Assim como a Venezuela se isola no mundo, o PT se isola no Brasil

Análise: Isolamento internacional da Venezuela fortalece Nicolás Maduro |  CNN Brasil

Isolamento internacional fortaleceria Maduro na Venezuela

Eliane Cantanhêde
Estadão

O presidente Lula virou “agente da CIA”? O assessor internacional Celso Amorim é “mensageiro do imperialismo norte-americano”? Essas acusações, feitas pela ditadura de Nicolás Maduro, demonstram o grau de ridículo e até de loucura do próprio Maduro, que perdeu as eleições, se autodeclarou vitorioso e continua destruindo a Venezuela, corrompendo as instituições e provocando o maior êxodo de venezuelanos da história.

Amorim combina duas posições amplamente conhecidas desde os dois primeiros mandatos de Lula, quando foi chanceler e atuou incisivamente a favor dos Brics, como resistência ao chamado “mundo unipolar”, ou seja, à hegemonia dos Estados Unidos. É (ou era?) não apenas o principal aliado brasileiro da Venezuela, desde Hugo Chávez, como também o maior crítico aos EUA. Mensageiro do imperialismo norte-americano? É patético.

DEMOCRACIA RELATIVA – A Venezuela deixou de ser uma questão internacional para ser também um problema de política interna para Lula, que foi imprudente e causou um horror generalizado ao receber Maduro com honras de Estado horror – exceto no PT, que insiste no erro de defender Maduro, o regime e a legalidade da eleição. Como cereja podre num bolo azedo, Lula ainda justificou que “democracia é relativa”.

Maduro, além de tudo, é ingrato, muito ingrato. Depois de todo o desgaste de Lula pelo apoio a ele, Maduro cospe todo dia no prato que comeu.

Ironiza Lula, ataca Amorim, chama o embaixador venezuelano no Brasil “para consultas” e, nesta quinta-feira, seu governo publicou um cartaz infame, com a imagem distorcida de Lula, a bandeira brasileira ao fundo e um grito de guerra: “Quem mexe com a Venezuela se dá mal”.

E AGORA, PT? – A ideologia, muitas vezes, cega a direita e a esquerda, e o partido do presidente enxerga o óbvio: o governo da Venezuela não é de esquerda, é depravado, insolente, corrupto, deteriorado… Ser a favor de Maduro é ser contra a sociedade venezuelana e tão ridículo e perigoso quando a Venezuela chamar Lula de agente da CIA e Amorim de mensageiro do imperialismo.

Jair Bolsonaro errou na outra ponta, ao romper com Caracas no seu mandato e prejudicar os setores privados e os brasileiros com interesses no País, mas está mais fácil justificar o rompimento do que qualquer proximidade com Maduro e Venezuela.

O PT está em pé de guerra pelo péssimo resultado nas eleições municipais, a perda de rumo e de relevância e a falta de perspectiva para o futuro, mas falta o principal: fazer mea culpa por sucessivos erros, como mensalão, petrolão, gestão Dilma Rousseff e a ideologização da política externa… Assim como Maduro se isola no mundo, o PT se isola no Brasil.

É preciso reavaliar o voto obrigatório, que é um velho e carcomido senhor

O voto em branco - Espaço Vital

Charge do Duke (O Tempo)

Dora Kramer
Folha

A abstenção de quase 30% no país nas eleições municipais assustou muita gente e despertou no Tribunal Superior Eleitoral a necessidade de se fazer um estudo profundo para saber as razões dessa acentuada ausência do eleitor.

Se somadas as quantidades de sufrágios em branco e nulos, a conta beira os 40% e, em números absolutos, mostra que vários candidatos perderam para o não voto.

NA PAUTA – Pela relevância dos dados e das motivações implícitas, a recusa à participação ativa foi um dos assuntos mais comentados nos balanços dos chamados recados das urnas.

Rivalizou com o sucesso da centro-direita, o mau desempenho da esquerda, a força das emendas parlamentares na reeleição e a constatação de que Luiz Inácio da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) não mandam na vontade das pessoas, mais interessadas na administração das respectivas cidades do que na briga dos chefes das torcidas da política nacional.

A encomenda do TSE para se estudar a abstenção nos detalhes sem dúvida é muito útil, pois uma vez concluído o trabalho vai se poder abordar o assunto com precisão, sem chutes nem ilações que possam distorcer as conclusões.

VOTO DESPREZADO – Não é necessário, porém, ir às profundezas sociológicas das raízes do Brasil para se chegar a alguns dos porquês de parcela crescente do eleitorado fazer do voto obrigatório — regido por regras de 1965, na ditadura — quase uma letra morta, quando em outro tempo já foi preferência nacional.

A cada nova pesquisa sobre o tema, porém, o facultativo ganha terreno e já representa a maioria. Segundo levantamento do Datafolha de 2020, 56% são contrários à obrigatoriedade.

Outra consulta feita em agosto de 2024, na capital paulista, registrou índice de 52%. Agora em outubro 34% dos paulistanos disseram ao mesmo instituto que não teriam votado se não fossem obrigados. A abstenção segue o ritmo de crescimento; foi de 16,2% em 2000, quase metade do índice atual.

DECISÃO PESSOAL – O que está havendo? Antes de falar sobre o descrédito na política e o comportamento dos partidos, vamos a outras hipóteses menos dramáticas para explicar: o aumento da população maior de 70 anos de idade, que não é obrigada a votar e a cada vez maior facilidade para se justificar ausência.

Sobre esse segundo ponto, um parêntese: por que tenho de dizer ao Estado onde estou no dia da votação ou lhe dar satisfação sobre uma decisão privada de não exercer um direito?

E aqui chegamos aos partidos e aos políticos que muitas vezes tampouco se obrigam a dar satisfações aos cidadãos.

TOTAL INDIFERENÇA – Partidos e políticos assumem atitudes — notadamente nos períodos de entressafra eleitoral — de total indiferença ao que lhes diz a sociedade.

Acontece, por exemplo, quando aprovam fundo eleitoral de R$ 5 bilhões, anistiam as próprias dívidas e se articulam para afrouxar a Lei da Ficha Limpa aprovada na pressão por um projeto de iniciativa popular. Isso para citar casos mais recentes.

Ao longo da história (só da redemocratização) há uma coleção dessas iniciativas dos políticos.

ILHAS DA FANTASIA – Cada vez mais livres de cobranças, desobrigados de prestar contas sobre a folha corrida dos candidatos escolhidos para concorrer, montados numa dinheirama pública cujos eventuais ilícitos são objeto de anistia autoconcedida, as agremiações partidárias viraram ilhas voltadas para seus interesses.

Caso precisassem atuar como entidades de direito privado que são, indo à luta para amealhar recursos e empenhar esforços para conquistar o eleitorado, não tivessem a reserva de mercado do voto obrigatório provavelmente outros galos cantariam na política nacional.

O Brasil está na vanguarda no sistema eletrônico de votação e apuração. Não faz sentido nem combina com tais avanços que se mantenha na retaguarda na relação do Estado com o cidadão que, se estimulado, poderia se transformar num eleitor mais bem disposto a ir às urnas. Ou se ausentar sem precisar se justificar.

