Crédito extraordinário: Solução ou paliativo para o tarifaço dos EUA?

Proposta do governo não pode se tornar uma política permanente

Pedro do Coutto

O governo Lula estuda conceder um crédito extraordinário bilionário para socorrer exportadores de frutas e peixes afetados pelo chamado “tarifaço” imposto pelos Estados Unidos, que elevou em 50% as tarifas sobre produtos brasileiros. A medida é uma tentativa de mitigar os impactos imediatos sobre setores que dependem fortemente do mercado norte-americano, mas levanta questionamentos sobre sua eficácia e sustentabilidade a longo prazo.

O setor já sinaliza que, com a barreira tarifária, as vendas se tornarão inviáveis, especialmente porque frutas e pescados são produtos perecíveis e exigem escoamento contínuo. Nesse cenário, a proposta do crédito parece mais um remédio paliativo do que uma solução definitiva, uma vez que a exportação desses itens é realizada todos os meses, o que exigiria a repetição da medida, criando um custo insustentável para os cofres públicos.

DISTORÇÕES – Além do impacto fiscal, essa política pode gerar distorções no mercado. Ao subsidiar exportações que não se concretizaram, o governo assumiria o papel de comprador indireto, o que configura uma espécie de estatização velada do setor exportador. Essa intervenção, embora bem-intencionada, pode comprometer a lógica de mercado, desestimular a eficiência e criar dependência de recursos públicos, em vez de incentivar soluções estruturais.

Outro ponto de preocupação é que o crédito extraordinário, se renovado continuamente, pressionaria ainda mais as contas públicas, forçando cortes em outras áreas prioritárias ou ampliando o endividamento. Trata-se, portanto, de uma medida emergencial que resolve apenas o sintoma, sem atacar a causa do problema.

Para enfrentar essa crise de forma estratégica, é necessário olhar para alternativas mais sustentáveis. A primeira delas é a diversificação de mercados, reduzindo a dependência do Brasil em relação aos Estados Unidos. Exportadores podem buscar novos destinos, como países da União Europeia, da Ásia e da América do Sul, que apresentam grande potencial de consumo e não estão sujeitos às mesmas barreiras tarifárias.

DIPLOMACIA – Outra ação essencial é fortalecer a diplomacia comercial. O Brasil já estuda levar a questão à Organização Mundial do Comércio (OMC) e adotar medidas de reciprocidade, mostrando que não aceitará passivamente sanções que distorcem a concorrência. A pressão diplomática e a negociação são instrumentos fundamentais para restabelecer condições mais equilibradas no comércio internacional.

Além disso, políticas internas também podem contribuir para amenizar os impactos. Estados como São Paulo, Rio Grande do Sul e Goiás já anunciaram linhas de crédito com juros reduzidos e devolução de ICMS para empresas prejudicadas pelo tarifaço, o que ajuda a manter o fluxo de caixa sem gerar dependência estrutural. Essa estratégia, quando combinada com incentivos à inovação, investimentos em logística e ações para aumentar a competitividade, pode fortalecer a posição brasileira no cenário global, mesmo diante de desafios tarifários.

CICLO – Em síntese, a proposta do governo ao setor exportador deve ser entendida como uma resposta emergencial, necessária para evitar um colapso imediato de empresas e empregos. No entanto, não pode se tornar uma política permanente, sob pena de criar um ciclo de dependência e desequilíbrio fiscal.

O caminho mais inteligente é adotar uma estratégia integrada, que envolva diversificação de mercados, negociação internacional e medidas internas de competitividade. Somente assim o Brasil poderá transformar uma crise comercial em oportunidade de fortalecimento econômico e inserção mais sólida no comércio global.

Lítio, nióbio e terras raras influem diretamente no tabuleiro geopolítico global

EUA querem acesso a minerais críticos do Brasil

Pedro do Coutto

Enquanto o mundo se move rumo à transição energética e ao fortalecimento de cadeias tecnológicas estratégicas, o Brasil se vê novamente no centro de uma disputa global que tem como pano de fundo seus recursos naturais mais valiosos: lítio, nióbio e terras raras. Em um movimento recente, revelado por matéria publicada no jornal O Globo, o governo Lula iniciou a formulação de uma Política Nacional para Minerais Críticos, um passo que reflete o reconhecimento de que esses elementos, antes subvalorizados, tornaram-se peças-chave na geopolítica contemporânea.

O interesse norte-americano pelos minerais brasileiros, especialmente por seu uso nas indústrias de defesa e tecnologia de ponta, transformou o tema em assunto de Estado — e de soberania nacional. Na quarta-feira, representantes da Embaixada dos Estados Unidos participaram de uma reunião com autoridades brasileiras, entre elas o embaixador Gabriel Escobar, atualmente a principal voz diplomática americana no Brasil.

MAIOR RESERVA – Em pauta, estavam os minerais estratégicos que repousam sob o solo brasileiro, com destaque para o lítio, essencial na produção de baterias, e o nióbio, que possui propriedades únicas na fabricação de ligas metálicas utilizadas em aviões, turbinas, foguetes e reatores nucleares. Com a maior reserva mundial de nióbio e um potencial crescente no setor de lítio, o Brasil entra no radar dos EUA como parceiro desejável — e, para muitos analistas, como alvo geopolítico.

O presidente Lula da Silva tratou o tema com cautela e pragmatismo. Reafirmou que não colocaria as mãos “sobre as terras brasileiras”, em referência a uma possível concessão de soberania, mas reconheceu que o interesse norte-americano oferece ao Brasil uma condição de negociação inédita. Não se trata apenas de vender commodities, mas de estruturar uma política que coloque o país em posição de liderança estratégica.

Lula indicou que o cenário abre margem para tratar de temas paralelos, como o tarifaço de 50% imposto aos produtos brasileiros pelo governo de Donald Trump. Em um gesto raro e politicamente delicado, fontes indicam que a própria situação do ex-presidente Jair Bolsonaro — alvo de investigações e ainda popular entre lideranças republicanas — foi mencionada nas discussões, assim como o tratamento dado às Big Techs no Brasil, apontando que a negociação ultrapassa os limites da mineração e avança sobre os terrenos da política e da comunicação.

ALERTA –  Raul Jungmann, presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), destacou que qualquer negociação no setor mineral deve partir do governo brasileiro, e não de empresas estrangeiras. O alerta não é trivial. Historicamente, o Brasil tem delegado a exploração de seus recursos estratégicos a empresas privadas, frequentemente estrangeiras, sem exigir contrapartidas à altura do valor das reservas.

Em um mundo onde a segurança energética, a autonomia industrial e a proteção ambiental se entrelaçam, manter o controle sobre os insumos críticos é uma questão de sobrevivência nacional. O Brasil precisa evitar cair novamente na armadilha do extrativismo primário, que exporta riquezas brutas e importa produtos industrializados a preços elevados.

Além dos minerais, outro trunfo silencioso do país é a água. Com aproximadamente 12% da água doce superficial do planeta, o Brasil é, literalmente, uma reserva estratégica em tempos de colapso climático. Se o século XX foi movido a petróleo, o século XXI será moldado por elementos mais invisíveis, porém igualmente valiosos: lítio, nióbio, dados e água. E o Brasil está sentado sobre todos eles.

