Camila Turtelli e Jeniffer Gularte
O Globo
Um dos articuladores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o agronegócio, o ex-ministro da Agricultura Neri Geller afirma que o governo já melhorou a relação com o setor, mas reconhece que o grupo ainda precisa ser mais ouvido na tomada de decisões. Como um desses instrumentos para estreitar os laços, ele defende um aumento na concessão de crédito para os pequenos agricultores e empresas.
Ministro da Agricultura na gestão de Dilma Rousseff, Geller é cotado para a Secretaria de Política Agrícola, cargo na pasta da Agricultura, sob o comando de Carlos Fávaro. O caminho para a nomeação foi aberto na semana passada, após o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reverter a decisão que cassou seu mandato de deputado, o que impedia a entrada no governo. No posto, pretende atuar também na articulação política e aproximar mais os deputados do PP, seu partido, e da bancada ruralista à gestão petista.
O senhor disse na transição que o agronegócio já tinha aderido ao Lula. As dificuldades, no entanto, permanecem. Por quê?
Uma boa parte do agro já aderiu ao governo. O Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar), a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e a Aprosoja já estão mais acessíveis, estamos conversando mais. Tem alguns que são radicais por natureza, mas tudo o que nós prometemos em campanha cumprimos, como o projeto dos defensivos agrícolas (aprovado no Congresso). Não estão acontecendo invasões de terras. O governo vai fazer reforma agrária, mas dentro dos preceitos legais. Em 2006 e 2007, quando todos nós estávamos quebrados, quem renegociou todo o crédito foi o governo do PT. Isso nos dá um discurso. Vai dar resultado inclusive para dialogar mais com a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Vou ajudar o (Alexandre) Padilha (ministro das Relações Institucionais) e o (Carlos) Fávaro (ministro da Agricultura) na articulação política.
Mas o que ainda falta para o setor se aproximar ainda mais?
Temos que fazer com que as decisões e as discussões sejam mais próximas e precisamos melhorar ainda o crédito. Foi feita muita coisa pelo BNDES. O financiamento de armazém em dólar foi um avanço importante que o Fávaro conseguiu implementar junto com o Mercadante e a equipe dele. Mas a gente precisa, no ano que vem, discutir as linhas de crédito mais robustas, pré-custeio. No primeiro ano teve muita dificuldade em função do Orçamento já ter sido votado e não ter espaço fiscal para ampliar essa linha de crédito.
O senhor é do PP, que apesar de comandar um ministério, tem uma bancada ainda distante do governo. Como vai atuar nessa aproximação?
O senador Luiz Carlos Heinze (PP-RS), por exemplo, nos ajudou muito em 2015. O deputado Luizinho (RJ), que é o líder do PP, é meu amigo. Nós ajudamos a coordenar a campanha do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Viajei vários estados junto com ele, articulando a eleição. Vamos fazer um trabalho para aproximar esses deputados que são ligados ao agro. Não estou falando que vai para a base, longe disso, mas a relação com o Partido Progressista é bastante forte.
Houve invasões do MST no primeiro semestre. O governo é complacente com o movimento?
O governo não abaixa a cabeça e ouve os movimentos sociais. Isso é virtude, não é defeito. Mas não apoia invasões irregulares, tanto que invadiram a Embrapa e foi desmobilizado. O governo não apoia de forma irregular a invasão de terra. Essa foi a ordem do presidente Lula.
O presidente Lula errou ao vetar o marco temporal?
Não, acho que é para isso que existe o Congresso Nacional. Eu, particularmente, sou a favor da regulamentação por emenda constitucional. O que é de direito é de direito, mas a demarcação de forma aleatória não dá para deixar. O marco temporal foi importante para o Congresso estabelecer sua autonomia.
A cassação do senhor foi revertida pelo TSE na semana passada. Sua nomeação no governo dependia disso?
Sim, 100%. O meu nome foi indicado e está na Casa Civil. Só não fui nomeado porque tinha essa pendência jurídica, que me inviabilizava do ponto de vista legal. Não pude disputar a eleição, de forma injusta, mas se estabeleceu a verdade. Eu poderia ter ajudado mais o governo.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Se tivesse mais habilidade e ouvisse o agronegócio, o governo não teria criado a crise do marco temporal. Mas falta raciocínio, é um governo que tenta viver de aparências. (C.N.)