Ação contra Moro é inócua, sem base legal e pode reverter contra os deputados do PT

Moro assume cargo de diretor em empresa norte-americana de consultoria

Se Sérgio Moro quiser, pode processar os deputados do PT

Jorge Béja

A Ação Popular que alguns deputados do Partido dos Trabalhadores deram entrada contra o ex-juiz federal Sérgio Moro, com pedido de indenização por danos patrimoniais e morais, é de uma insensatez, de uma bizarrice e de tamanha ignorância e teratologia jurídica que custa crer que seja verdade mesmo. Mas é.

O juiz já recebeu a petição da esdrúxula ação e determinou a citação de Moro para apresentar defesa. Poderia até tê-la indeferido de plano, exarando, desde logo, sentença terminativa do feito, por inépcia, por impropriedade da ação escolhida, pela ilegitimidade processual passiva de Sérgio Moro e por muitas outras razões legais.

TUDO ERRADO – Ação Popular contra quem já foi e não é mais agente público? Onde já se viu isso? O artigo 6º da velha ação popular (Lei 4717/1965), indica que apenas “autoridades, funcionários ou administradores públicos” é que podem ser alvo da referida ação.

Quem já foi – como é o caso de Moro – perde a legitimidade para figurar no polo passivo desta ação. Erro primário, portanto.

Além disso, a responsabilidade civil de um juiz, isto é, o dever de indenizar, por decisões que adota no processo que preside e julga, só existe nos casos de dolo ou fraude de sua parte quando, sem justo motivo, recusar, omitir ou retardar medidas que deve ordenar de ofício ou a requerimento da parte ….quando proceder com dolo ou fraude, conforme está previsto no artigo 143 do Código de Processo Civil.

IGNORÂNCIA – Quanta tolice dos deputados do PT! Ignoram que as decisões de Moro, quando à frente da 13ª Vara Federal de Curitiba, foram revistas, no mínimo por mais 8 magistrados que lhe eram superiores: 3 do Tribunal Regional Federal do Rio Grande do Sul e mais 5 do Superior Tribunal de Justiça. Isso sem contar os ministros do Supremo Tribunal Federal, que julgaram recursos no tocante às decisões de Moro.

Mas o juiz que acolheu a petição inicial desta tresloucada Ação Popular contra Moro e determinou a citação do ex-juiz para se defender, o magistrado abriu a oportunidade para que Moro, na contestação, faça uso do instrumento processual denominado Reconvenção.

Não há reconvenção em ação popular. No entanto, como o juiz aceitou essa ação totalmente irregular e fora do eixo, pode estar abrindo a possibilidade de Moro reconvir, passa de réu a autor. Numa só ação seriam embutidas duas: a dos deputados do PT contra Moro e a de Moro contra esses parlamentares.

DIZ O CÓDIGO – O instituto da Reconvenção é antiquíssimo. Atualmente está previsto a partir do artigo 343 do Novo Código de Processo Civil:

“Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa”. Indaga-se: e se os deputados do PT, amedrontados com a reconvenção que poderá culminar com a condenação deles a pagar vultosa indenização a Moro, desistirem da ação diante do medo?

A resposta é: não podem desistir mais. Os deputados terão de sofrer as consequências de sua iniciativa insana:

NA FORMA DA LEI – “A desistência da ação ou a ocorrência de causa extintiva que impeça o exame de seu mérito não obsta ao prosseguimento do processo quanto à reconvenção” (CPC, artigo 343, parágrafo 2º).

É quase certo que esta previsão (que não é astrológica, e sim fundada na experiência de mais de 40 anos de militância advocatícia exclusivamente neste ramo do direito “Direito das Obrigações – Reparação de Danos”) certamente pode acontecer. Seria a primeira reconvenção em ação popular. Moro tem imensa cultura jurídica para fazê-lo. E os deputados do PT que  tratem de arranjar dinheiro – e muito dinheiro – para pagar indenização a Sérgio Moro.

Multas que Moraes aplica a Silveira são ilegais, assim como o bloqueio dos bens do deputado

Moraes pede à PGR que se manifeste sobre descumprimento de ordem judicial  por Daniel Silveira - Brasil 247

Moraes usa equivocadamente o Código de Processo Civil

Jorge Béja

Como advogado, com mais de 40 anos de militância, me sinto mal, irritado, inconformado, afrontado, diante das anomalias que o ministro Alexandre de Moraes, em seu nome e em nome da corte que integra (Supremo Tribunal Federal), vem cometendo contra o deputado Daniel Silveira, que não é nenhum santo.

Mas não será pela falta de santidade do deputado que o ministro poderá subjugar Silveira ao que não é legal. E das muitas anormalidades (barbaridades, mesmo) cometidas, hoje vamos tratar aqui apenas de uma delas – as espantosas multas.

PENA INEXISTENTE – Como todos sabem, o relator do processo vem impondo a Silveira multa diária por descumprir a determinação de utilizar tornozeleira.

Moraes, Moraes, será que o senhor ministro não sabe que nas leis penais não existe a pena de multa diária – que os franceses chamam de “astreinte”? O senhor ministro também não sabe que multa é pena, é punição, é condenação, acessória ou não, para quem cometeu crime ou contravenção penal? E que pena de multa – que é de valor fixo e não pode ser imposta de forma diária – só pode ser cobrada depois que a sentença for definitiva, conforme reza o Código de Processo Penal?

“Artigo 686, CPP – A pena de multa será paga dentro em dez dias após haver transitado em julgado a sentença que a impuser”.

NO PROCESSO CIVIL – Ao impor ao deputado multa diária, o ministro Moraes está aplicando disposição que não existe nas leis penais, mas apenas e exclusivamente no Código de Processo Civil.  Somente no âmbito cível – em causas cíveis, portanto, e nunca em causas penais – é que a lei prevê a pena de multa por dia de atraso no cumprimento de obrigação de fazer, ou não fazer, e de entregar coisa certa. A conferir:

Código de Processo Civil – “Artigo 814 – Na execução da obrigação de fazer ou de não fazer…o juiz ao despachar a petição inicial fixará multa por período de atraso no cumprimento da obrigação e a data a partir da qual será devida

“Artigo 806 – O devedor de obrigação de entregar coisa certa será citado para, em 15 dias, satisfazer a obrigação…”

“Parágrafo 1º – Ao despachar a petição inicial, o juiz poderá fixar multa por dia de atraso no cumprimento da obrigação, ficando o respectivo valor sujeito a alteração, caso se revele insuficiente ou excessivo”.

SEM ANALOGIA – Não seria justificável se o senhor Ministro invocasse a analogia para utilizar, no processo penal, regras e disposições existentes somente no processo civil. Isto porque o processo penal trata e cuida, explicitamente, da pena de multa, acessória ou principal, e como ela, a pena de multa, deve ser cobrada.

Portanto, quando a lei processual penal cuida de determinada questão que a lei processual também cuida, não cabe a analogia, que é somente aplicável quando a lei processual penal for totalmente omissa a respeito, o que não é o caso.

Conclusão: todas essas multas que o ministro Moraes vem impondo ao deputado Daniel Silveira são nulas. De nada valem. É mais outro forte motivo que compromete a legalidade do processo aberto no STF contra Silveira.

BLOQUEIO ILEGAL – Para terminar, por hoje: o ministro Moraes também não pode determinar bloqueio de bens do deputado, com a finalidade do pagamento da multa. Isto porque o Código de Processo Penal, como visto e transcrito acima (artigo 686) cuida dessa questão e indica como o juiz deve proceder para cobrar o valor de multa imposta a quem for condenado a pagá-la.

O STF e seus ministros não são juízes de execução. Lá é uma Corte Recursal. Em matéria constitucional, a última corte. E na eventualidade da Corte expedir uma ordem, excepcionalíssima que seja, o STF é obrigado a emitir Carta de Ordem ao juiz competente da primeira instância para cumprir o que for determinado. E nada disso vem ocorrendo no processo contra o referido deputado. Neste embate, STF X Silveira, o relator assumiu o poder e a competência para resolver tudo, tudo e tudo.

Comissão de Ética do Planalto é uma peça de ficção, não vale nada, absolutamente nada…

Conselheiro acusa Comiss o de tica da Presid ncia de favorecer ao governo

Charge do Nani (nanihumor.com)

Jorge Béja

A matéria do Estadão sobre o discurso presidencial nesta segunda-feira, dia 16, repleto de gritos e palavrões, reproduzida na Tribuna da Internet, é uma das incontáveis provas de que, desde 1º de Janeiro de 2019, tudo que era necessário e bom para o Brasil deixou de existir ou retrocedeu consideravelmente.