Trump e Kamala demonstram por que jamais se deve “confiar” na imprensa

A GRANDE IMPRENSA PERDEU A LIBERDADE PARA O PATROCÍNIO – Portal Ambiente  Legal

Ilustração reproduzida do Arquivo Goggle

Mario Sabino
Metrópoles

Acompanhar as eleições pelos jornais americanos e pela TV americana é garantia de espanto, porque a imprensa dos Estados Unidos não cobre as campanhas de Donald Trump e Kamala Harris, mas participa delas como cabo eleitoral.

A imprensa democrata finge imparcialidade no noticiário ao dar força a Kamala e torpedear Trump; a imprensa republicana não tem essa preocupação ao dar força a Trump e torpedear Kamala. Ponto para a imprensa republicana.

SEPARAÇÃO – Os jornais americanos tentavam separar notícia e opinião. O endosso a uma candidatura presidencial ficava reservado a um editorial no qual os editores explicavam a sua preferência.

Hoje, essa tentativa de separação não existe mais ou é apenas canhestra. Há o editorial de endosso, mas o dia-a-dia da reportagem está inteiramente contaminado pela opinião.

Jeff Bezos, dono do Washington Post, resolveu abolir o endosso do jornal a pretendentes à Casa Branca. Em artigo publicado no próprio Washington Post, ele justificou a sua decisão, dizendo que “os apoios a candidatos presidenciais não contribuem em nada para inclinar a balança de uma eleição. Nenhum eleitor indeciso na Pensilvânia dirá: ‘Vou com o endosso do jornal A’. Nenhum. O que os endossos presidenciais realmente fazem é criar uma percepção de preconceito. Uma percepção de não independência”.

DEU ERRADO – A percepção dos leitores do Washington Post foi outra: a de que Jeff Bezos tem simpatia por Trump e, por isso, eliminou o endosso que seria dado a Kamala pelo jornal de tradição democrata. Anunciada a decisão, o Washington Post perdeu mais de 200 mil assinantes, enquanto a redação se vinga escalando nas pautas contra Trump e a favor de Kamala.

Na minha opinião, Bezos errou mais do que comercialmente no curto prazo. Os endossos são atos de transparência que deveriam fortalecer a credibilidade dos jornais, não fossem os verdadeiros problemas que os afetam. Outras publicações também resolveram, às vésperas da eleição, cancelar o endosso, como Los Angeles Times e o USA Today.

Mas o Washington Post é o Washington Post, e Jeff Bezos é Jeff Bezos, o dono da Amazon e de uma empresa espacial, a Blue Origin, que tem contratos com o governo.

FUNDO DO POÇO – O remédio do dono do Washington Post foi errado e suspeito, mas o seu diagnóstico inicial está correto: hoje, para os americanos, a imprensa merece menos confiança e reputação do que os políticos de Washington. Realmente, é o fundo do poço, como ele afirmou.

“A maioria das pessoas acredita que a mídia é tendenciosa. Qualquer um que não veja isso está prestando pouca atenção à realidade, e aqueles que lutam contra a realidade perdem. A realidade é uma campeã invicta”, escreveu Bezos.

O diagnóstico vale para a imprensa da maioria dos países, arrisco dizer. No Brasil, sem dúvida.

DIZ MAINARDI – O jornalista Diogo Mainardi, meu amigo e ex-sócio, foi direto ao ponto: “O pepino não é o editorial favorável ou contrário a uma determinada candidatura e sim a promiscuidade entre patrão e empregado, entre notícia e propaganda, entre repórter e fonte, entre jornalista e governo, entre reportagem e entretenimento, entre matéria e press-release, entre veículo e rede social, entre manchete e algoritmo”.

Há outro pepino: os leitores. A falta de credibilidade não é apenas responsabilidade da imprensa, e isso não significa isentá-la dos seus péssimos modos. O advento das redes sociais transformou todo mundo em arauto da verdade, e os fatos passaram a ser críveis somente se vão ao encontro da verdade de cada um.

Em resumo, o emissor da notícia é de baixa qualidade e o seu receptor não é muito melhor. Um jornal que publicasse somente notícias despidas de qualquer contexto que pudesse gerar questionamentos também seria visto como ideológico — e, portanto, pouco crível — pelo simples fato de estampar notícias que não são do agrado do leitor, mesmo que nuas e cruas.

PARCIALIDADE – Nunca houve imparcialidade no jornalismo. As manchetes e a hierarquização do noticiário já são, por si só, demonstração de escolhas. Mas, pelo menos, havia o esforço de buscar ser imparcial nas reportagens.

A conflagração política e as redes sociais derrubaram de vez o mito da imparcialidade da imprensa, ao mesmo tempo que a exigem desde que atenda às parcialidades individuais, partidárias e tribais que as movimentam. Ou seja, imparcialidade nenhuma. Nunca houve ser humano imparcial.

O corolário dessa situação é que as notícias verdadeiras deturpadas ou enviesadas ao gosto do freguês nas redes sociais, para não falar das puras fake news, atendem a uma demanda que extrapola a capacidade da imprensa de produzi-las.

SEM SOLUÇÃO – Não tenho solução, e solução não existe, ao contrário do que acreditam os censores, mas termino com uma historinha: há quase vinte anos, em reunião com o então dono da Veja, Roberto Civita, informei a pauta da semana da editoria de política.

“Puxa, só tem notícia ruim”, disse ele. “Para contrabalançar, que tal escrever uma carta ao leitor dizendo que, apesar de tudo, há políticos honestos?”.

“Escreva você, eu só escrevo sobre coisas que existem”, respondi, na minha mania pouco lucrativa de contrariar patrão.

MAIOR MENTIRA – Roberto Civita riu: “Você tem razão, o meu pai contava a piada da competição entre Giovanni, Piero e Marco para ver quem contava a maior mentira, conhece?”

“Não.”

“Eles resolveram competir, e Giovanni começou: ‘Era uma vez um político honesto…’. Piero e Marco o interromperam: “Pode parar, porque você já ganhou!”

Jornalistas e consumidores de notícias por qualquer meio deveriam levar a sério os três italianos da piada. Seja nos Estados Unidos, no Brasil, no raio que os parta.

2025 será um ano de desafios para o governo Lula

Lula terá que contonar o aumento do valor do dólar e seus reflexos

Pedro do Coutto

O governo Lula terá que enfrentar em 2025 um aumento de preços na alimentação, consequência da elevação da taxa do dólar que influi diretamente no abastecimento de gêneros, pois o preços dos transportes vão se elevar. Será um problema a mais junto à opinião pública que sofre os reflexos da oscilação para cima da moeda americana.

Mais um desafio para o presidente da República e que se adiciona ao processo ao aumento de preços. Difícil conter essa investida que, além da incidência inflacionária, sofre também os efeitos da especulação que parece não ter fim e por trás da qual estão os agentes de sempre. Um problema que se junta aos demais que existem na política.

ANISTIA – Neste cenário aparecem sempre as eternas dificuldades, umas das quais agora é a perspectiva da anistia aos invasores e depredadores do Supremo Tribunal Federal, da sede do Legislativo e do Palácio do Governo, marcas criminosas do 8 de janeiro. O processo tem embutida a recuperação dos direitos políticos do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A questão remete a um debate eleitoral à vista em 2025. É preciso considerar sob esse aspecto, o fato de o PT somente contar com o presidente Lula, não possuindo nenhum outro nome em condições de poder enfrentar uma eleição presidencial com boas perspectivas nas urnas. Com o tempo, aparecerá, como é natural na política.

