Carlos Newton Charge do Laerte (Folha)
Perto dos 81 anos, tornei-me um jornalista descrente. Constatei que aqui no Brasil a imprensa pode denunciar o maior escândalo e isso não significa nada, ninguém é punido. Chega a ser frustrante. Vou dar um exemplo. Recentemente, noticiamos, com absoluta exclusividade, que a ONG espanhola OEI (Organização dos Estados Ibero-Americanos) não poderia estar funcionando aqui, porque nenhum presidente brasileiro assinou tratado nesse sentido.
O único tratado assinado com a OEI, na década de 50, foi firmado por Maurício Montojos, um mero funcionário do Ministério da Educação, e não tem o valor de uma nota de três dólares, porque o presidente da República não pode delegar poderes a ninguém para assinar tratado internacional, nem mesmo à dona Janja, que em 2023 aceitou ser “coordenadora” da OEI, que subitamente passou a faturar cerca de R$ 1 bilhão em contratos com governos federal, estaduais e municipais, sempre sem licitações.
ÚNICA SAÍDA – Outros escândalos explodem diariamente na imprensa, porém não têm seguimento, as autoridades fingem que não leram, como as denúncias de Consuelo Dieguez esta semana na revista “piauí” sobre o Banco Master. Nenhuma autoridade se interessa a fundo, nenhum político verdadeiramente corre atrás. É raro fazer acontecer, como ocorreu na Lava Jato.
No caso da OEI, houve as primeiras denúncias na CNN, depois aqui na Tribuna da Internet, na Folha de S. Paulo e em outros jornais, mas os espanhóis continuam aplicando impunemente golpes sobre golpes no Brasil. Compreendi, então, que o único caminho é alertar pessoalmente às autoridades, para ver se elas acordam, até porque o almirante Barroso esperava que cada brasileiro cumprisse seu dever.
Resolvi que a partir de agora, vou fazer o seguinte: além de publicar a matéria, comunicarei o assunto diretamente às próprias autoridades. Como primeira experiência, escolhi o caso do Banco Master, porque disponho de informações complementares que não saíram nas matérias da grande imprensa.
ESCLARECIMENTOS – Assim, estou encaminhando representações e pedidos de esclarecimentos a três autoridades – João Pedro Barroso do Nascimento, presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM); Cristiano Cozer, procurador-geral do Banco Central; e Lucas Furtado, subprocurador-geral do TCU – sobre irregularidades na operação de compra de 58% do Master pelo Banco de Brasília (BRB).
A aquisição, aprovada pelo Conselho do BRB em 28 de março, envolveu a ilusória fatia majoritária do capital do Master (100% das ações preferenciais, mas apenas 49% das ações ordinárias com direito a voto), mantendo assim o controle com o irresponsável empresário Daniel Vorcaro, que gastou R$ 15 milhões na festa da filha e se orgulha de investir pesado na sociedade financeira do Atlético Mineiro…
É óbvio que se trata de uma falsa sociedade anônima, pois Vorcaro vai vender 100% das ações preferenciais, que existem para serem oferecidas ao mercado, Avaliada em R$ 2 bilhões, a operação de salvamento do banco ainda aguarda aval dos reguladores e levantou preocupação no mercado e entre órgãos de controle, devido ao risco que representa ao Sistema Financeiro Nacional.
IRREGULARIDADES – Segundo apurou a Tribuna da Internet, a negociação violou diversas normas de governança e transparência.
Por exemplo, investigações preliminares já indicam que a decisão do BRB de comprar o Banco Master não passou por assembleia de acionistas nem obteve autorização prévia da Câmara Legislativa do Distrito Federal, apesar de envolver uma instituição financeira pública.
O Ministério Público Federal, inclusive, instaurou no início de abril uma apuração de irregularidades na venda do Master, em função da seriedade das suspeitas levantadas.
SEM BALANÇO AUDITADO – Nos ofícios enviados às autoridades, apresentamos fundamentação jurídica robusta para embasar as denúncias. Um dos pontos centrais é a ausência de demonstrações financeiras auditadas quando houve a aprovação da compra pelo conselho do BRB. Na prática, isso significa que o negócio de R$ 2 bilhões foi chancelado sem que estivessem disponíveis balanços auditados recentes do Master, documentos indispensáveis para avaliar com precisão a saúde financeira e o valor real da instituição adquirida.
Vale lembrar que o preço acertado corresponde a 75% do patrimônio líquido consolidado do Banco Master, cálculo que deveria ser feito com base em números auditados – o que levanta a questão se tal avaliação foi feita de forma adequada antes da aprovação do Conselho.
Aprovar a operação sem esses dados configura falha de procedimento que fere princípios de diligência e prudência na gestão pública financeira.
SEM AUTORIZAÇÃO – Outra irregularidade é a infração à Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016). Por se tratar de uma sociedade de economia mista (BRB) que adquire participação em uma instituição privada, é necessário haver autorização específica – seja dos acionistas, seja do poder público controlador – antes de concluir o negócio.
E a nebulosa transação também não foi submetida a prévia autorização legislativa, condição que especialistas consideram obrigatória nesse caso, conforme a Constituição Federal e a própria Lei das Estatais.
Um parecer técnico da Câmara Legislativa do DF já havia concluído recentemente que a compra do Banco Master deveria ter passado pelo crivo dos deputados distritais, pois a exceção prevista na Lei das Estatais permite certas aquisições alinhadas ao plano de negócios e aprovadas apenas pelo Conselho, mas não abarca uma operação desse vulto e impacto estratégico.
FORA DA LEI – Além disso, promotores do Distrito Federal alertaram que até o momento não existe lei autorizando o BRB a adquirir parte de uma empresa privada, conforme exigem a Constituição e a Lei Orgânica do DF.
Esses pontos jurídicos reforçam a tese de falhas de governança e violação de normas legais na condução do negócio, que somente poderá ser fechado se não houver tantos descuidos e favorecimentos.
Assim, estou encaminhando o material nesta segunda-feira, dia 5, às três autoridades mencionadas, para mostrar que a mídia pode ter uma atitude proativa, sublinhando não somente sua função de observar e fiscalizar, mas também como agente ativo na proteção da moralidade administrativa e do interesse público.
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P.S. – Ando meio ocupado, mas estou pensando em apresentar também ações populares à Justiça sobre graves irregularidades administrativas que passam em branco. Se algum escritório de advocacia estiver interessado, por favor entre em contato conosco. (C.N.)