Antes, vigorava o chamado “Código de Ética da Presidência e da Vice-Presidência da República”. Instrumento legal que impunha normas de condutas do chefe do governo e a seu vice. Até seria desnecessário sua edição. Mas o que abunda não prejudica, ainda mais quando diz respeito ao comportamento do presidente, que representa toda a população brasileira.

ÚTIL E NECESSÁRIO – O referido Código foi criado pelo Decreto nº 4081, de 11.01.2002. Tudo nele era útil e necessário, a começar pelo artigo 4º, nº II, que obriga o presidente e o vice presidente da República “a manter clareza de posições e decoro, com vistas a motivar respeito e confiança do público em geral”.

Traduz-se, claramente, que a falta de decoro (e aí pode-se acrescentar inúmeros outros substantivos tais como decência, pudor, elegância, fidalguia…) produz efeito contrário no povo em geral, no eleitor, nos brasileiros.

Infelizmente, em 27.06.2019, subscrito pelo presidente em exercício Antonio Hamilton Martins Mourão, vice-presidente do Brasil, aquele Código de Ética foi revogado. Deixou de existir. E no seu lugar, o vice assinou o Decreto nº 9895 cuja finalidade é exclusivamente a criação da Comissão de Ética da Presidência da República. São apenas 10 artigos que estabelecem composição e normas de funcionamento desta tal “Comissão” da qual nunca se ouviu falar nem agir.

UMA NAU SEM RUMO – Curioso é a existência de uma “Comissão de Ética” sem um Código, sem uma norma, sem um diploma que estabeleça sobre os princípio da Ética, cuja “Comissão” tem a incumbência de investigar e concluir se a Ética foi ou não ferida pelos ocupantes da presidência e da vice.

Há um vazio, uma lacuna que precisa voltar a ser preenchida. O Código de Ética dos Agentes Públicos em exercício na Presidência e Vice Presidência da República, como assim era chamado desde a sua criação em 2002, foi expressamente revogado em 2019 por Hamilton Mourão, ao criar a Comissão de Ética. Tem-se, portanto, um diploma legal que cria e estabelece como deve agir a Comissão de Ética da Presidência da República sem, contudo, existir o Código de Ética.

É a mesma coisa que existir — como sempre existiu — um Código de Processo Penal, um Código de Processo Penal Militar e um Código de Processo Civil, sem existir, ao mesmo tempo, um Código Penal, um Código Penal Militar e um Código Civil. Seu valor equivale a zero. Não vale nada, absolutamente nada.

Não é possível que o STF declare inelegibilidade de Daniel Silveira, seria um erro judiciário

Por que Alexandre de Moraes virou a 'bola da vez' dos ataques de Bolsonaro - BBC News Brasil

Moraes erra, ao insistir na inelegibilidade de Daniel Silveira

Jorge Béja

A respeito do recente decreto presidencial que concedeu a Graça ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), muito tem se especulado, há um tiroteio intenso na imprensa e na internet, atingindo inclusive os sites especializados em temas jurídicos, mas devemos assinalar que a questão é outra, bem diferente e até aqui não foi levada em consideração.

É princípio do Direito Universal que o acessório segue o destino do principal. Isso se aplica a qualquer ramo do Direito. No caso da extinção da punibilidade com a concessão da Graça e sendo esta (a Graça) o principal, é preciso entender que a inelegibilidade, que é o acessório, deixa de existir, eis que, como pena acessória, segue o destino daquela condenação principal.

Quanto à Graça, a pessoalidade é a sua marca, o seu fundamento. Não pode existir decreto de Graça que seja impessoal, isto é, que tenha a marca constitucional da impessoalidade, visto que a Graça é concedida a determinada pessoa que o Presidente da República escolhe…

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
 – Como dizia o célebre Luiz de Camões, que com um olho só enxergava mais do que os intelectuais da época, “cesse tudo o que a Musa antiga canta, que outro valor mais alto se alevanta”. E neste caso o “outro valor mais alto” é a voz de um jurista de verdade, como Jorge Béja, que foi o grande influenciador do Código de Defesa do Consumidor e das modernas leis brasileiras que regulam as indenizações por perdas e danos. O Brasil deve muito a Jorge Béja, repita-se “ad nauseam”, como dizem os advogados.

E justamente agora, no meio dessa confusão institucional, surge a voz abalizada de Jorge Béja para clarear e esclarecer a nebulosa polêmica sobre as punições ao deputado Daniel Silveira. Em poucas palavras, direto ao ponto, o eminente jurista mostra que está totalmente equivocada a tese do ministro Alexandre de Moraes sobre a suposta inelegibilidade de Daniel Silveira. E Béja desmonta a acusação de que o perdão ao deputado teria a mácula da impessoalidade constitucional. Nessa era de trevas, podemos dizer que falta um Jorge Béja ao Supremo, para iluminar aquela “escuridão perpétua”, como diria o filósofo inglês Samuel Johnson (1709/1784), aquele que dizia que “o patriotismo é o último refúgio do canalha”. (C.N.)

Não é possível que o STF declare inelegibilidade de Daniel Silveira, seria um erro judiciário

Por que Alexandre de Moraes virou a 'bola da vez' dos ataques de Bolsonaro - BBC News Brasil

Moraes erra, ao insistir na inelegibilidade de Daniel Silveira

Jorge Béja

A respeito do recente decreto presidencial que concedeu a Graça ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), muito tem se especulado, há um tiroteio intenso na imprensa e na internet, atingindo inclusive os sites especializados em temas jurídicos, mas devemos assinalar que a questão é outra, bem diferente e até aqui não foi levada em consideração.

É princípio do Direito Universal que o acessório segue o destino do principal. Isso se aplica a qualquer ramo do Direito. No caso da extinção da punibilidade com a concessão da Graça e sendo esta (a Graça) o principal, é preciso entender que a inelegibilidade, que é o acessório, deixa de existir, eis que, como pena acessória, segue o destino daquela condenação principal.

Quanto à Graça, a pessoalidade é a sua marca, o seu fundamento. Não pode existir decreto de Graça que seja impessoal, isto é, que tenha a marca constitucional da impessoalidade, visto que a Graça é concedida a determinada pessoa que o Presidente da República escolhe…

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
 – Como dizia o célebre Luiz de Camões, que com um olho só enxergava mais do que os intelectuais da época, “cesse tudo o que a Musa antiga canta, que outro valor mais alto se alevanta”. E neste caso o “outro valor mais alto” é a voz de um jurista de verdade, como Jorge Béja, que foi o grande influenciador do Código de Defesa do Consumidor e das modernas leis brasileiras que regulam as indenizações por perdas e danos. O Brasil deve muito a Jorge Béja, repita-se “ad nauseam”, como dizem os advogados.

E justamente agora, no meio dessa confusão institucional, surge a voz abalizada de Jorge Béja para clarear e esclarecer a nebulosa polêmica sobre as punições ao deputado Daniel Silveira. Em poucas palavras, direto ao ponto, o eminente jurista mostra que está totalmente equivocada a tese do ministro Alexandre de Moraes sobre a suposta inelegibilidade de Daniel Silveira. E Béja desmonta a acusação de que o perdão ao deputado teria a mácula da impessoalidade constitucional. Nessa era de trevas, podemos dizer que falta um Jorge Béja ao Supremo, para iluminar aquela “escuridão perpétua”, como diria o filósofo inglês Samuel Johnson (1709/1784), aquele que dizia que “o patriotismo é o último refúgio do canalha”. (C.N.)

Erro de redação pode exigir republicação do decreto que beneficiou Daniel Silveira

O que é a graça constitucional, que Bolsonaro concedeu a Daniel Silveira | Política | G1

Assessoria do Planalto errou ao redigir o decreto

Jorge Béja

Juristas de renome estão comentando o Decreto de 21.04.2022 que o presidente Bolsonaro assinou concedendo o benefício da graça ao deputado federal Daniel Silveira, condenado, no dia anterior (20/4), a 8 anos e 9 meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal.

São comentários fecundos, eruditos e didáticos, para advogados e leigos em Direito. É a notícia do dia e que vai perdurar por muito tempo ainda, em consequência dos desdobramentos que virão.

NULO E SEM VALOR – Aproveita-se dos comentários a cultura e o saber que transmitem, sobre graça, indulto e anistia, institutos jurídicos com definições e aplicações próprias e distintas. Isto porque advogados e juristas estão comentando sobre decreto presidencial sem darem conta de que o ato possa ser inválido, nulo e sem valor jurídico.

Tudo por causa de um descuido na redação. Descuido grave e que compromete peso e valor jurídico ao Ato Administrativo (o referido Decreto) assinado pelo presidente da República.