Mas o fato é que as eleições serão em dois anos, tempo curto pela frente e que levará a legenda a se preparar com rapidez tanto para habilitar o próprio Lula quanto para ter em seus quadros alguém capaz de substituí-lo no embate que dará sequência à presença do partido, no caso o PT, na luta eleitoral que vai se renovar sempre. Essa renovação é fundamental. A idade tem o seu peso.

Em 2020, o “Mauro Cid” de Trump  também tinha um “minuta do golpe”

Read the memo from Trump aide's office making the case to fire Defense  Secretary Mark Esper - ABC News

John McEntee era uma espécie de “Mauro Cid” de Donald Trump

Bruno Boghossian
Folha

John McEntee chegou à Casa Branca em 2017 como o sujeito que carregava a pasta de Donald Trump. Tinha a confiança do presidente e uma mesa na antessala do Salão Oval. Era uma versão civil e turbinada de Mauro Cid, o notório ajudante de Jair Bolsonaro. Guardava segredos e seguia as ordens do chefe.

O auxiliar foi ganhando influência. Segundo a revista The Atlantic, McEntee fazia reuniões com advogados que trabalhavam para melar as eleições de 2020, coisa que alguns assessores se recusavam a fazer.

Às vésperas da invasão do Capitólio, ele enviou ao gabinete do vice-presidente um documento que o incentivava a declarar a vitória de Trump — um tipo de minuta do golpe.

PLANOS DE TRUMP – McEntee conhece um aspecto central dos planos de Trump para um segundo mandato em caso de vitória na terça-feira (5). Na reta final do primeiro governo, o assessor era o responsável por vigiar funcionários e expulsar dissidentes.

Agora, ele integra o Projeto 2025, grupo que criou um pacote radical com a previsão de um expurgo na administração pública, para reduzir os limites aos poderes do presidente.

A plataforma de Trump tem como pressupostos uma guinada autoritária, a desfiguração de leis, a construção de um círculo de lealdade absoluta e a asfixia de agentes capazes de resistir a suas ideias. São todas ferramentas essenciais para planos de deportação em massa, perseguição de adversários e, eventualmente, o prolongamento de sua permanência no poder.

MAIS OBSTÁCULOS – Em seu primeiro mandato, Trump enfrentou mais obstáculos internos do que gostaria. O secretário de Defesa recusou um pedido para atirar contra manifestantes, o secretário de Justiça abandonou a conspiração para reverter a derrota do republicano em 2020, e o vice-presidente ignorou pressões para roubar aquela eleição. Trump  agora  trabalha para evitar que isso se repita.

O ex-presidente não esconde seus desejos. Fala abertamente em eliminar o que chama de “Estado profundo”, promete distorcer leis antigas para perseguir imigrantes e sugere usar a força do governo para punir seus rivais. Se vencer, provavelmente dirá que obteve o aval das urnas para governar como um autocrata.

O dilema do poeta Antonio Cícero, em busca da profundidade de sua alma

Minha vida se tornou insuportável', escreveu Antonio Cicero antes de  suicídio assistido; leia carta completa | Cultura | cbn

Cicero era membro da Academia de Letras

O filósofo, escritor, compositor e poeta carioca Antonio Cícero Correa de Lima (1945-2024) reconhece, em poucos versos, ter um dilema existencial que o confundia bastante.

DILEMA
Antonio Cícero

O que muito me confunde
é que no fundo de mim estou eu
e no fundo de mim estou eu.
No fundo
sei que não sou sem fim
e sou feito de um mundo imenso
imenso num universo
que não é feito de mim.
Mas mesmo isso é controverso
se nos versos de um poema
perverso sai o reverso.
Disperso num tal dilema
o certo é reconhecer:
no fundo de mim
sou sem fundo.

Acredite se quiser! Lula e Bolsonaro se unem para eleger Hugo Motta na Câmara

Bolsonaro e Lula ganharam da Globo? Nada disso. A democracia foi a grande  vitoriosa - Jornal Opção

E lá vamos nós para votar de novo em Lula ou em Bolsonaro…

Francisco Leali
Estadão

Você é daqueles que não topa com o PT, o petismo e sua maior estrela, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva? Ou está entre os que não suportam bolsonaristas, bolsonarismo e o próprio Jair Bolsonaro? Esteja do lado que estiver, saiba que os dois grupos estão juntos agora. E vão ficar assim até que seja eleito o próximo presidente da Câmara dos Deputados. Traduzindo: Lula e o PT, Bolsonaro e seu PL, todos apoiam um mesmo candidato.

O anúncio com destino comum dos votos dos deputados de ambos os grupos foi confirmado na última quarta-feira, dia 30.

DIREÇÃO DA CÂMARA – PT e PL estão abraçados ao nome do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) para assumir o posto de presidente da Câmara quando o atual ocupante do cargo, o deputado Arthur Lira (PP-AL), terminar sua gestão no início de 2025.

Ver Lula e Bolsonaro juntos no palanque de mesmo candidato seria inacreditável se a política fosse arena para amadores. Não é. No mundo que os dois circulam o que anda valendo são gestos calculados com motivações claras.

O atual e o ex-presidente têm interesses diversos, obviamente, mas que resultam numa confluência conjuntural que os leva a bancar o nome de Motta, ungido pelo atual presidente da Câmara.

LULA DEPENDE DELE – Lula depende de certa cortesia e diálogo com quem ocupa a direção da Casa Legislativa. Os atos de governo que pretende empreender dependem da concordância do deputado que estiver no posto máximo da Câmara que tem o poder de pôr para votar ou deixar na gaveta qualquer projeto.

Do mesmo modo, Bolsonaro também quer na cadeira alguém que não seja governista raiz e que faça andar os temas que lhe interessam.

O prioritário é o projeto que o anistia e restitui seu direito de disputar uma eleição. Até onde se sabe, esse ponto foi colocado na mesa como condição para o PL apoiar o candidato de Lira.

MUITA CALMA – Reforça essa indicação o fato de Bolsonaro, até aqui, ter reagido com inusitada calma e tranquilidade ao fato de que o projeto da anistia, prestes a ser votado em uma comissão da Câmara, teve sua apreciação adiada por Lira. Mesmo assim, o ex-presidente declarou não se opor.

Já Lula, poder-se-ia acreditar, seria frontalmente contrário a um acordo para anistiar o antecessor que flertou com golpe e chegou a rascunhar minuta para anular as eleições.

Mas, até onde se vê, o círculo petista não parece mobilizado ou se importar com o tema publicamente. Afinal, esse não é um problema que hoje diz respeito à gestão petista nem afeta o modo como governa.

TUDO DE NOVO – Num livre pensar, haverá quem cogite que o presidente não descarta um eventual retorno de Bolsonaro às urnas na próxima eleição para ter como oponente um adversário já conhecido e derrotado.

Melhor ir contra o sabido do que a um desconhecido embate.

Enquanto 2026 não chega, Lula e Bolsonaro se unem por Hugo Motta. A façanha acaba dando diploma de PHD em política profissional a um quarto personagem: Arthur Lira que vai saindo de cena dando as cartas e indicando para onde a Câmara deve seguir.

Dividir a centro-direita será a estratégia da esquerda para as eleições de 2026

Charge do Duke (O Tempo)

Alexandre Garcia
Gazeta do Povo

Consolidou-se no segundo turno a força da centro-direita que se espalhou pelos municípios brasileiros no primeiro. A esquerda encolhe; o símbolo do PT se torna uma estrela cadente. O mais significativo é que o partido não teve nem sequer candidato para a prefeitura de São Paulo, onde foi criado, tendo de apoiar o candidato do PSol, que não elegeu prefeito algum.

