Washington Post teria se tornado o jornal oficial de Donald Trump?

Fake editions of The Washington Post handed out at multiple locations in D.C.

Jeff Bezos, dono do jornal, abandona a imparcialidade

Juliano Spyer
Folha

A noção de que “um bom jornal é uma nação conversando consigo mesma” deixou de ser verdade para The Washington Post. Desde a semana passada, a publicação aceita apenas artigos opinativos que defendam as liberdades individuais e econômicas. Teria se tornado, como dizem os críticos, o veículo de notícias oficial do trumpismo?

“A sociedade não precisa de jornais, o que precisamos é de jornalismo”, escreveu em 2008 Clay Shirky, professor e pesquisador da Universidade de Nova York. Para ele, o desafio era deixar de pensar em salvar jornais como modelo de negócio para, em vez disso, salvar a sociedade. Isso traria a motivação para reimaginar o jornalismo a partir de outros modelos.

CONTESTAÇÃO – O jornalista e pesquisador russo Andrey Mir, ligado à Universidade de York, no Canadá, aprofunda essa análise. Em seu livro mais famoso, “Post-Journalism and the Death of Newspapers” (Pós-Jornalismo e a Morte dos Jornais), ele argumenta que o trumpismo evoluiu a partir do mesmo contexto que produziu movimentos de contestação como a Primavera Árabe e o Occupy Wall Street.

Mir sustenta que não há uma intenção maliciosa ou uma conspiração por trás da polarização política. O modelo de negócio de veículos tradicionais como o Washington Post dependia da fabricação de consensos para agregar leitores com visões de mundo diferentes.

Mais leitores significavam mais receita publicitária. Mas a horizontalização do acesso à mídia tornou esse modelo obsoleto.

ESTÃO DISPONÍVEIS – Por que pagar por notícias se elas não estão mais limitadas à materialidade do papel, do rádio ou da TV e podem ser copiadas, coladas e redistribuídas infinitamente online? E como competir pela atenção do público com youtubers que entregam seu conteúdo gratuitamente nas redes sociais?

Jeff Bezos, bilionário dono do Washington Post, justifica a mudança na política editorial do jornal com base nessa mesma lógica da abundância de conteúdo. Em nota publicada no X, ele afirmou que, no passado, os jornais ofereciam aos leitores “uma seção de opiniões de base ampla que buscava cobrir todas as visões. Hoje, a internet faz esse trabalho”.

A teorização de Mir explica a trajetória recente dos jornais — não apenas do Washington Post — de substituir a fabricação de consensos pela escolha de um dos lados do debate político polarizado. Em um cenário em que todos têm acesso à mídia, é o dissenso, e não mais o consenso, que impulsiona a mensagem.

VAQUINHAS ONLINE – Essa mudança, segundo Mir, força o jornalismo a se transformar em “propaganda financiada por vaquinhas online”. O apelo para financiar o serviço passa a ser “defender a democracia” ou “combater o comunismo”.

“Os membros pagantes não pagam para receber as notícias (eles já as conhecem)”, escreve Mir. “Eles pagam para que as notícias sejam distribuídas para outros.”

A polarização não é um efeito colateral, mas uma condição para o sucesso desses negócios. Pessoas mais ansiosas tendem a apoiar mais seu veículo preferido. A perspectiva que Mir apresenta sugere que publicações como o New York Times, que criticaram a decisão de Bezos, estão mais próximas do Washington Post do que admitem.

NOTA DA REDAÇÃO DO BLOGEsse “alinhamento” do jornal a uma determinada corrente de opinião representa a morte do jornalismo e um gravíssimo retrocesso social. Significa abandonar a busca do que é certo e conveniente. A humanidade não merece isso, sinceramente.  (C.N.)

2 thoughts on “Washington Post teria se tornado o jornal oficial de Donald Trump?

  1. Aqui no Brasil há um nítido alinhamento não só dos Marinho, mas da imensa maioria dos veículos de comunicação com a impunidade e com a corrupção.

    Tão comprados e cínicos que deveriam se chamar Departamento de Propaganda (Enganosa).

  2. E o New York Times é o Pravda dos Democratas?
    E o que pensar da mídia brasileira, alguns veículos começam a deixar de ser ‘animador de auditório’ para acionar a claque dos aplausos.
    Ou o mapa da mina é outro, um ditado antigo afirma que, ‘é batendo na carroça que o burro anda.’ Nesse caso o burro é o cara que tem a chave do cofre para liberar as tais ‘verbas de publicidade.’
    Dom Curro, o papa da esperteza, já devia ter percebido que quanto mais ele abre a boca mais cai a popularidade, ela está indexada.

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