Trump age como Rússia e China ao atacar uma premissa fundamental do liberalismo

How Donald Trump's criminal charges are defining his White House race

Trump não quer nem saber das teorias do liberalismo

Carlos Gustavo Poggio
Estadão

“Mas eles não são capitalistas?” Essa teria sido a reação, em tom de estupefação, de oficiais soviéticos ao saber que o governo Reagan havia decidido proibir a exportação de componentes norte-americanos para um gasoduto que abasteceria a Europa com gás soviético, no início dos anos 1980.

Para os soviéticos, tratava-se de um projeto eminentemente econômico. Esperavam, portanto, que os americanos agissem como capitalistas: vendendo produtos, maximizando lucros, e deixando a ideologia para os políticos. A decisão de Reagan, no entanto, foi deliberadamente política. Seu objetivo era enfraquecer a União Soviética, bloqueando sua diplomacia energética e limitando seu acesso a divisas.

FISSURA IMPORTANTE – Esse episódio revelou uma fissura importante no pensamento liberal. Durante décadas, prevaleceu no Ocidente a ideia de que política e economia deveriam operar em esferas distintas. Os políticos que cuidassem da diplomacia e das guerras. Os empresários que cuidassem dos lucros.

O comércio, idealmente, seguiria suas próprias regras – técnicas, neutras, universais. A realidade, evidentemente, sempre foi mais ambígua, mas via de regra era essa a expectativa que se tinha dos Estados Unidos.

Países como China e Rússia, por exemplo, nunca aderiram de fato à lógica liberal de separar Estado e mercado. Para essas potências, comércio é ferramenta de poder. Pequim já deixou claro diversas vezes que decisões políticas têm consequências econômicas.

REAÇÕES DA CHINA -Em 2010, após o Comitê do Nobel da Noruega conceder o Prêmio da Paz ao dissidente Liu Xiaobo, o governo chinês suspendeu negociações comerciais e bloqueou a importação de salmão norueguês.

Em 2021, quando a Lituânia estreitou laços diplomáticos com Taiwan, a resposta chinesa foi rápida: importações interrompidas, empresas pressionadas, e sanções aplicadas de forma informal. A mensagem era clara: quem desafia a China politicamente, paga economicamente.

A Rússia sempre seguiu lógica semelhante, especialmente no uso da energia como instrumento de coerção. Durante anos, manipulou os preços do gás natural e seus contratos de fornecimento para recompensar aliados e punir países que buscavam aproximação com a União Europeia ou a Otan. O comércio, nesses casos, nunca foi apenas comércio: era política por outros meios.

AGORA, TRUMP – A novidade é que os Estados Unidos passaram a agir de maneira parecida. Donald Trump transformou o uso de tarifas em um instrumento sistemático de pressão externa. Suas medidas deixaram de ter como foco exclusivo déficits comerciais ou práticas desleais e passaram a responder também a divergências políticas e ideológicas.

A ameaça recente de impor tarifas generalizadas ao Brasil, país com o qual os EUA mantêm um superavit comercial, reforça esse padrão. A mensagem é menos sobre regras comerciais e mais sobre alinhamento político. Não se trata mais de defender o mercado interno, mas de redefinir o papel do comércio na política externa norte-americana.

Essa mudança carrega implicações profundas. Ao usar tarifas como forma de coerção política, os EUA se afastam do modelo que ajudaram a criar no pós-guerra, baseado em regras estáveis, instituições multilaterais e confiança mútua.

CAMPO DE DISPUTA – O comércio, que deveria ser terreno de cooperação e previsibilidade, torna-se campo de disputa e intimidação. A lógica liberal, segundo a qual o mercado deve operar com relativa autonomia frente ao poder político, dá lugar a uma visão transacional, na qual tudo é moeda de troca.

A adoção dessa postura pelos Estados Unidos marca um ponto de inflexão. O país que por décadas promoveu a abertura econômica, agora se aproxima das práticas adotadas por potências autoritárias. Resta saber se essa convergência é uma adaptação necessária às novas condições do sistema internacional ou um sintoma de sua fragmentação acelerada.

Seja qual for a resposta, o fato é que estamos testemunhando a erosão de uma das premissas centrais do liberalismo: a de que comércio e política devem obedecer a lógicas diferentes.

4 thoughts on “Trump age como Rússia e China ao atacar uma premissa fundamental do liberalismo

  1. Sanções de Trump ao Brasil miram a presença chinesa no continente

    Os States não têm condições de competir com a China em termos comerciais e de investimento, mas detêm o domínio do continente por meios financeiros, tecnológicos e militares.

    Para Trump, o presidente da Argentina, Javier Milei, e o ex-mito Bolsonaro são peças-chave para tentar mudar o jogo na América do Sul.

    Seu objetivo é impedir a reeleição de Lula e redefinir a posição do Brasil como satélite dos EUA, com valores conservadores e alinhamento automático nas grandes disputas globais.

    Fonte: Correio Braziliense, Governo, 20/07/2025 – 08:48 Luiz Carlos Azedo

    Presta atenção, Brasil!

  2. Edward Little Banana, sob a proteção de Uncle Trump, fez Live:

    Pegou leve demais.

    Disse o que todos já sabem de Xandão.

    Afirmou que seu pai, “o polîtico mais popular do Brasil” (sic) foi feito refém.

  3. A propósito de significação, até quando pagaremos fortunas pra formar doutores e phds no exterior pra produzirem masturbação metafísica travestida de teses e dissertações, que não servem absolutamente pra nada, pra que possamos questionar e enfrentar os nossos entraves e problemas estruturais.
    ?

    A produção em série de artigos científicos de doutores e phds, se imprimidos, nem pra papel higiênico seviriam.

    Há trabalhos destes pilantras defendendo que o impeachment da Dilma fora golpe e outros vagabundos, ainda piores, que dizem que a Lava Jato fora ação dos EUA.

    Gente, estou falando de trabalhos “científicos”.

    É preciso alguém pra cortar verba da linha de produção de gênios imbecilizados inúteis, ideólogos do culto de peesonalidade do farsante Lula.

    Trata-se sa construção do projeto “arrasa quarteirão” da imprestável e decadente moral, civilizacional e temporal Organização Petista.

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