Crise de popularidade e fragmentação política são os desafios de Lula em 2025

Charge do Cláudio (folha.uol.com.br)

Pedro do Coutto

O governo do presidente Lula da Silva enfrenta, em 2025, um cenário político e econômico desafiador. A recente tentativa de aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) gerou forte reação na Câmara dos Deputados, com parlamentares articulando movimentos para anular a medida. Essa iniciativa evidencia a crescente tensão entre o Executivo e o Legislativo, especialmente com o Centrão pressionando por maior influência e recursos no governo.

A base de apoio de Lula, que já demonstrava sinais de fragilidade, mostra-se cada vez mais fragmentada. Divergências internas e disputas por protagonismo entre diferentes alas do governo têm dificultado a implementação de políticas coesas. A falta de unidade compromete a eficácia administrativa e a capacidade de resposta às demandas populares.

ÍNDICES – A popularidade do presidente tem sofrido quedas significativas. Pesquisas recentes indicam uma aprovação de apenas 24%, o menor índice registrado em seus três mandatos. A desaprovação atinge 41%, refletindo o descontentamento da população com a gestão atual. Fatores como a inflação dos alimentos, que subiu 55% nos últimos cinco anos, têm impactado diretamente o poder de compra dos brasileiros, especialmente das classes mais baixas.

O Nordeste, tradicional bastião eleitoral de Lula, também apresenta sinais de desgaste. A aprovação na região caiu de 67% para 60% entre dezembro e janeiro, segundo levantamento da Quaest. A dificuldade do governo em dialogar com trabalhadores informais e pequenos profissionais liberais, comuns na região, contribui para esse cenário.

A comunicação do governo tem sido apontada como um dos pontos fracos. Erros estratégicos no início do mandato criaram falsas expectativas, segundo avaliação do próprio Planalto. A falta de clareza na divulgação de políticas e medidas adotadas contribui para a percepção de ineficiência e desorganização.

CRISES – Internamente, o governo enfrenta crises e instabilidades. Ministros manifestam desejo de deixar os cargos, e a relação com o Congresso é marcada por tensões. A recente decisão do Superior Tribunal Militar de reduzir penas de militares envolvidos na morte do músico Evaldo Rosa levanta preocupações sobre a justiça militar no Brasil e adiciona mais um elemento de desgaste para o governo.

A oposição, por sua vez, aproveita o momento para intensificar críticas. O ex-presidente Jair Bolsonaro, mesmo inelegível, declarou que Lula “está derretendo”, referindo-se à queda na popularidade do atual presidente. Pesquisas indicam que nomes da direita, como Bolsonaro e sua esposa Michelle, aparecem à frente de Lula em cenários de segundo turno para 2026.

Diante desse panorama, o governo Lula precisa reavaliar estratégias e buscar reconstruir sua base de apoio. A implementação de políticas eficazes, uma comunicação clara e a recomposição das alianças políticas são essenciais para superar os desafios atuais e evitar um isolamento político que comprometa a governabilidade e as perspectivas para as próximas eleições.

Centrão ensaia o desembarque: a crise silenciosa que ameaça Lula em 2026

Recuo no IOF expõe falhas na gestão e abala credibilidade do governo

Episódio gerou um embate direto entre Sidônio e Haddad

Pedro do Coutto

A recente tentativa do governo brasileiro de aumentar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre investimentos no exterior, seguida de um recuo parcial, expôs fragilidades na coordenação interna da equipe econômica e gerou tensões políticas significativas. O episódio não apenas abalou a confiança dos agentes econômicos, mas também forneceu munição à oposição para questionar a condução da política fiscal do governo.

Em entrevista ao jornal O Globo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, atribuiu a confusão à divulgação precipitada da medida pela Secretaria de Comunicação, liderada por Sidônio Palmeira. Haddad afirmou que a pasta não costuma participar da elaboração de relatórios finais, mas que, neste caso, divulgou a decisão de reajustar o IOF, o que teria causado a turbulência. Essa tentativa de transferir a responsabilidade para a comunicação institucional foi vista por muitos como uma estratégia defensiva para se desvincular das consequências políticas e econômicas da medida.

