O mundo, enfim, está acabando, mas não se perderá muita coisa

Filmes e romances de ficção científica dos anos 50 descrevendo os iminentes fins do mundo

Ilustração de Heloísa Seixas (Folha)

Ruy Castro

Por algum motivo – por que será? –, os EUA estão vivendo uma epidemia de livros sobre o fim do mundo. Não que o dito fim seja uma total novidade. Os últimos 200 anos têm sido pródigos em prognósticos, análises, romances, contos, poemas, peças de teatro, filmes e, agora, séries sobre o assunto.

Neles, o mundo já explodiu, derreteu, congelou, inundou, chocou-se contra outros mundos ou foi destruído por guerras nucleares, bactérias traiçoeiras, dinossauros gigantes e marcianos invejosos, esses os meus favoritos.

BASE CIENTÍFICA -Mas, nos últimos tempos, as previsões catastrofistas parecem ter mais base na ciência. Ainda não se chegou a um acordo sobre a data do infausto acontecimento – daqui a 3 bilhões de anos ou no ano que vem –, embora essa cronometragem esteja sendo feita pelo Relógio do Juízo Final, um contador simbólico controlado pelos cientistas atômicos da Universidade de Chicago.

Até a semana passada, estávamos, segundo eles, a 1 minuto e meio da meia-noite, considerada a hora final. Agora, com Trump pilotando as carrapetas, o ponteiro deve ter dado um salto.

Os fundamentalistas, com suas informações de cocheira, parecem saber o dia e hora do Apocalipse, embora não arrisquem dizer como será o day after.

LOCAL DO BREJO – A grande questão, no entanto, talvez já não seja como ou quando, mas onde a vida irá de vez para o brejo – ou seja, a localização do brejo. Neste momento, os favoritos são Teerã e Tel-Aviv, suplantando Kiev e Moscou, na ponta até outro dia. Mas Washington também não deve ser descartada. E, por outros motivos, temos a Groenlândia e a Amazônia como apostas seguras, embora a médio prazo.

O planeta nunca esteve em falta de profetas pregando o seu fim, mas, com tudo isso, ainda estamos aqui. E talvez a grande pergunta seja: para quê? Para ver voltar o discurso fascista, a nostalgia da ditadura, as tentativas de golpe?

O fato de que o fim do mundo não provocará nem um infinitesimal chilique no Universo deveria nos fazer suspeitar de que, no fundo, não se perderá grande coisa.

Brasil de Lula sempre “pega leve” com governos corruptos e tirânicos

Charge Zé Dassilva: Lula e a Venezuela - NSC Total

Charge Zé Dassilva (NSC Total)

Fabiano Lana
Estadão

Como já era previsível, mas sem qualquer repercussão efetiva no cenário internacional, o presidente Lula condenou o ataque dos Estados Unidos às instalações nucleares do Irã, ao reproduzir a nota do Ministério das Relações Exteriores sobre o tema. Alegou violação da soberania, do direito internacional e transgressão à Carta das Nações Unidas.

O problema é que quando a lei se volta contra amigos, como ocorreu na Rússia, na Argentina e no Peru, o governo tem um comportamento diferente e deixa a formalidade de lado para defender os seus.

ALIADO DE PUTIN – A Ucrânia, por exemplo, foi invadida pelo exército de Vladimir Putin em 2022. O presidente Lula tem tido um papel praticamente de aliado dos russos. Seja por declarações típicas de mesa de bar como, “quando um não quer dois não brigam”, ou mesmo com a infame presença na Praça Vermelha, no dia 8/5, em evento com ditadores por todos os lados a celebrar a força militar de Putin, sob o argumento cínico de que se comemoravam os 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial.

Outro caso de incongruência com relação à lei. Na Argentina, a Justiça condenou a ex-presidente Cristina Kirchner, por favorecimento indevido a empresários, ou seja, por corrupção. O presidente Lula prestou solidariedade para a condenada. A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, considerou a sentença “uma grave ameaça para as liberdades políticas na Argentina”.

Houve, também, o caso no Peru, onde a ex-primeira-dama, Nadine Heredia, foi condenada a 15 anos de prisão por lavagem de dinheiro. Teria recebido recursos indevidos da construtora brasileira Odebrecht e do governo do ex-presidente venezuelano Hugo Chávez. Ganhou não só asilo diplomático brasileiro, como chegou a Brasília em um avião da Força Aérea Brasileira.

PODE TER FORRA – A contradição nesses casos do continente não é só internacional, mas também local, pois as dará margem a que outros países critiquem uma provável condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.

“Acabou a ordem mundial”, disse, de maneira veemente, o conselheiro internacional de Lula, Celso Amorin, sem lidar com as próprias contradições. Há cerca de 20 anos, o Brasil tentou mediar um acordo nuclear com o Irã, que foi negado pelos EUA e pela Europa.

Eram tempos de mais megalomania e Lula até sonhava com o Nobel da Paz. Hoje, ao Brasil, carta fora do baralho, resta acompanhar os desdobramentos como espectador perplexo.

TRABALHO SUJO – Mesmo com a convicção mal disfarçada de que Israel faz o “trabalho sujo” ao acuar o regime teocrático iraniano, a comunidade internacional também reprovou as ações de Trump. Faz sentido a ambiguidade. O caso do Irã é extremamente complexo para ser definido em sentenças simples.

Se a teocracia estava construindo a bomba de maneira clandestina, driblando as agências internacionais, e não aceita a existência de Israel, qual a saída tomar? Insistir na diplomacia? Apelar para a força? Não fazer nada?

Vale falar em autodeterminação dos povos quando um governo reprime oposição, mulheres, LGBT de maneira violenta? As respostas divergem a partir da ideologia de cada um.

LEMAS DE TRUMP – Os Estados Unidos, por outro lado, contam com um líder, Donald Trump, que tem como lemas “atacar sempre”, “proclamar vitória sempre” e “moldar a realidade conforme sua vontade” (assistam ao excepcional filme “O Aprendiz”, nos streamings).

Israel, por outro lado, se de fato há décadas sofre ataques terroristas por milícias armadas pelo Irã, como o libanês Hezbollah, por outro loteia indevidamente áreas pertencentes aos palestinos, como na Cisjordânia. E, para comoção mundial, tem destruído impiedosamente Gaza, com a morte de milhares de inocentes, para se livrar do Hamas (que também é financiado pelo Irã).

Nessa situação, sem respostas simples, o que faz o Brasil? Age conforme princípios? Não. Pesa a mão no antiamericanismo e costuma passar pano para os “companheiros” internacionais. O problema é que os amigos que o Brasil resolve pegar leve, em sua maioria, são regimes autocráticos (Rússia e Venezuela), teocracias como Irã, ou condenados por corrupção em seus países de origem.

Piada do Ano! Comissão que vai reformar Justiça já esqueceu os penduricalhos…

Juízes auxiliares do STF ganham mais que os ministros da corte - Espaço  Vital

Charge do Alpino (Yahoo Notícias)

Rayssa Motta
Estadão

Já que a Ordem dos Advogados do Brasil não dá o ar de sua graça, a seccional de São Paulo decidiu sair em campo e criou uma comissão de altíssimo nível para debater uma reforma ampla do Poder Judiciário. A primeira reunião foi nesta segunda-feira, dia 23, na sede da entidade, para definir um cronograma de reuniões e trabalho.

A comissão vai analisar temas delicados não somente sobre o funcionamento do Supremo, mas também no que se refere à conduta de seus ministros, e questões relacionadas à administração da Justiça.

Há muito trabalho a fazer e a empolgação é grande, com expectativa de que a proposta de reforma esteja pronta dentro de um ano, para ser encaminhada ao Congresso e ao Supremo.

CRISE DE CREDIBILIDADE – A maior preocupação é a crescente perda de credibilidade. Reportagem de Rayssa Motta, no Estadão, relata que antes da reunião, na cerimônia para instalar o grupo de trabalho, os membros da comissão mencionaram a crise de credibilidade do Poder Judiciário em todos os discursos.

“O momento é exatamente adequado para que nós trabalhemos sobre esse tema porque o Judiciário se encontra sob crítica violenta de todos os lados. Não consegue agradar a ninguém”, afirmou a ministra Ellen Gracie, aposentada do STF, uma das integrantes do grupo de trabalho.

O ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr. também vai fazer parte da comissão. Ele defendeu que o STF é um dos objetos de “preocupação” do grupo de trabalho. “Seja com relação à sua competência, seja com relação ao seu regimento interno, seja com relação à sua imagem. Para a preservação de sua imagem como um órgão neutro, imparcial e íntegro”, afirmou o ex-ministro.

CORREÇÃO DE RUMOS – À primeira vista, como dizia Nelson Rodrigues, os idiotas da objetividade vivem momentos de puro êxtase com as metas da comissão. No entanto, é preciso entender que a iniciativa dos conselheiros da OAB paulista tem um encontro marcado com o fracasso.