Dos 39 municípios da Grande São Paulo, região de operários e berço de sindicatos, a esquerda ficou com apenas três prefeituras, com PDT, PSB e PT. Lula nem foi a São Bernardo votar e a alegação oficial foi a de que já não é obrigado, pelos 78 anos de idade; seria melhor ter assumido o motivo real: o risco de voar com hematoma intracraniano.

QUASE EMPATE – O segundo turno mostrou quase empate em Fortaleza (CE), Pelotas (RS) e Ribeirão Preto (SP) – onde a diferença foi de 687 votos. Casos para recontagem manual, se isso fosse possível. Em Camaçari (BA), Campo Grande (MS), Olinda (PE) e Caxias do Sul (RS) o resultado foi um apertado 51% a 49%.

No primeiro turno, todos os eleitos já eram prefeitos; no segundo, repetiu-se o favoritismo de quem já detinha o poder municipal em Palmas (TO), São Paulo (SP), Porto Alegre (RS) e Belo Horizonte (MG).

Partidos mais à esquerda, como PSTU, PCB e PCO, além do PSol, não elegeram prefeito algum, assim como ficaram fora de prefeituras de capitais o PSDB, o PDT, o PCO e o Cidadania (ex-PCB). O PT ficou só com Fortaleza e está em nono lugar em prefeituras.

EXEMPLO DE GRAEML – Curitiba mostrou que é possível uma pessoa sem Fundo Partidário, sem dinheiro, boicotada pela mídia e, na prática, candidata avulsa, poder chegar ao segundo turno com 43% dos votos válidos.

 Cristina Graeml decidiu disputar com o vice-prefeito, apoiado pelo prefeito, pelo governador e por ex-governador, e chamou a atenção do país inteiro pela determinação e coragem, como candidata saída das aspirações populares e não de diretórios partidários e acertos e interesses políticos.

Sua presença na eleição mostra que é possível sair do povo e não da estrutura política tradicional. Não foi eleita, mas é vitoriosa.

O CASO MARÇAL – Na principal eleição também surgiu um personagem sem biografia partidária, Pablo Marçal, que quase foi para o segundo turno, mas insistiu em participar da decisão e se perdeu. Acabou dando palanque a um dos candidatos, e deixou à mostra o objetivo de se promover; com erros de tática e estratégia, acabou perdendo o que conquistara.

Em Goiânia (GO), o governador Ronaldo Caiado mostrou sua força para 2026, derrotando o candidato de Jair Bolsonaro e do deputado Gustavo Gayer – que, abalado pela visita da Polícia Federal, atribuiu a derrota a Caiado e o chamou de “canalha” nas redes.

A reação emocional esquece que, se a centro-direita se dividir, abre espaço para a esquerda em 2026. É preciso ser pragmático como Tarcísio de Freitas e guardar as emoções para os prazeres e não para a guerra eleitoral. Dividir a centro-direita será a estratégia da esquerda neste pré-2026.

(Artigo enviado por Mário Assis Causanilhas)

O tédio desesperador da conversinha mole do Brasil, cada vez mais travado

Tribuna da Internet | Em meio às assombrações da economia, Haddad pega  carona num trem-fantasma

Charge do JCaesar (Veja)

Vinicius Torres Freire
Folha

Quando se assunta com gente do governo o que seria o plano de contenção de gastos Haddad-Tebet, o que mais se ouve é desconversa, desconhecimento ou desprezo. Quando vazam medidas “em estudo”, parte do governo sabota as ideias, até em público.

Deve ser por isso que Fernando Haddad procura despistar todo o mundo a respeito do que seria seu plano, como o fez nesta terça (29): não haveria data para divulgar o pacote ou tamanho dele. Talvez seja melhor não contar nada, discutir o assunto só com o presidente da República e, assim, evitar sabotagens nas internas. Afinal, governo e PT brigam em público até por picuinhas municipais.

TUDO CHUTE – O dólar foi a R$ 5,76. A moeda americana subira mais um degrau alto da escada de problema antes mesmo de Haddad dar a tal entrevista do “nada definido”. Não houve rolo maior no mundo; nem nos países pares mais afetados se deu atenção ao rolinho cambial. D

e manhã, porta-vozes pouco relevantes de “o mercado” diziam que a perspectiva do “pacote” Haddad-Tebet acalmava a praça. No final da tarde, o dólar saltara por causa do “fiscal”. Tudo chute.

De mais certo é que, com a dívida pública malparada, qualquer coisinha provoca baixa ainda maior do real, moeda que mais se desvalorizou, de longe, desde abril, entre as três dúzias mais relevantes do mundo. Estocamos pressão inflacionária.

MEDIOCRIDADE – Com sorte, o preço do petróleo se comporta; choveu, o que pode aliviar a inflação de comida e eletricidade. Notem, no entanto, a submediocridade dessa conversa nacional. O Brasil é um tédio desesperador, desculpem o oximoro.

Mais uma revolução tecnológica passa pela nossa janela (IA). Os carros chineses balançam a indústria do mundo rico ocidental e também por aqui, no Extremo Ocidente (ou Ocidente Médio?).

Os Estados Unidos tomam medidas novas na guerra geoeconômica (como explorar mais lítio ou barrar mais intercâmbios financeiros e tecnológicos com a China). Todo o mundo faz política industrial, a gente faz favor setorial. Etc.

CAOS À VISTA – Plano ambiental e tecnológico, degradação amazônica, o crime organizado tomando o Estado, tiroteio nas ruas, reforma do SUS, nada disso se torna drama nacional consequente, afora em momentos breves de pico do noticiário.

Nem mesmo uma eleição nacional resulta em discussão melhor. Lula 3 adia o pacote fiscal para pensar também em como ganhar a eleição de 2026? Ganhar a eleição de presidente, digo, pois a do resto, governadores inclusive, vai para o vinagre tinto do direitão que toma conta do país.

Vai se fechando cada vez mais o círculo de ferro da feudalização da política: barões do Congresso mandam dinheiro para os feudos, elegem mais prefeitos, que ajudam a eleger mais deputados, já com orçamentos gordos a facilitar a reeleição e favorecidos pela direitização geral do povo e pela esquerda desmiolada. O Orçamento vira pó.

SEM PROGRAMA – O que quer o direitão vitorioso, afora o óbvio? Não sai uma ideia dali —até Michel Temer tinha programa.

Os direitões não se articulam com setor social mais prestante e pensante ou com grupos de tecnocratas ou estudiosos nem para fingir que se ocupam de dar rumo a essa nossa mixórdia.

No máximo, os que se ocupam da política-politiqueira tratam de “bastidores”, fofocas e ninharias sobre o que vai fazer um desses tipos do direitão para levar mais poder e dinheiro.

Enquanto líder do Hezbollah acena para acordo, Irã promete atacar Israel

Hezbollah nomeia Naim Qassem como novo secretário-geral

Naim Qassem, do Hezbollah, admite negociar um acordo

Wálter Maierovitch
do UOL

O guia supremo do Irã, o enfermo aiatolá Ali Khamenei, ordenou ao Conselho de Segurança Nacional que se prepare para atacar Israel. Seria a resposta ao ataque às instalações militares iranianas, da madrugada da última sexta-feira. A notícia foi revelada pelo New York Times.