Vamos explicar. A redação legislativa há de ser precisa e perfeita. Não pode conter erro de qualquer natureza. Muito menos excesso de palavras e/ou palavra(s) inútil(eis). E quando há contradição, aí mesmo é que o defeito pode invalidar a lei e/ou o ato administrativo expedidos.

HÁ CONTRADIÇÃO – No decreto que o presidente Bolsonaro assinou e que está sendo objeto de debate, existe uma grave contradição, capaz de invalidar o ato presidencial. Ou seja, invalidar e obrigar sua republicação, desta vez com a redação certa.

O referido decreto inicia com seis “considerandos” e termina com três curtos artigos. O artigo 1º diz que “Fica concedida a graça constitucional a Daniel Lucio da Silveira…….”. E o artigo 2º diz que “A graça de que trata este Decreto é incondicionada e será concedida independentemente do trânsito em julgado da sentença penal condenatória…”. Já o 3º e último artigo menciona as penas que a graça alcança.

A flagrante contradição está na redação do artigo 2º. Aquela locução verbal referente à graça —” e será concedida”— está erradíssima. Isto porque a graça já está concedida, já foi concedida no artigo 1º: “Fica concedida a graça constitucional…”.

REDAÇÃO EQUIVOCADA – Bem, tendo sido concedida no artigo 1º, a redação do artigo 2º anula a concessão do artigo 1º, visto estar escrito que a graça é incondicionada “e será concedida…”. Como assim, “será concedida”, se concedida já foi no artigo 1º?

A permanecer a redação como está, o decreto é inválido. É nulo em razão da apontada contradição. É preciso republicar o decreto. Basta excluir a locução “e será concedida”, posta no texto do artigo 2º de forma desnecessária e contraditória.

Aí sim, a redação estará correta: “Artigo 2º – A graça de que trata este Decreto é incondicionada e independentemente do trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. Não precisa constar escrito “e será concedida”, porque concedida já está no artigo 1º.

Famílias dos torturados e mortos podem pedir revisão dos processos arquivados no STM

Charge questionando o tema Direitos Humanos - Frank 14/01/10

Charge do Frank (Arquivo Google)

Jorge Béja

Uma das consequências das gravações, agora reveladas e tornadas públicas – e que ninguém ainda se deu conta – é a possibilidade da abertura, no Superior Tribunal Militar, de processos de revisão dos julgamentos que as gravações trataram.

Mesmo passados 50, 60…anos, ou seja, “a qualquer tempo” como diz a lei, a revisão criminal é admitida, pelo Código de Processo Penal (artigo 621 em diante) e pelo Código de Processo Penal Militar (artigo 550 em diante).

NA FORMA DA LEI – Diz o artigo 554 do CPPM: “A revisão será processada e julgada pelo Superior Tribunal Militar nos processos julgados na Justiça Militar”.

E quem pode pedir a revisão é o próprio réu e no caso de sua morte, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. No caso da tortura que as gravações revelaram agora, em 2021, certamente haverá descendente para propor a revisional.

Outra consequência é renascimento do direito de pedir indenização à União. Renascimento porque a prescrição estava consumada enquanto se desconheciam as gravações.

PRAZO É ESTENDIDO – E desde que os áudios se tornaram públicos neste final de semana, daí em diante o prazo prescricional recomeça a ser recontado, agora em razão dessas gravações de sessões de julgamento no Superior Tribunal Militar.

Serão ações procedentes. E as condenações pecuniárias serão de grande expressão financeira, face à gravidade dos fatos e de tantos anos de silêncio e encobertamento.

NA FORMA DA LEI – Diz o artigo 554 do CPPM: “A revisão será processada e julgada pelo Superior Tribunal Militar nos processos julgados na Justiça Militar”.

E quem pode pedir a revisão é o próprio réu e no caso de sua morte, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. No caso da tortura que as gravações revelaram agora, em 2021, certamente haverá descendente para propor a revisional.

Outra consequência é renascimento do direito de pedir indenização à União. Renascimento porque a prescrição estava consumada enquanto se desconheciam as gravações.

PRAZO É ESTENDIDO – E desde que os áudios se tornaram públicos neste final de semana, daí em diante o prazo prescricional recomeça a ser recontado, agora em razão dessas gravações de sessões de julgamento no Superior Tribunal Militar.

Serão ações procedentes. E as condenações pecuniárias serão de grande expressão financeira, face à gravidade dos fatos e de tantos anos de silêncio e encobertamento.

Guerra na Ucrânia mostra a inutilidade e a ilegalidade do Conselho de Segurança da ONU

Rússia adia votação no Conselho de Segurança por falta de apoio

Embaixador russo veta resolução da ONU contra seu país

Jorge Béja

A Organização das Nações Unidas (ONU), e seu ilegalíssimo, prepotente e imbecil Conselho de Segurança, envergonham o mundo. Não se vai aqui contar a história da ONU. A abordagem é sobre fatos, passados, presentes e atualíssimos. Faltam à instituição internacional e seu Conselho de Segurança, moralidade, poder e autoridade. Até hoje, passados mais de 70 anos, a Resolução do Conselho de Segurança que ordenou que a China desocupasse o Tibet não foi cumprida. E a ocupação permanece.

E o Dalai Lama Tenzyn Guiatzu, que tive a honra de defendê-lo na Justiça brasileira por ocasião da Eco-92, continua refugiado na India, onde chegou a pé, atravessando as montanhas geladas do Tibet, na década de 50, junto com um pequeno grupo  de seu povo. E a ONU, covarde, cruza os braços. Até hoje nada fez. E nunca fará.

ONU PROCESSADA – Na condição de advogado de Gilda Vieira de Mello, abri processo na Justiça brasileira contra a ONU. A certidão de óbito de seu filho, o brasileiro Sérgio Vieira de Mello, Alto Comissário da ONU para Direitos Humanos, foi expedida com dois graves erros. Um, apontava Sérgio com “cidadão iraquiano”. Outro, a médica norte-americana Elizabeth House apontou como “explosão” a causa da morte de Sérgio, em Bagdá, para onde a ONU o enviou por ordem do então presidente George W. Bush e da secretária Condolessa Rice.

O saudoso médico Ednei José Dutra de Freitas, que foi comentarista e articulista da Tribuna da Internet e também amigo de Dona Gilda, contestou a causa da morte. “Explosão foi o fato, mas para a medicina é preciso, através da autópsia, indicar qual o órgão ou quais os órgãos do corpo que foram atingidos e que deu ou deram motivo à morte“, escreveu o Dr. Ednei no seu Parecer entregue à Justiça.

E Dona Gilda venceu a causa. A ONU perdeu. E a ONU teve que expedir outra certidão de óbito.

CONSELHO INÚTIL – No tocante ao Conselho de Segurança da ONU, pode-se afirmar que tal Conselho viola todos os princípios primários da Ciência do Direito, da Razão e do Bom Senso. É vergonhoso que um de seus cinco membros, quando julgado e a ele imposta sanção, esta seja vetada pelo próprio membro que a sofreu e a decisão torna-se inócua e cai por terra.

O fato é recente e atual. Punida pelo Conselho, a própria Rússia –  que não poderia votar, mas votou – vetou a punição contra si própria. É nada mais, nada menos, que dar ao acusado o direito de decidir sobre o crime que cometeu e, quando condenado, tem ele o poder de descumprir, desatender, vetar, anular e retirar do mundo jurídico-político, a sanção que o próprio acusado sofreu.

É vergonhoso e insensato. Que tribunal? Que corte de justiça? Que instituição é essa que permite que um de seus juízes vote, vete e descumpra a sanção que o colegiado lhe impôs?

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DECÁLOGO DA PILANTRAGEM DA ONU

Aqui na TI não há espaço para dissertar sobre o tema ONU. Mas para se ter uma ideia do ambiente que reina naquele prédio de vidro em Nova Iorque, vamos ao “Decálogo de Um Funcionário da ONU”, que o brasileiros Hernane Tavares de Sá, que foi Segundo-Secretário de Informação Pública da ONU, de 1960 a 1965, nos deixou publicado e que está esgotado. Em síntese diz o “Decálogo”:

1) Nunca expresse sua opinião por escrito sobre coisa alguma.

2) Passe sempre para o papel tudo aquilo que não for de importância, mas redija de maneira que seus colegas pensem duas vezes antes de atribuir-se a autoria.

3) No trato diário e no diálogo, inclusive em conversas informais nos corredores, procure apurar o dom de fazer que o banal se torne prenhe de possibilidades misteriosas, e que o irrelevante pareça profundo.

4) Telegrafe com maior frequência possível, e que cada telegrama seja marcado “confidencial distribuição vedada”, visto que isto lhe dará prestígio.

5) Em reuniões, use da palavra bem ao começo ou então quando a sessão já vai chegando ao fim, mas nunca deixe de se fazer ouvido.

