Todo mundo que morre em serviço ou por causa dele estaria usando botas

Maria Lenk morreu na piscina, dando uma aula de natação

Ruy Castro
Folha

Outro dia, passei para mim em DVD o clássico “O Intrépido General Custer” (1941), de Raoul Walsh, com Errol Flynn. Conta a história do massacre de um regimento da cavalaria americana pelos sioux e cheyennes em 1876 —o único filme em que os índios ganham no fim. O título original, “They Died With Their Boots On”, se refere ao fato de que os soldados morreram de botas, ou seja, em missão.

Mas não é preciso ser soldado americano para morrer de botas. Todo mundo que morre em serviço ou por causa dele morre, metaforicamente, de botas.

MUITOS EXEMPLOS – O fabuloso artista gráfico J. Carlos, o maior capista da imprensa, enfartou na prancheta, desenhando, com a pena na mão, em 1950. Outro grande capista brasileiro, só que de livros, Enrico Bianco, em 2013, sentiu que ia morrer e pediu que lhe dessem uma pena para segurar. Deram e ele expirou.

A nadadora Maria Lenk, glória do esporte nacional, morreu na piscina, dando uma aula, em 2007. Portinari morreu envenenado pelo chumbo contido em suas tintas, em 1962. E Gilberto Cardoso, presidente multicampeão do Flamengo, morreu de enfarte provocado por uma cesta rubro-negra, a três segundos do fim de um jogo de basquete no Maracanãzinho, em 1955.

MAIS, AINDA – O cientista Alvaro Alvim, pioneiro da radiologia, morreu horrivelmente de exposição à radioatividade, em 1928. Houdini, o homem das mil façanhas, morreu de apêndice rompido pelos socos no abdômen que aceitou receber de um desafiante, em 1926.

Há quem acredite que o padre Bartolomeu de Gusmão, o “Padre Voador”, tenha morrido ao saltar de um penhasco com um par de asas grudado com cera ao seu corpo. Ao se aproximar do sol, a cera teria derretido e ele caiu lá de cima. Mas quem morreu assim foi Ícaro, herói da lenda grega. Gusmão era um inventor de balões, mas morreu prosaicamente em terra firme, em 1724.

E Jesus Cristo —com todo respeito— também morreu durante o trabalho.

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