ALÍQUOTA – O aumento do IOF, que previa uma alíquota de 3,5% sobre investimentos de brasileiros no exterior, foi anunciado como parte de um esforço para aumentar a arrecadação e atingir as metas fiscais estabelecidas. No entanto, a medida gerou críticas imediatas de diversos setores, incluindo o Banco Central, que não teria sido consultado previamente. A reação negativa levou o governo a recuar parcialmente, mantendo a alíquota zero para transferências de fundos de investimento brasileiros para o exterior, mas mantendo aumentos em outras operações, como empréstimos corporativos e transações com cartões internacionais.

A reversão parcial da medida resultou em uma perda estimada de R$ 6 bilhões na arrecadação prevista até 2026, comprometendo os planos do governo de reforçar o caixa e cumprir as metas fiscais. Além disso, a forma como a decisão foi tomada e posteriormente revertida levantou questionamentos sobre a coordenação entre os diferentes órgãos do governo e a clareza na comunicação das políticas econômicas.

A oposição aproveitou o episódio para criticar a condução da política econômica do governo, apontando para a falta de planejamento e a instabilidade nas decisões. A situação também reacendeu debates sobre o papel do Congresso Nacional na definição das políticas fiscais, com Haddad reconhecendo que o ajuste fiscal depende cada vez mais da atuação do Legislativo, em um contexto que ele descreveu como de “semipresidencialismo”.

DIVERGÊNCIAS – A crise também expôs divergências dentro da própria equipe econômica, com relatos de que o Banco Central e outros setores do governo foram pegos de surpresa pela medida. A falta de alinhamento interno e a ausência de uma estratégia de comunicação eficaz contribuíram para a percepção de desorganização e improviso na condução da política fiscal.

Analistas políticos destacam que o episódio pode ter impactos duradouros na credibilidade do governo junto ao mercado e à sociedade. A confiança na estabilidade e previsibilidade das políticas econômicas é fundamental para atrair investimentos e garantir o crescimento sustentável. A instabilidade gerada por decisões mal coordenadas pode minar esses objetivos e dificultar a implementação de futuras medidas necessárias para o equilíbrio fiscal.

Em resumo, o episódio do aumento e recuo do IOF revelou falhas significativas na coordenação e comunicação das políticas econômicas do governo. A tentativa de transferir a responsabilidade para a Secretaria de Comunicação não convenceu e expôs ainda mais as fragilidades internas. Para recuperar a confiança dos agentes econômicos e da sociedade, será necessário um esforço coordenado para melhorar a governança interna, fortalecer a comunicação institucional e garantir a previsibilidade das políticas fiscais.

Crise de direção, com claros sinais de desorganização na gestão econômica

Charge do Jorge Braga ( Arquivo Google)

Pedro do Coutto

O recente episódio envolvendo o aumento do IOF, seguido por um recuo constrangedor da equipe econômica, expôs mais do que um erro técnico ou uma mudança estratégica. Ele revelou uma profunda desarticulação entre os planejamentos e a execução das políticas financeiras do governo. O vaivém na decisão não apenas afetou o mercado, mas também comprometeu a credibilidade da gestão econômica perante investidores, analistas e a sociedade.

A hesitação do Ministério da Fazenda diante da pressão política e da reação pública evidenciou um problema maior: a falta de coesão entre os discursos e as ações. A impressão que se passa é de um governo que testa hipóteses em tempo real, sem considerar os impactos estruturais ou mesmo os compromissos assumidos anteriormente. A imagem que fica é a de uma gestão vacilante, sem uma bússola clara.

FRAGILIDADE – Esse tipo de comportamento, infelizmente, não é um caso isolado. A instabilidade econômica e a fragilidade nas decisões encontram paralelos nos escândalos recentes envolvendo o INSS. Como explicar a ocorrência de nove milhões de fraudes em um sistema que já havia sido denunciado publicamente? A resposta não está apenas na má gestão, mas na conivência passiva com o descontrole.