6) Quer em sessões formais ou em pequenas reuniões, quando lhe fizerem uma pergunta responda sempre com outra pergunta, pois isto desconsertará seu interlocutor.

7) Nunca se prontifique a dar uma informação. Não se esqueça que qualquer informação é um artigo de valor, que não deve ser esbanjado.

8) Se você foi promovido a um posto já em nível onde são tomadas decisões, nunca as tome. Sempre que chamado a decidir diga que vai refletir antes.

9) O cordial aperto de mão e o sorriso constante são instrumentos básicos para o seu trabalho e nunca você deve cansar-se deles. Sorria para a sua imagem no espelho ao barbear-se pela manhã e sorria diante do espelho durante o dia, na ONU, toda vez que for ao toalete dos homens.

10) Preocupe-se e siga preocupando-se. Se não o fizer, não terá uma carreira bem sucedida ou promoções rápidas, ainda que seja hábil na lisonja, nas manobras ou nos planos”.

Taí um “Decálogo da Pilantragem”. Nada é sincero. Tudo é postiço. Tudo é falso. Nada é autêntico nem verdadeiro. E é nesta Organização que o destino da Ucrânia e dos ucranianos está sendo decidida. Coitados. A depender da ONU e do seu Conselho de (In)Segurança, a Ucrânia corre o risco de desaparecer junto com o povo ucraniano. E o presidente Zelenski ter um trágico fim de vida.

Se Miriam Leitão recorrer à Justiça, Eduardo Bolsonaro terá de pagar uma elevada indenização

Eduardo Bolsonaro debocha tortura sofrida por Miriam Leitão na ditadura  militar

Eduardo Bolsonaro debochou da tortura sofrida por Miriam

Jorge Béja

A talentosa jornalista Miriam Leitão passou a ter direito, líquido e certo, para ir à Justiça Comum do Rio (uma das Varas Cíveis, por residir no Rio, fato que torna competente a Justiça de seu domicílio) e pedir reparação por dano moral contra o deputado Eduardo Bolsonaro.

O fato que gera para Miriam a reparação do dano moral é o vil ataque que o deputado cometeu contra a jornalista, referindo-se à tortura que Miriam sofreu na ditadura e, grávida aos 19 anos, ainda foi sido colocada nua numa cela escura, junto com uma jiboia.

DANOS DE TODA ORDEM – Advoguei por mais de 40 anos, sempre em defesa de vítimas de danos de toda ordem. Talvez seja até o pioneiro na defesa da reparabilidade do dano moral, puro e autônomo, como este sofrido por Miriam Leitão.

A luta e o empenho que tive por tantas décadas foram compensadores. Veio a Constituição Federal de 1988, e o que antes era polêmico e duvidoso (a reparabilidade do dano moral, ainda mais na forma pura e autônoma) foi, enfim, inserido na Carta, conforme se lê no artigo 5º V (“é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”).

E ainda, no mesmo artigo, nº X (“são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”).

DUPLA AUTORIZAÇÃO – Se constata que em dois momentos, em duas passagens, a Constituição Federal oficializa, constitucionaliza e autoriza a busca e a reparação por dano moral. Assim, o que antes era duvidoso, quase sempre negado e pouquíssimas vezes concedido, tornou-se norma constitucional.

E neste episódio do ataque, do vilipêndio de Eduardo Bolsonaro contra Miriam Leitão não se vê possibilidade de defesa para o parlamentar. A imunidade que detém, por ser deputado federal, é exclusivamente no âmbito penal e desde que o delito seja cometido no exercício do mandato. No âmbito cível — e ainda mais fora do exercício do mandato — não há defesa para Eduardo Bolsonaro.

E já está mais do que provado que a pena pecuniária é a mais eficaz. Supera prisão ou tornozeleira, não é mesmo, deputado Daniel Silveira? Desobediente à ordem assinada por ministro da Suprema Corte, que assim decidiu a pedido da Procuradoria-Geral da República e não, voluntariamente, Silveira resistiu o quanto pôde. Mas quando o ministro, em razão da recalcitrância de Silveira, expediu ordem que ia aos poucos esvaziando o bolso do deputado e suas contas bancárias. E vendo e sentindo que ficaria sem um tostão, rapidinho, rapidinho, Silveira deu o pé para a colocação da tornozeleira.

Indenização elevada – Miriam Leitão, que só conheci, pessoalmente, quando, à noitinha, fui até à redação do O Globo, chamado por Ricardo Boechat, e Miriam estava sentada ao lado da mesa do jornalista e ela e eu nos cumprimentamos.

Miriam não deveria deixar passar em branco o reavivamento, com carga de deboche, da sua dolorosa prisão e tortura. É preciso que se faça justiça. E a maneira mais eficaz é uma ação reparatória do dano moral. E que não será de baixo valor, considerando a projeção social e política do ofensor e da ofendida e, mormente, a intensidade da ofensa.

Nenhuma pessoa tem o direito de relembrar ao vitimado a tragédia que um dia, numa época, a pessoa passou na vida. O vitimado sabe. O vitimado nunca esquece e sempre sente a dor. Dor que até se transmite aos familiares, principalmente aos filhos. É covardia fazer isso.

Liminar esdrúxula do Lollapalloosa entra para a história dos absurdos jurídicos no Brasil

Decisão do TSE contra manifestação de artistas no Lollapalooza provoca críticas no Twitter

Ministro Raul Araújo afrontou o Código de Processo Civil

Jorge Béja

O ministro Raul Araújo, do Tribunal Superior Eleitoral, jamais poderia homologar o pedido de desistência do Partido Liberal quanto à Reclamação em que o partido político pediu e obteve liminar proibindo manifestações eleitorais no Lollapalloosa. Não poderia, mas já homologou a desistência, decisão que o ministro tomou no final da noite desta segunda-feira(28).

Era e continua sendo vedado ao ministro acatar a desistência porque a parte contrária já tinha sido citada, isto é, já estava oficialmente ciente da liminar e até recorreu para cassá-la.

NA FORMA DA LEI – Para homologar a desistência do PL, era imperioso, sob pena de nulidade, que a organização do Lollapaloosa concordasse com o pedido de desistência. E isto não aconteceu, em grave desafio ao artigo 485, X, parágrafo 4º do Código de Processo Civil, que diz textualmente: “Oferecida a contestação, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação”.

Aqui, no caso, ao recorrer da decisão monocrática do ministro Raul Araújo, a organização do Lollapalooza fez mais do que contestar: recorreu. E quem recorre é porque não está conformado com a decisão recorrida. Não a quer vigente e pede sua cassação.

Recorrer é expressão maior do que contestar. Ou seja, é uma contestação perante a instância superior. Mas não foi isso que aconteceu.

A CENSURA VENCEU – O PL foi ao ministro de plantão no TSE, dele recebeu a liminar que o partido queria que lhe fosse dada. E depois de concedida, desistiu da ação, que é uma Reclamação. E o ministro, sem atentar para o fato de que sua liminar já produzira efeitos fáticos e jurídicos… sem atentar para o fato de que o réu da Reclamação já havia interposto recurso, que tem peso maior do que mera contestação… voltou a decidir sozinho. E já homologou a desistência.

Com isso a “censura” venceu. E sua liminar esdrúxula entra para história do absurdo. Isto porque se fosse analisada pelo plenário do TSE a liminar do ministro seria cassada, por representar efetiva censura

Espera-se que a organização do show recorra, agora, contra a homologação da desistência. É preciso que o plenário do TSE diga se aquela liminar de censura foi ou não jurídica e democrática. Sem o pronunciamento do plenário do TSE, o que somente ocorrerá se for apresentado recurso contra a homologação da desistência, a liminar do ministro prepondera. Não chega a ser jurisprudência. Mas será uma maligna referência no futuro. E isto jamais poderá acontecer.

André Mendonça não tem notório saber jurídico para ser integrante do Supremo

Pastor presbiteriano pode ser o próximo ministro do STF - Portal Daqui

Escolhido por ser pastor, qual é o mérito de Mendonça?

Jorge Béja

Dos meus 75 anos vividos, excluindo os anos dos antigos cursos primário, ginasial, clássico e os anos destinados ao estudo do piano, tudo mais foi estudando Direito. Até o destino comigo foi diferente, porque nasci dentro do Fórum do Rio, então Distrito Federal. Literalmente. Ficava na Rua Dom Manoel 29, hoje Museu da Justiça. É uma história única e que já tive a felicidade de contar aqui na TI como foi.

Todo o resto, a partir dos 21/22 de idade, me dediquei à advocacia. E ao longo de mais de 50 anos comprei livros. Foram cerca de 3 mil. Todos de Direito. Apenas 1 ganhei de meu Pai. Os demais foram comprados com o dinheiro que ganhava.