Todas as regras possíveis e imagináveis sobre imparcialidade, suspeição, abuso de poder e outros males já foram criadas e estão em pleno vigor.

A única norma que pode ser reforçada é a proibição de cônjuges e parentes de ministros atuarem como advogados de causas no Supremo, mesmo assim eles logo darão um jeito, uma nova interpretação.

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P.S.
O que seria mais importante não entrará na reforma. Acredite se quiser, mas a tal comissão não discutirá os penduricalhos. Eles estão fora de pauta, protegidos pelo vexaminoso esquema corporativista que passou a reger os salários dos operadores de Direito. Isso significa que os salários de Executivo e Legislativo também continuarão a receber penduricalhos “per saecula saeculorum”, ou seja, para sempre ou até o fim dos nossos dias. Alguém esperava coisa diferente? (C.N.)

Indiferente à opinião pública, Congresso apoia propostas rejeitadas em pesquisas

O Congresso que é a Cara do Brasil: cúmplice da corrupção - O que é notícia em Sergipe

Charge do Clayton (O Povo/CE)

Dora Kramer
Folha

“Esta casa faz o que o povo quer.” A frase indicativa do dever de representação popular do Parlamento nos idos de 1992 funcionou como a senha dada pelo então presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, à aprovação do impedimento de Fernando Collor na Presidência da República.

Hoje o lema é para lá de discutível frente a decisões que privilegiam interesses internos. Está especialmente em xeque em dois temas que contrapõem as posições dos congressistas às opiniões da maioria dos brasileiros, captadas em recentes pesquisas do Instituto Datafolha.

TEMAS IMPOPULARES – O aumento do número de deputados e o fim da reeleição para presidente, governadores e prefeitos são propostas rejeitadas por 76% e 57% dos consultados, respectivamente. Ainda assim, os parlamentares tendem a aprová-las sem levar em conta o que seus representados pensam a respeito.

A Câmara já aprovou e o Senado se prepara para nos próximos dias corroborar a decisão de aumentar de 513 para 531 as vagas para deputados, indiferente aos custos diretos e indiretos (com emendas, por exemplo), além do efeito cascata nas assembleias legislativas, que teriam acréscimo de 30 cadeiras.

Isso ao arrepio dos dados objetivos apurados pelo Censo Demográfico do IBGE, que indicaram a necessidade de redistribuição de vagas de acordo com a população de cada estado.

ADEQUAÇÃO – O Supremo Tribunal Federal determinou apenas a adequação à qual o Congresso se dispõe a acrescentar mais 18 lugares na Câmara, sob o cínico argumento de preservar a representação, quando, de fato, atuam para distorcê-la, desrespeitando o critério da proporcionalidade das bancadas por habitantes.

Os congressistas exibirão o mesmo desdém em relação a preferências populares se apoiarem a emenda pelo fim da reeleição aprovada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

Vão contrariar os 57% favoráveis à chance de um segundo mandato nos Poderes Executivos, sem provas de que a prática seja nociva e em nome do desejo de encurtar a fila de políticos de olho nos cargos.

Barroso tenta “acordo” e suspende julgamento que atinge as big techs 

Julgamentos "relâmpago" crescem no plenário virtual do STF

No Supremo, cada cabeça é uma sentença sobre big techs

Daniel Gullino
O Globo

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, anunciou nesta quarta-feira a suspensão do julgamento sobre as regras de responsabilidade das redes sociais sobre os conteúdos publicados nelas. Dez dos 11 ministros já votaram, com um placar de oito votos a dois para aumentar a responsabilização, mas há divergências entre os votos.

Será realizado um almoço com os ministros para tentar chegar a uma posição intermediária. O ministro Nunes Marques, o único que ainda não votou, só apresentará sua posição após essa conversa.

— Fica suspenso o julgamento para, internamente, discutirmos as teses. Se já conseguirmos chegar a um acordo nesta quinta, nós proclamaremos o resultado. Se precisarmos de um pouco mais de tempo, precisaremos de um pouco mais de tempo. Mas acho que avançamos bem nos debates — anunciou Barroso.

CÁRMEN E FACHIN – Nesta quarta, a ministra Cármen Lúcia reforçou a maioria que defende aumentar a responsabilidade das plataformas, enquanto Edson Fachin votou com a divergência.

Dos dez ministros que já votaram, apenas André Mendonça e Fachin defenderam a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil. O dispositivo diz que “o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros” se, após ordem judicial, “não tomar as providências” para retirar o conteúdo.

HÁ CONTROVÉRSIAS – Já entre os oito magistrados que defendem a responsabilização, três — Dias Toffoli, Luiz Fux e Alexandre de Moraes — votaram pela inconstitucionalidade do artigo. Os outros cinco — Luís Roberto Barroso, Flávio Dino, Cristiano Zanin, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia— avaliaram que o trecho da lei deve ser considerado apenas parcialmente inconstitucional.

Apesar da maioria, há diferenças entre os votos dos minitros. No caso de crimes contra a honra, como calúnia e difamação, há uma divisão entre os que veem a necessidade de ordem judicial para retirada de conteúdo e outra corrente que considera suficiente uma notificação extrajudicial às plataformas.

Já um dos pontos em que há concordância é o reconhecimento da responsabilidade das redes em caso de conteúdos patrocinados. Nesta hipótese, as plataformas deverão ter a obrigação de checar se o conteúdo é criminoso.

POR NOTIFICAÇÃO – Um dos pontos a ser definido é a extensão da aplicação de outro artigo do Marco Civil, o 21. Neste trecho, há obrigação de retirada de conteúdo após notificação extrajudicial, pela vítima, no caso de conteúdos que violem a intimidade. Toffoli defendeu que esse modelo seja geral, para qualquer situação, e foi acompanhado pela maioria dos que votaram.

Neste ponto é que há divergência em relação aos crimes contra a honra. Para Barroso, deve continuar valendo a necessidade de ordem judicial para remoção. Flávio Dino acompanhou esse ponto, votando para manter as regras atuais do artigo 19 apenas nesses casos.

Cristiano Zanin, por outro lado, votou por uma posição intermediária: a remoção só deve ocorrer sem ordem de um juiz quando o caráter criminoso do conteúdo for evidente. Nos casos em que essa caracterização não for clara, será preciso aguardar o Judiciário.

MAIS DISCUSSÕES – Outro ponto é a possível responsabilização das plataformas por uma “falha sistêmica”. Barroso defende que as empresas precisam ter a obrigação de evitar conteúdos como pornografia infantil, instigação a suicídio ou automutilação, terrorismo e crimes contra a democracia.

Dino reforçou essa obrigação e sugeriu que, caso ocorra essa falha em série, as empresas sejam punidas com base em um artigo do Código de Defesa do Consumidor, que prevê a reparação por danos causados na prestação de serviços.

Gilmar Mendes sugeriu algumas obrigações específicas, como a publicação de um relatório anual de transparência sobre práticas de moderação de conteúdo e a manutenção de repositório de anúncios com acompanhament0o em tempo real.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Como dizia Machado de Assis, a confusão é geral. Os ministros querem agradar Moraes contra Musk e Trump, mas não têm como. O artigo 19 é constitucional e deveria ter sido obedecido por Moraes, como Musk sugeriu, aliás, mas a vaidade bateu mais forte e agora está difícil encontrar uma solução conciliatória. Resumindo: mais um vexame de Moraes, o grande jurista. (C.N.)

O romantismo da “Canção da Volta”, de Antonio Maria e Ismael Netto

O centenário de Antônio Maria, um dos reis do samba-canção – CartaCapital

Antonio Maria, um grande compositor

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, cronista e compositor pernambucano Antonio Maria Araújo de Morais (1921-1964), em parceria com o cantor e compositor paraense Ismael de Araújo Silva Netto (1925-1956), escreveu um clássico do repertório da MPB: “Canção da Volta”, que retrata o arrependimento de alguém por seguir às ordens do seu coração. Este samba-canção foi gravado por Dolores Duran, em 1954, pela Copacabana.

CANÇÃO DA VOLTA
Antonio Maria e Ismael Netto

Nunca mais vou fazer
O que o meu coração pedir
Nunca mais vou ouvir
O que o meu coração mandar
O coração fala muito
E não sabe ajudar

Sem refletir
Qualquer um vai errar, penar.
Eu fiz mal em fugir
Eu fiz mal em sair
Do que eu tinha em você
E errei em dizer
Que não voltava mais

Nunca mais
Hoje eu volto vencida
A pedir pra ficar aqui
Meu lugar é aqui
Faz de conta que eu não saí

De onde poderia vir esse choro espalhado pelo mundo, eterno e contínuo?