A intervenção direta do presidente Lula no INSS e a posterior demissão de Carlos Lupi demonstram que a crise extrapolou os limites técnicos e se tornou um problema político. A substituição de nomes, no entanto, não resolve a ausência de um projeto sólido. Sem uma estratégia coerente, mudanças de comando podem até sinalizar ação, mas não garantem eficiência.

Mais preocupante é a recorrência desse padrão de improviso e correção. A gestão econômica precisa de estabilidade, previsibilidade e responsabilidade. O Brasil, diante de desafios internos e externos, não pode se dar ao luxo de decisões tomadas ao sabor do vento, com recuos apressados que só reforçam a percepção de um governo desorganizado.

VULNERABILIDADE – A fragilidade das estruturas de fiscalização e controle, evidenciada no caso do INSS, expõe uma vulnerabilidade perigosa. Se nem mesmo denúncias públicas são capazes de provocar respostas rápidas e eficazes, o que esperar de outras áreas igualmente sensíveis? O dano institucional é profundo e de longo alcance.

O mais alarmante é que esses episódios não parecem provocar no governo uma reflexão estratégica de médio e longo prazo. A impressão que se tem é de um foco exclusivo na gestão de crises, sempre reagindo a escândalos e pressões, em vez de atuar preventivamente com base em dados e planejamento sério. Isso mina a confiança de todos os setores da sociedade.

Enquanto não houver um reposicionamento firme das lideranças da área econômica, com diretrizes claras, transparência e compromisso com a estabilidade, os sinais de fraqueza e vacilação continuarão a pautar a percepção pública sobre o governo. E em política, como se sabe, a confiança é um ativo difícil de recuperar uma vez perdido.

Crise do IOF: Falta de coordenação externa e interna expõe fragilidades do governo

Charge do Cazo (blogdoaftm.com.br)

Pedro do Coutto

O governo Lula enfrentou mais uma turbulência institucional após a publicação de um decreto que previa aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) para uma série de operações de câmbio e crédito de empresas. A medida, anunciada sem o necessário amadurecimento técnico e político, precisou ser revisada poucas horas depois da sua edição, revelando falhas graves de coordenação interna no Executivo e falta de sensibilidade em relação aos impactos no mercado financeiro.

O recuo quase imediato da equipe econômica, convocando uma reunião emergencial no Palácio do Planalto, escancarou a improvisação que permeou a construção da medida. Participaram da reunião ministros estratégicos, como Rui Costa (Casa Civil) e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), além de técnicos da área jurídica do governo. A ausência física de Fernando Haddad, que participava remotamente por estar em São Paulo, também evidencia o grau de desconexão entre os setores responsáveis pela política econômica.

REAÇÃO – A decisão de aumentar a alíquota de IOF para aplicações de fundos de investimento no exterior gerou forte reação do mercado financeiro, que alertou o governo para os riscos de desorganização no fluxo de capitais. A equipe econômica, ao perceber que o texto original autorizava uma tributação diária desses fundos, recuou, restaurando a alíquota zero anterior. A correção, embora necessária, comprometeu a credibilidade do governo ao expor uma falha de avaliação técnica da Fazenda.

A resposta oficial do Ministério da Fazenda, que classificou a mudança como um “ajuste com equilíbrio”, não foi suficiente para conter as críticas. A comunicação truncada e os ruídos entre as pastas envolvidas criaram um cenário propício para especulações e disseminação de desinformação, o que obrigou o governo a editar um novo decreto antes mesmo da abertura dos mercados na sexta-feira. Essa instabilidade teve impacto imediato na confiança de investidores e agentes econômicos.

Outro ponto que motivou revisão foi a previsão de aumento do IOF sobre remessas de brasileiros ao exterior para fins de investimento, o que causou apreensão entre contribuintes e operadores do setor financeiro. A Fazenda esclareceu que a alíquota de 1,1% seria mantida, mas o estrago na percepção pública já estava feito. A oposição rapidamente explorou o episódio, acusando o governo de buscar formas disfarçadas de controle de capitais.