NO ESCRITÓRIO – Todos estão lá no escritório. Hoje silenciosos e talvez empoeirados. Todos lidos e relidos. Digo com a mais segura certeza que nunca li uma obra jurídica de André Luiz de Almeida Mendonça. Nem referência a ele nas obras que li. Nem nas bibliografias no final dos livros.

Também nunca li um artigo dele em lugar nenhum. Não estou errado. Falo e comprovo. É possível que exista algum livro escrito por ele. Ou algum artigo, ou alguma referência bibliográfica a ele feito em alguma obra. Talvez. Mas trata André Mendonça como detentor de notável saber jurídico, aposto que não é. Quanto à ilibada conduta, não posso falar.

Falo apenas que, para mim, como jurista, ele não é pessoa de notável saber jurídico.

Guedes, o ignorante, quer vender imóveis no Rio que são “tombados e inalienáveis por natureza”

Palácio Capanema, no Rio de Janeiro (Reprodução)

Mural de Portinari embeleza uma das entradas do Palácio

Jorge Béja

O decreto que organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional é bastante antigo e até hoje vigente, a salvaguardar os bens que marcam a História e a Arte nacionais. É o Decreto-lei nº 25, de 30 de Novembro de 1937, assinado pelo Presidente da República, doutor Getúlio Vargas, junto com Gustavo Capanema, então ministro da Educação e Cultura.

São 29 artigos imortais. E que ninguém se atreva a alterá-lo, desconstituí-lo, porque afrontado ele já vem sendo pela ignorância do ministro Paulo Guedes, que queria vender até o Palácio Capanema, a mais importante obra do período republicano.

SAIU NO JORNAL – “União põe à venda Mercadinho São José e antiga sede da Ancine”, é o título da matéria de quatro colunas e meia página, publicada na edição deste sábado do O Globo (página 39). Começa informando que “o Mercadinho São José, em Laranjeiras, está entre os 168 imóveis apresentados pelo Ministério da Economia durante o primeiro Feirão de Imóveis SPU+, para pré-venda, por estarem desembaraçados….”.

Êpa, paremos por aí. Pré-venda? Venda? A matéria tem muito mais notícia, inclusive a declaração de Eduardo Paes, prefeito do Rio, sobre a inclusão para leilão do Palácio Capanema, que recebeu forte reação do povo e das instituições do Rio. Disse Paes:

“Fiquei muito impressionado com a defesa ao Capanema, como se frequentassem o prédio. É um prédio estatal, usado por poucos em benefício de poucos… Questiono por que as pessoas defendem tanto sem nunca terem frequentado”.

PESSOAS CULTAS – Respondo eu: Defendem o Palácio Capanema porque são pessoas cultas, eruditas e sabem o valor arquitetônico e histórico daquele prédio, enquanto você, Paes, é um coroa-garotão imaturo, de poucos estudos e que, naquela conversa ao telefone com Lula e que a Polícia Federal gravou durante a Lava Jato, menosprezou a belíssima cidade de Maricá, pertinho aqui no Rio e que tem cinco gigantescas lagoas interligadas, com ecossistema preservado.

Mas não é do Palácio Capanema que estamos aqui a falar, como se diz em Portugal. Falemos do imóvel que foi título de matéria do O Globo, que é o “Mercadinho São José”.  Antes, é importante dizer desde logo que, a teor do artigo 11 do Decreto-Lei do Presidente Vargas, bens públicos tombados só podem ser transferidos, graciosa ou onerosamente, a outro ente público.

“Artigo 11 – As coisas tombadas, que pertençam à União, aos Estados ou aos Municípios, inalienáveis por natureza, só poderão ser transferidos de uma à outra das referidas entidades”.

VENDA PROIBIDA – Nada mais claro, portanto. Aquela oração “inalienáveis por natureza”, diz tudo. Proíbe a alienação. Ou seja, a venda. Proibição sem exceção, sem contorno, sem malandragem. A lei é cogente e taxativa. Não pode, não pode.

Mas o Mercadinho São José, um dos polos culturais do Rio, está na lista dos bens da União que serão leiloados? Sim, está. E poderia estar? Para ser leiloado, não. Leilão é forma de alienação. Quase sempre e na maioria das vezes decorrente de litígio judicial. Primeiro ocorre a hasta pública e em seguida o leilão. Ou vice-versa, para alguns.

Qualquer bem particular pode ser vendido através de leilão. Basta o proprietário querer e contratar um leiloeiro particular. Já o Mercadinho, como bem público tombado, não pode ser vendido, consequentemente não pode ser leiloado.

PODERÁ SER CEDIDO – O Mercadinho São José somente poderia ser incluído no rol dos bens imóveis pertencentes à União desde que fosse para o fim de transferência de propriedade, da União para o Estado do Rio de Janeiro. Ou da União para o Município do Rio de Janeiro, que atualmente voltou a ter o erudito Eduardo Paes à frente do Poder Executivo.

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Mercadinho é uma das raras construções da época colonial

O imóvel jamais poderá ser leiloado-vendido. Isto porque, desde a edição da Lei Municipal nº 2.263, de 16 de dezembro de 1994, assinada pelo então prefeito César Maia, o Mercadinho foi tombado. A conferir:

“Artigo 1º – Fica tombado, por seu valor histórico e cultural, o Mercado São José, localizado na Rua das Laranjeiras, nº 90, no bairro de Laranjeiras – IV Região Administrativa”.

ATIVIDADES PRESERVADAS – Mas tem mais. A Lei sancionada por César Maia não apenas tomba o mercadinho como também assegura a permanência daqueles que lá estão com atividades artísticas e culturais e até mesmo comerciais A conferir o parágrafo Único do artigo 1º:

“As atividades artísticas e culturais, bem como as relativas ao comércio com suas divisões em boxes, serão mantidas no Mercado São José”.

Pronto. Nada mais é preciso dizer. A Autoridade Municipal tombou o bem e ainda garantiu a permanência das atividades artísticas e culturais e até mesmo comerciais lá existentes. Somente uma outra lei municipal poderia revogar a lei de tombamento que César Maia sancionou ao assiná-la. Assim, representa e constitui autêntico direito de ficar.

DIREITO DE FICAR – Quando a Constituição Federal garante o Direito de Ir e Vir, implícito está o Direito de Ficar, de Permanecer. E no caso desse Mercadinho, a autoridade maior é o chefe do Executivo Municipal. Logo, o decreto de tombamento é ato jurídico perfeito e subscrito por quem detinha legitimidade.

Vai aqui um conselho: que o ministro Paulo Guedes combine com o prefeito do Rio, Eduardo Paes – que é bolsonarista de raiz –, a transferência do Mercadinho São José para o Município do Rio. Ou então que faça o mesmo com o governador Cláudio Castro, outro bolsonarista fanático, entregando o imóvel ao acervo imobiliário do Estado. O que não pode e não deve é a União colocar ilegalmente o Mercadinho a leilão.

Sem respeito a si mesmo e ao cargo, Jair Bolsonaro está criando um “auto-impeachment”

Seria esta a imagem de algum presidente da República?

Jorge Béja

No início deste mês de agosto de 2021, Jair Bolsonaro, presidente do Brasil, xingou de “filho da puta” o ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal. Foi no dia 6, em Joinville. Depois, Jair apagou o vídeo. Agora, terminando o mês de agosto, nesta sexta-feira 27, ele novamente abriu a boca e disse a seus apoiadores — e como sempre num linguajar chulo —, que todos os brasileiros precisam comprar um fuzil.

E chamou de “idiota” quem defende a compra de um pacote de feijão ao invés de fuzil. A declaração. Evidentemente, repercute negativamente no Brasil e no Mundo.

DISSE BOLSONARO – “Tem que todo mundo comprar fuzil, pô. Povo armado jamais será escravizado. Eu sei que custa caro. Aí tem um idiota: ‘Ah, tem que comprar é feijão’. Cara, se você não quer comprar fuzil, não enche o saco de quem quer comprar” – isto foi dito, literal e publicamente, a apoiadores no tal “cercadinho” na portaria externa do Palácio da Alvorada.

Quando Jair Bolsonaro endereçou ao presidente do Senado o pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes e após eu ler a petição, escrevi artigo aqui na “Tribuna da Internet”, edição do dia 21 último. No texto afirmei que a petição era “fraquinha”. E que o destino do pedido era o indeferimento. Não demorou quase nada. Três ou quatro dias depois o presidente do Senado Federal, baseado em parecer do seu setor jurídico, negou o pedido e o arquivou.

Dizem que existem na gaveta do presidente da Câmara 126 pedidos de impeachment de Jair Bolsonaro. Continuam sem apreciação, sem decisão de admissibilidade ou não. Pode até ser verdade. Mas são pedidos desnecessários.

