
Glauber faz greve de fome e dorme no Conselho de Ética
Fabiano Lana
Estadão
De um lado, a cabeleireira Débora Rodrigues. Ela pode ser condenada a 14 anos de prisão por tentativa de golpe de estado e de abolição do Estado de direito. Mas ficou conhecida mesmo pela pichação com batom da frase “Perdeu, Mané”, na estátua de João Ceschiatti localizada em frente à sede do Supremo Tribunal Federal, que representa a Justiça (há bastantes imagens).
A acusada alega que não participou da depredação das instalações das sedes de três poderes no infortunado dia 8/1 de 2023 (parece não haver imagens).
CASSAÇÃO – Do outro lado, o deputado Glauber Braga, do PSOL do RJ. Sua cassação foi aprovada por 13 votos a 5 no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados esta semana. Ele pode ser punido pela agressão física a um militante do Movimento Brasil Livre (MBL) ocorrido em 2024 (há um vídeo com o ocorrido). Glauber tem alegado que está sendo punido não pelo que fez, mas por sua postura usual de enfrentamento, inclusive contra o todo-poderoso ex-presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-PB). O caso vai ao plenário.
Enquanto isso, o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) permanece na câmara dos deputados, em Brasília, em greve de fome. Parecem situações distintas. Mas a estrutura é bastante parecida.
Em ambos, há a suspeita de que a proposta de pena tenha sido desproporcional à infração cometida. Que a vingança é o que move os algozes, tanto no STF quanto no Congresso. Que ambos, Débora e Glauber, pagarão não só pelo que fizeram, mas pelo que representam.
LADOS RADICAIS – Há também uma diferença fundamental aí. Em geral, percebam, quem quer a anistia para a cabeleireira espera a cassação de Glauber. E quem quer a absolvição de Glauber, quer que a cabeleireira seja punida por mais de uma década.
A suspeita, como desconfiava um pensador do século 19 como Friedrich Nietzsche, é que mesmo os sentimentos de indignação moral e de justiça se subordinam aos nossos afetos, às nossas preferências pessoais. E na política a questão se exacerba.
Em outras palavras. Se o sujeito não é da minha simpatia, não é da minha ideologia, não pertence ao grupo político que eu me identifico, que se opõe ao que acredito, mesmo que seja apenas no campo das ideias, não ligo tanto para que ele seja punido. Aliás, posso torcer até que ele tenha um castigo rigoroso. Mas se a pessoa for de um grupo com o qual tenho afinidades, que se opõe ao que me oponho, e por aí vai, minha tendência é não querer sua punição. Quero, na verdade, sua absolvição, sua anistia.
DESEQUILIBRIO SOCIAL – Noções como justiça e equilíbrio, no dia a dia das pessoas, ficam em segundo ou terceiro plano frente aos sentimentos envolvidos.
É dessa maneira que as pessoas funcionam, incluindo os grupos sociais, as nações: em bando. A individualidade não é um artigo apreciado nem em pensamento. O risco ocorre quando o desequilíbrio passa a dominar as instituições. Quando os critérios objetivos não parecem mais valer nas entidades que deveriam cuidar disso.
Assim, Glauber e Débora, em seus âmbitos específicos, podem ser penalizados com sanções maiores do que as recebidas por um assassino. É justo? Lembrando que no Código Penal a pena é de seis a vinte anos. E, no caso da Câmara, há suspeitos de homicídio que não tiveram seu caso nem analisado ainda pelo Conselho de Ética. Vivemos tempos de desequilíbrio e paixão.