Israel submete população de Gaza 'à fome forçada', diz alto funcionário da  ONU à BBC - BBC News Brasil

Crianças palestinas disputando arroz na Faixa de Gazaq

Luiz Felipe Pondé
Folha

Em algum dia de 2022, entrei num templo yazidi na Armênia, um belíssimo templo cor âmbar, com seu grande pavão ao centro do altar. Radicalmente vazio, suportando uma imensa luz, como que cantando o canto do pavão, representante da sua divindade monstruosa, conhecida como o anjo mau. Vendo vítimas em Israel, Gaza, Ucrânia, Irã e África, é impossível as almas mais atentas não buscarem rastros do anjo mau yazidi.

O Estado Islâmico, grupo assassino islamita, matou yazidis aos montes, escravizou suas mulheres como prostitutas não pagas, aos olhos de um mundo indiferente ao massacre yazidi. A “justificativa” do “califado” era que os yazidis são adoradores do Satanás.

SANTA HERESIA – A cosmologia yazidi é parente próxima de heresias cristãs desde a Antiguidade, como gnosticismo, maniqueísmo, e, já adentro da Idade Média europeia, os bogomilos e cátaros. Os yazidis também são considerados uma heresia dentro do islamismo.

Todas essas formas de espiritualidades sombrias carregam consigo a hipótese, para alguns, herdeira do zoroastrismo persa antigo, segundo a qual há uma força, ou divindade, que age sobre o mundo fazendo dele um local de sofrimento, agonia e desespero.

Quando vemos a agonia dos seres humanos, dos cachorrinhos e seres vivos como um todo diante do envelhecimento e da morte, é impossível as almas mais desesperadas não sentirem o halo do anjo mau yazidi sobre o horizonte.

VÍTIMAS DA GUERRA – Quando vemos as vítimas massacradas em Israel, Gaza, Ucrânia, Irã e na sempre esquecida África, é impossível as almas mais atentas não buscarem os rastros do anjo mau yazidi.

De onde poderia vir esse choro espalhado pelo mundo, eterno, contínuo, ensurdecedor, senão dos olhos cheios de sangue desse anjo mau?

Qual a resposta possível, razoável, à hipótese yazidi? O filósofo alemão Leibniz (1646-1712) perdia o sono buscando uma resposta racional à hipótese gnóstica e seu demiurgo cruel criador do mundo —parente próximo do anjo mau yazidi, representado pela figura do pavão majestoso em seus templos.

SURGE A TEODIREITA – Se essas cosmologias negativas tiverem razão, o que fazer? Leibniz acabou por cunhar o importante conceito de teodiceia para responder aos gnósticos. Há que responder a este desafio de forma racional, ou seja, encontrar um caminho que justifique o mundo tal como ele é, sem apelo à revelação sagrada. Daí a sua hipótese do “melhor mundo possível”.

Nosso mundo é o melhor mundo possível. Uma vez que só Deus é perfeito, nada pode sê-lo sem ser essa coisa mesma Deus. Deus entrega esse mundo a nós, e cabe a nós fazer o melhor que os imperfeitos podem fazer numa matéria sem si imperfeita.

São inúmeras as controvérsias acerca dessa hipótese. Voltaire (1694-1778) mesmo escreveu seu “Cândido” para criticar Leibniz e tirar sarro da sua proposta ingênua diante de um mundo de trevas dominado por superstições, ignorância e religiões idiotas — para Voltaire, uma redundância.

SOMOS CÂNDIDOS – Para Cândido, o protagonista, a única solução ao final seria “cuidar do nosso jardim”, ou seja, o mundo lá fora está além das nossas possibilidades de redenção. O nome em francês, “Candide”, carrega a mesma ambiguidade do termo em português, nome próprio e adjetivo similar a ingênuo ou dócil.

Para o “mainstream” teológico das três religiões monoteístas abraâmicas —judaísmo, cristianismo e islamismo—, a hipótese negativa dos yazidis e seus próximos no cristianismo é absurda. O criador é bom e justo, e sua criação, portanto, é bela e boa —parece Platão.

Somos chamados à ação sobre o mundo e no mundo. Somos chamados a cuidar da criação, uma vez que, como diz Deus a Adão, somos os guardiões da criação divina.

AO ANJO CRUEL – Apesar do caráter sedutor e elegante da hipótese negativa acerca da criação —para a razão, parece mais razoável, dado o estado do mundo, que ele tenha sido criado, ou seja administrado, por um princípio mau—, se fosse dado a mim escolher entre a hipótese negativa dessas heresias e a hipótese “otimista” da teologia “mainstream”, escolheria esta. Teologicamente e existencialmente, parece-me terrível a possibilidade de Deus ser mau ou ter entregado sua criação ao cruel anjo mau.

UMA GRANDE VIAGEM – Por exemplo, parece-me também muito elegante a hipótese da filósofa portuguesa Cristina Sá Carvalho, professora da Universidade Católica Portuguesa em Lisboa, inspirada nas ideias do papa Francisco, morto recentemente, de que devamos fazer uma “viagem até a misericórdia” a fim de cuidar do mundo e das coisas.

Seu livro “A Misericórdia como Categoria Política”, da UCP Editora, é um belo trabalho de argumentação a favor da ideia de que, sem a misericórdia, não há como sustentar o mundo e as coisas dentro dele. Entretanto, a misericórdia, como tudo mais que importa, está sempre nos detalhes.

Juros altos até 2026: o desgaste prolongado da política econômica

Charge do Cicero (Aqruivo

Charge do Cicero (Arquivo do Google)

Pedro do Coutto

O adiamento da expectativa de corte da taxa Selic para apenas janeiro de 2026, conforme projeções recentes do mercado financeiro, representa um duro golpe para as ambições do governo federal em reaquecer a economia ainda em 2025. Embora a decisão final ainda dependa das próximas reuniões do Copom, a sinalização de que o Banco Central manterá os juros em 15 % até o fim do ano reforça a percepção de que o cenário macroeconômico segue fragilizado — e que o Planalto perdeu capacidade de induzir uma reversão de expectativas no curto prazo.

O governo Lula iniciou seu terceiro mandato com promessas de reconstrução do Estado e de retomada do crescimento com inclusão social. Contudo, a persistência da taxa básica de juros em patamares elevados compromete esse projeto e impõe limites ao alcance de políticas públicas voltadas ao consumo, ao crédito e ao investimento. A leitura do mercado é clara: sem reformas estruturais e sem um ajuste fiscal crível, não há espaço para uma política monetária mais branda.

RESULTADOS – O grande desafio do Planalto, portanto, não está apenas em pressionar o Banco Central, mas em mostrar resultados concretos na área fiscal. A frustração com a arrecadação, o ritmo lento da reforma tributária e a dificuldade em cortar gastos colocam o Ministério da Fazenda numa posição delicada. A sinalização de que os juros não vão cair antes de 2026 reforça a tese de que o BC considera os fundamentos econômicos frágeis — uma crítica implícita à condução da política fiscal atual.

No plano político, essa previsão representa uma crescente fonte de desgaste para o governo. O eleitorado que confiou no discurso de retomada da economia começa a sentir os efeitos prolongados do juro alto: crédito mais caro, consumo estagnado e dificuldades para pequenos e médios empresários. A base aliada, especialmente no Congresso, também começa a demonstrar impaciência, cobrando resultados mais rápidos em um ambiente de pressão eleitoral antecipada.

A permanência dos juros elevados afeta ainda a própria autoridade do presidente sobre a narrativa econômica do país. Lula, desde o início de sua gestão, criticou abertamente a política monetária do Banco Central, especialmente sob a presidência de Roberto Campos Neto. Agora, com a transição de comando se aproximando, o mercado sinaliza que a mudança de nomes não será suficiente para alterar a orientação do Copom sem um ambiente fiscal mais seguro. Isso dilui o impacto político que o governo esperava colher com a troca de comando.

PROGRAMAS SOCIAIS –  Outro reflexo imediato é a dificuldade em impulsionar programas sociais e de infraestrutura. Mesmo com o novo PAC e iniciativas voltadas à habitação popular e transição energética, o financiamento se torna mais difícil e mais caro. O setor produtivo, especialmente a indústria e a construção civil, sente o impacto direto da política monetária e começa a rever planos de expansão. Isso reduz o potencial multiplicador da política fiscal e trava a geração de empregos — um dado sensível para a popularidade presidencial.

Internamente, a equipe econômica enfrenta crescente pressão. A figura do ministro Fernando Haddad, que até agora tem sido o fiador da moderação fiscal, começa a ser colocada em xeque, tanto por alas mais à esquerda, que defendem estímulos ao crescimento, quanto por setores do mercado que duvidam da efetividade de suas medidas. A expectativa de juros altos até 2026 impõe um novo teste à sua permanência e à coesão política dentro do governo.

EQUILÍBRIO – Externamente, o Brasil ainda mantém relativa atratividade para o capital estrangeiro, justamente por causa dos juros altos. Mas esse movimento é ambivalente: ao mesmo tempo que garante fluxo cambial positivo, também indica um país com dificuldades em equilibrar crescimento e estabilidade. Essa leitura de “país travado” compromete a imagem de modernização e de protagonismo internacional que o governo busca reconstruir.