“AUTO-IMPEACHMENT” – Jair Bolsonaro, com seus gestos, palavras, ações, omissões e tantas outros comportamentos e atitudes que vão se avolumando e multiplicando com o passar do tempo, ele mesmo já decretou o seu próprio impedimento para continuar presidente da República.

Sem levar em conta outros gestos, palavras e ações, esses dois recentes atos – a ofensa ao ministro e a exortação ao fuzil – cravaram sua incapacitação, seu natural impedimento para prosseguir como presidente da República.

Pode até continuar na função, mas desmoralizado. Jair, como gosta de ser chamado, perdeu o respeito ao cargo e a si próprio. Assim, Jair impõe uma espécie de “auto-impeachment”.

FALTA DE DECORO – Sabemos que a rejeição a Jair não é unanimidade. Sempre existem seus adeptos, seus eleitores, como enganadamente fui um deles. Mas aqueles que o elegeram já não somam tantos milhões como foram. Restam muitos poucos.

E o que Jair pede é um ímpeachment natural, sem que haja necessidade da formalização, processamento e decisão do Senado Federal. Isto porque, reiteradamente – e sobretudo agora, no caso do xingamento de um ministro do STF e no caso dos “fuzis para todos” no lugar da compra de feijão –, Jair não procedeu de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo?

E presidente da República que assim procede se enquadra no artigo 9º, item 7, da Lei do Impeachment (nº 1079, de 1950).

DIZ A LEI – “Artigo 9º – São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração….7) proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”.

Portanto, Jair Bolsonaro se auto-incrimina. Ele se auto-desmoraliza. Ele próprio não respeita o cargo. É por isso que não precisa de impeachment. Ele próprio prova e comprova sua incapacidade para ocupar o cargo do qual está investido. Ele próprio se auto-destruiu. Ele mesmo fez por onde perder a dignidade e a autoridade moral que todos esperam de um presidente da República.

No entanto, se for apresentado um pedido formal de impeachment, com fundamento apenas nestes dois fatos aqui narrados, certamente será recebido, processado e julgado.

São ilegais os habeas corpus que o Supremo tem concedido a quem vai depor na CPI

(Arquivo do Google)

Jorge Béja

À luz da sociologia, da civilidade, da razão e, fundamentalmente, à luz da legalidade, são inconcebíveis e repugnantes as ordens de Habeas Corpus que o Supremo Tribunal Federal vem expedindo para quem é convocado a depor nesta CPI da Covid, ou CPI da Pandemia, instalada no Senado Federal.

Ninguém, sem exceção, tem direito a receber da Justiça salvo-conduto para não responder às perguntas dos senadores. Cada ordem (salvo-conduto) de HC que o STF expede, três princípios jurídicos são gravemente violados pela Suprema Corte: 1) o de que a ninguém é dado o direito de mentir ou ficar calado quanto interrogado pela autoridade competente; 2) o de que toda pessoa tem o dever de colaborar com a Justiça no descobrimento da verdade; 3) e o princípio de que o interesse coletivo sempre prevalece sobre o Direito ou interesse individual, interesse particular. Ou seja, sempre que se defrontam interesse particular e interesse público coletivo, este  que deve prevalecer. Sempre.

OBJETIVOS CLAROS – Este Inquérito Parlamentar no Senado Federal não investiga conflito entre particulares. Seu objeto é investigar a atuação do governo federal no combate à pandemia do Coronavírus-19, que está perto de atingir 600 mil mortos, sem contar os sequelados.

E investigar, também, a corrupção que os irmãos Miranda – sem que ninguém esperasse – denunciaram que vinha sendo articulada no Ministério da Saúde na intermediação da compra de vacina.

Portanto, o que está em causa é interesse público. É a saúde pública. É a vida do povo brasileiro. É a honestidade dos agentes públicos.  É o dinheiro público quase, quase, empenhado e quase, quase entregue para comprar uma tal vacina indiana.

DEVER DE FALAR – Daí porque todos que comparecem à CPI para depor tem o dever de falar. E falar a verdade. Porque é o interesse público que está em causa. Interesse público que esmaga e acaba com a eventual possibilidade de alguém ficar calado. De alguém não responder. De alguém obter na Justiça uma garantia para nada dizer. Nada falar. Para se omitir. Para mentir. Não, não é sadio. Não é justo que a Justiça beneficie o particular em prejuízo do descobrimento da verdade que trouxe tanta desgraça à coletividade.

Esses salvo-condutos do STF são escancaradamente escandalosos. Jamais poderiam ser concedidos. “Ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade”. Eis o comando do artigo 378 do Código de Processo Civil (CPC), fonte suplementar e subsidiária do Código de Processo Penal.

E quem vai depor na CPI e mente e/ou se cala, está sujeito à prisão em flagrante e às penas cominadas ao crime de mentir em juízo. De não dizer a verdade. Sim, em juízo, visto que toda CPI detém “poderes de investigação próprios das autoridades judiciais” (artigo 58, parágrafo 3º da Constituição Federal).

AUTORIDADES JUDICIAIS – Registre-se que a Carta não diz “autoridades judiciárias”, que são os delegados de polícia. A Carta é clara: “autoridades judiciais”, que são os magistrados. Portanto, quem vai à CPI depõe perante agentes públicos parlamentares investidos de poderes que só a magistratura detém.

Dirão alguns que o artigo 379 do CPC dispõe que fica “preservado o direito de não produzir prova contra si próprio”. Ora, é uma excepcionalidade que cede, que não prevalece, que deixa de existir quando se está investigando questão de interesse coletivo, de interesse de toda a população brasileira. Repita-se: esta CPI não investiga conflito particulares.

E para encerrar, aqui vai uma pergunta-sugestão: por que a CPI não enfrenta, imediatamente, as ordens de Habeas-Corpus que são expedidas pelo STF?. Tão logo o ministro a conceda, a CPI, pessoalmente, vai ao gabinete do ministro que concedeu e pede a reconsideração-revogação da ordem. Argumentos e fundamentações jurídicas é que não faltam. Aqui neste artigo estão algumas.

A petição do impeachment de Moraes, que Bolsonaro assinou, é peça muito fraquinha…

Alexandre de Moraes tem pedido de impeachment feito por Bolsonaro

Moraes não devia ter assinado o ofício enviado a ele mesmo

Jorge Béja

Li as dezoito páginas da petição denominada “queixa-crime”, que Jair Bolsonaro endereçou e protocolou no Senado Federal com o pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal. E no final deste breve artigo segue o link da referida petição, para que nossos leitores a conheçam na íntegra.

A peça é assinada apenas por Jair Bolsonaro. Mas se percebe que não foi ele quem a redigiu. Forma, conteúdo e fundamentação partiram de quem é advogado.

LEU E CONCORDOU – Embora Jair seja leigo em Direito, é certo que, depois de pronta, ele leu a petição. Ou alguém leu a peça para ele, explicando linha por linha. E ele concordou. Mesmo porque a peça está formalmente bem feita. Nela, não se detecta erro vernacular nem gramatical.

O conteúdo é que é fraco. As acusações são genéricas. Não indicam a comprovação. A rigor, nem mesmo era preciso a prova. São fatos públicos e notórios e que independem de comprovação. O ponto central está no oficiamento que Moraes/TSE fez a Moraes/STF.

O denunciado ministro oficiou a si próprio. Como integrante do Tribunal Superior Eleitoral, Moraes subscreve ofício ao Supremo Tribunal Federal, abordando crime que teria sido cometido por Bolsonaro. Até aí, nada demais. Mas não endereçou o ofício à presidência do STF, para proceder à livre distribuição. Moraes, que também assina o ofício, endereçou esse documento ao próprio Alexandre de Moraes, na condição de ministro do STF.

ISSO NÃO PODE – Em suma: Morais, do TSE, oficia a Moraes, do STF; E Moraes, do STF, acata o ofício de Moraes, do TSE, e atende o que nele contém. Realmente é uma tremenda irregularidade que compromete processos e inquéritos derivados desta anomalia.

Grave falta de ética. Moraes não deveria ter assinado o ofício que os ministros do TSE enviaram conjuntamente ao STF. Ou, decidindo assiná-lo, deveria pedir que fosse endereçado ao ministro Luiz Fux, presidente da Corte.

Mas não passa disso. Não passa de irregularidade procedimental. Não justifica a expulsão de Moraes do STF com a recepção, processamento, julgamento e acolhimento do impeachment.

As mortes por falta de oxigênio em Manaus e o direito à indenização de suas famílias

Parentes de pacientes hospitalizados se reúnem para comprar oxigênio e encher botijões em empresa privada em Manau — Foto: REUTERS/Bruno Kelly

De quem foi a culpa pela falta de oxigênio no Amazonas?

