Gigantismo estatal causa a crise que destrói a própria democracia

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Charge da Érica Aves (Arquivo Goggle)

João Pereira Coutinho
Folha

Hora da confissão: sempre que escuto a palavra “polarização” sinto vontade de puxar o revólver. E, quando escuto as explicações para essa polarização, a vontade é sacar a bazuca.

Sim, mil vezes sim: a desigualdade econômica, imigração, redes sociais e seus capangas digitais… tudo isso agravou o tom e o estilo da discussão pública. Mas democracias livres são, por definição, polarizadoras. E é bom que sejam. A nostalgia da unidade é o sonho molhado dos tiranos.

ÓDIO EXISTENCIAL – O ódio que hoje corre solto tem razões mais fundas: é um ódio existencial, como se cada eleição pusesse em risco a própria sobrevivência de metade do país. Haverá explicação para esse surto psicótico? Talvez — e mais racional do que se imagina.

O diplomata britânico David Frost, escrevendo no Daily Telegraph, oferece a hipótese mais convincente que conheço para o pensamento binário que domina a espécie: globalistas contra nacionalistas; “fascistas” contra “comunistas”; e, no contexto britânico, partidários da União Europeia contra defensores do brexit.

É o Estado, estúpido! Houve um tempo em que o governo se ocupava das funções soberanas (justiça, ordem interna, defesa), tentando ainda fornecer serviços básicos à população. O Estado não estava em todo lugar, mas tentava estar onde deveria. Isso deixava algum oxigênio para os indivíduos, que podiam tocar suas vidas sem a sombra permanente do Leviatã.

ESTADO TENTACULAR – Não mais. Vivemos em “Estados totalizantes” (não confundir com totalitários), que se expandem muito além de suas funções específicas. Não é só justiça ou segurança. Não é apenas saúde ou aposentadoria.

É economia, cultura, educação, costumes, vida privada, pensamentos íntimos —nada escapa ao Leviatã e seu desejo de controle social. O oxigênio se foi e ficou a sensação permanente de asfixia.

Moral da história? Quando tudo depende do Estado, tudo depende do acesso ao poder. Isso significa que tudo é político — até onde a política estatal tradicionalmente não entrava. Como conclui David Frost, o que está em jogo é importante demais para você não ser tragado pelo vórtice.

TESE FORTE – É uma tese forte, admito, que os números e a história reforçam. Nos últimos 150 anos, os gastos públicos no Ocidente só caminharam numa direção —para cima. Parte se explica por conjunturas (guerras, pandemias) ou por causas nobres (não pertenço à seita dos neoliberais, para quem o Estado de bem-estar é um dos cavaleiros do apocalipse).

Mas o gigantismo estatal não nasceu apenas de boas intenções. Depois da Primeira Guerra Mundial, entraram em cena os “Estados-projeto”, para usar o conceito do grande historiador Charles Maier: Estados ativistas que não se limitavam a administrar, mas se lançavam na tarefa de refazer a economia, a sociedade e a própria natureza humana de acordo com um plano ideológico.

No século 19, tivemos projetos de Estado —o Brasil pós-Independência ou a unificação alemã com Bismarck são exemplos clássicos dessa construção institucional.

DOMÍNIO TOTAL – O “Estado-projeto” é outra coisa: pressupõe a existência desses elementos (população, território, soberania, governo), mas vai muito além. Sua ambição é remodelar o cidadão com os instrumentos do Estado.

E, para desespero dos críticos, Maier lembrava: não é só coisa de ditadura. Democracias liberais também podem ser “Estados-projeto”, descontada a violência. O que define é a intenção: a decisão política de mobilizar o Estado para moldar o futuro.

De vez em quando escuto amigos reclamando da onipresença da política em suas vidas. Entendo o cansaço, a náusea mesmo, com a gritaria sem fim.

Mas essa gritaria não é tão irracional: a política, de fato, infiltra-se em tudo —até na intimidade. Quem zomba de progressistas (ou conservadores) que juram nunca namorar alguém do “outro lado” ignora que isso é apenas a consequência lógica do nosso tempo.

E AS ELEIÇÕES? – Uma eleição tampouco é apenas uma eleição —um mecanismo pacífico de trocar governantes sem derramamento de sangue, como dizia o filósofo. É a hora em que recursos colossais e instrumentos tentaculares do Estado mudam de mãos. E, se isso não é uma ameaça existencial, o que é?

A polarização poderia ser saudável —se o Estado também fosse. Mas, para tanto, seria preciso devolver o Leviatã às suas funções próprias e limitadas, longe dos delírios dos “Estados-projeto”.

Caso contrário, marcharemos de eleição em eleição no ódio existencial — até chegarmos à última.

11 thoughts on “Gigantismo estatal causa a crise que destrói a própria democracia

  1. ‘Somos admiradores do regime chinês’, diz Gilmar Mendes …

    “…PF investiga se empresa de chineses no PI era fachada para enviar barbatanas de tubarão e cavalos-marinhos como eletrônicos para SP

    Polícia encontrou duas toneladas de espécies marinhas protegidas e documentos com transações milionárias na casa dos suspeitos. A Justiça converteu a prisão dos dois em preventiva nesta sexta-feira (26).

    https://g1.globo.com/pi/piaui/noticia/2025/09/26/pf-investiga-se-empresa-de-chineses-no-pi-era-fachada-para-enviar-barbatanas-de-tubarao-e-cavalos-marinhos-como-eletronicos-para-sp.ghtml

    PS.