Enquanto isso, o novo guia do Hezbollah, Naim Qassem, acenou para um acordo de paz, prometendo o fim dos bombardeamentos na região israelense da Galileia (norte de Israel). Dois cenários em aparente contradição — só aparente, como entendem os analistas militares internacionais e os operadores do direito internacional público.

DAR RESPOSTA – Todos sabem que o Irã, na sua meta expansionista e religiosa no Oriente Médio, financia e influencia o Hezbollah, Hamas, Jihad palestina, milícias iraquianas e frente síria.

No caso, volto a frisar, a contradição é apenas aparente. Os aiatolás entendem necessária uma resposta, para não parecer estarem em desvantagem. O Hezbollah, sob bombas e invasões, tenta um respiro para se reorganizar, depois da sua cúpula de governo ter sido eliminada.

Naim Qassem, um clérigo-combatente, fez a primeira aparição como novo guia do Hezbollah. E sua manifestação foi surpreendente.

TUDO IGUAL – Disse que irá manter a linha política beligerante do antecessor Hassan Nasrallah e que continuará a bombardear o norte de Israel, ou seja, a região da Galiléia, onde ocorreu um êxodo de 60 mil israelenses, diante dos bombardeamentos progressivos. Até aí, nenhuma surpresa.

Surpreendeu, no entanto, ao ressaltar que o Hezbollah está pronto a um acordo com Israel.

Para os especialistas em geoestratégia militar e em geopolítica, ficou claro que o Hezbollah está tentando separar as duas guerras (Israel x Hamas e Israel x Hezbollah) e se descolar da imagem do Hamas.

SOLIDARIEDADE – O Hezbollah, no dia 8 de outubro de 2023, dia seguinte ao da ação terrorista do Hamas em Israel, declarou solidariedade.

No momento, Israel continua a bombardear o sul do Líbano e já ocupa uma faixa de 6 km. As tropas de Unifil, compostas pelos chamados capacetes azuis de paz da ONU, estão aquarteladas.

A linha azul traçada pela ONU cobre 120 km e corre entre o mar Mediterrâneo, a oeste, e o Golã, a leste. Foi essa linha estabelecida pela resolução ONU de número 425, de 19 de março de 1978. A área ocupada pelas instalações Unifil, e vista por Netanyahu com obstáculo à defesa de Israel, tem pouco mais de 20 km e chega até o rio Litani.

SE REORGANIZAR – O novo líder do Hezbollah, conforme percebeu o comando militar israelense, pretende deixar o combate da fronteira sul para ter um cessar fogo de modo a se reorganizar no Líbano, em especial na capital Beirute, onde o seu quartel-general foi destruído.

O ministro da defesa de Israel, Yoav Gallant, publicou uma foto de Qassem, com o título: “Emprego temporário”. Foi a resposta à afirmação de Qassem de que Israel pagaria caro a permanência no Líbano.

Para os 007 da inteligência ocidental, duas conclusões podem ser tiradas do pronunciamento de Qassem.

RECOMPOSIÇÃO – A primeira indica que o Hezbollah dá sinais de recomposição da sua cúpula de governo, depois das mortes de Hassan Nasrallah e do seu sucessor, o sobrinho e também clérigo Safi Al Din.

O arco temporal de espera para a escolha do novo guia do Hezbollah foi considerado longo, a mostrar o sucesso de Israel no ataque pontual a Beirute, mais especificamente ao bairro xiita de Dahieh, centro administrativo do Hezbollah.

Vale lembrar que Nasrallah foi assassinado em 27 de setembro passado e Qassem só deu as caras — ou melhor, sentiu-se seguro para aparecer em público — apenas em 30 de outubro.

EM GUERRA – A segunda conclusão decorre da promessa de Qassem de continuar a linha política, beligerante e filo-iraniana de Nasrallah. Disse, com todas as letras, que continuará a atacar, embora queira se descolar do Hamas, ainda que temporariamente.

Em razão da desarticulação, o Hezbollah intensificou as chamadas “ações kamikaze”. Qassem, segundo os serviços secretos, queria aparecer pela primeira vez com um troféu: o ataque kamikaze à famosa Unidade 8.200 de Israel, especializada em espionagem eletrônica. Um caminhão foi lançado próximo do prédio.

Ao lado da americana NSA, trata-se da segunda maior agência de espionagem eletrônica do planeta. A lembrar: Israel consta com três serviços de espionagem e operações especiais: Mossad (inteligência externa), Shin Bet (inteligência interna) e Unidade 8.200 (inteligência eletrônica).

MAIORES ALVOS – O motorista do caminhão matou-se e o veículo ficou imobilizado em uma parada de ônibus, matando um idoso e ferindo cerca de 60 pessoas.

Com a definição do novo líder do Hezbollah, os dois maiores alvos de Israel passaram a ser Quassem e Mohammed Sinwar, este do Hamas, irmão do ex-comandante em chefe Yahya Sinwar, morto em confronto com cadetes israelenses em 16 de outubro.

Mohammed Sinwar, dada a sua atividade de construtor, foi considerado o responsável pela construção dos túneis do Hamas que surpreenderam os agentes de inteligência de Israel.

A AMEAÇA DO IRÃ – A teocracia iraniana movimenta-se e vaza informações para fazer parte do seu sistema de propaganda.

Dado o grave estado de saúde de Khameni, que tenta emplacar o filho na sucessão de guia-supremo do Irã, o país tem que ameaçar. Joga mais internamente, pois existe uma disputa com relação à sua sucessão.

Num pano rápido, a paz está distante. Para se ter ideia, sete israelenses foram mortos ontem por bombas disparadas pelo Hezbollah. O número de mortos no Líbano, pelos disparos das forças israelenses, chegou a 45 — e o premiê libanês, Najib Mikati, disse esperar por um imediato cessar-fogo.

Ideia de Lula seria boa – fazer referendo em vez de prosseguir guerra na Ucrânia

Lula sugere 'referência' sobre territórios na Ucrânia e diz que G20 não vai discutir a guerra | Política | G1

Lula sugere ‘referendo’ diz que o G20 não vai discutir a guerra

Deu no Estadão

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sugeriu em entrevista ao canal de TV francês TF1 que os presidentes da Ucrânia e da Rússia, Volodymyr Zelensky e Vladimir Putin, realizam um referendo para decidir sobre as áreas que estão no centro do conflito no Leste Europeia.

”Eu fico pensando que a Rússia diz que o território que eles estão ocupando é russo. A Ucrânia diz que é deles. Mas por que, ao invés da guerra, não faz um referendo para ver com quem o povo quer ficar? Seria muito mais simples, democrático e mais justo”, argumentou o presidente.

MEDIAÇÃO – Lula voltou a defender a participação do Brasil em uma mediação para dar fim à guerra.

