Lula, o IOF e o risco de insistir no erro: entre o recuo e o desgaste inevitávelsvl

Charge do Benett (Arquivo do Google)

Pedro do Coutto

Por um triz, o governo Lula se vê novamente diante de uma encruzilhada política delicada — e, mais uma vez, corre o risco de errar o caminho. Após a decisão do Congresso Nacional de derrubar o decreto presidencial que modificava as regras de cobrança do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), o Palácio do Planalto ainda avalia se leva a disputa ao Supremo Tribunal Federal.

A hesitação em si já diz muito: revela um governo que, além de acuado, ainda busca coesão interna para decidir sobre um impasse que não deveria existir. Segundo reportagem precisa de Rafaela Gama, em O Globo, há um dado alarmante: nem mesmo o governo parece estar convencido da solidez do argumento que pretende levar ao STF.

DESCONFORTO – O próprio decreto, antes da derrota legislativa, já havia provocado desconforto na base aliada, e foi derrubado com uma margem expressiva — 383 votos a favor da anulação contra apenas 98 pela manutenção. Uma derrota acachapante, politicamente ruidosa, e que deveria, por si só, provocar uma reavaliação estratégica.

O presidente Lula da Silva tem nas mãos uma decisão que transcende o campo jurídico. Mais do que uma disputa constitucional sobre a validade de um decreto, o recurso ao STF é um gesto político — e, se insistido, poderá soar como tentativa de contornar a vontade soberana do Parlamento. A insistência nesse caminho, além de juridicamente frágil, é politicamente desaconselhável. Um eventual revés na Corte Suprema não apenas reafirmaria a derrota como ampliaria a percepção de fraqueza e isolamento do Executivo.

O Supremo dificilmente encontrará espaço jurídico para sustentar a tese da Advocacia-Geral da União. Ainda que se reconheça ao Executivo o poder de regulamentar certos tributos, a amplitude e os efeitos do decreto sobre o IOF tornaram inevitável sua leitura como uma manobra arrecadatória disfarçada de ajuste técnico.

RISCO –  O Congresso reagiu, com contundência, e anulou o texto presidencial. Recorrer agora ao STF seria transferir uma crise política para o Judiciário — um gesto arriscado, com potencial explosivo para a estabilidade entre os Poderes. A hesitação do governo, por sua vez, revela um dilema que se repete com frequência no terceiro mandato de Lula: agir com base na convicção política ou recuar diante da realidade institucional.

A demora em decidir já alimenta críticas sobre falta de comando e coordenação interna. Não se trata apenas de perder uma queda de braço com o Congresso; trata-se de reconhecer os limites da governabilidade em um cenário de equilíbrio instável entre Executivo e Legislativo.

A popularidade do presidente, que já enfrenta sinais de erosão, pode sofrer mais um baque caso o governo insista em um caminho que leve a uma nova derrota. O eleitorado, especialmente o mais pragmático, exige soluções e firmeza — não flutuações estratégicas que resvalam para o improviso. O desgaste de imagem pode se agravar se a narrativa pública passar a ser de um presidente que não apenas erra, mas insiste no erro.

DIÁLOGO –  Neste momento, o mais prudente talvez seja aceitar a derrota legislativa como um fato consumado e seguir adiante, apresentando ao Congresso um novo projeto de lei que contemple os mesmos objetivos, mas dentro dos ritos institucionais esperados. Um texto construído com diálogo, em vez de decreto imposto de cima para baixo, teria mais chances de êxito e poderia até reposicionar o governo como aberto à negociação e ao bom senso.

Lula, político experiente, sabe que há derrotas que podem ser pedagógicas — e até regeneradoras. Tentar transformar um impasse em confronto pode render aplausos momentâneos de setores mais ideológicos, mas o preço a médio prazo será alto. O país precisa de maturidade política.

1 thoughts on “Lula, o IOF e o risco de insistir no erro: entre o recuo e o desgaste inevitávelsvl

  1. Para Congresso, governo Lula já acabou

    A chance do governo se recuperar já não funciona mais: os cargos, os ministérios, as emendas. A partir do momento em que um deputado se recusou a ser ministro, partiu-se o cristal.

    Um cargo não é mais algo que faça um político mudar de ideia.

    Fonte: O Globo, Opinião, 02/07/2025 15h17 Por Merval Pereira

    Além “dos cargos, ministérios, emendas”, deixou ainda de citar os Fundos Partidário e Eleitoral, as várias verbas e os diversos penduricalhos.

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