Emendas parlamentares, seus privilégios e a urgência de fiscalização

Charge do Baggi (instagram.com/falabobaggi)

Pedro do Coutto

O recente escândalo envolvendo o deputado federal Júnior Mano, acusado de destinar emendas parlamentares para a cidade onde sua esposa exerce o cargo de prefeita, expõe mais uma fissura crônica na estrutura orçamentária e política brasileira. Trata-se de um episódio simbólico — e não isolado — de um sistema que permite o redirecionamento de recursos públicos com finalidade eleitoral, muitas vezes passando ao largo da transparência e da moralidade administrativa.

As chamadas emendas impositivas, instituídas pela Emenda Constitucional nº 86/2015, foram pensadas para garantir aos parlamentares a capacidade de indicar diretamente a aplicação de parcelas do orçamento da União, sob o manto da descentralização e da representatividade. Na prática, no entanto, têm se tornado terreno fértil para o clientelismo, o favorecimento pessoal e, como no caso de Júnior Mano, o conflito de interesses. O orçamento público, nesse contexto, transforma-se em moeda política, barganhada por apoio e reeleição.

REGRA – Reportagens investigativas de veículos como Folha de S.Paulo, O Globo e Agência Pública têm demonstrado que essa prática, longe de ser exceção, é regra silenciosa no jogo político nacional. Parlamentares articulam o repasse de verbas para municípios aliados — ou administrados por seus familiares — e, muitas vezes, escolhem as empresas que executarão as obras com base em vínculos obscuros, quando não escandalosamente evidentes.

A questão central é: quem fiscaliza esse circuito orçamentário? A Controladoria-Geral da União (CGU), o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério Público Federal têm atuado, mas com recursos e quadros limitados frente ao volume de emendas e à complexidade de rastrear a efetiva execução das obras. Em muitos casos, os projetos não saem do papel ou são superfaturados, e a prestação de contas se perde em burocracias lenientes ou coniventes.

O modelo das emendas impositivas, sem um controle institucional eficiente, cria uma simbiose perigosa entre orçamento público e projeto de poder. O dinheiro que deveria ser destinado à saúde, educação, infraestrutura e desenvolvimento regional, muitas vezes é desviado para alimentar redutos eleitorais e relações promíscuas com empreiteiras. É a perpetuação de um ciclo vicioso: recursos públicos que financiam campanhas disfarçadas de obras públicas.

FICALIZAÇÃO – Não se trata de criticar o instrumento das emendas parlamentares — elas podem, sim, ser um importante mecanismo de descentralização e democratização dos investimentos federais. Mas é preciso apertar os parafusos da fiscalização. Um sistema automatizado e transparente, como propõem especialistas da Transparência Internacional, combinado com auditorias frequentes do TCU e ações proativas do Ministério Público, pode reduzir drasticamente o desvio de finalidade.

Enquanto não houver rigor na apuração e punição exemplar dos envolvidos, escândalos como o de Júnior Mano continuarão surgindo — e se multiplicando. O Parlamento, que deveria ser a casa da representação popular, corre o risco de se tornar apenas o balcão de negócios das elites políticas locais. E o cidadão, como sempre, paga a conta.

A crise ética que corrói o uso das emendas parlamentares não é apenas uma questão técnica de gestão orçamentária — é, sobretudo, uma questão moral e democrática. Ou o Brasil enfrenta com seriedade essa distorção, ou continuará sendo vítima do velho hábito nacional de transformar o público em privado sob o pretexto da legalidade.

16 thoughts on “Emendas parlamentares, seus privilégios e a urgência de fiscalização

  1. Pedro do Coutto está correto em criticar a maracutaia do esquerdoso Junior Mano; mas o que o Pedro do Coutto acha do pedágio de 12%, cobrado a mando do ladrão Lula da Silva, para liberar as emendas parlamentares?

    • Não tem lógica o seu comentário, Sr. Jorge. É exatamente o Judiciário, que vem botando freio nessa orgia das emendas parlamentares,. O ministro Flávio Dino, está cobrando transparência e não libera as emendas, enquanto os parlamentares não assinarem a rúbrica deles, no dinheiro público enviado para seus currais eleitorais.
      Senadores e deputados, resistem e fogem da transparência como o diabo foge da cruz.

      Com essas medievais emendas, nenhum deputado ou senador, perde eleição. Vão ser eleitos e reeleitos até morrerem, porque felizmente, ninguém é eterno.