CAUTELA – O vice-presidente Geraldo Alckmin, que lidera o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, tem acompanhado as negociações, mas evitou comentar publicamente qualquer acordo em curso. Disse apenas que a “pauta da mineração é longa e pode avançar”. Sua discrição reflete o cuidado necessário em um momento em que interesses econômicos se sobrepõem a sensibilidades diplomáticas e políticas internas. Qualquer sinal de entrega de soberania pode ter efeitos devastadores na opinião pública e no cenário eleitoral.

A formulação da Política Nacional para Minerais Críticos é, portanto, um passo estratégico e urgente. Mas, para surtir efeito real, ela precisa ir além das boas intenções. Deve envolver regulação clara, exigência de conteúdo local, transferência de tecnologia, formação de mão de obra qualificada e inserção do Brasil nas cadeias produtivas globais não apenas como fornecedor de matéria-prima, mas como parceiro industrial. O país tem a chance de transformar sua riqueza subterrânea em progresso sustentável, liderança internacional e desenvolvimento científico.

A história mostra que os países que souberam controlar seus recursos estratégicos — como a Noruega com o petróleo ou a China com as terras raras — conseguiram se posicionar com força nos debates globais. O Brasil não pode mais se dar ao luxo de desperdiçar oportunidades. Os minerais críticos, assim como a água, não são apenas bens econômicos: são ativos de soberania. E soberania não se negocia, se defende com estratégia, ciência e visão de futuro.

Crise tarifária: Brasil lidera resposta multilateral contra medidas dos EUA

Na OMC, Brasil recebeu o apoio de cerca de 40 países

Pedro do Coutto

Na última sessão da Organização Mundial do Comércio (OMC), ocorrida nesta quarta-feira, o representante brasileiro proferiu um discurso contundente e necessário. A fala denunciou o uso político, desequilibrado e unilateral das tarifas comerciais por parte do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, especificamente contra países como o Brasil. A crítica ganha relevo não apenas por sua dureza, mas pela consistência técnica e pelo risco real que tais medidas representam para a ordem econômica internacional.

A decisão de Trump de impor um novo pacote de tarifas — conhecido nos bastidores como tarifaço — não é apenas um ato protecionista. Trata-se de uma jogada que visa produzir efeitos eleitorais internos e reafirmar sua retórica de “America First”, ainda que isso custe a estabilidade do comércio global. A crítica brasileira ganhou respaldo imediato entre diversos países membros da OMC, justamente porque a elevação arbitrária das tarifas compromete o equilíbrio das cadeias produtivas e comerciais mundiais. Não é apenas uma questão entre EUA e Brasil — é um ataque ao sistema multilateral que sustenta o comércio desde o pós-guerra.

INFLAÇÃO INTERNA – É importante lembrar que o aumento de tarifas, ao contrário do que muitas vezes se propaga nos discursos nacionalistas, também afeta duramente o país que as impõe. Os produtos encarecem, a inflação interna sobe e empresas que dependem de insumos importados perdem competitividade. Estudos de instituições como o Peterson Institute for International Economics e o próprio Congressional Budget Office mostram que as tarifas impostas por Trump desde seu primeiro mandato resultaram em aumento de preços para o consumidor americano, perdas de empregos na indústria e tensões com aliados estratégicos.

No caso brasileiro, setores como o agronegócio, a indústria de base e a exportação de aço são diretamente impactados. O Brasil, que nos últimos anos vinha reconstruindo sua credibilidade internacional, vê-se agora forçado a responder à altura. Segundo fontes do Itamaraty e da Secretaria de Comércio Exterior, o presidente Lula da Silva avalia a formação de uma rede comercial de resistência, composta por até 40 países, para contrabalançar os efeitos das novas tarifas, que devem vigorar a partir de 1º de agosto.

DIPLOMACIA – A proposta lembra a articulação do chamado Sul Global e da União Europeia em momentos de tensão com Washington, e pode reforçar a diplomacia econômica brasileira como um vetor de liderança internacional. As tarifas elevadas causam, além de distorções de preços, um verdadeiro caos regulatório.

Ao variar de país para país, a diversidade de alíquotas quebra a previsibilidade necessária para o planejamento de empresas e investidores. Isso gera incertezas, desestimula o comércio e encoraja medidas retaliatórias. É nesse cenário de confusão que Trump prospera. Seu estilo político é alimentado por conflitos — comerciais, diplomáticos e ideológicos. E isso faz dele não apenas um líder controverso, mas um agente de instabilidade global.

RESPONSABILIDADE –  O alerta brasileiro na OMC deve ser entendido como um gesto de responsabilidade internacional. É preciso haver um contraponto à escalada tarifária e ao uso das tarifas como armas políticas. A OMC, embora enfraquecida nos últimos anos, ainda é o foro legítimo para conter abusos e restaurar a confiança no sistema multilateral.

Por fim, o que está em jogo vai além das tarifas em si. Trata-se da manutenção de um ambiente internacional baseado em regras, previsibilidade e cooperação — fundamentos que garantiram décadas de crescimento e desenvolvimento. O Brasil faz bem em reagir com firmeza, mas também com inteligência estratégica, para que não sejamos reféns da lógica de conflito que Trump parece não saber — ou não querer — evitar.

Bolsonaro, Moraes e os limites da vigilância digital: entre o direito e a suspeita

Charge do Jônatas(hpoliticadinamica.com)

Pedro do Coutto

O mais recente episódio envolvendo Jair Bolsonaro e a exigência do ministro Alexandre de Moraes por explicações sobre supostas entrevistas concedidas pelo ex-presidente enquanto cumpre as medidas cautelares que o proíbem de utilizar redes sociais, direta ou indiretamente, evidencia um ponto nevrálgico do nosso tempo: os limites entre controle judicial, liberdade de expressão e a fluidez do ambiente digital.

A decisão de Moraes de solicitar esclarecimentos teve como base conteúdos veiculados na internet, atribuídos a Bolsonaro, que poderiam sugerir uma violação das condições impostas recentemente. No entanto, ao optar por não confirmar a autoria das declarações — posição que, a princípio, pareceu evasiva — o ex-presidente lançou luz sobre um dilema contemporâneo: como responsabilizar alguém por manifestações publicadas online, quando há tantas formas de manipulação digital, de montagens a republicações de falas antigas?

MOBILIZAÇÃO – Esse contexto, ainda mais sensível pela figura política envolvida, mobilizou os bastidores do Supremo Tribunal Federal. De acordo com reportagem publicada pelo jornalista Valdo Cruz no portal G1, ministros da Corte passaram a defender uma abordagem mais prudente, entendendo que as medidas necessárias já foram tomadas e que não há motivo, neste momento, para novas sanções. A avaliação predominante no STF é que seria precipitado endurecer o regime de prisão com base em indícios frágeis e difíceis de comprovar.

Os ministros temem que novas determinações mais rígidas possam ser interpretadas como perseguição política, alimentando narrativas de vitimização e colocando em xeque a imparcialidade da Corte. Para além do conteúdo das falas, pesa o impacto institucional e simbólico de cada passo.