PREVISÃO – A estimativa inicial da equipe econômica era de que o aumento do IOF poderia render até R$ 20,5 bilhões em 2025, cifra que ajudaria a aliviar o esforço fiscal. No entanto, com as mudanças de última hora, essa previsão caiu entre R$ 1 bilhão e R$ 2 bilhões. A perda potencial de arrecadação, somada ao desgaste político, questiona se o custo-benefício da iniciativa compensou o embate com o setor produtivo e a sociedade civil.

O episódio também gerou ruídos políticos. Empresários influentes, como Flávio Rocha da Riachuelo, foram duros nas críticas, classificando a medida como “uma explosão de arrecadação insuficiente para uma expansão assustadora do gasto público”. O governo, por sua vez, teme que a oposição capitalizará politicamente o aumento do IOF sobre cartões de crédito no exterior, ainda mantido no decreto, como forma de desgastar Lula perante a classe média.

Por fim, o episódio serve como um alerta para os desafios de gestão política e técnica enfrentados pela atual administração. Em um momento em que busca equilibrar as contas públicas e demonstrar compromisso com a responsabilidade fiscal, o governo precisa urgentemente melhorar sua articulação interna e comunicação com o mercado. A construção de uma agenda econômica sólida exige previsibilidade, diálogo e, sobretudo, coerência entre discurso e prática.

Tentativa de golpe: O que revela o depoimento do ex-comandante da Aeronáutica

Vaiado por prefeitos: Lula sente o peso do desgaste com o Centrão

Presidente foi recebido com protestos na Marcha dos Prefeitos

Pedro do Coutto

As vaias direcionadas ao presidente Lula da Silva durante um evento com prefeitos em Brasília evidenciam um cenário político cada vez mais complexo para o governo federal. Embora o encontro tenha reunido lideranças municipais de diferentes espectros, o predomínio de representantes do chamado “centrão” expôs com clareza as dificuldades de articulação política enfrentadas pelo Palácio do Planalto. Lula se vê diante de uma classe política majoritariamente pragmática, que, apesar de integrar a base aliada formalmente, tem demonstrado crescente insatisfação com decisões que afetam sua autonomia orçamentária.

As manifestações de desaprovação ocorreram em momentos simbólicos: ao ser anunciado no palco, ao iniciar seu discurso e ao encerrar sua fala. Ainda que também tenha havido aplausos, o clima geral foi de constrangimento político. Esse tipo de recepção, em um evento institucional, representa não apenas um gesto de desrespeito à figura presidencial, mas também um sinal de que a base municipalista já não se sente plenamente representada ou contemplada pelas ações do governo federal.

CAPILARIDADE – O pano de fundo dessa tensão remonta ao desempenho eleitoral dos partidos do centrão nas eleições municipais de 2024. Siglas como PSD e MDB saíram fortalecidas, governando um número expressivo de municípios — o que lhes confere não apenas capilaridade, mas também poder de barganha. A leitura feita por muitos prefeitos é de que suas demandas locais têm sido negligenciadas em função de uma pauta federal mais centralizada e fiscalizadora, especialmente no que diz respeito ao uso de emendas parlamentares.

É nesse ponto que surge a figura do ministro Flávio Dino, agora no Supremo Tribunal Federal, como um elemento central da irritação dos gestores municipais. Suas decisões, voltadas para a moralização e transparência na liberação de recursos públicos, afetaram diretamente a fluidez dos repasses de emendas. O episódio mais recente foi a suspensão do pagamento de emendas de comissão, que expôs fragilidades no modelo de destinação dos recursos e resultou na abertura de um inquérito pela Polícia Federal.

A medida foi motivada por representações feitas por partidos como o PSOL, que denunciaram supostas irregularidades na liberação de R$ 4,2 bilhões em emendas. O argumento era de que os repasses ocorreram sem critérios claros de transparência e com base apenas na assinatura de um grupo restrito de líderes partidários. A resposta do STF, ao exigir explicações da Câmara dos Deputados, colocou ainda mais lenha na fogueira da disputa entre os poderes.

