
Charge do Thyagão (Diário do Nordeste)
Pedro do Coutto
O Brasil vive hoje uma realidade alarmante: em média, ocorre uma tentativa de fraude digital a cada dois segundos. O dado, revelado por levantamentos da Serasa Experian e divulgado pela imprensa, dá a dimensão de um problema que deixou de ser periférico para se tornar estrutural. Mais do que números frios, essa estatística traduz um cotidiano em que cidadãos e empresas convivem permanentemente sob risco, com impactos que vão muito além das perdas financeiras imediatas.
O crescimento exponencial dessas ocorrências está associado a uma conjunção de fatores. De um lado, a sofisticação crescente das técnicas de fraude, cada vez mais amparadas pelo uso de inteligência artificial, engenharia social e perfis digitais falsos capazes de enganar mecanismos de segurança.
DEPENDÊNCIA – De outro, a fragilidade de sistemas ainda dependentes de autenticações únicas, como senhas ou códigos enviados por SMS, que já não são suficientes diante de métodos cada vez mais avançados de falsificação. Some-se a isso a cultura de compartilhamento indiscriminado de dados e a dificuldade das instituições de acompanhar, em velocidade e escala, a engenhosidade dos criminosos digitais.
Os setores mais visados são bancos, financeiras e empresas de telefonia, mas a vulnerabilidade é generalizada. Fraudes envolvendo documentos adulterados, biometria facial falsificada e inconsistências cadastrais são cada vez mais comuns. O alvo preferencial dos fraudadores está na faixa etária de 26 a 50 anos, mas ninguém está imune: jovens e idosos também aparecem nas estatísticas, sobretudo quando menos familiarizados com práticas de segurança online.
ATAQUES – Geograficamente, o Sudeste concentra a maior parte dos ataques, mas Norte e Nordeste registram crescimento proporcional mais acelerado, o que reforça que o problema se espalha pelo território de forma desigual.
O impacto não se limita a prejuízos individuais. A proliferação de fraudes corrói a confiança no ambiente digital, eleva os custos de compliance das empresas e amplia desigualdades, já que os mais vulneráveis têm menos recursos para se proteger.
Além disso, abre espaço para efeitos políticos e sociais graves, pois a manipulação de identidades digitais e a captura de dados sensíveis podem ser usadas para disseminar desinformação, financiar atividades ilícitas e até fragilizar a democracia. O risco de que a fraude se torne ferramenta de manipulação política é real e já foi observado em diferentes contextos internacionais.
DESCOMPASSO – Apesar de avanços como a Lei Geral de Proteção de Dados e o uso de autenticação em camadas, ainda há um descompasso entre a velocidade com que o crime digital evolui e a resposta institucional. Falta integração entre órgãos públicos, empresas e forças de segurança, bem como uma estratégia nacional de segurança cibernética capaz de coordenar esforços e estabelecer padrões mínimos de proteção. A responsabilização efetiva de fraudadores também é um desafio, especialmente quando atuam de fora do país ou escondidos em redes anônimas.
Diante desse quadro, a saída passa por medidas múltiplas e simultâneas: ampliar a educação digital de forma massiva, transformar a segurança cibernética em política de Estado, criar regulações mais ágeis e transparentes e incentivar soluções tecnológicas acessíveis. É preciso também exigir mais das empresas quanto à transparência de incidentes e oferecer mecanismos rápidos de reparação às vítimas.
O dado de uma fraude a cada dois segundos não pode ser visto apenas como uma estatística de impacto. Ele é o retrato de uma guerra silenciosa em curso, na qual a proteção do cidadão comum depende de escolhas coletivas e institucionais. Proteger dados e transações significa proteger a dignidade digital, a confiança no mercado e a própria saúde democrática do país.
Há “dendos”, em:
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É o retrato 3×4 do Brasil. O maior exemplo vem de Brasília.