Vale lembrar que Bolsonaro não é, neste caso, uma vítima do acaso. Encontra-se nessa situação por seu envolvimento em atos graves, investigado por fomentar uma tentativa de golpe de Estado e — conforme revelações recentes — por integrar ou liderar planos que envolveriam até atentados contra adversários políticos, como Lula, Alckmin e o próprio Moraes. O rigor da lei, nesse sentido, se justifica. Mas é justamente esse rigor que exige cautela: para ser legítimom não se pode confundir com arbitrariedade.

DISTORÇÃO – No ambiente virtual, onde conteúdos são replicados e manipulados com facilidade, até mesmo a intenção original de uma fala pode ser distorcida. Há também o risco real de terceiros publicarem conteúdos em nome de alguém, sem seu consentimento, ou mesmo com a finalidade de gerar uma punição judicial. Nessas circunstâncias, o ônus da prova se torna ainda mais complexo.

Ao não confirmar a veracidade das falas atribuídas a ele, Bolsonaro adotou uma estratégia jurídica defensiva — que, nesse momento, se mostrou eficaz. Evitou-se um desfecho mais grave e, conforme indica o G1, o STF dá sinais de que pretende tratar o caso com equilíbrio, reconhecendo os limites de sua própria atuação diante das ambiguidades do ambiente digital.

CONTROLE – A questão permanece aberta: como controlar as fronteiras da legalidade num mundo hiperconectado, onde os fatos podem ser tão rapidamente manipulados quanto disseminados? A resposta, talvez, esteja menos na repressão imediata e mais na construção de critérios claros, imparciais e tecnicamente consistentes.

No Brasil atual, cada passo dado no campo jurídico é observado com lupa pela sociedade — e cada excesso pode custar caro à credibilidade das instituições. Neste episódio, o bom senso parece ter prevalecido. Mas ele também deixa uma advertência: a linha entre justiça e injustiça pode ser tão tênue quanto uma postagem fora de contexto nas redes sociais.

Entre a ordem judicial e o espetáculo político de Jair Bolsonaro

As investidas de Trump e a erosão da imagem dos EUA no mundo

A escalada antidemocrática nas relações Brasil-EUA é preocupante

Charge do Aroeira (brasil247.com)

Pedro do Coutto

O gesto do governo dos Estados Unidos de aplicar sanções a ministros do Supremo Tribunal Federal brasileiro representa um dos episódios mais graves e inéditos na história das relações diplomáticas entre duas das maiores democracias do hemisfério ocidental. Ao denunciar com firmeza essa afronta, o presidente Lula da Silva faz não apenas a defesa da soberania nacional, mas também do princípio da separação dos poderes — um alicerce das democracias modernas e do pacto constitucional brasileiro.

Segundo informações confirmadas por veículos como a BBC Brasil e o The New York Times, a administração Trump tem atuado com viés ideológico explícito ao acolher e incentivar pressões vindas do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro, que busca minar instituições democráticas brasileiras por meio de articulações que ultrapassam todos os limites da razoabilidade diplomática.

ESTRATÉGIA – Não se trata apenas de uma ingerência externa, mas de uma tentativa deliberada de deslegitimar decisões de um tribunal supremo soberano, com o objetivo de alimentar tensões políticas internas no Brasil, forçando o país a responder não apenas com firmeza, mas com inteligência estratégica.

Ao sancionar magistrados que representam o mais alto tribunal do país, a Casa Branca rompe com a prática diplomática consagrada, colocando em xeque sua própria credibilidade internacional. Tais ações só são cabíveis — e mesmo assim sob forte debate jurídico e político — em contextos extremos, como em tempos de guerra ou em resposta a regimes de exceção que cometem violações sistemáticas dos direitos humanos.

O Brasil, por mais que enfrente turbulências políticas, permanece uma democracia funcional, com Judiciário ativo, eleições regulares e liberdades garantidas constitucionalmente. O gesto norte-americano, portanto, beira a ilegalidade e o arbítrio, e pode, inclusive, configurar abuso de poder de natureza extraterritorial.

DESCOMPROMISSO – No centro dessa crise está Eduardo Bolsonaro. Sua atuação, à margem do Itamaraty e em flagrante oposição ao governo legitimamente eleito, escancara o descompromisso de parte da extrema direita com os fundamentos republicanos. Trata-se de um comportamento que pode configurar “traição à pátria”, ainda mais grave por envolver conluios com potências estrangeiras em detrimento do interesse nacional.

Ao instrumentalizar seu sobrenome e a herança política do pai para pressionar uma potência estrangeira a intervir nas instituições brasileiras, Eduardo Bolsonaro ultrapassa os limites da liberdade parlamentar e entra no terreno pantanoso das ações antinacionais.

O pano de fundo disso tudo é ainda mais tenso. A política tarifária de Donald Trump contra o Brasil — o chamado “tarifaço” — impõe sérias restrições a setores estratégicos da economia brasileira, como o aço, o alumínio e os produtos agrícolas. Recuar agora, para Trump, significaria um sinal de fraqueza junto a sua base ultranacionalista.

RISCO – Avançar, por outro lado, representa um risco geopolítico de alta intensidade. É nesse contexto que Lula ganha pontos: ao se posicionar de forma firme, articulada e serena, reforça sua imagem de estadista diante de um cenário internacional polarizado e de um presidente norte-americano imprevisível.

Para além das disputas momentâneas, o que está em jogo é a soberania do Brasil e a integridade de suas instituições. Permitir que sanções arbitrárias vindas de Washington determinem os rumos da política interna brasileira seria um retrocesso histórico — e um grave precedente para o continente latino-americano, já marcado por ciclos de interferência e tutelagem estrangeira.

DESCONFORTO –  A comunidade internacional observa com atenção. Organismos como a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o próprio Conselho de Direitos Humanos da ONU já demonstraram, em outras ocasiões, desconforto com atitudes semelhantes.

Cabe agora ao Brasil se unir em torno de suas instituições — independentemente de filiação partidária — para rejeitar qualquer tentativa de desestabilização promovida por interesses que não dialogam com os valores democráticos nem com o respeito ao direito internacional.

O futuro dessa crise dependerá não apenas da resposta do governo brasileiro, mas também da postura da sociedade civil, da mídia responsável e do Congresso Nacional. Afinal, não se trata apenas de política externa. Trata-se da preservação da nossa soberania, da integridade do sistema de Justiça e, sobretudo, da dignidade institucional do Brasil como nação.

É preciso entender a gravidade da retaliação de Trump contra o STF

Arquivo do Google

Pedro do Coutto

A decisão do governo Donald Trump de revogar os vistos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, entre eles Alexandre de Moraes, é um dos gestos diplomáticos mais agressivos e infundados dos últimos tempos — e revela mais sobre a política externa do presidente norte-americano do que sobre o Brasil.

Trata-se de uma retaliação puramente política, que expõe o esforço deliberado de Trump em se alinhar a Jair Bolsonaro e pressionar o Judiciário brasileiro, que, por dever constitucional, declarou o ex-presidente inelegível. Não há qualquer justificativa jurídica ou diplomática concreta para impedir a entrada de magistrados em solo norte-americano — apenas uma tentativa de intimidar e constranger quem cumpre a lei.

SANÇÕES – O recado é claro e perigoso: para Trump, decisões judiciais que desagradam seus aliados merecem sanções internacionais. Ao suspender os vistos dos ministros e ameaçar ampliar o veto, o presidente dos Estados Unidos adota uma postura digna de um imperador autocrático, não de um chefe de Estado que respeita o princípio da separação de Poderes — tanto no seu país quanto no exterior.