ENTRAVE – Para os prefeitos, no entanto, a questão transcende o mérito jurídico ou ético da decisão. O que se impõe é a percepção de que o governo federal passou a ser um entrave ao funcionamento do sistema político tal como ele operava até então — baseado em trocas, emendas e alianças informais. E, mesmo que a atuação de Flávio Dino seja independente, a associação simbólica com o governo Lula é inevitável, reforçada ainda pelo histórico político do ministro e sua ligação com o campo progressista.

Nesse contexto, a impopularidade do presidente em certos círculos políticos locais se intensifica. Prefeitos e vereadores, especialmente aqueles que dependem de emendas para fazer frente às demandas básicas de suas cidades, sentem-se desamparados por Brasília. A lógica de que “o culpado está no Planalto” ganha tração, mesmo que as decisões tenham origem no Judiciário ou no Legislativo. Trata-se, em última instância, de um problema de comunicação política, que o governo ainda não soube resolver adequadamente.

Esse episódio também reforça um ponto que tem sido recorrente desde o início do terceiro mandato de Lula: a dificuldade em consolidar uma base política confiável, mesmo entre aliados tradicionais. O centrão, apesar de compor formalmente a coalizão governista, se comporta com crescente independência — ora pressionando por mais recursos, ora demonstrando insatisfação em público, como ocorreu nesse encontro com os prefeitos.

VOLATILIDADE – O contraste com episódios anteriores, como as vaias direcionadas a Jair Bolsonaro em 2022 por públicos similares, mostra como a popularidade entre as bases municipais é volátil e sujeita a cálculos conjunturais. Aquilo que hoje se apresenta como descontentamento com Lula pode, em outro momento, ser redirecionado para outro ator político, dependendo de quem estiver no controle dos recursos e da agenda institucional.

Por fim, o episódio deve servir de alerta para o governo federal sobre os limites de sua capacidade de articulação em tempos de escassez fiscal e judicialização da política. O ruído gerado por decisões judiciais, somado à fragmentação do sistema partidário, cria um ambiente propício para a erosão da autoridade presidencial. E, enquanto isso, prefeitos seguem na busca por visibilidade, autonomia e recursos — mesmo que isso signifique vaiarem o presidente da República em rede nacional.

 

O depoimento que tensiona a narrativa militar sobre a tentativa de golpe

Endividamento das famílias brasileiras é reflexo de políticas insuficientes

A crise dos descontos indevidos e o alerta ao sistema previdenciário brasileiro

Quase 1,5 milhão de pessoas já pediram reembolso

Pedro do Coutto

O recente aumento no número de aposentados e pensionistas que solicitaram reembolso de descontos indevidos revela um problema sistêmico na relação entre o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e entidades associativas. Segundo dados divulgados pelo próprio INSS, quase 1,5 milhão de beneficiários contestaram cobranças em apenas quatro dias, entre 14 e 17 de maio. O dado, além de alarmante, levanta sérias questões sobre a fiscalização e a transparência no sistema previdenciário.

A velocidade com que esses números cresceram — de 1,3 milhão para 1,46 milhão em apenas 24 horas — sugere que o problema está longe de ser pontual. O fato de que apenas 27 mil pessoas, entre mais de 1,4 milhão, autorizaram de fato os descontos comprova a extensão do descontrole. Trata-se de uma desconfiança generalizada dos beneficiários, que passaram a questionar a legitimidade de vínculos com sindicatos e associações.

FRAGILIDADES – O episódio evidencia fragilidades no sistema de consentimento para débitos em folha. A facilidade com que entidades acessam os valores pagos a aposentados sem autorização explícita expõe não só uma falha operacional do INSS, mas também a atuação predatória de organizações que, sob a justificativa de representação coletiva, exploram economicamente uma população vulnerável.

A resposta do governo, por meio do aplicativo “Meu INSS” e da Central 135, ainda que bem-vinda, veio com atraso. As instabilidades relatadas no aplicativo reforçam a percepção de despreparo tecnológico do sistema público frente a demandas urgentes. O presidente do INSS, Gilberto Waller, recomendou “calma” aos usuários, mas o pedido soa insuficiente diante da frustração de milhões de brasileiros que dependem desses valores para sua sobrevivência.

