
Helio Fernandes trabalhou até morrer, aos 100 anos
Carlos Newton
Helio Fernandes, o maior jornalista brasileiro, teria completado nesta sexta-feira 124 anos. Vamos transcrever este artigo de Sebastião Nery, escrito em 1977 e inserido no seu livro “Ninguém me contou; Eu Vi – De Getúlio a Dilma”.
O artigo trata de um personagem da história da imprensa brasileira que se notabilizou pela combatividade e, também, pelo idealismo, em tempos difíceis nos quais o idealismo predominava acima de interesses pessoais.
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O GUERRILHEIRO DA NOTÍCIA
Sebastião Nery
No fim de 1968, já cansado do anonimato profissional na editoria política da TV Globo, entrei de manhã no escritório de José Aparecido, no edifício Avenida Central, encontrei Hélio Fernandes conversando sobre as amarguras de um jornal de opinião em um regime de exceção.
– Você, por exemplo, Nery, por que não escreve na “Tribuna da Imprensa?”
– Sou nordestino de Jaguaquara. Lá na minha terra a gente só entra na casa dos outros se for convidado. Não escrevo porque você nunca me convidou.
– Pois está convidado. Quando quer começar?
– Hoje. Quanto você me paga?
– Nada. A “Tribuna” não tem dinheiro para um profissional como você. Mas tem toda a liberdade que você quiser usar.
À noite, estava eu na redação da “Tribuna da Imprensa”, na rua do Lavradio, no Rio, entregando minha primeira coluna. Escrevi durante dez anos, todos os dias. Nunca Hélio Fernandes viu a coluna antes, nunca me pediu para mudar nada. Às vezes discordava depois, discutíamos, eu tocava em frente. Com a liberdade que era o meu salário.
Para usar um adjetivo muito dele, um diretor do jornal exemplar. Não fora a censura, eu estaria lá até hoje, dando meu recado político. Como lá estariam Paulo Francis, Oliveira Bastos, Monserrat, Evaldo Diniz, Genival Rabelo, tantos outros. Mas voltaremos.
O engenheiro Joaquim Cardozo, o poeta genial do cálculo e do verso, é quem melhor localizou, em um poema seco, o campo de trabalho do jornalismo: “As coisas estão se reunindo por detrás da realidade. O jornalista é o homem que assiste à reunião das coisas por detrás da realidade. Vai lá e as flagra no seu quente instante. E conta, quer gostemos delas ou não”.
O passado, sendo presente, pois intocável boa memória!
Com Carlos Newton, a Tribuna continua com toda a liberdade que queiramos usar!
Se eu não me engano, a Tribuna da Internet começou um pouco antes da morte de Hélio Fernandes.