Ao misturar preferências políticas pessoais com a diplomacia internacional, ele compromete a seriedade das relações entre as nações e abre um precedente inaceitável de interferência estrangeira em assuntos internos do Brasil. O Judiciário brasileiro, alvo direto da medida, não responde ao Executivo, tampouco deve satisfações a interesses estrangeiros. Atua, como manda a Constituição, com base nas leis e nas provas.

A reação brasileira foi imediata e firme. O procurador-geral da República classificou a medida como “arbitrária e ofensiva à soberania nacional”. O Itamaraty, embora cauteloso, manifestou preocupação com os rumos da política externa norte-americana. Ministros do Supremo também se pronunciaram, reafirmando que não se curvarão a pressões externas.

DIÁLOGO – A percepção geral é de que a medida enfraquece o diálogo institucional entre os dois países e atinge diretamente o coração de um dos pilares democráticos: a independência judicial. A imprensa internacional também reagiu com perplexidade. Jornais como The New York Times, El País e Le Monde destacaram o caráter inédito da decisão e alertaram para os perigos que ela representa à democracia.

Negar vistos a magistrados de uma nação soberana, sem apresentar provas de má conduta, é um gesto extremo e antidemocrático. É como se Trump quisesse exportar sua política de intimidação institucional — a mesma que o levou a confrontar seu próprio sistema judiciário nos EUA — para além das fronteiras americanas, utilizando o peso geopolítico de seu país como ferramenta de pressão ideológica.

Mais do que um gesto contra os ministros do Supremo, a revogação dos vistos é uma tentativa de deslegitimar o sistema de Justiça brasileiro e enfraquecer a autonomia de suas instituições. Se for aceita sem contestação, abre-se um precedente perigoso para que outros países passem a interferir em processos internos do Brasil, com base em afinidades políticas ou conveniências geoestratégicas.

PRESSÃO EXTERNA – O que está em jogo, portanto, não é apenas o direito de magistrados brasileiros de viajarem aos EUA, mas a própria ideia de que a Justiça deve ser livre de pressões externas, soberana e intransigente na defesa da legalidade. Ao se utilizar do aparato diplomático para proteger Bolsonaro e atacar ministros que apenas cumprem sua função, Trump mais uma vez demonstra que vê a política internacional como uma extensão de suas disputas pessoais e eleitorais.

Mas o Brasil não pode aceitar esse jogo. A resposta precisa ser institucional, firme e à altura do ataque. Afinal, um país soberano se reconhece também pela sua capacidade de proteger seus juízes quando estes são atacados por fazerem justiça. E justiça, neste caso, é não ceder ao autoritarismo travestido de diplomacia.

Lula x Trump: a crise das tarifas e o duelo por soberania no cenário global

Trump, tarifas e a surreal investigação do comércio da Rua 25 de Março

Não há razões consistentes para questionar o sistema Pix

Pedro do Coutto

A decisão do presidente Donald Trump de intensificar sua política tarifária contra o Brasil, incluindo agora menções à movimentação do Pix e até ao comércio informal da Rua 25 de Março, em São Paulo, expõe uma escalada de tensões que ultrapassa os limites da lógica comercial. Reportagem de O Globo traz à tona um cenário que, além de surreal, tangencia perigosamente a violação de soberanias e o uso do protecionismo como ferramenta de intimidação geopolítica.

De fato, a popularidade do presidente Lula da Silva experimentou uma alta expressiva desde o início da retaliação americana. A imagem de um chefe de Estado defendendo os interesses nacionais contra uma superpotência tem, historicamente, forte apelo no Brasil. Ao se posicionar contra o chamado “tarifaço” de 50% anunciado por Trump — que entra em vigor no próximo dia 1º de agosto — Lula parece ter conquistado não apenas apoio institucional, mas também adesão popular.

SISTEMA PIX – O que causa estranhamento — ou perplexidade — é a alegada investigação norte-americana sobre o sistema Pix e a Rua 25 de Março. Trata-se de uma via tradicional de comércio popular na capital paulista, conhecida por seu dinamismo, informalidade e acessibilidade a produtos de baixo custo. Qual seria o interesse de Washington em um centro comercial que sequer exporta produtos para os Estados Unidos?

Segundo apurou a reportagem, nem mesmo diplomatas ou analistas do Itamaraty conseguem compreender a lógica dessa investida. O próprio ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, reagiu duramente: “Estamos diante de uma intromissão absolutamente indevida”.

Sob o pretexto de combater práticas que, segundo o governo americano, “ameaçam a competitividade e segurança econômica” dos EUA, Trump parece usar a política tarifária como instrumento de pressão política. No entanto, o argumento desmorona diante da realidade: o comércio popular da 25 de Março não influencia as exportações brasileiras de aço, alumínio, produtos agrícolas ou qualquer outro item sob tarifação. Trata-se de uma economia essencialmente interna, de sobrevivência, longe do radar geoeconômico internacional.

NARRATIVAS – O episódio reflete uma estratégia mais ampla de Donald Trump em seu segundo mandato: construir narrativas de confronto internacional como meio de reforçar sua retórica nacionalista. Em 2018, adotou medidas semelhantes contra China, Canadá e União Europeia, todas revestidas de um discurso de “America First”, ainda que seus efeitos, por vezes, tenham ferido mais consumidores americanos do que adversários comerciais.

Nesse novo capítulo com o Brasil, as consequências são duplas. De um lado, há o impacto direto no agronegócio, no setor metalúrgico e na indústria de transformação, que dependem fortemente do mercado americano. De outro, a retórica hostil fortalece o discurso nacionalista no Brasil e amplia a coesão política em torno de Lula — um efeito colateral que talvez Trump não tenha previsto.

MODERAÇÃO – A crise, porém, está longe de ser apenas retórica. A entrada em vigor da tarifa pode gerar uma perda bilionária ao Brasil em menos de seis meses, enquanto organizações empresariais dos dois países pedem moderação e diálogo. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a US Chamber of Commerce têm feito apelos conjuntos por uma renegociação, reconhecendo que a medida é prejudicial para ambos os lados.

Em resumo, a ameaça tarifária de Trump contra o Brasil revela não apenas um embate econômico, mas um jogo político de alto risco. Ao mirar no Pix e na 25 de Março, o presidente norte-americano parece desferir mais um golpe simbólico do que efetivo. Mas, como toda política simbólica, seus efeitos não devem ser subestimados: eles moldam percepções, inflamam debates e alteram rumos eleitorais.

O Brasil, por ora, responde com diplomacia firme. E Lula, com isso, colhe dividendos de imagem — o que, convenhamos, em política, vale tanto quanto um acordo comercial bem-sucedido.

 

Repúdio ao tarifaço de Trump une empresários dos EUA e Brasil

Entre a retaliação e a estratégia: A resposta do Brasil ao tarifaço de Trump

Charge do Jôantas(politicadinamica.com)

Pedro do Coutto

Em resposta às tarifas impostas pelos Estados Unidos, o presidente Lula da Silva decidiu regulamentar a chamada lei da reciprocidade, um instrumento que pode permitir ao Brasil aplicar medidas semelhantes contra produtos norte-americanos. A iniciativa surge após o presidente Donald Trump, em seu segundo mandato, anunciar sobretaxas de até 50% sobre produtos brasileiros como aço, carne e derivados agrícolas, a partir de 1º de agosto.

