Dino, o agente provocador, pode causar radicalização da Magnitsky à brasileira

Prometeu o céu, entregou o inferno: os dados que desmentem a promessa de Flávio  Dino - Crítica Cotidiana

Charge sem assinatura (Arquivo Gppgle)

Carlos Andreazza
Estadão

Um dos grandes problemas do Brasil é o excesso de valentes – de candidatos a heróis. De corajosos que não pisam nas ruas e não experimentam a materialidade-decorrência de suas bravuras. Os tomadores de riscos com o pescoço alheio – temos deles aos montes e com muito poder. Nós os bancamos.

Nada aprendemos com a história, inclusive a recente, a da Lava Jato, ou talvez admitamos utilitariamente que corrupções nos processos – que arreganhos autoritários – sejam usados contra os nossos adversários, por motivo nobre; sendo sempre bom lembrar que os precedentes ficam.

NOBREZA DEMAIS – Os motivos serão sempre nobres. O gênio xandônico não voltará à lâmpada, mesmo quando já não houver Xandão. Não nos faltam salvadores da pátria, os que pretendem nos proteger de nós mesmos, autorizados, sempre em nome de causa virtuosa, a enfrentar situações excepcionais com atos de exceção.

Entre esses barrosos, destaca-se Flávio Dino, senador togado, o ministro da Corte Constitucional com maior vocação para concorrer com Alexandre de Moraes à condição de mestre-criador do Direito, ao posto de instrumentalizador-geral da lei.

Veja-se o caso da reação do Supremo – a reação irresponsável de Dino é do Supremo – à Lei Magnitsky. Há uma ADPF específica a respeito, sob relatoria de Cristiano Zanin. Foi ignorada-atropelada. Impossível crer que sem combinação-articulação entre ministros. Tem método.

ESCOLA DE SAMBA – Ainda que, em momentos de pressão, o STF vire uma escola de samba, com seus integrantes plantando anonimamente na imprensa que alas do tribunal estariam incomodadas com decisões de fulano ou sicrano, Dino – jamais sozinho – escolheu manipular a natureza de uma ação sobre a tragédia de Mariana para mandar recados políticos e, na prática, produzir insegurança jurídica e amedrontar certamente não o governo americano.

De novo: não sem aval dos donos da corte, Dino disparou recados ao sistema financeiro nacional, produziu insegurança jurídica interna e amedrontou – acirrando a nossa já intensa imprevisibilidade – os brasileiros. Parabéns.

Para o objetivo de brecar os efeitos da Magnitsky no Brasil, a decisão do ministro é inócua. Eficaz somente para lançar as instituições financeiras brasileiras numa encruzilhada que, afinal, tende a evidenciar a fraqueza do STF, limitação também sobre a compreensão do tamanho do problema. Porque a questão crucial permanece: sobre se haveria alternativa a um banco, se se quiser inserido no sistema financeiro global, senão se submeter às consequências da Magnitsky no Brasil.

DÚVIDA FATAL – Esse é o impasse, enfraquecedor do Supremo, que o despacho de Dino arma – e que se pode resumir na forma de pergunta: tendo de escolher, uma instituição brasileira preferirá violar a soberania nacional, contrariar o STF e se defender no Brasil, talvez mesmo contratando banca que conte com parentes de ministros do tribunal, ou enfrentar as sanções econômicas baixadas nos (e a partir dos) EUA? Como responderia a essa inquirição um banco com linhas de crédito sob financiamento internacional?

Essa indagação serve para empresas brasileiras no geral, cujos sistemas – os provedores de infraestrutura, por exemplo – são americanos. Contratos que seriam encerrados – nos EUA – sob ordens da OFAC, a agência do Departamento do Tesouro americano que cuida de sanções econômicas e comerciais.

Sobre isso, também e bizarramente no Supremo, parece haver desconhecimento; sendo assustador que decisões voluntariosas sejam tomadas sob ignorância.

CONTRA OS BANQUEIROS – A decisão de Dino esclarece o óbvio, pela honra (uhu!) da soberania nacional: que determinação judicial de tribunal de outro país não vigorará no Brasil sem homologação do STF. Lindo. Lindo e em nada responsivo à Lei Magnitsky, que se desenvolve em outro registro e não sobre território brasileiro. Decisão, portanto, que serviu somente para emparedar – em resumo – os banqueiros. Banqueiros dos bancos em que todos nós, os ferrados, temos contas. Nossos dinheiros estão lá. Parabéns.