A narrativa de que o Banco Central atua de maneira excessivamente conservadora perde força diante da leitura generalizada do mercado: os riscos fiscais, a desorganização orçamentária e a ausência de reformas relevantes são hoje os principais obstáculos à queda da Selic. O governo se vê diante da necessidade de mudar o foco do embate com o BC para um esforço real de coordenação entre Executivo e Legislativo em torno de uma agenda econômica sólida e sustentável.

Em síntese, a projeção de que os juros só começarão a cair em 2026 impõe ao governo um novo ciclo de frustração política. A promessa de alívio econômico no curto prazo já não convence nem o mercado nem a população. Resta agora ao Executivo o desafio de resgatar a confiança com medidas concretas, capazes de reorganizar as contas públicas e construir as bases para uma retomada sustentável — ainda que essa reconstrução custe capital político e revele fissuras internas. O tempo, mais do que nunca, passou a jogar contra.

Os seus inimigos na política não são muito diferentes de você

Observe a charge Infere-se sobre a charge:Joel Pinheiro da Fonseca
Folha

Foi Carl Schmitt quem definiu com muita propriedade: a política se funda na distinção entre amigo e inimigo. Por trás de todas as discussões técnicas, de todos os argumentos e do embate de valores abstratos há a realidade mais básica do conflito irreconciliável entre dois grupos humanos que estão dispostos a matar para preservar seu modo de vida.

Isso vale sobretudo para a relação entre povos —e seus Estados— mas está cada vez mais presente na política doméstica de cada país, também ela constituída de identidades coletivas que enxergam no outro uma ameaça.

BEM GOVERNAR– Contra Schmitt, com milênios de distância, está Aristóteles, cuja filosofia política era acima de tudo sobre como bem governar a sociedade. Diferentes formas de governo e diferentes leis devem ser conhecidas e discutidas para garantir uma ordem social justa e que permita o florescimento humano.

A tensão entre os dois sempre fará parte da política: promoção do bem comum —ou, vá lá, de alguma agenda— e disputa pelo poder são dois lados da mesma moeda. Mas hoje é Schmitt quem está por cima.

Preferimos atacar o inimigo que mora ao lado do que engajar num debate construtivo. Expor as contradições do defensor médio do lado oposto —reais ou imaginadas—, para então poder rotulá-lo de “hipócrita”, é o que passa por discussão política, como bem apontado pelo artigo de Deborah Bizarria na sexta-feira.

ISRAEL X IRÃ – Mesmo num tema global como a guerra Israel-EUA X Irã, o principal alvo do brasileiro que se posiciona são seus rivais ideológicos aqui no Brasil. O esquerdista que supostamente apoia o regime dos aiatolás; ou o direitista supostamente vendido ao imperialismo norte-americano. O primeiro, movido por antissemitismo; o segundo, por racismo.

Ou seja, algum ódio irracional, atávico, ao mesmo tempo explica e desqualifica o diado adversário. Você, ao contrário, é movido pelo real amor à justiça e à igualdade.

Penso que a prioridade número 1 para aprimorar nossa política é um número maior de pessoas se convencer que seu próprio grupo não é um bastião de valores mais elevados. Amigos e inimigos, sob cores e fantasias diferentes, são muito mais parecidos do que gostam de acreditar.

TRAIR IDEAIS – Atribuir o mal da sociedade ao coletivo adversário, você dá às lideranças do seu lado a permissão moral para traírem os ideais que elas deveriam representar. É acreditando piamente defenderem o lado que valoriza a vida que muitos defensores de Israel chancelam massacres. E é em sua objeção ao imperialismo que tantos aceitam as piores formas de opressão.

Não é ingênuo acreditar na possibilidade de um meio-termo justo, num padrão objetivo 100% livre de partidarismo? Assim de forma pura, com certeza. Nenhum de nós é desprovido de seus vieses. Nossa escolha é se damos livre curso a eles ou se buscamos limitá-los, mirando uma realidade sempre complexa e cheia de nuances.

Apontar uma suposta “hipocrisia” do lado adversário em nada ajuda a mostrar que aquilo que você defende está certo. Não faltam desumanidades e contradições para todos. Resistamos a Schmitt! Trabalhar para reduzir as contradições do nosso próprio lado, aí sim, pode nos ajudar a progredir e, quem sabe, encontrar consensos entre os que hoje se odeiam e recuperar algum tipo de bem comum.

Edson Fachin enfrenta Moraes e vota  contra responsabilização de big techs

Fachin diverge de maioria em julgamento sobre responsabilização de redes e  defende ordem judicial para remoção de posts

Fachin cai na real e desiste de apoiar os excessos de Moraes

Carlos Newton

Sabe-se que o Supremo Tribunal Federal, ao assumir as arbitrariedades do ministro Alexandre de Moraes, caiu na armadilha que todo corporativismo monta diante de qualquer pretensão verdadeiramente descabida. Moraes é ocriador de estranhas novidades, como o inquérito do fim do mundo, aquele que não acaba nunca, no dizer do ministro aposentado Marco Aurélio Mello.

Moraes comete erros primários, afronta as leis, porém os demais ministros nada fazem, para não criar mais problemas externos e internos, pois Moraes, por si só, já significa um problemaço.

DISSIDENTES – De vez em quando, um dos ministros resolve colocar ordem na verdadeira zona em que se transformou a Suprema Corte, mas acaba desistindo, como já aconteceu nos casos de Luiz Fux, André Mendonça e Nunes Marques, sempre esmagados pela maioria, que prefere não contrariar Alexandre de Moraes em suas psicodélicas viagens jurídicas, que seguem rotas e normas de alta criatividade e que pouco têm a ver com os rigorosos princípios que preservam a Ciência do Direito.

No importantíssimo processo das fake news, que tem implicações internas e externas, o primeiro a enfrentar Moraes foi novamente André Mendonça, cujo voto tornar-se-á uma bela aula de Direito.

E agora é o ministro Edson Fachin, que acompanha Mendonça e também votou para manter a constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet, no julgamento da possibilidade de responsabilizar as big techs por conteúdos de terceiros.

DISSE FACHIN – “Vejo a necessidade de termos uma certa cautela ao arrostarmos a concentração de poder, que é inequívoca das plataformas e suas empresas”, ressaltou o ministro.

“Não creio que esse tema necessariamente será enfrentado, ou solvido, ou esgotado, com a remoção das plataformas. Por isso, a minha divergência em relação ao remédio que está sendo empregado”, disse Fachin.

O ministro ainda acrescentou que acredita que “há uma necessidade de uma regulação estruturada e sistêmica, e preferentemente não via Poder Judiciário”.

TRADUÇÃO SIMULTÂNEA – André Mendonça e Edson Fachin, em tradução simultânea, estão tentando uma saída honrosa para Alexandre de Moraes e também para o próprio Supremo. Mas o ministro-relator e seus seguidores mostram-se irredutíveis.

Insistem em pretender que o governo, o Congresso e a Justiça dos Estados Unidos joguem no lixo a fabulosa Primeira Emenda, destinada a garantir a inviolabilidade da democracia, antes que algum aventureiro lance mão, como disse Dom João VI, ao deixar o Brasil, sugerindo ao filho Pedro que colocasse a coroa sobre sua cabeça.

O Supremo pode fazer o que o sinistro Moraes bem entender. Mas  seus membros podem estar certos de que não conseguirão mudar a Primeira Emenda nem instituir a censura prévia em países que amem a democracia. É uma iniciativa vexaminosa. Alguém precisa parar Moraes.

Governo é humilhado no Congresso, com aliados votando contra o aumento do IOF

Congresso derruba a toque de caixa a mudança de Lula no IOF

Alcolumbre rapidamente colocou o decreto em votação

Deu no Correio Braziliense

Na noite desta quarta-feira, logo após aprovação na Câmara dos Deputados, o Senado Federal seguiu na mesma direção e derrubou o decreto presidencial que estabelecia alíquotas maiores do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para transações que envolvem câmbio, seguros e crédito para empresas.

O resultado representa mais uma derrota no Congresso Nacional do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da equipe econômica, liderada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

ÀS PRESSAS – A votação da pauta foi incluída às pressas pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que em comunicado, afirmou que a decisão de votar o Projeto de Decreto Legislativo 214/25 ainda nesta quarta-feira (25/6) teria como base o cumprimento a um “compromisso político e institucional” firmado com a Câmara, que havia aprovado o projeto na mesma noite.

Em votação simbólica, apenas o Partido dos Trabalhadores (PT) e do líder do Partido Democrático Trabalhista (PDT) no Senado, Weverton Rocha, foram contrários à medida. Esse posicionamento foi apenas para não humilhar ainda mais o governo.

Foi a primeira vez, desde 1992, no governo Collor, que um decreto presidencial é derrubado.

