Hélio Schwartsman
Folha
No Reino Unido, os religiosos desempenharam um papel importante na luta contra a escravidão. Nos EUA, não. Ou melhor, houve um primeiro pico de circulação de ideias abolicionistas, ainda no século 18, para o qual grupos religiosos como os quakers contribuíram, mas o movimento não foi para a frente e a religião acabou se tornando no século 19 uma força majoritariamente pró-escravidão. Pior, os donos de escravos religiosos eram, nas palavras do abolicionista Frederick Douglass, ele próprio um ex-escravo, muito piores que os menos religiosos. Por que a diferença?
O filósofo Matthew Stewart explica isso e muito mais em “An Emancipation of the Mind” (Uma Emancipação da Mente). Os americanos sempre foram mais fundamentalistas que os britânicos.
SOBRE A BÍBLIA – No novo mundo o debate não se deu entre diferentes concepções éticas, mas como uma discussão sobre se a Bíblia, tida como última palavra em moral, autoriza ou não a escravidão. E não há hermenêutica que transforme a Bíblia num livro que condene a escravidão, nem o antigo nem o novo testamento.
Os abolicionistas americanos tiveram assim de buscar outras fontes para alimentar suas posições. E as encontraram no idealismo alemão, especialmente em algumas de suas figuras mais radicais, como Ludwig Feuerbach e David Friedrich Strauss.
Houve um grupo de abolicionistas tão ligados ao pensamento crítico alemão que hoje são conhecidos como “hegelianos de Ohio”.
LINCOLN E MARX – Não foi algo restrito a intelectuais. Por meio do próprio Douglass e de Theodore Parker, um clérigo unitarista que foi praticamente excomungado após negar os milagres bíblicos, essas ideias chegaram a um então jovem político que se tornou ávido leitor de todos esses autores, Abraham Lincoln.
Stewart conta em detalhes essas e várias outras histórias, incluindo a de uma carta que Karl Marx escreveu para Lincoln, de quem era admirador.
Filósofos às vezes provocam resultados práticos.
Excelente postagem.Como é bom ler artigos assim.Nada da monotonia sobre Lula e Bolsonaro.