“Está faltando interlocução, pessoas com substituição para serem ouvidas. É aí que o Brasil tem se colocado. O Brasil está dizendo, em alto e bom som, que não queremos participar do conflito, que nós gostamos de sentar à mesa para ver se encontrar uma solução é plenamente possível”, afirmou.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
A informação foi enviada pelo comentarista Gilberto Clementino, sempre atento à política internacional. A ideia de Lula é altamente democrática, mas não se adapta à situação. Por óbvio, o governo da Ucrânia não vai aceitar, porque várias regiões do seu país são mais russas do que ucranianas, como a Crimeia, por exemplo. Portanto, o presidente Volodymyr Zelensky vai colocar areia na proposta de Lula, jamais a aceitará. Enquanto não destrói seu país e seu povo, Zelensky não sossega . E Lula deveria estar cuidando da vida do Brasil e não da vida dos outros . (CN)

Condenação de assassinos de Marielle foi a justiça possível, disse o promotor

Análise: caso Marielle mostra a necessidade de reforma da segurança

Agora, falta o principal – condenar os mandantes do assassinato

Flávia Oliveira
O Globo

Foi a justiça possível, como definiu o promotor Fábio Vieira, do MP-RJ, que se fez com a condenação de Ronnie Lessa e Élcio Queiroz. Seis anos, sete meses e 17 dias depois do crime, a sociedade, por meio do Tribunal do Júri, mostrou que, desta vez, a impunidade não prevaleceu. A sentença da juíza Lúcia Glioche, que fixou penas de, respectivamente, 78 e 59 anos de prisão aos assassinos, traz alívio; alegria, nunca.

As lágrimas brotam porque, se confirma agora, Marielle Franco e Anderson Gomes não retornarão; Fernanda Chaves, a única sobrevivente, jamais terá de novo a vida que lhe foi sequestrada. Tampouco voltarão à normalidade Luyara, Monica, Marinete, Antônio, Anielle, Arthur, Ágatha, familiares tornados vítimas perpétuas da barbárie.

RECADO AOS RÉUS – A titular do 4º Tribunal do Júri foi precisa ao anunciar que o veredito é mais recado aos réus e à laia de criminosos que acossam o Rio de Janeiro do que alento às famílias.

— Talvez justiça fosse que o dia de hoje jamais tivesse ocorrido, talvez justiça fosse Anderson e Marielle vivos — reforçou.

O julgamento que presidiu, num par de sessões com transmissão ao vivo, ensinou que fulminados também são os que sobrevivem ao homicídio de seus amores. Pedagogia pura num país recordista em assassinato de defensores de direitos humanos, num território em que dezenas de milhares de corpos, quase sempre pretos, quase sempre pobres, tombam anualmente.

OUTRAS VÍTIMAS – A orientação da ONU, que consta da política do Judiciário brasileiro, considera formalmente vítima não só a pessoa atingida pelo fato criminoso, mas também os familiares — explica a juíza federal Adriana Cruz, secretária-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A Resolução 253/2018 do CNJ, que trata do tema, saiu da provocação dos movimentos de mães de vítimas da violência. Obriga os tribunais a ter centros de atendimento para assistir os familiares.

A compreensão alcança todas as etapas da luta por justiça, não apenas o processo criminal. Engloba, por óbvio, os filhos de uma mulher morta por feminicídio que busquem benefício previdenciário via Justiça Federal.

CRIME ORGANIZADO – O caso Marielle Franco, que já apresentara ao Brasil o conceito de feminicídio político, agora nos escancara a vastidão dos danos de um assassinato. E mostrou ao Rio de Janeiro, ao país e ao mundo o tamanho do buraco em que o crime organizado nos meteu.

Ronnie Lessa e Élcio Queiroz integram uma engrenagem a serviço da morte. O atirador contou com frieza assustadora no interrogatório que, contratado para o crime, encomendou ao mandante o kit assassinato: carro clonado, arma e telefone celular.

Ele contou que Macalé, o intermediário, tinha conexões com o camelódromo de Madureira, com farta oferta de aparelhos. Os criminosos se comunicavam sem risco de expor as linhas contratadas nos próprios CPFs. A cadeia de roubos, furtos e receptação de celulares — crimes galopantes no estado e já associados a falsos sequestros e extorsões praticadas de dentro dos presídios da capital — também se liga à indústria da morte.

Supremo anula penas da Lava Jato, mas não reduz seus efeitos políticos

Gilmar diz que 'lero-lero' sobre as urnas não se repetiu neste ano

Argumentos técnicos de Gilmar não conseguem “apagar” os crime

William Waack
CNN

Já lá se vão quase cinco anos desde que o plenário do STF concluiu pela suspeição do então juiz Sergio Moro, e passou a anular suas decisões.

Ao apagar nesta terça-feira (29) todas as condenações de José Dirceu — um dos nomes históricos mais fortes do PT — o ministro Gilmar Mendes estendeu os efeitos daquela decisão antiga do plenário sobre a suspeição de Sergio Moro.

MOTIVOS TÉCNICOS – Seriam, digamos, motivos técnicos, até lógicos, para livrar Zé Dirceu da Lava Jato — ele já fora condenado antes no mensalão.

Esses mesmos motivos técnicos haviam sido contestados pelo Procurador-Geral da República quando defendeu que Gilmar Mendes não acolhesse o pedido de Dirceu para anulação de condenações proferidas por Sergio Moro. O PGR argumentava, por sua vez, também com base em critérios técnicos.

Ocorre que não estamos diante de uma questão técnico-jurídica — ainda que também seja. Estamos diante de um esforço de reescrever um pedaço de enorme relevância da história recente do país, a título de reparar erros que a Lava Jato tenha cometido.

ARGUMENTOS… – Quem opera no campo do Direito, como juízes, advogados e promotores, pode argumentar que erros jurídicos anulam investigações, processos e condenações.

Como as feitas pela Lava Jato por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilhas para enriquecimento privado e/ou tentativa de partidos políticos de ficar para sempre no poder.

Mas os crimes existiram, seus autores foram identificados, muitos confessaram, e bilhões foram devolvidos. Motivos técnicos não anulam esses fatos da memória coletiva. A Lava Jato foi principalmente uma expressão de indignação e de repúdio ao sistema, e esses fatores continuam aí.

Chamar Trump de “fascista” pode ter sido um grave erro de Kamala Harris

Metade dos americanos considera Trump 'fascista', diz pesquisa - Internacional - Ansa.it

Na verdade, Trump parece um ator e cada hora faz um papel

Demétrio Magnoli
Folha

Na reta final, diante de uma coleção de pesquisas assustadoras, Kamala Harris reverteu aos sombrios alertas de Biden, desistindo da linha de reduzir Trump a uma figura “esquisita”, “bizarra”, quase risível. Nasceu daí a decisão de classificá-lo como “fascista” e, na sequência, através de terceiras vozes, a de traçar paralelos hiperbólicos entre o comício do rival no Madison Square Garden e a manifestação nazista, no mesmo local, em 1939, que exibiu no palco um retrato de George Washington emoldurado por suásticas.

Erro tático, concluíram analistas independentes e mesmo alguns estrategistas democratas. A radicalização retórica presta desserviço à imagem de candidata “unificadora” que Harris tenta projetar e a seu intento de persuadir eleitores indecisos.

SERIA VERDADE? – No fim, ela estaria submetendo-se às regras do jogo de um rival que aposta na desqualificação e no insulto. Mas, de fato, independente das conveniências da disputa por votos, seria verdadeiro o adjetivo? Trump deve ser, objetivamente, definido como fascista?

A extensa família do nacionalismo compartilha traços superficiais do fascismo. A Reunião Nacional francesa, de Le Pen, e o Irmãos da Itália, de Meloni, repudiam oficialmente o fascismo mas conservam, em gestos e palavras, fragmentos de suas raízes históricas.

 A tirania imperialista, grão-russa e ultraconservadora de Putin contém pitadas de fascismo, algo que também pode ser identificado na ditadura pós-chavista de Maduro. Contudo, um rigor intelectual básico, que saiu da moda, proíbe classificar como fascistas tais partidos ou regimes.