COMPROVAÇÃO – O processo de contestação e reembolso também apresenta gargalos. As entidades têm até 15 dias úteis para comprovar a autorização do desconto e, caso não o façam, mais 15 dias para devolver os valores ao INSS. No entanto, essa devolução não será feita diretamente aos beneficiários — o que, embora vise proteger dados bancários, aumenta a distância entre quem sofreu o prejuízo e o ressarcimento efetivo.

A centralização do reembolso no INSS pode gerar novos atrasos e ineficiências, especialmente se considerarmos a já conhecida sobrecarga do órgão. O modelo atual, embora preventivo em termos de segurança de dados, não oferece garantias claras sobre prazos de ressarcimento ou mecanismos de responsabilização para entidades que atuaram de forma irregular. A ausência de sanções mais duras pode estimular a reincidência dessas práticas.

Conclui-se, portanto, que o episódio dos descontos indevidos é mais do que uma falha administrativa: é um sintoma de um modelo previdenciário que carece de mecanismos modernos de proteção ao beneficiário. O Estado precisa rever urgentemente os critérios de autorização de débitos e fortalecer sua infraestrutura digital para evitar que aposentados, muitos deles sem familiaridade com aplicativos e serviços online, sejam prejudicados por práticas abusivas. Se não houver uma resposta institucional firme, esse tipo de escândalo tende a se repetir, corroendo ainda mais a já frágil confiança no sistema público.

INSS, fraudes e a responsabilidade política que ninguém quer assumir

A CPI do INSS e a tentativa do governo Lula de controlar os danos

Charge do Cláudio de Oliveira (folha.uol.com.br)

Pedro do Coutto

A instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a corrupção no INSS não é apenas um reflexo da indignação pública, mas uma imposição dos fatos. O escândalo envolvendo fraudes em descontos consignados de aposentados e pensionistas ultrapassou qualquer limite de tolerância — não apenas pela cifra astronômica (fala-se em 9 milhões de autorizações falsas), mas pela sensação de abandono institucional diante de um crime que se desenrolava à luz do dia.

Diante desse cenário, o governo Lula recuou de sua postura inicial de contenção e decidiu apoiar a CPI. Foi uma adesão forçada, mais por sobrevivência política do que por genuíno compromisso com a transparência. Afinal, seria politicamente insustentável se opor a uma investigação que já conta com farta documentação, denúncias confirmadas e cobertura extensa da imprensa.

ESCÂNDALO – A linha oficial do Planalto tenta empurrar a gênese da corrupção para o governo anterior, de Jair Bolsonaro. Ainda que as raízes do esquema possam, de fato, estar lá, é impossível ignorar que o escândalo atingiu proporções industriais justamente em 2024 — já sob a responsabilidade plena do atual governo. A alegação de “herança maldita” pode funcionar como argumento político, mas não resiste à análise administrativa: se o problema cresceu, foi porque não houve ação eficaz para detê-lo.

Mais grave ainda é a tentativa do governo de ocupar simultaneamente a presidência e a relatoria da CPI. Ao buscar o controle da comissão, o Planalto sinaliza que seu apoio à investigação é, na melhor das hipóteses, condicional. Trata-se de uma estratégia de contenção de danos, não de responsabilização. A relatoria, posição estratégica da CPI, terá a caneta que poderá dar nome aos bois — ou livrá-los discretamente. Por isso, a disputa por esse posto é um termômetro claro do quanto está em jogo.

A tentativa de concentrar poder dentro da comissão levanta suspeitas legítimas sobre a real disposição do governo em permitir que a investigação vá até as últimas consequências. A sociedade exige respostas. E não há mais espaço para o discurso do “não sabíamos”. As denúncias estavam disponíveis, os alertas foram dados, e as consequências agora pesam não apenas sobre os que operaram o esquema, mas também sobre aqueles que fecharam os olhos.