Na Justiça enlouquecida, o rei inglês estava doido, mas degolaram o francês

Tribuna da Internet | Justiça no Brasil, manipulada e dispendiosa, custa  três vezes mais que a média mundial

Charge do Kemp (humortadela.com.br)

Elio Gaspari
O Globo

O paralelo pode parecer exagerado, mas o caso é o seguinte. Em 1788, depois de ter perdido as colônias da América do Norte, George 3º, o rei da Inglaterra, ficou maluco. Um ano depois, deu-se uma Revolução na França. Luís 16 foi deposto, preso e guilhotinado. Degolaram também sua mulher e barbarizaram a vida de seu filho, uma criança.

A revolução aconteceu na França porque lá o andar de cima perdeu a cabeça na defesa de privilégios e honrarias absurdos, pouco se lixando para a defesa das instituições que lhes pareciam sólidas. A cegueira dos franceses foi tamanha que madame Du Barry, namorada do avô de Luís 16, fugiu para Londres e vivia bem, até que decidiu voltar à França. Presa, foi para a lâmina.

AUTOAVACALHAÇÃO – Dois séculos e um oceano separam o Brasil do 21 e a França do 18. Muitos são os males que afligem Pindorama, mas uma parte da magistratura e do Ministério Público foram para uma coreografia de penduricalhos y otras cositas más. Armou-se um sistema de autoavacalhação institucional.

Dentro de uma legalidade que é desenhada pela magistratura, o Código do Processo Civil permite que assessorias jurídicas “podem ser exercidas de modo verbal”, sem necessidade “de formalização por contrato de honorários”. Em 2016, 10 dos 33 ministros do Superior Tribunal de Justiça tinham parentes advogando na corte.

Anos depois esse número passou para cerca de 15. Vá lá, quem trabalha de graça é relógio. A questão acaba sendo a forma como se trabalha.

SUPERSALÁRIOS – Graças aos penduricalhos, uma desembargadora de São Paulo recebeu R$ 678 mil líquidos em dezembro passado. São os supersalários, disseminados pelo país e pelas diversas instâncias. No ano passado, os penduricalhos custaram à Viúva R$ 6,7 bilhões. Os supersalários transbordaram para o Ministério Público. Todos legais, diria o conde de Artois, irmão de Luís 16.

O ministro Gilmar Mendes, do STF, reclamou dos penduricalhos, dizendo que “estamos vivendo um quadro de verdadeira desordem”. Astuciosa desordem, pois sempre custa à Viúva, jamais a remunera.

Astuciosa e potente, pois a repórter Rosane Oliveira foi condenada a indenizar uma juíza que recebeu R$ 662 mil partindo de um vencimento de R$ 35 mil. Tudo legal. O malfeito da repórter foi ter dado cifras aos bois.

GRATIFICAÇÕES – Os penduricalhos estabeleceram-se disfarçando-se como gratificações que poderiam ser cobradas retroativamente. Em abril, tentou-se saber a quanto ia a conta. Nada feito. Novo pedido, nova negaça. Numa gracinha típica da espécie, o Ministério Público de São Paulo decidiu conceder um mimo que pode chegar a R$ 1 milhão, indenizando os promotores pelos serviços prestados há décadas, quando eram estagiários.

Magistrados e procuradores sonham com a planilha salarial de Polichinelo. Contratado por 30 liras mensais, ele queria receber uma lira por dia, sete por semana, 15 por quinzena e 30 ao fim do mês.

Estavam assim as coisas quando o repórter Arthur Guimarães de Oliveira revelou que os penduricalhos do Ministério Público de São Paulo formaram um passivo de R$ 6 bilhões, ervanário equivalente a uma vez e meia o orçamento anual da instituição. Esse dinheiro não existe, mas as excelências correrão atrás dele.

Trump contradiz agências de inteligência e diz que Irã desenvolvia armas nucleares

Donald Trump não tem provas e decide a seu bel prazer

Deu na Folha

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse em carta ao Congresso que as instalações nucleares iranianas atingidas no sábado (21) por um bombardeio americano abrigavam “um programa de desenvolvimento de armas nucleares” —contradizendo as agências de espionagem dos EUA, que dizem que esse programa não existe.

O documento, enviado na segunda (23) para o presidente da Casa, o republicano Mike Johnson, e publicado hoje pela Casa Branca, afirma que as Forças Armadas americanas “conduziram um ataque de precisão contra três instalações nucelares no Irã usadas pelo governo da República Islâmica em seu programa de desenvolvimento de armas nucleares”.

RELATÓRIO NEGA – Não está claro em quais informações Trump se apoia para fazer essa afirmação. Em um relatório apresentado ao Congresso em março, a diretora de Inteligência Nacional dos EUA, Tulsi Gabbard, disse que o líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, ainda não havia tomado uma decisão sobre reiniciar o programa de armas nucleares do país persa, abandonado oficialmente em 2003.

O órgão nuclear da ONU afirma que o Irã vem enriquecendo urânio a um nível além do necessário para usos puramente civis. A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) diz que Teerã possui cerca de 400 kg de urânio enriquecido a 60% de pureza.

A maioria dos reatores nucleares para produção de energia elétrica necessita de urânio enriquecido a apenas 5%, enquanto armas atômicas geralmente utilizam material com pureza de 90% ou mais. Segundo especialistas, o Irã poderia rapidamente enriquecer os 400 kg já existentes para níveis ainda maiores de material físsil.

SEM PROVAS – Entretanto, a diferença crucial é que não há provas de que o regime tenha optado por seguir esse curso. Tecnicamente, o Irã ainda é membro do Tratado de Não Proliferação Nuclear (NPT), que barra a produção de armas nucleares por países que não as possuem, e tem desde 2003 há um fatwa —isto é, uma opinião jurídica islâmica— emitida por Khamenei proibindo o desenvolvimento da bomba atômica por Teerã.

Oficialmente, o regime diz que seu programa nuclear tem fins pacíficos. A carta de Trump ao Congresso americano dá a entender que o presidente ignorou as informações que tinha à disposição das agências de inteligência dos EUA ao ordenar o ataque sem precedentes contra as instalações nucleares de Fordow, Natanz e Isfahan, no Irã.

O caso levou analistas a traçarem comparações com as afirmações feitas por George W. Bush em 2003, quando buscou justificar ao mundo sua invasão do Iraque dizendo que o país tinha armas de destruição em massa. Essas armas nunca foram encontradas.

TRUMP NÃO LIGA – Antes do ataque contra o Irã, Trump foi questionado por jornalistas sobre o relatório de Gabbard negando a existência de um programa de armas nucleares iraniano. Na ocasião, o presidente respondeu: “Eu não ligo para o que ela disse. Eu acho que eles estão muito próximo de conseguir uma [bomba atômica]”.

Gabbard, uma aliada próxima de Trump, tentou amenizar suas afirmações ao Congresso, dizendo que a espionagem americana aponta que o Irã poderia produzir uma bomba “em semanas ou meses” se assim desejasse —um argumento também apresentado por Israel e seu primeiro-ministro, Binyamin Netanyahu.

Trump e seu secretário de Defesa, Pete Hegseth, dizem que o ataque americano “obliterou completamente” o programa nuclear iraniano. Um relatório confidencial revelado pela imprensa americana nesta terça (24), entretanto, aponta que o bombardeio teve o efeito de atrasar o programa somente em alguns meses.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Diante desse impasse, quando não há solução para nada, a gente lembra o célebre poema “Sete Faces”, de Carlos Drummond de Andrade, em que ele diz: “Mundo, mundo, vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo, seria uma rima, não seria uma solução”. (C.N.)

Guerra em Gaza divide israelenses, mas ataque ao Irã une todos eles

rbscidade, onde é possível ver uma densa camada de fumaça se elevando em meio a prédios iluminados. O céu está parcialmente nublado, e as luzes da cidade se espalham ao fundo, criando um contraste com a escuridão da noite. A fumaça parece estar concentrada em uma área específica, sugerindo um possível incêndio ou explosão.

Míssil israelense explode em zona urbana na ,pitalx

Demétrio Magnoli
Folha

O Irã não era um país de fanáticos. Foi palco da Revolução Constitucional de 1906, fonte do primeiro parlamento no mundo muçulmano, extinto pelo monarca com apoio de tropas russas. Teve um governo nacionalista e democrático, de Mossadegh, um dos jovens líderes daquela revolução, entre 1951 e 1953, deposto no golpe articulado pela CIA e pelo MI6.

O fanatismo islâmico emergiu com a revolução de 1979 — ou melhor, com o triunfo da facção dos aiatolás no turbulento período pós-revolucionário. Daí nasceu o objetivo de exterminar Israel.

CONTRA O XÁ – A queda do xá Reza Pahlevi, em janeiro de 1979, resultou de um amplo movimento popular conduzido por islamistas, nacionalistas, democratas e comunistas.