A decisão americana é justificada como um movimento protecionista, voltado a reequilibrar a balança comercial, mas é vista no Brasil como uma ação agressiva, com fortes impactos sobre as exportações nacionais. Diante disso, o governo brasileiro tenta reagir com firmeza, mas enfrenta um dilema delicado: as transações comerciais não ocorrem entre governos, mas sim entre empresas privadas.

EFEITOS REAIS – Portanto, a aplicação de tarifas em resposta precisa considerar os efeitos reais sobre a cadeia produtiva brasileira. Taxar produtos americanos de forma genérica, sem uma análise criteriosa, pode acabar punindo distribuidores nacionais ou mesmo consumidores brasileiros que dependem desses bens importados. É por isso que o governo incluiu empresários e especialistas do setor para mapear os impactos do tarifaço americano e propor caminhos que equilibrem soberania com bom senso.

Ainda assim, a reação brasileira tem méritos. Ao anunciar a regulamentação da lei de reciprocidade, Lula sinaliza que o país não aceitará passivamente imposições unilaterais, como tantas vezes ocorreu no passado. Há, portanto, um gesto de autonomia importante.

Mas ele precisa ser sustentado por inteligência estratégica. O mercado internacional é complexo e multifacetado, e as retaliações comerciais podem ter efeitos colaterais amplos, atingindo justamente as empresas que o governo pretende proteger. Um erro comum — e perigoso — é confundir as esferas pública e privada, como se todo comércio exterior fosse exclusivamente estatal.

CAUTELA – O Brasil, portanto, precisa agir com cautela. A reciprocidade não pode ser cega. Ainda que seja legítimo revidar, é essencial compreender a estrutura das transações comerciais e evitar que a resposta se transforme em armadilha. A taxação de produtos americanos, se mal calibrada, pode provocar prejuízos internos maiores do que os ganhos simbólicos da retaliação.

Por isso, o texto final da regulamentação será decisivo. Só com ele em mãos será possível avaliar se a reação está à altura do desafio ou se se trata apenas de uma resposta impulsiva. De toda forma, o gesto inicial foi positivo. Mostra que o Brasil está disposto a se posicionar no cenário internacional com altivez e firmeza.

Mas firmeza, no campo da diplomacia comercial, não é sinônimo de bravata — é, sobretudo, sinônimo de estratégia. O país precisa proteger seus interesses, mas também preservar sua integração com os fluxos globais de produção e consumo. O equilíbrio entre reação e racionalidade será a chave para que o governo Lula transforme uma provocação externa em uma oportunidade de fortalecimento da posição brasileira no comércio mundial.

O desafio brasileiro diante do tarifaço de Trump

Charge do J.Bosco (oliberal.com)

Pedro do Coutto

O anúncio recente do presidente Donald Trump de impor tarifas de 50% sobre produtos brasileiros — como aço, café, carne e alumínio — não apenas criou uma crise diplomática com o Brasil, como também desencadeou reações imediatas do governo Lula. Nesta terça-feira, o vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, anunciará que o governo editará um decreto para regulamentar a resposta brasileira ao impacto dessas tarifas.

Como se esperava, a reação interna foi de coesão: Lula contou com apoio expressivo da indústria nacional e de diferentes setores políticos. O sentimento geral é de que o Brasil precisa, com urgência, formular uma estratégia clara e assertiva para proteger suas exportações e sua base produtiva. A preocupação da indústria é palpável — afinal, os Estados Unidos seguem sendo um dos maiores parceiros comerciais do Brasil, sobretudo em segmentos industriais de alto valor agregado.

RETALIAÇÃO – O situação escancarou o desconforto diplomático e também expôs uma verdade incômoda: o tarifaço de Trump ameaça diretamente o desempenho da balança comercial brasileira e a confiança nos acordos multilaterais. Lula, porém, evita o caminho da retaliação desordenada. Segundo fontes da Câmara Americana de Comércio, a expectativa é de que a medida brasileira siga princípios legais, possivelmente apoiada pela recém-regulamentada lei de reciprocidade.

Essa resposta, que deve vir na forma de um decreto ainda hoje, pode representar um ponto de inflexão na relação comercial Brasil-EUA. A equipe econômica trabalha sob forte pressão para encontrar uma saída que preserve os interesses brasileiros sem incendiar de vez a relação bilateral.

CAUTELA – Especialistas como Monica de Bolle (Peterson Institute for International Economics) e Cláudio Frischtak (Inter.B Consultoria) apontam que a medida de Trump pode estar mais vinculada ao cenário interno americano — uma tentativa de galvanizar apoio de setores industriais em estados-chave para sua reeleição — do que a qualquer justificativa econômica sólida. O próprio mercado financeiro americano reagiu com cautela, indicando que o aumento de tarifas poderá afetar também a cadeia produtiva dos Estados Unidos, especialmente em setores que dependem de insumos brasileiros.

A partir de 1º de agosto, o Brasil pretende aplicar sua nova estratégia comercial, que está sendo construída com base em dados técnicos, diálogo com o setor produtivo e forte articulação diplomática. O objetivo é duplo: mitigar os danos imediatos e evitar que o episódio crie jurisprudência para novos ataques protecionistas no futuro.

A crise, por mais grave que pareça, também traz uma oportunidade: revisar e fortalecer a política industrial brasileira, apostar em acordos comerciais mais diversificados e diminuir a dependência de mercados voláteis. Em tempos de nacionalismos exacerbados, manter a sobriedade e a legalidade como guia pode ser a chave para preservar a soberania sem perder o bom senso.

Eduardo Bolsonaro entre o patriotismo de fachada e a dependência de Trump

Charge de Mário Adolfo (marioadolfo.com)

Pedro do Coutto

Eduardo Bolsonaro voltou ao centro do debate político com declarações inflamadas e carregadas de contradições. De sua residência nos Estados Unidos, o deputado federal licenciado e filho do ex-presidente Jair Bolsonaro gravou um vídeo em que desafia o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, a incluir Donald Trump no inquérito das fake news.

Com tom provocador, Eduardo chamou Moraes de “frouxo” e insinuou que o ministro estaria “com medo” da aplicação da Lei Magnitsky, uma norma americana que permite sanções a autoridades estrangeiras acusadas de violar direitos humanos. O gesto, no entanto, revela mais do que ousadia — expõe um comportamento contraditório e perigosamente ambíguo.

APELAÇÃO – Enquanto se apresenta como defensor da soberania nacional, Eduardo Bolsonaro apela, sem pudor, a pressões de um governo estrangeiro contra instituições brasileiras. Cobra coragem e firmeza de um ministro do STF, mas ao mesmo tempo se exila politicamente nos EUA e atua como porta-voz informal de Trump, anunciando que o presidente americano vai “vir para cima” de Moraes e até de sua esposa.

A suposta defesa da liberdade de expressão parece ceder lugar a uma forma de chantagem diplomática: ameaçar autoridades brasileiras com sanções americanas, como se os interesses nacionais pudessem ser subordinados aos ventos da Casa Branca. Não há soberania possível quando se tenta resolver impasses institucionais internos com intimidação externa.

