
Conflito ultrapassou os limites do direito humanitário
Marcelo Copelli
Revista Visão (Portugal)
Em Gaza, onde a fome e a guerra se entrelaçam diariamente, até a ajuda humanitária é impedida de chegar. O bloqueio a um comboio marítimo internacional que transportava alimentos e medicamentos para o território sitiado não pode ser tratado como um mero incidente naval. Representa, antes, a evidência de um conflito que há muito ultrapassou os limites do direito humanitário e que coloca em xeque a própria credibilidade do sistema multilateral.
De acordo com a IV Convenção de Genebra (1949), em particular os artigos 33 e 55, é proibida a punição coletiva e deve ser garantido o abastecimento de alimentos e medicamentos à população civil em territórios sob ocupação ou cerco. A destruição sistemática de infraestruturas vitais, a limitação do acesso a bens essenciais e a obstrução da assistência humanitária constituem violações flagrantes dessas disposições.
“CRIMES DE GUERRA” – Relatores especiais das Nações Unidas já utilizaram termos como “crimes de guerra” e “crimes contra a humanidade” para descrever as práticas em curso, reforçando a gravidade jurídica da situação. Israel justifica o bloqueio com razões de segurança, mas a desproporcionalidade das medidas adotadas adquire uma dimensão punitiva que ultrapassa qualquer ameaça militar concreta.
O direito humanitário estabelece o princípio da proporcionalidade como requisito fundamental em conflitos armados: a ação militar não deve provocar danos excessivos aos civis em comparação com a vantagem militar prevista. Contudo, relatórios recentes do Office for the Coordination of Humanitarian Affairs da ONU (OCHA), da Cruz Vermelha e da Human Rights Watch apontam para um quadro devastador: mais de 70% da população enfrenta insegurança alimentar grave, hospitais estão em colapso e milhares de crianças sofrem de desnutrição aguda. Esses efeitos não são colaterais inevitáveis — são resultados previsíveis de políticas deliberadas.
A responsabilidade não recai apenas sobre Israel. A comunidade internacional tem falhado em agir. No Conselho de Segurança, resoluções que pediam a abertura de corredores humanitários e a cessação imediata do bloqueio foram sistematicamente vetadas pelos Estados Unidos.
BLOQUEIO – A proteção diplomática oferecida por Washington contribui para a perpetuação de crimes de guerra, ao inviabilizar mecanismos de responsabilização independentes. Ao bloquear tais instrumentos, os EUA afastam-se da sua própria retórica de defesa de uma ordem baseada em regras, aplicando um duplo critério que mina a sua legitimidade como potência normativa.
Na Europa, a contradição é igualmente gritante. Apresentando-se como guardiã do multilateralismo e das normas globais, limita-se a declarações de preocupação, incapaz de transformar indignação em medidas concretas — seja na revisão de acordos comerciais, seja na imposição de sanções ou na pressão diplomática.
A União Europeia cai, assim, numa contradição profunda: é rápida e firme em determinados contextos, mas permanece resignada quando se trata de Israel. Essa seletividade mina a sua autoridade moral e reforça a percepção de que os princípios universais são invocados apenas quando servem interesses estratégicos.
EFEITOS – Essa omissão tem efeitos corrosivos. Ao tolerar práticas que configuram violações graves do direito humanitário, os Estados e instituições que se proclamam defensores da ordem global acabam por transmitir a mensagem de que certos países podem agir acima da lei quando apoiados por aliados poderosos. Tal precedente fragiliza não só a arquitetura jurídica construída após a Segunda Guerra Mundial, mas também a confiança dos povos no valor universal dos direitos humanos.
É neste contexto que a interdição dos navios de ajuda humanitária assume um significado ainda mais perturbador. Não se trata de um episódio isolado, mas da demonstração de que até a assistência vital — princípio basilar protegido pelas Convenções de Genebra — foi transformada em arma de guerra. Impedir a chegada de socorro essencial a uma população sitiada é a tradução mais cruel de uma política que pune civis pela sua simples sobrevivência.
HESITAÇÃO – O bloqueio ao comboio marítimo rumo a Gaza é o retrato de uma ordem mundial que hesita em proteger a dignidade humana. O silêncio europeu, cristalizado pela inação, transforma-se em cumplicidade. Já os Estados Unidos, com o seu apoio incondicional a Israel, reforçam a percepção de que o Ocidente deixou de estar comprometido com valores universais, servindo apenas aos seus interesses imediatos.
Se a Europa continuar a calar-se perante Gaza, não será apenas Gaza a morrer. Será também a própria ideia de uma ordem internacional fundada no direito e na humanidade.
Se a Europa fosse uma só mulher, autista, Greta Thunberg, faria a diferença.
A verdade é que os autistas sentem muita empatia, que demonstram em atitudes. São a mais pura emoção humana, sinceridade, transparência, mas não conseguem se comunicar.
São o extremo oposto dos psicipatas:
Charmosos, convincentes, grandes comunicadores, que enganam meio mundo.
Expressam tudo, para manipular, mas não sentem nada.
O silêncio dos neurotípicos é um misto de indiferença e de covardia.
Dos reféns ninguém fala mais . Até os KAPOS boa esqueceram .
* Um kapo era um prisioneiro em um campo de concentração nazista designado pelos guardas da SS para supervisionar as atividades de turmas de trabalho forçado dentro e fora dos campos ou executar tarefas administrativas.
IA
Haverá um momento em que aqui no RJ haverá o confronto “Comunidades vs Os outros” (uma outra versão do nós contra eles). Todavia, muitos agora que tomam partido seja pró Israel ou pró Hamas já não mais estarão vivos para sustentar a posição atual.
Segundo li, não lembro se no Cláudio Humberto, quando os militares israelenses foram resgatar a tão falada ajuda para destiná-la aos famintos de Gaza, não encontraram nada.
Uai, mais cedo fiz ligeiro comentário sobre o autor. Não creio que o espaço mais eclético e democrático da mídia pindoramense o tenha eliminado. Jamais ousaria pensar em censura. Portanto, peço vênia ao estimado e admirado editor para repetí-lo, em outras palavras.
Vamos lá: toma tenêcia, seu Copelli. Além de ser expressar mal, fá-lo (!) por perspectiva absolutamente esdrúxula.
Vamos respeitar os articulistas, amigo De Marco. Discordar é uma coisa; esculhambar, outra muito diferente. Você é uma pessoa de educação esmerada, precisa dar o exemplo.
Abs.
CN
Estimado CN, de forma alguma “esculhambei” alguém. Já disse e repito que o que me interessa mesmo na TI são suas NRs que, aliás, estão mais raras. Uma pena. O restante, com raríssimas excessões, a mim nao causam emoção alguma. Esperando que o amigo esteja bem, envio um grande e humilde abraço.