O primeiro presidente da nova república, Abolhassan Banisadr, representava aquela aliança antimonárquica. Seu impeachment, em junho de 1981, assinalou a dissolução da aliança e a instauração do poder absoluto do clero xiita sob Khomeini. Na república islâmica, o governo oficial habita a masmorra do regime teocrático: o aiatolá manda, o presidente administra.

Dois golpes sucessivos propiciaram o triunfo da facção clerical. O primeiro, interno: a invasão da embaixada americana em Teerã e a tomada de seus funcionários como reféns por uma organização estudantil controlada por Khomeini, em novembro de 1979. O segundo, externo: a invasão do país pelo Iraque, em setembro de 1980, que deflagrou uma guerra devastadora de oito anos. Sob as crises justapostas, cancelaram-se as liberdades públicas.

PAÍS PERSA – O Irã não é um país árabe, mas persa. O regime dos aiatolás engajou-se na missão de enterrar a tradição persa, enraizando sua legitimidade no solo do Islã. O fundamentalismo islâmico funcionou como ferramenta de projeção de influência no mundo árabe.

Por isso, o Estado clerical funda-se na hostilidade aos EUA (o “Grande Satã”) e a Israel (o “Pequeno Satã”). O antissemitismo e seu corolário, a negação do Holocausto, esculpe o discurso dos aiatolás. De nação, o Irã tornou-se uma cruzada.

Nessa moldura, a questão palestina, tema caro aos árabes mas não aos persas, surge como pretexto estratégico do regime. A invocação do direito nacional palestino nutriu a política externa do Irã, abrindo-lhe caminho para uma rede de alianças no mundo árabe: o “eixo da resistência” envolveu a Síria de Assad, o Hezbollah xiita no Líbano e o Hamas sunita nos territórios palestinos.

EXTERMINAR ISRAEL —Eis a meta geopolítica definida pelo Irã dos aiatolás. De fato, um Irã nuclear ameaçaria a sobrevivência do Estado judeu. Por isso, o ataque ao Irã exprime um consenso social em Israel e na diáspora judaica. A guerra em Gaza, brutal e criminosa, divide os israelenses, mesmo depois dos bárbaros atentados do Hamas.

Mas a deflagração de um confronto decisivo com o regime iraniano unifica todas as correntes políticas relevantes em Israel.

O objetivo oficial do ataque ao Irã, destruir o programa nuclear do país, depende das megabombas antibunker dos EUA. Contudo, pode-se atingi-lo por meio do objetivo oficioso: a queda do regime dos aiatolás. A antiga bandeira nacional iraniana, substituída após a revolução de 1979 mas ainda utilizada pelas comunidades iranianas no exílio, exibe o leão persa à frente do sol nascente. Israel batizou sua operação militar como Rising Lion, Leão Nascente.

“Os Três Reis Magros”, um soneto bem humorado de Olegário Mariano

OLEGÁRIO MARIANO (1889-1958) - POESIA DOS BRASIS – PERNAMBUCO -  www.antoniomiranda.com.br

Olegário, retratado por Portinari

Paulo Peres
Poemas & Canções

O diplomata, político e poeta pernambucano Olegário Mariano Carneiro da Cunha (1889-1958), num soneto bem-humorado, afirma conhecer uma mulher que amou “Os Três Reis Magros”, ou seja, três peraltas, cada qual pior, na opinião do poeta.

OS TRÊS REIS MAGROS
Olegário Mariano

Amas a três peraltas. Dividida
tua alma é deles. Cada qual pior.
Andam-se engalfinhando toda a vida…
Gaspar e Baltasar e Melchior.

Este joga foot-ball. É um rei do sport,
difícil de levar-se de vencida.
Aquele tem uma barata Ford.
E o outro é um bate-calçadas da Avenida.

Isso é um nunca acabar! De luta em luta,
de mentira em mentira, esperta e astuta,
vais a vida levando…Mas bem vês:

tornas teus dias cada vez mais agros
e, dando o coração aos três reis magros,
ficas mais magra do que todos os três.

Bolsonarista pede que EUA decidam logo as sanções para punir Moraes

A imagem mostra uma audiência em um comitê, com várias pessoas sentadas em cadeiras. No primeiro plano, há um homem de terno e uma mulher, ambos em uma mesa com garrafas de água. Ao fundo, há uma parede decorada com bandeiras e quadros, e várias pessoas, incluindo homens com turbantes, estão sentadas em fileiras. O ambiente é bem iluminado e possui um teto ornamentado.

Paulo Figueiredo depôs pela segunda vez no Congresso

Deu na Folha

O ex-comentarista da Jovem Pan Paulo Figueiredo pediu nesta terça-feira (24) à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos que recomende sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), em 30 dias.

Figueiredo, que mora nos EUA há dez anos, repetiu o argumento de que Moraes extrapola suas funções e viola os direitos de cidadãos em solo americano, em nova investida contra o magistrado. Ele figurou como testemunha em sessão do colegiado que ouviu outras cinco pessoas de nacionalidades diferentes sobre o que seriam violações transnacionais cometidas por agentes de seus países.

LEI MAGNISTKY – “Os EUA têm ferramentas poderosas, como a Lei Magnistky. Eu urjo para recomendarem sanções a Moraes nos próximos 30 dias”, afirmou o ex-comentarista.

O depoimento foi prestado diante do copresidente da comissão, o democrata James P. McGovern, em uma sessão esvaziada de congressistas. Em determinados momentos, o deputado americano discordou do comunicador sobre uma alegada censura e perseguição a opositores de Moraes.

A oitiva de Figueiredo faz parte de movimento de aliados de Jair Bolsonaro (PL), incluindo Eduardo Bolsonaro (PL-SP), para que a Casa Branca puna o membro do Supremo. O filho do ex-presidente, inclusive, licenciou-se do mandato de deputado federal para morar nos EUA e negociar as sanções.

À ESPERA DE TRUMP – A expectativa dos bolsonaristas é que o presidente Donald Trump chancele punições econômicas ao ministro, o que ainda não foi concretizado.

O ex-comentarista da Jovem Pan chamou Moraes de “ditador disfarçado de juiz” e citou outras pessoas em território americano que foram alvos dele, como o bolsonarista Allan dos Santos, além de Elon Musk, dono do X (ex-Twitter), e Chris Pavlovski, CEO do Rumble.

“Hoje, Moraes me insulta me chamando de fugitivo. Ele alega que tem um mandado secreto contra mim, e eu não fui formalmente condenado, e nem sei se meu nome está na Interpol”, afirmou na comissão.

DISCORDÂNCIAS – James McGovern discordou de Figueiredo quando o comunicador abordou o inquérito das fake news e quando discutiu sobre a perseguição a jornalistas e políticos no Brasil e nos EUA.

Na primeira ocasião, Figueiredo afirmou que a investigação do Supremo é usada pela corte como instrumento de perseguição e repressão a conservadores. Nesse ponto, o copresidente afirmou que eles “concordariam em discordar” sobre a finalidade das apurações, sem se aprofundar na questão.

No segundo momento, McGovern afirmou, após Figueiredo dizer se sentir seguro em terras americanas, se sentir feliz pelo ex-comentarista, mas que ele próprio não se sentia seguro como legislador, citando casos recentes de violência policial. O brasileiro o questionou, então, se há políticos presos nos Estados Unidos, e o democrata respondeu que sim.

SENADOR ALGEMADO – Há duas semanas, o senador democrata Alex Padilla foi empurrado para fora de uma sala, jogado no chão e algemado por agentes de segurança. Ele tentava fazer uma pergunta durante uma entrevista coletiva da secretária de Segurança Interna, Kristi Noem, sobre os protestos na Califórnia.

Figueiredo foi denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) acusado de participar na trama golpista que impediria a posse do presidente Lula (PT). Antes, já investigado, teve seu passaporte cancelado por Moraes.

O ex-comentarista prestou depoimento na comissão pela primeira vez no ano passado. Desta vez, disse que se os EUA não tomarem uma atitude contra Moraes, o Brasil pode virar “uma Venezuela”, se referindo a um governo autoritário, diferente da democracia que prevalece no país.

O avanço unilateral dos EUA e o silêncio da ordem mundial

Trump aproveita o vácuo de autoridade internacional

Pedro do Coutto

A mais recente ofensiva americana contra bases iranianas marca um novo e perigoso capítulo na já conturbada geopolítica do Oriente Médio. Utilizando bombas de penetração capazes de atingir até 90 metros no subsolo, os Estados Unidos demonstram não apenas seu poderio militar, mas sua disposição em liderar uma reconfiguração unilateral da ordem global.

O ataque, realizado sob a justificativa de dissuadir avanços iranianos e em apoio tácito a Israel, provocou resposta imediata de Teerã, que lançou mísseis contra bases americanas no Catar.  A movimentação ocorre em meio a um vácuo de autoridade internacional.