Outro ponto gritante é a sequência de promessas e prazos não cumpridos. Desde maio, Eduardo vem garantindo que as sanções contra Moraes estariam prestes a ser aplicadas, ora em “duas ou três semanas”, ora “nos próximos dias”. Até agora, nada foi oficializado, e nem mesmo o Departamento de Estado americano confirmou qualquer medida.

SEM CREDIBILIDADE – A repetição desse padrão enfraquece sua credibilidade e sugere que mais do que articulação política, há um jogo de cena, uma encenação performática que busca alimentar o bolsonarismo digital com manchetes inflamadas e promessas vazias.

Eduardo também costuma repetir que suas ações são em nome do povo brasileiro, tentando vestir a capa de defensor das liberdades. Mas ao recorrer à Lei Magnitsky — criada originalmente para punir regimes autoritários que perseguem opositores — contra ministros do Judiciário, ele distorce o espírito da norma e instrumentaliza uma política de Estado estrangeira para interesses pessoais e ideológicos.

Acaba promovendo aquilo que diz combater: a interferência externa nas decisões soberanas do Brasil. Nesse jogo de inversões, quem defende a democracia termina por flertar com o autoritarismo, e quem diz lutar contra a censura adota práticas de intimidação.

ATAQUES – As contradições não param por aí. Ao denunciar o que chama de abusos do STF, Eduardo Bolsonaro deixa de mencionar seu próprio histórico de ataques às instituições — de flertes com o fechamento do Congresso ao já infame vídeo em que sugere um “novo AI-5”. Sua crítica à atuação de Moraes também ignora que ele próprio é alvo de investigações sobre disseminação de fake news, suspeitas que não se dissiparam mesmo após sua mudança para os Estados Unidos.

No fim das contas, o discurso moralista que empunha contra o Judiciário esbarra em sua própria trajetória política, marcada por excessos verbais, teorias conspiratórias e uma retórica de confronto permanente. O caso recente reforça uma faceta conhecida do bolsonarismo: a de que a lógica do “nós contra eles” precisa ser alimentada continuamente.

Eduardo Bolsonaro não apenas age como uma extensão ideológica do trumpismo em solo brasileiro — ele parece querer ser o elo entre dois projetos políticos que compartilham estratégias semelhantes: deslegitimar instituições, atacar a imprensa, alimentar suspeitas sobre processos eleitorais e judicializar adversários. Ao fazer isso, se coloca não como parlamentar atuante, mas como agitador profissional em busca de palco.

INCONSISTÊNCIA – comportamento recente de Eduardo Bolsonaro é revelador não apenas por seu conteúdo, mas por suas inconsistências. Ataca quem acusa de ser covarde, enquanto se abriga na proteção de Trump. Fala em patriotismo, enquanto roga por sanções de Washington.

Prega por democracia, mas tolera intimidação. Anuncia medidas que não se concretizam. Seu discurso, ao fim, é menos sobre o Brasil e mais sobre manter viva uma narrativa política que o sustenta: a do combate permanente, mesmo que à custa da coerência.

Trump mira o Brasil e acerta o próprio pé, com a reação global ao tarifaço

Gilmar Fraga (Arquivo do Google)

Pedro do Coutto

A ofensiva tarifária de Donald Trump contra produtos brasileiros — com sobretaxas que atingem setores-chave como aço, carne e café — não provocou apenas tensão no eixo Brasília-Washington. O gesto unilateral, em tom de revanche econômica e aceno à sua base ultranacionalista, atingiu proporções inesperadas: levou à manifestação formal da China em defesa do Brasil, mexeu com os mercados e reacendeu velhas incertezas sobre o papel dos Estados Unidos no comércio internacional.

A política de confronto adotada por Trump, agora em seu segundo mandato, foi descrita pelo The Guardian como “uma volta à diplomacia do tapa”, que ameaça o multilateralismo e compromete a estabilidade das cadeias globais de suprimento. O jornal britânico também destaca que o presidente norte-americano tenta reeditar os moldes de sua primeira gestão, quando impôs tarifas a aliados como Canadá, União Europeia e México. Mas o mundo de 2025 não é o de 2018 — e as consequências de agora mostram-se bem mais delicadas.

REAÇÃO – No Brasil, a reação foi imediata e institucional. O presidente Lula da Silva designou seu vice, Geraldo Alckmin, também ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, para liderar um grupo especial de resposta. A frente conta com representantes da diplomacia, do agronegócio e do setor industrial, que buscam manter pontes abertas com os importadores americanos e costurar uma saída pragmática. “É preciso inteligência e firmeza. A prioridade é proteger os interesses do Brasil, mas sem romper com o que foi construído até aqui”, afirmou Alckmin, em declaração ao Valor Econômico.

O impacto da medida é real: segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, o Brasil registra um déficit comercial com os Estados Unidos — e setores como o aço e o agronegócio, justamente os atingidos pelas tarifas, representam boa parte das exportações brasileiras para o mercado americano. A estratégia de Trump mira diretamente nessas vulnerabilidades, e analistas sugerem que a ação visa também enfraquecer a imagem internacional de Lula, com quem o republicano mantém uma relação fria desde sua vitória em 2022.

ECO – Mas o que Trump não esperava era o eco negativo de sua medida no cenário global. A China, maior parceiro comercial do Brasil, não perdeu tempo: declarou, por meio de seu Ministério das Relações Exteriores, que “ações unilaterais, punitivas e politizadas não são o caminho para relações internacionais saudáveis e sustentáveis”. A fala, embora diplomática, é carregada de recado. O gesto chinês visa reforçar sua posição como defensora da ordem multilateral — e, de quebra, enfraquecer a influência dos EUA na América Latina.

Além disso, líderes da União Europeia e da Organização Mundial do Comércio (OMC) também manifestaram preocupação. Para Pascal Lamy, ex-diretor-geral da OMC, “as ações de Trump aprofundam o isolamento dos EUA no comércio global e podem gerar represálias coordenadas”. A França, por sua vez, mencionou em nota oficial o risco de “desequilíbrio estrutural nas relações Norte-Sul”, sugerindo que medidas protecionistas desse tipo só agravam a desigualdade entre países ricos e em desenvolvimento.

CRÍTICAS – No campo político interno, o episódio também ressuscita fantasmas do bolsonarismo. Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil e aliado ideológico de Trump, foi alvo de críticas por parte de membros do próprio Partido Republicano brasileiro, que veem na atual crise um reflexo do alinhamento automático que o ex-chefe do Executivo adotou com Washington durante seu governo. A retórica de “submissão aos EUA”, agora associada a perdas concretas, começa a ser contestada até mesmo por empresários que, no passado, apoiavam Bolsonaro.

Segundo o New York Times, o cálculo de Trump poderá sair caro. “Ele mirou em um parceiro regional, mas acabou acendendo alertas em todo o mundo — da OMC a Pequim, passando pela América do Sul e os aliados europeus.” Fontes do mercado financeiro relatam que a expectativa é de recuo. A própria Casa Branca estaria avaliando o custo político da medida, após o Departamento de Comércio receber pressões de importadores americanos temerosos com o efeito inflacionário das tarifas.