  2. Se não me engano, me corrijam se eu estiver errado, há anos atrás a Engenharia da Caixa Econômica Federal, acompanhava e fiscalizava os repasses oriundos do governo federal. Orçamento da união.
    Escapando deste controle a corrupção explodiu.

    • Os deputados e senadores, não querem transparência de jeito nenhum.
      E são eles, suas excelências, que mandam no Orçamento, logo no país.

      Era melhor aprovar, o quanto antes, o Parlamentarismo. Com esse Congresso empoderado, qualquer presidente gira rainha da Inglaterra.
      Talvez seja por esse protagonismo do Congresso, que Bolsonaro tentou o Golpe de Estado.
      Lá atrás, Jânio Quadros também tentou, com sua renúncia.

  3. Estranhamento o Pedro do Coutto não comentou o tarifaço. Nada como se fazer de morto para não ter que explicar a lambança que o painho arrumou.

  4. Sr;. Pedro

    Será que no caso do Sinistro do Narco-Iphone X9 com esse volume de emendas, ops, errei, com sua riqueza multiplicada por 30 , vamos ter uma guerra declarada entre Ricos e Pobres…?

    “…Patrimônio de ministro aumenta 30 vezes desde 2006 e passa de R$ 79 milhões

    O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), construiu uma rede de empresas privadas que hoje valem mais de R$ 79 milhões….”

    https://www.congressoemfoco.com.br/noticia/29416/patrimonio-de-ministro-aumenta-30-vezes-desde-2006-e-passa-de-r-79-milhoes

  5. Sr. Pedro,

    Veja quem está no “comando” da “cueca de ouro”.?

    A Facção Criminosa está em todas, até nas “emendas”., e eles não “se emendam” e continuam a roubar…

    È a volta á cena do crime, como disse o Ladrão de Merendas..

    “..PF aponta ‘pedágio’ de 12% para repasse de emendas e cita recursos indicados por líder do governo

    Também são mencionados recursos indicados pelos deputados Eunício Oliveira (MDB-CE) e Yuri do Paredão (MDB-CE)..””

    A investigação da Polícia Federal que mira o envolvimento do deputado Júnior Mano (PSB-CE) em um suposto esquema de desvios de emendas aponta que o grupo criminoso exigia uma taxa de retorno de até 12% para que prefeituras recebessem os recursos. Além de valores destinados pelo deputado do PSB, a apuração cita cobranças referentes a emendas enviadas pelo atual líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE). Ele nega envolvimento no caso e não foi alvo da operação deflagrada nesta terça-feira.

    “…a apuração cita cobranças referentes a emendas enviadas pelo atual líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE)…”””

    Pode isso, Sr, Pedro..?

    aquele abraço

  6. Insta salientar, que a farra das Emendas Parlamentares, é de natureza supra partidária. Portanto, todos os Partidos teem direito a essa montanha de recursos públicos da ordem de mais de 60 bilhões de reais para serem usados nos currais eleitorais de suas excelências, o deputado e o senador.
    É um sistema injusto, que corrompe o processo eleitoral, porque os parlamentares de posse dessa montanha de recursos, em pleno exercício de seus mandatos, dificilmente deixarão de ser reeleitos indefinidamente. Está sacramentado o sistema de castas no Congresso.
    A falta de vergonha chegou ao absurdo, que deputados e senadores, elegem filho senador, outro filho deputado federal, a mulher senadora, o cunhado deputado federal, outros colocam na chapa tô Senador, a mãe como primeira suplente.
    E o povo, o contribuinte eleitor nessa farra do boi?
    Não sobra nada nesse banquete da elite legislativa.

  7. Inaceitável o apoio do Centrão e da oposição capitaneada pelo líder do PL, Sóstenes Cavalcante, em apoio ao tarifaço de Donald Trump, aplicado ao Brasil, na ordem de 50 por cento.

    Até o governador de SP, Tarcísio de Freitas de manhã, também bateu continência para Trump e Bolsonaro, culpando Lula pelo tarifaço. A tarde, depois de voar até Brasília para beijar a mão de Bolsonaro,Tarcísio de Freitas ao chegar a São Paulo a tarde, mudou o rumo da conversa, sob a alegação de que São Paulo será mais prejudicado pelo tarifaço, pregando conciliação. Terrível, não saber analisar os fatos, por isso essas idas e vindas ridículas.

    Caiu a ficha da oposição, que fala em Deus, Familia e Pátria. Apoiando Donald Trump, se mostraram completamente impatrióticos. Sob Deus e Família, soa como piada de salão. Os fatos não correspondem a narrativa, de nenhum desses bolsonaristas do Congresso.

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