XENOFOBIA – Do fascismo, Trump recolhe a xenofobia extremada e o impulso à construção de um movimento de massas, o Maga (Make America Great Again), em cuja periferia movem-se milícias supremacistas. Mas, na salada ideológica do trumpismo, inexiste o conceito fascista nuclear do Estado corporativo. Além disso, ao longo do mandato original do ex-presidente, as liberdades públicas e políticas seguiram intactas.

Foi John Kelly, general da reserva e ex-chefe de gabinete de Trump, quem colocou o adjetivo na roda, propiciando o avanço retórico da candidata democrata.

“O ex-presidente situa-se no campo da extrema direita, é um autoritário e admira ditadores. Assim, com certeza, ele encaixa-se na definição geral de fascista.” A “definição geral” invocada por Kelly abrange incontáveis tiranetes e, sobretudo, ignora as singularidades do fascismo.

FIDELIDADE – O ponto crucial da entrevista de Kelly encontra-se em outro lugar: a menção a um diálogo no qual o então presidente louvava a fidelidade inabalável dos generais de Hitler. O relevante, aí, não é o nome Hitler, mas a palavra fidelidade.

O chefe do Maga ressente-se das resistências dos seus antigos auxiliares militares em cumprir suas ordens impulsivas e, ainda, dos inquéritos instalados contra ele por promotores judiciais. Como lulistas e bolsonaristas, Trump enxerga nas agências públicas autônomas um “Estado profundo” engajado na sabotagem da vontade soberana do Líder eleito.

Trump promete, num segundo mandato, varrer o “Estado profundo”. A alta burocracia estatal seria submetida a expurgos purificadores e colonizada por figuras tão leais quanto os generais de Hitler. Não é fascismo, mas configura um desafio existencial à democracia americana.

STF vai enterrar anistia para golpistas de 8 de Janeiro se Congresso aprovar?

Charge Clayton | Charges | OPOVO+

Charge do Clayton (O Povo/CE)

Carolina Brígido
do UOL

Se o Congresso Nacional aprovar anistia para os golpistas de 8 de janeiro de 2023, como se desenha o cenário, certamente a legalidade da medida será questionada perante o STF (Supremo Tribunal Federal) —a mesma Corte, aliás, que julgou e condenou os réus.

É claro que os integrantes do STF terão interesse em restituir a validade das condenações. Mas há caminhos jurídicos para se fazer isso?

CASO DO INDULTO – Há precedentes diferentes no Supremo sobre casos que podem ser considerados análogos. O mais recente é de maio do ano passado, quando o plenário anulou o decreto do ex-presidente Jair Bolsonaro que havia concedido indulto ao ex-deputado Daniel Silveira, condenado a oito anos e nome meses de reclusão pelo Supremo por agressões aos ministros do tribunal e ameaças ao Estado Democrático de Direito.

O plenário decidiu que houve desvio de finalidade na concessão do benefício, já que Silveira era aliado político de Bolsonaro. Ao longo do mandato, o então presidente também se dedicava a proferir críticas contundentes contra a Corte.

Para a maioria do STF, embora o indulto seja um ato político privado do presidente da República, é possível que o Judiciário verifique se sua concessão está de acordo com a Constituição Federal.

VÍNCULO POLÍTICO –  No caso de Silveira, ficou entendido que o benefício foi concedido apenas pelo vínculo político-ideológico, o que seria incompatível com os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade administrativa.

O ministro Luiz Fux foi mais enfático. Para ele, as ameaças proferidas por Silveira configuram crime político, contra o Estado Democrático de Direito, e, por esse motivo, não seria passível de induto ou anistia. O raciocínio seria um caminho para o plenário do STF derrubar anistia eventualmente aprovada no Congresso Nacional.

Antes do julgamento sobre o indulto de Silveira, o plenário do STF analisou, em maio de 2019, ação contra o decreto de Natal assinado em 2017 pelo então presidente Michel Temer.

DECRETO DE NATAL – A maioria dos ministros manteve a validade do decreto. Ponderou, no entanto, que o ato de clemência do presidente da República é passível de ter a legalidade analisada pelo Judiciário.

Na forma, a anistia que se ensaia no Congresso Nacional aos golpistas de 8 de janeiro de 2023 é diferente. Ela não seria baixada por decreto presidencial. Está em votação um projeto de lei que, se aprovado, será sancionado pelo presidente da República.

O modelo seria, em tese, o mesmo da anistia aprovada pelo Congresso em 1979, quando foi pavimentado o fim da ditadura militar no Brasil. O projeto que deu origem à Lei da Anistia foi escrito pela equipe do presidente João Figueiredo, que concedeu perdão aos perseguidos políticos. O Congresso discutiu e aprovou o texto em apenas três semanas.

LEI DA ANISTIA – Em 2010, o plenário do STF julgou ação questionando a Lei da Anistia e, por sete votos a dois, decidiu que ela não era passível de revisão.

 A ação tinha sido proposta pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), com a intenção de possibilitar a punição para militares e policiais acusados de atos de tortura durante o regime militar.

No julgamento, os ministros assentaram que o perdão foi para todos, militantes e militares. “Só o homem perdoa, só uma sociedade superior qualificada pela consciência dos mais elevados sentimentos de humanidade é capaz de perdoar. Porque só uma sociedade que, por ter grandeza, é maior do que os seus inimigos é capaz de sobreviver”, disse, na ocasião, o então presidente do STF, ministro Cezar Peluso.

Passados 14 anos, a composição do Supremo mudou. Portanto, se o julgamento fosse realizado hoje, o resultado não seria necessariamente o mesmo. Há recurso da própria OAB à decisão tomada em 2010. Não há previsão de quando o plenário vai se debruçar novamente sobre a causa.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Excelente matéria de Catarina Brígido. Mostra que a nova Lei da Anistia tem amplas condições de ser aprovada, até porque o PT deve votar a favor, junto com os partidos de sua Federação – PcdoB, PSol, PV e PDT, que já entraram no embalo de aprovar Hugo Motta na presidência da Câmara. (C.V.) Dos cinco partidos, só falta o PSol se manifestar. (C.N.)

Bolsonaro acredita que será anistiado, mas quadro que se desenha para 2026 segue restrito

Por decoro, o poeta queria cobrir o olhar da amada com uma folha de parreira

Manuel Antônio Álvares de Azevedo - Frases Perfeitas - Querido Jeito

Álvares de Azevedo criava frases geniais

Paulo Peres
Poemas & Canções

O dramaturgo, jornalista, contista e poeta maranhense Artur Nabantino Gonçalves de Azevedo (1855-1908) sustenta que “Por Decoro”, os olhos de sua amada, quando expostos publicamente, deveriam estar cobertos por uma discreta folha de parreira.

POR DECORO
Artur Azevedo

Quando me esperas, palpitando amores,
e os lábios grossos e úmidos me estendes,
e do teu corpo cálido desprendes
desconhecido olor de estranhas flores;

quando, toda suspiros e fervores,
nesta prisão de músculos te prendes,
e aos meus beijos de sátiro te rendes,
furtando às rosas as purpúreas cores;

os olhos teus, inexpressivamente,
entrefechados, lânguidos, tranquilos,
olham, meu doce amor, de tal maneira,

que, se olhassem assim, publicamente,
deveria, perdoa-me, cobri-los
uma discreta folha de parreira.