    Sr. Newton

    Esses vermes demônios comunistas estão destruindo nosso Páis,

    Estão nos roubando , levando nossas riquezas e ainda tem vermes demônios comunistas daqui que defendem esses lixos tóxicos…

    aquele abraço

  2. “”Contrabando de produtos chineses gera prejuízo anual de R$ 224 bilhões ao Brasil, aponta levantamento..””

    Contrabando, falsificações e pirataria produzem prejuízo de R$ 500 bilhões para a economia brasileira em 2024

    O setor audiovisual teve um prejuízo de R$ 4 bilhões. É a pirataria digital de softwares, cursos online, vídeos, músicas e filmes, vendidos sem autorização dos donos.

    “Imagina esse dinheiro sendo movimentado pelas empresas legais, o investimento que isso representaria, geração de novos empregos, a inovação que seria intensificada. De outro lado, o consumidor é prejudicado. Esse produto afeta sua saúde, a sua segurança, é um produto que não tem durabilidade porque ele não respeita norma técnica, não respeita nenhum órgão regulador. Perde a indústria, o comércio que pagam impostos, perde o consumidor, perde o erário com a brutal sonegação decorrente e cada vez mais a segurança pública é afetada, porque nós estamos fortalecendo elos criminosos que atuam no nosso país”, afirma Edson Vismona, presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade.

    https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2025/02/12/contrabando-falsificacoes-e-pirataria-produzem-prejuizo-de-r-500-bilhoes-para-a-economia-brasileira-em-2024.ghtml

    PS.

    Sr. Newton

    Como dizia o famoso Mafioso da Bahia, “Se não sair no Globo não é verdade..”””

    eh!eh!eh

    aquele abraço

  3. Sr. Newton

    O “Gigante Estatal” Demônio Comuna Xing Ling Pinga leva toda a nossa riqueza, nossos indústrias, nossos empregos, destrói a saúde do povo brasileiro, incita a violência, e ainda tem filhos de umas catapultas que ‘admiram” essa desgraça ….

    “..Invasão de produtos chineses fecha indústrias no Brasil, aponta levantamento

    No segmento de escovas, por exemplo, de 40 empresas que atuavam no mercado, apenas duas mantêm as atividades

    https://exame.com/economia/invasao-de-produtos-chineses-fecha-industrias-no-brasil-aponta-levantamento/

  4. Certo dia, um advogado levado ao poder por um presidente observou que um partido possuía muito dinheiro e poderia se perpetuar no poder mandando e desmandando. Este advogado e seus colegas de trabalho se aliaram ao grupo daquele partido e criaram a “democracia do demo”, onde seus iguais podem fazer o que quiserem, até matar ou deixar morrer quem se interpusesse ao seu projeto.

    É óbvio que muito dinheiro foi pago e gasto para o que se tem hoje.

    Consummatum est.
    O brasileiro é bom de bola, mas frouxo como homem.

  5. Artigo que mostra, como na fabula de cozinha o sapo em agua crescentemente mais quente, acostuma o a agua escaldante, antes temida

    No Brasil fomos nos acostumando a que tudo deve ser decidido pelo estado.]

    Pais estabelecendo limites aos filhos? Lá vem a punição do conselhop tutelar e até perda da guarda

    Filhos convivendo com a familia? Claro que nao. as criancas devem ser entregues aos ideologos de plantao, cada vez mais cedo. Que o digam os avós que mesmo com tempo e amor para dar, nao conseguem viver com seus netos pois aos 6 anos, devem, obrigatoriamnet ser cedidos ao estado.

    Empreender mesmo nas mais seculares atividades? Claro que nao. Qualquer contratacao de mao de obra, mesmo obdecendo regars legais gerais e negociada entre as partes, pode ser alvo de furiosos fiscais, com drones, espioes e denuncias criminosas e assim jogados a exacração publica e arruinados.

    Imprensa livre?/ Onde? Como?

    Noticias sem fakes??? Impossivel a imensa maquina estatal coopta todos e a tudo e o Brasil, parece o sonho cor de rosa.

    O filme Adeus Lenin, no Brasil, pareceria uma conto dos Irmãos Grinnn ou das fadas sonhadoras.

    o pior é que passamos os dias, sob as mais variadas razões, implorando para que o Estado resolva nosso problemas, sem pensar que a cada nova intervenção, desaparece o pouco de liberdade e auto decis~~ao que porventura ainda tenhamos

  6. Parece que a historia é diferene da contada pelo articulista que parece pregar o Estado mínimo. O Estado foi essencial para o crescimento dos países.

    E onde foi que o Estado somente se ocupou de segurança e saúde?

    O Estado Leviatã imaginado por Hobbes é mais parecido com uma ditadura, pois sugere o sufoco das liberdaes individuais. Mas o excesso de tais liberdades individuais também é prejudicial, pois amplia as desigualdades sociais.

    Para mim, a melhor ideologia política é uma democracia tipo social-democracia.

    Lembremos que o capitalismo liberal com o Estado mínmo, proposto pelo Consenso de Whashington não deu certo. Até os EUA estão tentando reverter a receita.

  7. Não consigo entender o que de fato significa o tão propagado ” gigantismo estatal ” , se o Estado Nacional Brasileiro fora reduzido ao mínimo , mas mesmo assim os arautos do estado mínimo ou mesmo sua ausência na economia se negam em largarem sua teta , extraindo-lhes até sangrar a ultima gota .

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