SEM VOZ ATIVA – As Nações Unidas, fragilizadas por anos de ineficácia e politização, assistem sem voz ativa. O embaixador brasileiro Celso Amorim, em recente entrevista, reconheceu esse descompasso institucional, apontando que a ordem mundial vigente está sendo gradualmente superada por ações unilaterais, à revelia de qualquer consenso multilateral. O Conselho de Segurança permanece paralisado, refém dos interesses dos membros permanentes.

Donald Trump, em um movimento político calculado, anunciou que Israel e Irã teriam aceitado um cessar-fogo. A declaração teve impacto imediato nos mercados: o preço do petróleo caiu e os índices de Wall Street subiram. Trump tenta se posicionar como figura central na diplomacia internacional, mesmo que por meio da força. Ao se apresentar como árbitro supremo de um conflito complexo, ele redefine a lógica da mediação: não mais pela construção de pontes, mas pela imposição de limites.

A resposta iraniana, embora ruidosa, foi cuidadosamente calibrada. Teerã optou por uma retaliação simbólica, preservando o equilíbrio entre firmeza e prudência. O regime dos aiatolás sabe que, apesar do discurso inflamado, um confronto direto com os Estados Unidos seria desastroso. A ameaça do Parlamento iraniano de fechar o Estreito de Hormuz – rota por onde passa 20% do petróleo mundial – é reveladora: trata-se de uma carta geopolítica de alto risco, mas cujo simples anúncio já serve como instrumento de pressão internacional.

DISTÂNCIA – Enquanto isso, a China permanece distante. O governo de Pequim, embora preocupado com a estabilidade regional – especialmente por suas relações comerciais com o Irã e o Golfo –, evitou se envolver diretamente. A prioridade da liderança chinesa continua sendo a estabilidade interna e a contenção dos conflitos periféricos.

A Rússia, por sua vez, enfraquecida por uma guerra prolongada e inconclusiva na Ucrânia, não dispõe de recursos militares ou diplomáticos para interferir de forma eficaz no Oriente Médio. O desequilíbrio é evidente: a hegemonia norte-americana avança sem antagonistas à altura.

Essa configuração global aproxima o mundo de uma arquitetura baseada no poder e não no diálogo. A centralização das decisões em torno de Washington reaviva um modelo unipolar que parecia superado após o fim da Guerra Fria. Ao contrário do multilateralismo proposto por diversas nações – inclusive o Brasil –, a atual dinâmica privilegia ações rápidas, pouco transparentes e marcadas por interesses nacionais imediatos. O risco maior reside na normalização do uso da força como ferramenta primária de resolução de conflitos.

COMPROMISSO – O presidente Lula da Silva, ao condenar a ofensiva norte-americana, reafirma o compromisso do Brasil com a paz e o direito internacional. Sua postura dialoga com uma tradição diplomática brasileira que privilegia o respeito à soberania dos povos e a busca por soluções negociadas. No entanto, diante da atual correlação de forças, a influência de vozes moderadas é limitada. A diplomacia precisa ser acompanhada de reformas institucionais, que fortaleçam organismos multilaterais e inibam ações unilaterais de potências armadas.

A população civil, como sempre, paga o preço mais alto. A cada explosão, cresce o número de deslocados, mutilados e mortos. A guerra, com sua estética de poder e domínio, esconde o drama humanitário que se alastra por Gaza, Teerã, Beirute e outras cidades vulneráveis da região. A ideia de que se pode impor a paz por meio da violência continua sendo uma falácia perigosa, que apenas posterga as soluções reais e perpetua o sofrimento coletivo. A consciência internacional deve se reerguer diante desse ciclo de brutalidade.

OPINIÃO PÚBLICA – O papel da opinião pública global, embora fragmentado, ainda pode ser determinante. Organizações civis, movimentos pela paz e setores acadêmicos têm o dever de iluminar os bastidores da geopolítica e exigir responsabilidade dos líderes mundiais. A paz não é um ideal utópico, mas uma necessidade urgente num mundo interconectado e ambientalmente frágil. Cada conflito regional tem potencial para se tornar um incêndio planetário. A contenção deve ser priorizada, e não a revanche.

O que está em jogo é a própria capacidade da humanidade de superar sua lógica de destruição. A ofensiva americana e a reação iraniana são apenas expressões de um sistema internacional desequilibrado, onde a força predomina sobre a razão. Enquanto isso, a guerra segue como ameaça constante, travestida de solução. Resta à diplomacia – ainda que enfraquecida – lembrar que o mundo não precisa de reis ou impérios, mas de líderes que respeitem a dignidade humana e o direito à vida em paz.

Ex-comandante do Exército muda versão e defende Anderson Torres

Ex-comandante Freire Gomes afirma que Bolsonaro discutiu minuta golpista  semelhante à encontrada na casa de

Freire Gomes acusou e agora defende Anderson Torres

Eduardo Barretto
Estadão

O advogado Eumar Novacki, que defende o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, afirmou nesta terça-feira, 24, que Torres não participou de reuniões de teor golpista com o ex-presidente Jair Bolsonaro e ex-comandantes militares. Mais cedo, Torres e o general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército, fizeram uma acareação no Supremo Tribunal Federal (STF).

Nesse procedimento, pessoas que deram versões conflitantes em um processo judicial ficam frente a frente para tentar esclarecer os fatos.

GENERAL MENTIU – “A acareação foi importante para esclarecer fatos que a defesa vinha sustentando: o ex-ministro da Justiça não participou de reunião com o ex-presidente e os ex-comandantes das Forças Armadas para discutir qualquer medida antidemocrática e tampouco assessorou o ex-presidente em medidas dessa natureza”, afirmou Novacki à Coluna do Estadão.

Durante a acareação, Freire Gomes mudou sua versão e disse que Torres “jamais opinou no sentido da quebra do Estado de Direito”, e que o ex-ministro “jamais incentivou qualquer ato fora da legalidade”.

O general afirmou não se lembrar de quais reuniões participou com Torres. Genericamente, citou reuniões ministeriais, ressaltando que podem ter acontecido antes da eleição de 2022.

ACUSAÇÃO FORTE – Anderson Torres é réu na ação penal do golpe. Foi acusado pela Procuradoria-Geral da República como uma espécie de assessor jurídico do golpe. A defesa nega que ele tenha escrito a minuta golpista para anular o resultado da eleição de 2022 e decretar intervenção no Tribunal Superior Eleitoral.

O documento foi apreendido pela Polícia Federal na casa de Torres. O advogado afirma que foi dado um “peso descomunal” a um arquivo “absurdo e apócrifo”, acrescentando que o material já circulava na internet.

O ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro ficou preso preventivamente entre janeiro e maio de 2024, por supostos crimes no 8 de Janeiro. Ele era secretário de Segurança Pública do Distrito Federal no dia do ataque golpista aos três Poderes. Desde maio do ano passado, Torres continua usando tornozeleira eletrônica e cumprindo medidas cautelares, como restrições de horário para sair de casa.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
– Não se pode confiar na memória de Mauro Cid ou de Freire Gomes. Ambos são capazes de dar informações gravíssimas que depois são plenamente desmentidas, algo que não condiz com a missão de membros das Forças Armadas. Tenho vergonha dessa gente. (C.N.)

‘Cid não retrucou ao ser chamado de mentiroso’, diz advogado de Braga Netto

Braga Netto diz que delator Mauro Cid mentiu em depoimentoMateus Coutinho
do UOL

O ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), o tenente-coronel Mauro Cid, não saudou o general Walter Braga Netto na acareação hoje no STF (Supremo Tribunal Federal), apesar de ser seu superior militar. “Cid permaneceu com a cabeça baixa”, descreveu o advogado José Luís de Oliveira Lima.  

O advogado afirmou que Cid ficou cabisbaixo e não retrucou quando foi chamado de mentiroso por Braga Netto. “Uma pena que não tenha sido gravada a cena”, por imposição do relator Alexandre de Moraes.

PONTOS DE VISTA  – A defesa de Cid rebate advogado de general, nega o episódio e diz que em nenhum momento Braga Netto se dirigiu diretamente a Cid nem o chamou de mentiroso. Segundo o advogado de Cid, Braga Netto teria se dirigido a Moraes e afirmado que era mentira a alegação de que ele teria entregado dinheiro a Cid.

Não há registro dessa cena nos autos. A descrição da reunião não registra esse episódio especificamente, apenas aponta que os dois mantiveram versões diferentes sobre os episódios citados na delação premiada.

Na acareação, não foram feitos registros em imagem nem foi permitido o uso de celulares. Somente foi redigida uma ata após o término da sessão, seguindo decisão de Moraes. O encontro foi feito para esclarecer divergências no que falaram sobre a tentativa de golpe de Estado.