No Brasil, a política tornou-se exercício diário do maior surrealismo do mundo

Bolsonaro e Lula se enfrentam em último debate nesta sexta-feira | CNN Brasil

Lula e Bolsonaro são grandes mestres no surrealismo da política

Carlos Newton

Já dissemos aqui na Tribuna da Internet que não mais existem brasilianistas por essas bandas. Até recentemente parecia uma praga. A política brasileira era acompanhada por um número enorme de observadores internacionais, que se surpreendiam com a sucessão da acontecimentos surrealistas. De tal maneira que eles acabaram desistindo de tentar entender a política aqui no mais importante país debaixo do Equador.

Realmente, não dá para comparar com nenhum outro fenômeno mundial. Vejam agora o que está acontecendo com o projeto que anistia os perigosos “terroristas” do 9 de Janeiro.

DURO DE ACEITAR – As pessoas normais, digamos assim, não conseguem compreender nem aceitar que de repente se tenha começado a falar na anistia, com a situação evoluindo velozmente de um dia para outro. Então, digamos que é resultado de uma evolução astrológica, com vários assuntos entrando em linha e cada um influenciando o outro.

O primeiro fato é que Jair Bolsonaro quer ser candidato de qualquer jeito e a única saída para ele é a anistia. Ao mesmo tempo, Lula caiu no banheiro, quebrou a cabeça e…acordou, ao invés de desmaiar. De repente, percebeu que está velho demais e pode não aguentar o tranco de uma nova campanha.

Nessas condições, como enfrentar um candidato jovem e forte, como Tarcísio de Freitas, chancelado pelo maior partido evangélico do país?

PT TAMBÉM ACORDA – Ao mesmo tempo, o PT também acordou e percebeu que não tem candidato que possa substituir Lula numa emergência. Assim, a solução seria lançar o próprio Lula contra Bolsonaro, porque a possibilidade de vitória seria muito maior, sem Tarcísio na disputa.

Mas acontece que Bolsonaro está inelegível, diria o conselheiro Acácio, personagem de Eça de Queiroz. Ora, é para isso que existem os três poderes, operando em ritmo de lavandaria. O Congresso lava, o Executivo enxágua, o Supremo passa a ferro – e o candidato imundo fica pronto para outra.

Não foi assim que passaram alvejante em Lula da Silva em 2021, deixando-o limpinho para a campanha? E não está sendo assim agora com José Dirceu, que está sendo recuperado para  trabalhar novamente com Lula, embora estejam rompidos desde 2015?

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P.S.
Isso é política ou surrealismo? Não sei. Chamar de política seria esculhambar a democracia e o barão de Montesquieu. Dizer que é surrealismo significaria desconsiderar importantes escritores e artistas que fizeram história no século passado. Assim, a conclusão mais direta é dizer que, no Brasil do século 21, o que parece surreal é apenas o dia-a-dia da política. (C.N.)

Anistiar Bolsonaro significa suicídio democrático e convite à baderna

Charge do dia do campinense Fred Ozanan: Anistia

Charge do Fred Ozanan (Paraíba Online)

Hélio Schwartsman
Folha

Uma pauta que irá animar o noticiário político pelos próximos tempos é a anistia aos golpistas do 8 de janeiro e, por extensão ampliada, a Jair Bolsonaro, hoje considerado inelegível pelo TSE por crimes eleitorais.

Não é exagero afirmar que essa será uma definição fundamental para o futuro político do país. Os pleitos municipais mostraram que Bolsonaro é menos forte do que se julga, mas está longe de ser uma figura sem influência eleitoral relevante.

POSSIBILIDADES – Há três cenários para 2026. Bolsonaro poderá estar preso, poderá estar solto mas sem direito de concorrer à Presidência, ou terá sido anistiado e poderá candidatar-se. Cada um deles traz implicações muito diferentes para o campo da direita e, por conseguinte, para o processo eleitoral como um todo.

Nenhum dos principais candidatos a candidato da direita deverá se colocar no jogo sem saber se o ex-presidente estará no páreo.

No mérito, não consigo conceber erro maior do que conceder um perdão a Bolsonaro. Eu diria até que, se o sistema político embarcar nessa, estará flertando com a autoaniquilação.

VULNERÁVEIS – Democracias são especialmente vulneráveis a ameaças internas, isto é, a líderes regularmente eleitos que passam a minar suas regras mais essenciais com o intuito de perpetuar-se no poder. Bolsonaro fez isso de múltiplas maneiras, da campanha para desacreditar as urnas eletrônicas à minuta de golpe, passando pela intentona do 8 de janeiro.

A principal e possivelmente a única linha de defesa do Estado de Direito contra esse tipo de empreitada é agir com rigor contra governantes que atentam contra seus princípios de modo muito escancarado e fracassam, caso de Jair Bolsonaro.

Deixar de puni-lo, tanto pelos vários crimes eleitorais, como pelos delitos penais, já seria inquietante. Conceder uma anistia, que é como dizer “nós vimos o que você fez, mas não achamos que seja grave”, seria incomensuravelmente pior. Seria um convite a próximos governantes com tendências autoritárias para atropelar as regras de que não gostem sem se preocupar com responsabilização futura.

Esquerda tem graves problemas a resolver, mas não consegue encontrar soluções

Charge do JCaesar | VEJA

Charge do JCaesar | VEJA

Bruno Boghossian
Folha

Depois da onda da direita de 2018, líderes da esquerda puseram sobre a mesa um problema e uma solução. Para políticos veteranos, parte do desgaste daquele ciclo era reflexo da adesão em massa a valores conservadores e da consequente rejeição ao PT e outros partidos.

Uma das propostas para sair do enrosco envolvia a redução do peso da pauta de costumes e a reconquista do eleitor pelo discurso econômico.

EFEITO LULA – Os anos se passaram, e a esquerda ancorou sua volta ao poder no personagem que simbolizava uma plataforma de transferência de renda e redução de desigualdades. Ele trazia no bolso uma carta aos evangélicos para suavizar desconfianças, além de se escorar no pilar laico da preservação da democracia.

O ambiente político atual e os últimos resultados eleitorais sugerem que a esquerda tem agora dois problemas sobre a mesa.

Acenos tímidos ao público conservador tiveram efeitos igualmente tímidos, enquanto itens do programa econômico se mostram incapazes de sensibilizar segmentos importantes.

BAIXAR O TOM – Na última década, a consolidação do eleitorado conservador fez com que alguma tensão se acumulasse na esquerda. Pragmáticos radicais diziam que era preciso baixar o tom da chamada pauta identitária para não afugentar uma parte considerável do país.

Setores ligados à defesa das minorias, por sua vez, consideravam urgente enfrentar de peito aberto o que já se transformava numa guerra cultural.

A visão do primeiro grupo prevaleceu em muitas elites partidárias, formadas por veteranos menos conectados à agenda identitária e convencidos de que a fórmula econômica era suficiente para obter vitórias políticas.

IDEIA FRÁGIL – A ideia de que ganhos de renda e outros benefícios desobstruiriam pontes com evangélicos e a classe média, porém, era mais frágil do que esses políticos pensavam.

Até aqui, ninguém encontrou um ponto de equilíbrio capaz de permitir à esquerda caminhar sobre a corda bamba da agenda de costumes sem perder sua identidade nem abandonar convicções importantes.

A busca por uma nova mensagem econômica que caia bem nas periferias urbanas e nas classes trabalhadoras representa um desafio parecido.