agendas como participação em seminários e a assinatura de um contrato para ampliar a capacidade de armazenamento de gás natural liquefeito no Complexo de Suape.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Para que servem esses encontros no exterior? Bem, a única e exclusiva motivação é reforçar a promiscuidade entre políticos, empresários e governos, numa boca livre gigante, armada por lobistas. Apenas isso. O pais ganha o quê com isso? Nada, rigorosamente nada. (C.N.)