Se recuará ou dobrará a aposta, ninguém sabe ao certo. O que parece claro, no entanto, é que a tentativa de Donald Trump de se impor como “xerife do comércio global” encontrou resistência inédita, não apenas em Brasília, mas também em Pequim, Bruxelas e Nova York. A história mostra que, em política internacional, gestos têm peso — e consequências. E, neste caso, o gesto de Trump reacendeu uma fogueira que talvez ele não consiga apagar sozinho.

Trump ataca, Brasil responde as ofensas com inteligência estratégica

Lula pretende usar reciprocidade contra tarifa de Trump

Pedro do Coutto

A ofensiva tarifária do presidente Donald Trump contra o Brasil não poderia ter gerado repercussão mais desfavorável ao líder americano. A imprensa internacional foi quase unânime em condenar a medida, classificada como arbitrária, revanchista e perigosa para o comércio global. A decisão de impor tarifas de 50% sobre produtos brasileiros como café, suco de laranja, carne e aço foi anunciada como uma resposta ao julgamento de Jair Bolsonaro, numa mistura preocupante entre diplomacia econômica e interesses pessoais.

Trump parece confundir seus aliados ideológicos com os interesses institucionais dos Estados Unidos, atacando o Brasil como se estivesse em uma cruzada pessoal contra Lula e o sistema de justiça brasileiro. Mas, ao contrário do que talvez esperasse, o governo brasileiro reagiu com firmeza e equilíbrio, posicionando-se de maneira estratégica diante do maior parceiro comercial das Américas.

ESTRATÉGIA – O presidente Lula, que poderia ter usado o episódio para inflamar a base e criar uma narrativa eleitoral agressiva, preferiu agir com inteligência política. Em entrevista ao Jornal Nacional, evitou confrontos verbais e disse que não se move quando a temperatura está alta demais. Com isso, deu o tom de uma diplomacia madura: enquanto articula a entrada do caso na Organização Mundial do Comércio (OMC), já orienta o Ministério do Desenvolvimento e o Itamaraty a estudarem medidas de retaliação.

Está em discussão a aplicação da chamada Lei da Reciprocidade, que permite ao Brasil retaliar na mesma proporção tarifas impostas por parceiros comerciais. Patentes americanas e bens culturais podem ser os primeiros alvos. O objetivo do governo brasileiro, no entanto, é mostrar que tem instrumentos técnicos, jurídicos e diplomáticos à disposição para se defender — mas não cairá na armadilha da histeria protecionista.

APREENSÃO – A ação de Trump, ainda que tenha gerado apreensão entre exportadores brasileiros, permitiu ao governo Lula consolidar apoio interno entre os produtores, especialmente nos setores agrícola e industrial, e reposicionar o país no cenário internacional como uma nação capaz de resistir a pressões políticas externas sem comprometer sua soberania.

O Itamaraty, antes questionado por falta de protagonismo, agora se vê à frente de uma crise que pode, se bem administrada, fortalecer a imagem do Brasil como potência comercial e diplomática. A imprensa mundial destacou essa virada com ênfase.

O Financial Times afirmou que Lula está usando o embate com Trump para fortalecer sua posição política, ao passo que o The Guardian observou que o Brasil está mais preparado do que nunca para lidar com governos hostis e manobras imprevisíveis.

REAÇÃO – A verdade é que Trump atingiu, com sua tarifa, não apenas os produtos brasileiros, mas também o espírito da cooperação internacional. O Brasil, ao reagir de forma articulada e racional, consegue transformar uma provocação em oportunidade.

Resta agora saber se os efeitos econômicos — inevitáveis — serão atenuados pela ação rápida do governo e pela coesão política que Lula conseguiu construir em torno do tema. No tabuleiro do comércio global, quem perde o equilíbrio perde o jogo. Até agora, quem demonstrou estar mais firme sobre os próprios pés foi o Brasil.

Tarifas, ameaças e interferência: o Brasil na linha de fogo de Trump

Charge de William Medeiros (Arquivo do Google)

Charge de William Medeiros

Pedro do Coutto

O presidente Donald Trump protagonizou um dos episódios mais tensos das relações diplomáticas entre os Estados Unidos e o Brasil. Em um gesto unilateral, o governo americano anunciou a imposição de tarifas de 50% sobre uma série de produtos brasileiros — como aço, alumínio, café, açúcar e carne — o que deve provocar impacto direto na economia brasileira e nas cadeias globais de comércio.

Mais do que uma decisão econômica, a medida tem um evidente componente político: Trump, que já declarou abertamente apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro, usou o anúncio para desferir críticas duras ao Supremo Tribunal Federal e ao governo Lula, acusando-os de promover uma “caça às bruxas” contra seu aliado ideológico.

CARTA – A retórica usada por Trump foi agressiva e impositiva. Em uma carta enviada diretamente ao Palácio do Planalto, o presidente norte-americano exigiu que o governo brasileiro cessasse imediatamente o “comportamento persecutório” contra Bolsonaro, fazendo referência ao julgamento que tramita no STF sobre a tentativa de golpe em janeiro de 2023.

Para analistas internacionais, a linguagem usada por Trump extrapola os limites da diplomacia tradicional, resvalando numa interferência inaceitável nos assuntos internos de outro país. O tom determinante da carta e o gesto de impor tarifas comerciais como forma de pressão revelam uma tentativa clara de condicionar decisões judiciais soberanas a interesses políticos externos.

A resposta do governo brasileiro veio com rapidez. O presidente Lula convocou uma reunião de emergência com ministros da área econômica e da diplomacia e já anunciou que o Brasil deve aplicar medidas de retaliação comercial, com base na Lei de Reciprocidade e nas regras da Organização Mundial do Comércio.

NOTA –  O Itamaraty também divulgou uma nota firme, classificando as declarações de Trump como “ofensivas à soberania brasileira” e alertando para os riscos que essa escalada pode trazer para a estabilidade das relações bilaterais. O mercado reagiu com nervosismo: o dólar subiu, a Bolsa recuou e setores exportadores ligados aos produtos afetados já começaram a reavaliar contratos e projeções de lucro.

Mais do que um conflito comercial, o que se desenha é um embate geopolítico e ideológico. Trump parece decidido a transformar Bolsonaro em símbolo de perseguição política — narrativa semelhante à que ele próprio alimenta nos Estados Unidos ao se apresentar como vítima de um “sistema corrompido”. Ao atacar o STF e criticar abertamente o processo legal em curso no Brasil, o presidente americano tenta deslegitimar instituições democráticas em nome de alianças pessoais e eleitorais.

É uma estratégia já conhecida: criar tensão, alimentar a polarização e mobilizar sua base conservadora com discursos inflamados contra inimigos externos e internos. O problema é que essa tática não se limita ao campo retórico — ela tem efeitos reais e imediatos. O aumento nas tarifas pode causar prejuízos bilionários ao agronegócio e à indústria brasileira, além de pressionar a inflação nos Estados Unidos e desorganizar cadeias de fornecimento internacionais.

RETRAÇÃO –  Setores como o do café e da carne, que têm forte presença no mercado americano, já estimam retração nas exportações. Ao mesmo tempo, consumidores norte-americanos também devem sentir os efeitos com preços mais altos nas prateleiras. Ou seja, trata-se de uma guerra onde todos perdem, mas que interessa a Trump como combustível eleitoral.