Jorge Béja

Desde o início da pandemia que a questão da responsabilização civil não sai do meu pensamento. Nela reflito todos os dias. Afinal, foram mais de 40 anos, sem interrupção, patrocinando ações indenizatórias cíveis, com pedidos de reparação por danos de toda ordem.

Na sessão da CPI da Pandemia desta quarta-feira (11), seu presidente, senador Omar Aziz, disse que entraria em contato com a Defensoria Pública do Estado do Amazonas para que os defensores “acolhessem” os parentes dos vitimados que morreram em Manaus pela falta de oxigênio.

E em defesa deles dessem entrada na Justiça com pedido de indenização. Nada mais justo. Iniciativa oportuna e que tem fundamentação jurídica.

TODOS SÃO VÍTIMAS – Pela pandemia, à primeira vista, não se pode imputar a responsabilização ao poder público. No plano internacional, seria cabível examinar o dever de indenizar que recai sobre a República Popular da China, de onde partiu o vírus. Mas imputar responsabilidade pública no âmbito na administração nacional, a princípio creio que não. Todos fomos e somos vitimados, o Brasil e os brasileiros.

No entanto, se ficar constatado que o poder público não agiu a contento em defesa da saúde pública, do socorro aos cidadãos, daí nasce o dever de indenizar. Seja sob a ótica da Teoria Objetiva, que recai sobre o Poder Público, seja pela ótica da Teoria Subjetiva, também denominada Culpa Extracontratual ou Aquiliana, o dever estatal de reparar o dano passa a ser indiscutível.

DANO E NEXO CAUSAL – Na responsabilização estatal objetiva não se discute culpa. Basta a constatação do dano e o nexo causal com a ação omissiva ou comissiva do poder público, representado por seus agentes, para daí nascer o dever de indenizar.

Exemplo de um caso concreto. Foi na década de 80. Aqui no Rio, mãe e filho de 5 anos caminhavam de mãos dadas pela calçada. Inesperadamente a criança larga a mão da mãe e corre para rua. Atingido por um jipe do Exército, a criança morre em consequência.

Houve culpa da vítima?. De certa forma sim, ainda que não se possa atribuir culpa a uma criança de 5 anos. Mas nem isso livrou a União de ser condenada a pagar o dano pela morte da criança. Isto porque a Justiça Federal, corretamente, aplicou o princípio da Responsabilidade Civil Objetiva inscrita no artigo 37, parágrafo 6º da Constituição Federal:  “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros…”.

CASO DA PANDEMIA – Mas a Responsabilidade Civil Objetiva não deve ser invocada nem aplicada no caso das mortes pela pandemia. Salvo, se ficar comprovado que o Poder Público teve sua parcela de culpabilidade, mínima que seja.

Para José de Aguiar Dias — o mais respeitado e consagrado jurista brasileiro —, na sua clássica e sempre consultada obra “Da Responsabilidade Civil”, ele ensina que, na excepcionalidade de haver necessidade da apuração da culpa estatal, como ocorre no caso da “faute du service”, esta se verifica quando 1) o serviço inexistiu; 2) o serviço existiu mas não foi prestado; 3) o serviço existiu, foi prestado, mas deficientemente. Daí, ensina Aguiar Dias, nasce o dever estatal de indenizar o dano causado.

É o caso de Manaus, onde a falta de oxigênio causou tantos óbitos.  O serviço inexistiu. Faltou, quando dele precisava. Faltou, quando dele havia uma grita geral que estava acabando e não havia mais cilindros. Faltou, e por causa da falta ocorreram muitos e muitos óbitos que não ocorreriam se oxigênio houvesse.

A QUEM PROCESSAR? – Portanto, no caso da comprovação da morte pela falta de oxigênio, a responsabilização do poder público se mostra patente. Mas aqui se levanta uma questão que o senador Omar Aziz não comentou: contra quem dirigir as ações indenizatórias? Contra o Município de Manaus? Contra o Estado do Amazonas? Contra a União?.

Numa viagem ao passado e pela experiência acumulada por tantos anos, se advogado fosse dos parentes dos que morreram, ingressaria com as ações contra todos. Isto porque todos são solidariamente responsáveis. E onde a responsabilidade civil é solidária, o credor por dirigir seu pleito contra um, contra uns ou contra todos os devedores solidários. Eles é que se entendam e resolvam como pagar e quem vai pagar. A União, porque ciente do caos em Manaus, cruzou os braços, difundiu tratamento precoce e um tal de “tratcov”, e só depois socorreu. O Estado e o Município porque era de suas competências e obrigações prestar o socorro imediato e adequado. Não lhes socorre o retardo que veio depois do governo federal.

E nunca é demais fazer este alerta: o prazo para dar entrada com as ações na Justiça é de 5 anos. Depois deste prazo, consuma-se a prescrição. Portanto, todo cuidado é pouco. Toda a atenção se pede aos familiares dos que morreram.

Não é justo calar a verdade nos tribunais, fora deles e onde quer que seja.

Charge do Frank (Arquivo Google)

Jorge Béja 

Nem tudo o que é legal é também moral.  Dois exemplos do dia-a-dia: segundo a lei, devedor de dívida prescrita não está obrigado a pagá-la. E moralmente? O princípio “Nemo Tenetur Se Detegere”, ou seja, ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo, dá ao acusado, ao indiciado, ao investigado o direito de não produzir prova contra si próprio.

Pode ficar calado e mentir diante da autoridade constituída, tal como vem acontecendo na CPI da Pandemia no Senado Federal. E nada lhe acontece.

ISSO É LEGAL? Sim, é legal, no Brasil e no Mundo, porque garantido pela Constituição Federal Brasileira, pela Convenção Americana de Direitos Humanos, pelo Pacto de São José da Costa Rica e até outros diplomas mais. Mas é uma garantia de cunho moral? Evidentemente que não. É imoralíssima.

Imoralíssima porque o que busca a Justiça é o descobrimento da verdade. E para o fim da distribuição de uma Justiça justa, a ninguém é dado o direito de mentir perante os tribunais, perante o próximo.  Em qualquer circunstância, mentir, jamais.  A Humanidade não aceita a mentira.

Nem é preciso repetir aqui aquela conhecida, mas nunca praticada, passagem bíblica que se lê no Evangelho de João 8:32. Todos a conhecemos. Até o Jair Bolsonaro repete a mensagem bíblica. Mas a prática é outra.

CASO ESCADINHA – Certa vez, no Fórum do Rio, o doutor Carlos Alberto de Mattos Bulhões, juiz titular da 17a. Vara Criminal, antes de interrogar José Carlos dos Reis Encina, vulgo “Escadinha”, permitiu que o réu permanecesse sentado enquanto o juiz fez a leitura da denúncia que o Ministério Público apresentou contra o interrogado. Terminada a leitura, o juiz disse ao acusado:

– O senhor tem o direito de ficar calado, de nada responder à pergunta que lhe faço, mas sou obrigado a fazer. O senhor nega ou confessa?

E “Escadinha” a todos surpreendeu: Ele disse ao Juiz: “Confesso”. Tempos depois o juiz condenou o réu, mas aplicou-lhe a atenuante por ter confessado. Eu estava presente. Vi tudo.

UM JUIZ SÁBIO – O Dr. Bulhões era um sábio. Seu raciocínio era lógico e jurídico. Se testemunha que mente pode depois – antes do sentenciamento – contar a verdade e com isso se livrar do crime de falso testemunho, por que não dar ao réu os benefícios de ter sido verdadeiro a fim de obter um julgamento do justo?

Sabemos que esta visão, a de ser a pessoa humana sempre verdadeira e dizer sempre a verdade – ainda que seja em prejuízo próprio –é visão pessoal, idealista, pragmática e inata. Mas é certo que os Humanos teriam uma vida, pessoal e coletiva, bem diferente. Muito menos pior da que temos, da que vivemos.

A deputada Janaína Paschoal precisa pedir desculpas ao piedoso Padre Julio Lancellotti

Janaina Paschoal durante sessão no Senado sobre processo de impeachment de Dilma Rousseff, em 2016 — Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Janaina é deputada e devia refletir antes de se manifestar

Jorge Béja

Janaína Paschoal é a advogada e professora universitária de São Paulo que assinou a petição do Impeachment de Dilma Rousseff. Por isso tornou-se conhecida. E se elegeu deputada em São Paulo pelo PSL. Neste fim de semana, Janaína criticou o padre Júlio Lancellotti e a Pastoral do Povo de Rua de São Paulo por distribuir alimento à população de rua no Centro da capital paulista, na região da Cracolândia.