MANTIVERAM AS VERSÕES – Ata da acareação não detalha a versão relatada pela defesa de Braga Netto. Documento traz registros dos depoimentos dos dois durante os interrogatórios e aponta apenas que, frente a frente, eles mantiveram as versões apresentadas antes e que as contradições entre os dois relatos w

Assim, a contradições são as mesmas de interrogatórios. O delator e o general apresentaram versões diferentes sobre reunião de miltares na residência de Braga Netto em novembro de 2022 e sobre entrega de dinheiro em espécie para Mauro Cid. Fatos já haviam sido mencionados antes na investigação e durante os interrogatórios dos réus acusados se integrarem o “núcleo crucial” da tentativa de golpe de Estado.

Os dois militares ficaram frente a frente pela primeira vez desde que Braga Netto foi preso. O general foi o primeiro a chegar, por volta das 9h30. Eles se reuniram, por cerca de uma hora e meia, em uma sala de audiências do STF (Supremo Tribunal Federal), em sessão conduzida presencialmente pelo ministro Alexandre de Moraes. O ministro Luiz Fux também esteve presente e fez duas perguntas.

SEM GRAVAÇÃO – A defesa de Braga Netto reclamou de violação do processo por não poder ter gravação. Oliveira Lima disse que vai recorrer no processo e à OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) porque foi negada essa importante prerrogativa de o advogado gravar a acareação da qual seu cliente participa.

Questionado se vai pedir anulação da delação, ele disse que “evidentemente que sim”. Novamente, criticou a delação e disse que Cid não tem provas “de nada”.

“Mente muito”, insistiu Oliveira. Ele disse que Cid mencionou um terceiro local onde teria recebido o dinheiro de Braga Netto. Entre as possibilidades, estariam duas garagens e uma sala no Alvorada. Ele ainda rebate detalhes da entrega, como que, se a caixa estava lacrada, Cid não teria como saber se havia dinheiro lá dentro.

DESMORALIZAÇÃO – Celso Vilardi, advogado de Jair Bolsonaro, considerou “lamentável a sessão não ter sido transmitida”. “O delator fez o que tem feito reiteradamente. Ele mentiu e, no meu modo de ver, foi desmoralizado.”

A defesa de Bolsonaro criticou Cid e elogiou Braga Netto. Sobre Cid, disse que “contradições são o que ele apresenta cotidianamente”.

“Ele não consegue sanar [as contradições]. Quando aperta, ele não lembra”, disse Vilardi. Já sobre as falas do general, ele considerou que “mais uma vez ratificou que, após a reunião do dia 7 [de dezembro de 2022], o presidente Bolsonaro não fez mais nada”. “Ele concordou e desistiu de tudo.”

DELAÇÃO CONTESTADA – A delação de Cid foi decisiva para a denúncia da PGR contra o “núcleo crucial”. Foram acusados Bolsonaro, Braga Netto e outras seis pessoas por tentativa de golpe. As defesas do ex-presidente e do ex-ministro tentam anular o acordo e colocar em xeque a credibilidade dos relatos de Cid.

Advogado do general Mário Fernandes foi barrado ao tentar entrar no STF. Marcus Vinicius Figueiredo ficou cerca de 20 minutos na portaria e depois foi embora. Fernandes, que teria elaborado o “Punhal Verde e Amarelo”, foi denunciado em outro núcleo e, por isso, a participação de seu advogado não estava autorizada na acareação de hoje.

Defesas apontam duas principais divergências nas versões de Cid e Braga Netto. Eles questionam as declarações de Cid sobre a reunião na residência do general para supostamente discutir um plano para monitorar e matar autoridades. O segundo ponto é o suposto repasse de dinheiro para financiar a ação.

DINHEIRO VIVO – Em sua delação, Cid afirmou ter recebido dinheiro vivo de Braga Netto em uma caixa de vinho. Em seguida, o montante teria sido entregue para o major Rafael de Oliveira, um dos envolvidos no “Punhal Verde e Amarelo”, suposto plano para matar o presidente Lula (PT), o vice Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes.

Braga Netto nega. Ele confirma o pedido, mas diz que nunca entregou dinheiro a Cid e que tomou conhecimento do plano “Punhal Verde e Amarelo” pela imprensa.

Moraes também autorizou acareação entre o ex-ministro Anderson Torres e o ex-comandante do Exército Freire Gomes. Os dois falaram após a sessão de Cid e Braga Netto.

ANULAÇÃO IMPROVÁVEL– Como mostrou o UOL, porém, a anulação dos termos de Cid pelo STF é improvável. Histórico da Corte mostra que, mesmo em casos em que delatores mentiram, as provas e relatos apresentados por eles foram mantidos após a PGR (Procuradoria-Geral da República) renegociar os termos do acordo.

O STF nunca anulou um acordo da própria Corte. Essa medida é vista como improvável de acontecer, pois significaria para o tribunal reconhecer que eles cometeram os mesmos equívocos cometidos pela Operação Lava Jato, em Curitiba, que teve várias condenações anuladas justamente pelo STF.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOGFica cada vez mais claro que Moraes age no sentido de preservar Mauro Cid, cuja delação chega a ser patética, pois não apresenta as provas. Assim, pode-se dizer que no Brasil já não há mais militares e juízes como antigamente. A nação está comprometida, sem a menor dúvida. (C.N.)

Governo terá de fazer “gatos” para evitar apagões precoces no gasto público

Como você pode associar a charge abaixo ao Absolutismo antigo sistema?​ -  brainly.com.br

Charge do Junião (Arquivo Google)

Vinicius Torres Freire
Folha

O que vai sair do pacote de medidas “estruturantes” e do catadão de dinheiros para cobrir o buraco das contas do governo em 2025 e 2026? Um troço desestruturado.

O governo declara que não quer conter o aumento de despesa. O Congresso, com cara-de-pau cínica, apenas cobra a contenção do gasto que frequentemente aumenta. Vão sobrar gambiarras a fim de manter a luz acesa em 2025. Para 2026, continua o risco de apagão, antes previsto para 2027.

PODIA SER PIOR – A revolta contra impostos, falta de pagamento de emendas parlamentares e a pré-campanha eleitoral vão depenar os planos do governo de aumentar impostos. Poderia ser pior.

Graças a Donald Trump, diminuiu o risco de a situação macroeconômica degringolar no Brasil, no curto prazo. O dólar ficou mais fraco pelo mundo e por aqui. A economia mundial em marcha mais lenta contém o preço de commodities como o petróleo.

A China, de resto praticamente em deflação, desova mais produtos baratos no mercado internacional. A grande safra no Brasil deve contribuir para a conter a carestia dos alimentos.

INFLAÇÃO – A inflação deste 2025 pode embicar na direção de 5%, muito acima da meta, mas desacelerando mais do que o previsto —poderia ser pior, com contaminação maior da inflação de 2026. As taxas de juros no atacadão do mercado de dinheiro estão mais contidas em seu nível ainda horrível.

Como a biruta do comportamento de Trump varia de acordo com os ventos de seus oportunismos e necessidades circunstanciais de seu projeto tirânico, não conviria contar com essa sorte provisória.

Por aqui, o problema crítico de 2027 nas contas públicas começou a brotar antes do que se esperava. Haddad diz que oposição faz ‘molecagem’, e bate-boca encerra comissão na Câmara.

COM GAMBIARRAS – Sem aumento de imposto, o governo apenas cumprirá as metas relaxadas do arcabouço fiscal por meio de gambiarras piores ou também de um arrocho agônico no que resta do dinheiro que já não está destinado a despesas obrigatórias.

A lambança do IOF não deve render mais do que um terço da receita prevista. O buraco seria compensado por um catatau de dinheiros a cobrar neste ano e por medidas “estruturantes”.

Já o risco de que passe apenas parte até do catado de dinheiros, composto de mais imposto sobre “bets”, sobre fintechs, juros sobre capital próprio e um boato sobre tributação de criptoativos, por exemplo, dinheiros que poderiam ser cobrados neste ano.

ALTERNATIVA VÃ – A medida “estruturante” que sobrou, que taparia o buracão fiscal de 2026, pode cair inteiramente. Trata-se da cobrança de IR sobre o ganho com aplicações financeiras ora isentas, tais como aquelas que financiam o agro, o setor imobiliário e, talvez, infraestrutura. Em si, essa tributação faz sentido. Mas serve agora apenas para cobrir contas no vermelho; quem a ela se opõe, em geral quer apenas manter o privilégio de sua isenção tributária.

No que resta, o governo deve bater na porta de estatais, pegando mais dividendos, aqueles que no início do Lula 3 seriam cortados de modo a haver mais investimento de “empresas estratégicas”.

PETRÓLEO – O governo deve tentar aumentar a arrecadação com o setor de petróleo, que por prevenção já reclama de quebra de contratos. A ideia seria antecipar receitas, um tipo de gambiarra histórica em desarranjos fiscais.

Mesmo assim, talvez falte ainda algum, sendo então necessário contingenciamento (contenção) extra de despesa.

Em resumo, o governo terá de fazer “gatos” fiscais a fim de evitar apagões na máquina pública e no investimento.