A crise que se abre tende a se prolongar. De um lado, o governo brasileiro tem o desafio de defender sua soberania jurídica e econômica sem comprometer relações comerciais fundamentais. De outro, Trump parece determinado a usar o Brasil como palco secundário de sua cruzada ideológica. O embate, ao que tudo indica, está apenas começando — e poderá se tornar um dos capítulos mais delicados da diplomacia latino-americana contemporânea.

Emendas parlamentares, seus privilégios e a urgência de fiscalização

Charge do Baggi (instagram.com/falabobaggi)

Pedro do Coutto

O recente escândalo envolvendo o deputado federal Júnior Mano, acusado de destinar emendas parlamentares para a cidade onde sua esposa exerce o cargo de prefeita, expõe mais uma fissura crônica na estrutura orçamentária e política brasileira. Trata-se de um episódio simbólico — e não isolado — de um sistema que permite o redirecionamento de recursos públicos com finalidade eleitoral, muitas vezes passando ao largo da transparência e da moralidade administrativa.

As chamadas emendas impositivas, instituídas pela Emenda Constitucional nº 86/2015, foram pensadas para garantir aos parlamentares a capacidade de indicar diretamente a aplicação de parcelas do orçamento da União, sob o manto da descentralização e da representatividade. Na prática, no entanto, têm se tornado terreno fértil para o clientelismo, o favorecimento pessoal e, como no caso de Júnior Mano, o conflito de interesses. O orçamento público, nesse contexto, transforma-se em moeda política, barganhada por apoio e reeleição.

REGRA – Reportagens investigativas de veículos como Folha de S.Paulo, O Globo e Agência Pública têm demonstrado que essa prática, longe de ser exceção, é regra silenciosa no jogo político nacional. Parlamentares articulam o repasse de verbas para municípios aliados — ou administrados por seus familiares — e, muitas vezes, escolhem as empresas que executarão as obras com base em vínculos obscuros, quando não escandalosamente evidentes.

A questão central é: quem fiscaliza esse circuito orçamentário? A Controladoria-Geral da União (CGU), o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério Público Federal têm atuado, mas com recursos e quadros limitados frente ao volume de emendas e à complexidade de rastrear a efetiva execução das obras. Em muitos casos, os projetos não saem do papel ou são superfaturados, e a prestação de contas se perde em burocracias lenientes ou coniventes.

O modelo das emendas impositivas, sem um controle institucional eficiente, cria uma simbiose perigosa entre orçamento público e projeto de poder. O dinheiro que deveria ser destinado à saúde, educação, infraestrutura e desenvolvimento regional, muitas vezes é desviado para alimentar redutos eleitorais e relações promíscuas com empreiteiras. É a perpetuação de um ciclo vicioso: recursos públicos que financiam campanhas disfarçadas de obras públicas.

FICALIZAÇÃO – Não se trata de criticar o instrumento das emendas parlamentares — elas podem, sim, ser um importante mecanismo de descentralização e democratização dos investimentos federais. Mas é preciso apertar os parafusos da fiscalização. Um sistema automatizado e transparente, como propõem especialistas da Transparência Internacional, combinado com auditorias frequentes do TCU e ações proativas do Ministério Público, pode reduzir drasticamente o desvio de finalidade.

Enquanto não houver rigor na apuração e punição exemplar dos envolvidos, escândalos como o de Júnior Mano continuarão surgindo — e se multiplicando. O Parlamento, que deveria ser a casa da representação popular, corre o risco de se tornar apenas o balcão de negócios das elites políticas locais. E o cidadão, como sempre, paga a conta.

A crise ética que corrói o uso das emendas parlamentares não é apenas uma questão técnica de gestão orçamentária — é, sobretudo, uma questão moral e democrática. Ou o Brasil enfrenta com seriedade essa distorção, ou continuará sendo vítima do velho hábito nacional de transformar o público em privado sob o pretexto da legalidade.

Trump, Bolsonaro e a diplomacia como ringue

Trump saiu em defesa de Jair Bolsonaro e Lula revidou

Pedro do Coutto

A política externa de Donald Trump nunca foi regida pela estabilidade, pelo diálogo ou pela diplomacia tradicional. Pelo contrário, sua retórica — sempre marcada por ameaças, imposições tarifárias e criação de tensões — segue um roteiro de confrontação permanente.

E, agora, em seu novo ciclo de protagonismo, Trump volta a mirar não apenas os adversários tradicionais dos Estados Unidos, mas também a política interna de outros países, como o Brasil, utilizando Jair Bolsonaro como símbolo e escudo de uma narrativa antagônica ao atual governo Lula.

Ao ameaçar com tarifas produtos oriundos de países do Brics — bloco que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul —, Trump acena com uma espécie de guerra comercial unilateral, que visa enfraquecer alianças do Sul Global e reafirmar a primazia americana pela via da coação econômica. Essas ameaças, embora ainda retóricas, geram efeitos concretos nos mercados emergentes, afetando as expectativas de juros e impactando diretamente a balança comercial brasileira, por exemplo.

CRÍTICAS –  O episódio mais recente, porém, vai além da política econômica e mergulha num terreno de ingerência política. Trump reviveu a expressão “caça às bruxas”, usada com força nos Estados Unidos nos anos 1950 durante o macarthismo — período de perseguições ideológicas marcadas pelo anticomunismo histérico —, para criticar os processos judiciais enfrentados por Bolsonaro no Brasil. Em sua visão enviesada, o ex-presidente brasileiro estaria sendo alvo de uma perseguição política articulada pelo governo Lula. Mas essa narrativa não resiste a uma leitura objetiva da realidade jurídica do país.

Bolsonaro é réu em múltiplos processos no Supremo Tribunal Federal, muitos deles relacionados a ações e omissões durante a pandemia, além de tentativas de minar o sistema democrático brasileiro. Trata-se de processos conduzidos por instituições autônomas, como o Ministério Público e o Judiciário, em consonância com os princípios do Estado de Direito. Reduzi-los a um jogo de interesses ideológicos é uma tentativa grosseira de deslegitimar as estruturas republicanas brasileiras.

Trump não demonstra interesse em apresentar propostas construtivas, seja no cenário interno americano, seja no panorama internacional. Sua política é a da provocação, da divisão, da confrontação perpétua. O Brasil, neste contexto, se vê tragado por uma retórica que visa fortalecer sua base ideológica com ecos em segmentos bolsonaristas. Não se trata de defender Bolsonaro por afinidade genuína, mas de usá-lo como peça retórica para atacar Lula, que representa um projeto antagônico ao que Trump defende.

INTERFERÊNCIA – É preocupante que o presidente americano utilize sua visibilidade internacional para interferir, mesmo que simbolicamente, no processo político brasileiro. Mais do que declarações isoladas, esses movimentos revelam uma tentativa de alinhar agendas autoritárias em diferentes partes do mundo, reforçando uma frente de oposição às democracias pluralistas e ao multilateralismo.

Em tempos em que o planeta clama por cooperação e reconstrução, Trump insiste em transformar a diplomacia num ringue, a política em espetáculo, e a verdade em arma. E o Brasil, infelizmente, volta a ser cenário — e não ator — dessa encenação.

Previdência: o desafio está no equilíbrio, não apenas na despesa