“A distribuição de alimentos na Cracolândia só ajuda o crime”, escreveu Janaína neste sábado(7). “O padre e os voluntários ajudariam se convencessem seus assistidos a se tratarem e irem para os abrigos”.

RESPOSTA DO PADRE – O respeitado e conhecido sacerdote não se curvou à deputada e respondeu. No seu perfil, reproduziu um meme com imagens que representam a deputada dormindo, noutro o número de brasileiros que morreram por Covid-19 se aproxima de 600 mil, e depois exibe Janaína acordada e revoltada com a doação de alimento. Na legenda. o padre escreveu: “lutar e crer”.

Não, deputada. Conheço a Cracolândia de SP. É verdade que todos precisam do amparo estatal para recuperar a saúde e a dignidade humana. Amparo permanente, estruturado, prioritário e de qualidade. Mas dizer que o Padre Lancelloti “ajuda o crime” quando leva alimento àquela população desvalida, isso não é crítica, mas ofensa ao religioso e a todos que com ele operam.

COMPARAÇÃO – Daí surge uma pergunta: faz décadas e décadas que o padre Lancellotti é nacional e internacionalmente conhecido por suas ações humanitárias em prol da população de rua, drogados e não drogados. E a advogada Janaína, há quatro anos, é conhecida por ter sido a co-subscritora da petição de afastamento de Dilma da presidência da República. Nada mais. Parece que a diferença entre um e outro é abissal. Ou não é?

Fico com o padre. E bem conheço as críticas infundadas e os ataques que políticos disparam contra quem defende os vulneráveis, sejam santos ou pecadores.

OUTRO EXEMPLO – Nas décadas de 70 e 80, ao lado do padre Bruno Trombetta, responsável pela Pastoral Penal da Arquidiocese do Rio de Janeiro, testemunhei o empenho do Reverendo (Reverendo de verdade) na defesa da população carcerária.

Constatando que as prisões não ressocializam e que o apenado, quando consegue sobreviver ao cárcere, dele sai pior do que nele entrou, Trombeta arregaçou as mangas. E de batina surrada, entrou em campo, tal como fez o italiano Giovanni Melchior Bosco, o Dom Bosco (15.8.1815 — 31.1.1888), em defesa dos “biriquinis”, como eram chamados os meninos de rua de uma Itália ainda dividida em Reinos. A todos acolheu e deles fez homens de bem.

Aqui no Rio, toda semana, todos os meses, todos os anos, centenas de presidiários eram assassinados nos presídios. Era o chamado Comando Vermelho.

PONTO CENTRAL – O complexo penitenciário da Rua Frei Caneca era o ponto central de onde partiam as ordens de extermínio. E o padre Bruno Trombeta levava até meu franciscano escritório na Praça Mauá os familiares dos detentos mortos. E deles constituído advogado, dava entrada na Justiça com ações contra o Estado do Rio de Janeiro. Por serem ações inéditas, as três primeiras a Justiça não acolheu. Mas todas as dezenas e dezenas de outras, todas foram acolhidas. E o Estado restou condenado. As indenizações foram pagas.

Cada condenação do Estado era notícia de primeira página nos jornais. E foram tantas as condenações que os constituintes entenderam incluir na Constituição Federal de 1988 esta deterninação:

“É assegurado aos presos o respeito à integridade física e mental” (artigo 5º, XLIX).

SEMELHANÇAS – Mas o que tem a ver?. O que tem de comum entre a censura de Janaína ao padre Lancellotti e a ação do padre Bruno Trombetta no Rio nas décadas de 70 e 80? Tem tudo a ver. É a repetição. Tanto naquela época quando agora, dos políticos vinha sempre a censura. Teve um dia que Leonel Brizola chegou a telefonar para meu pai pedindo que eu parasse. E que deixasse Lancellotti e passasse para o lado dele. Foi em vão. Nem fui ao seu encontro.

Mas os ataques – tal como o de Janaína, perto de 50 anos depois – eraM forte contra o religioso Trombetta, assim como agora, contra outro religioso, Júlio Lancellotti. A deputada paulista aponta o dedo contra Lancellotti. E dispara que o gesto cristão, humanitário e indispensável de levar comida aos sem vez e sem voz da população de rua e da Cracolândia “só ajuda o crime!”.

REFLEXÃO – Professora, reflita antes de falar. Reflita antes de escrever. Não falte com a nobreza, com a fidalguia. No último 4 de julho publiquei aqui na Tribuna da Internet artigo em que termino pedindo à senhora que não ensine a seus alunos o que a senhora disse sobre o presidente Bolsonaro. Ou seja, que o presidente não cometeu crime de prevaricação quando soube da notícia de corrupção do Ministério da Saúde e nada fez. Porque seu argumento nada tinha de jurídico, ao sustentar que é preciso primeiro apurar se houve mesmo a prática do crime, para só depois responsabilizar a autoridade que dele soube, cruzou os braços e, aí, sim, prevaricou.

Desta vez torno a pedir à senhora, pessoa que estimo e com quem já travamos troca de mensagens: reflita antes de falar e escrever. E peça desculpas ao padre Julio Lancellotti.

Ao xingar Barroso de “filho da p…”, Bolsonaro deve ser condenado pelo STF e ficar inelegível

Filhos de Bolsonaro postaram o video e depois apagaram

Jorge Béja

Bolsonaro, o presidente da República, chamou Luiz Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal, de “filho da puta”. É uma baita ofensa. Imensa ofensa. A carga ofensiva desta injúria tem peso e consequências de tal ordem porque parte da boca do presidente da República.

E é inacreditável que tanto tenha ocorrido mesmo. Mas ocorreu, sim. O curto vídeo está na internet. Peço ao nosso editor, jornalista Carlos Newton, que não o reproduza neste meu artigo. Nem em artigo algum, porque repercute, dá elasticidade e divulgação.

CRIME DE INJÚRIA – Barroso tem agora o dever de, imediatamente, representar ao Ministério Público Federal para que instaure Ação Penal por crime de injúria, previsto no artigo 140 do Código Penal, que prevê pena de detenção de um a seis meses ou multa.  .

Artigo 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro;

Pena – detenção, de seis meses, ou multa.

E no caso da inércia do Ministério Público Federal, isto é, se a Procuradoria-Geral da República cruzar os braços e nada fizer em 5 dias úteis, então o cabe ao ministro, ele próprio, ingressar com ação penal privada subsidiária à pública. O foro competente é a própria corte que o ministro Barroso integra, o STF.

NÃO EXISTE DEFESA – Não vejo defesa para Jair. A prova é pública. A ofensa, por partir de quem partiu e por ofender quem foi ofendido, ganha proporções gigantescas.

Luiz Roberto Barroso também precisa ingressar na Justiça Federal de primeira instância em Brasília com outra ação. Esta para ir no bolso do Bolsonaro. É a ação reparatória por dano moral. E considerando o baita palavrão que Jair xingou o ministro, a repercussão, e o cargo que Barroso ocupa, a experiência e especialidade nesta área me fazem pensar em não menos de 1 milhão de reais. Daí pra cima.

E tem mais: se Barroso processar criminalmente Jair Bolsonaro e o STF decidiu pela condenação, é certo que Jair se tornará inelegível, na Lei da Ficha Limpa, porque será condenação definitiva e irrecorrível, por ter sido proferida pela Suprema Corte.

Ação movida contra o sigilo do Exército no caso Pazuello pode se tornar uma ameaça

Jorge Béja

Passa despercebida a gravidade de uma ação no Supremo Tribunal Federal, da iniciativa de três ou quatro partidos políticos de oposição, que pedem àquela Corte que derrube o sigilo de 100 anos que o Exército impôs ao processo disciplinar que culminou na absolvição do general Eduardo Pazuello, por participar de ato político ainda na ativa.

Cármen Lúcia, ministra-relatora, já recebeu a defesa do Exército que insiste na manutenção do sigilo, alegando que não havia motivos para punir o oficial.

HAVERÁ UMA DECISÃO – O fato é que o STF, por uma de suas turmas, pelo plenário ou até mesmo, provisoriamente, por liminar da relatora, terá que decidir a respeito.

Digamos que a decisão seja desfavorável ao Exército. Ou seja, que ordene ao Exército Brasileiro que torne público o processo disciplinar.

E digamos, ainda, que o Exército diga “não cumpro”. Que desobedeça à ordem do STF. Indaga-se: a que força militar-policial o STF recorrerá para que sua ordem seja cumprida? Se não tanto, qual a medida de eficácia coercitiva terá o STF ao seu alcance?

Parece que pode ser o início do princípio do fim da democracia. Todo cuidado é pouco. Fica o registro. Tomara que tudo seja resolvido na paz, na harmonia, e fundamentalmente dentro da legalidade, dentro da Constituição. Na forma da lei.