Nota pétrea; e não exclusivamente destinada a um ex-governador do Maranhão, Estado que deixou na mesma miséria que encontrara: soberania de brasileiro – no mundo real, aquele em que não vivem os ministros do STF – é comida em casa, segurança na rua e condições para trabalhar. No caso de um empresário, previsibilidade para manter funcional o seu negócio.

Esclareça-se: toda empresa que assina contrato com prestadores de serviços americanos – como os de soluções para tecnologia – contrata também o compromisso de obedecer aos efeitos das sanções, sanções aplicadas nos EUA, sob o risco de sanção contra si a partir dos EUA. A Lei Magnitsky pune – nos EUA – com multas bilionárias, para estrangular mesmo, empresas ou instituições financeiras estrangeiras que tenham negócios nos EUA e se relacionem formalmente com sancionados.

AGENTE PROVOCADOR – Donde, repita-se, o caráter inócuo da decisão de Flávio Dino, posto que a Magnitsky não toma providências diretamente no Brasil, mas com consequências no Brasil, se quiserem as empresas brasileiras continuar existindo nos EUA – estando os EUA, economicamente, em todo lugar.

A decisão de Dino tem por eficiência – aí, sim – provocar. Esse é o potencial; e não é bom. Da mesma maneira que ele presta esclarecimentos sobre a defesa da soberania nacional brasileira, seus despachos podem motivar esclarecimentos também de parte do governo americano. Não seria bacana. Porque, hoje, os efeitos da Magnitsky contra Moraes – assim tocam os bancos brasileiros – são meia-boca, sobretudo intimidatórios, e estão limitados a bloquear operações em dólar e o uso de cartões com bandeiras americanas, liberados os trânsitos em real. Sobrevive-se.

Seria o caso de torcer para que o arranjo continuasse acomodado desse jeito, com Trump fingindo não ver Dino e satisfeito em apenas estacionar o uso pervertido da lei, como ameaça, sobre o Brasil – uma espécie de Magnitsky à brasileira. Mas Dino quer a Magnitsky à americana. Mui amigo.

11 thoughts on “Dino, o agente provocador, pode causar radicalização da Magnitsky à brasileira

  1. Os milhões e milhões do clã

    De onde vem tanto dinheiro. Ex-mito movimentou mais de R$ 44 milhões em 2 anos, aponta PF.

    De acordo com relatório da PF, R$ 30 milhões do montante foram movimentados em apenas um ano.

    O Coaf identificou as transações como “suspeitas de configurarem indícios de lavagem de dinheiro e outros ilícitos penais” entre março de 2023 e junho de 2025.

    Fonte: Metrópoles, Opinião, 22/08/2025 12:08 Por Marco Miguel / Ricardo Noblat

  2. Globo descobre que “bolsonaros só agem em benefício próprio ($)”

    Anistia pessoal: Ex-mito só pensa em si mesmo e está se lixando até para aliados

    O Globo, Editorial, 21/08/2025 18h01

    Que novidade!

  3. Em 2025, Bolsonaro sacou, por dia, mais de dois salários-mínimos em espécie

    Chama atenção a grande movimentação de dinheiro da família do ex-mito, conforme relatório da PF.

    Entre janeiro e julho, foram realizados 40 saques em caixas eletrônicos e guichês, totalizando R$ 130.800,00 — o equivalente a R$ 3.270,00 por dia em sete meses, mais de dois salários-mínimos.

    Já o Coaf informa que, entre março de 2023 e fevereiro de 2024, foram 97 saques, que somaram R$ 198.100,00.

    Fonte: O Globo, Rio, 23/08/2025 05h00 Por Nelson Lima Neto / Ancelmo Gois

  4. Mais um lambe b …. Dino só decici com base nas nossas leis. Estará errado? Ora, devemos perder a dignidade, então? Ainda bem que temos Ministros que têm coragem de seguir as nossas leis. Se dependessemos desses puxa sacos, como esse articulista, voltaríamos a ser colônia..

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