INTERFERÊNCIA – Ao apoiar a CPI, Lula tenta se desvincular do escândalo. Mas, ao mesmo tempo, busca interferir diretamente em sua condução. Essa contradição revela um dilema típico de quem governa em tempos de crise: ser investigado ou controlar a investigação? A escolha do Planalto parece estar clara — resta saber se o Congresso e a opinião pública aceitarão esse roteiro.

O Brasil assistirá, mais uma vez, ao embate entre discurso e prática, entre a retórica da apuração e o jogo de bastidores. O que está em julgamento não é apenas um esquema de corrupção. É a capacidade do Estado de zelar por seus mais vulneráveis — e de impedir que a máquina pública seja sequestrada pela impunidade.

INSS na mira: Quando o Estado falha com os que mais precisam

Charge do Jônatas (politicadinamica.com)

Pedro do Coutto

A revelação de que quase meio milhão de aposentados e pensionistas foram alvo de descontos indevidos em seus benefícios do INSS demonstra mais do que uma brecha explorada por entidades oportunistas — escancara a falência de mecanismos de controle dentro do próprio Estado. Quando 98,6% dos que se manifestaram dizem desconhecer qualquer vínculo com as associações que retiraram dinheiro de suas aposentadorias, não estamos falando de erro isolado. Trata-se de um esquema de larga escala, com traços de conivência estrutural.

O mais alarmante nessa operação conjunta da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União não é apenas o número de vítimas, mas o tempo em que essas fraudes puderam ocorrer sob o olhar aparentemente cego da administração pública. Como é possível que 41 entidades atuem livremente com descontos em folha sem uma verificação robusta de autorização? A resposta, infelizmente, está no tipo de gestão negligente que o sistema previdenciário brasileiro tem tolerado há décadas.

PAGAMENTO – A resposta oficial, embora articulada, soa defensiva. O presidente do INSS, Gilberto Waller, fez questão de repetir que o pagamento será feito diretamente pela folha e que o segurado não deve dar informações a ninguém. A ênfase na cautela — ainda que válida — escancara o receio de que o vácuo institucional seja explorado por novos golpistas. Mas há uma ironia cruel nisso: os próprios canais do governo já foram, de fato, explorados por supostas “associações” que tiveram acesso facilitado às folhas de pagamento.

É difícil acreditar que esse tipo de fraude seja realizado sem o envolvimento, direto ou indireto, de servidores ou prestadores de serviço ligados ao sistema. A DataPrev, que processa essas informações, também está no centro das atenções, e ainda assim, sua responsabilidade prática tem sido pouco debatida. Fala-se em “monitoramento”, mas não há qualquer indício de responsabilização efetiva por falhas que permitiram o início e a perpetuação dessas práticas.

Outro ponto que merece crítica é a reação da plataforma digital. A nota de protesto contra os “curiosos” que congestionam o sistema soa como um desvio de foco. Ora, se o número de vítimas é tão expressivo, não seria mais sensato reforçar os canais digitais, garantir estabilidade e transparência, ao invés de pedir silêncio da população? A curiosidade, nesse caso, é legítima — o medo de ser mais uma vítima é real.

ALENTO – A promessa de que não haverá prazo para a contestação é um alento tímido frente ao estrago causado. Mas o verdadeiro teste será a agilidade e transparência na devolução dos valores. E mais ainda: o governo tem a obrigação de fazer uma devassa nos processos de autorização de descontos em folha, auditar todas as entidades envolvidas e rever profundamente os critérios de cadastramento de associações no sistema previdenciário.

Se o Brasil quer mesmo proteger seus aposentados — aqueles que sustentam, com décadas de trabalho, a espinha dorsal do sistema —, precisa fazer muito mais do que ressarcir valores. Precisa punir os culpados, rever processos e assumir publicamente sua falha. Não basta dizer que “ninguém será deixado de fora”. O Estado já se ausentou demais. Agora, é hora de estar presente — com rigor, justiça e transparência.

INSS exibe a conivência silenciosa do Estado com o crime institucionalizado

Charge do J. Bosco (liberal.com)

Pedro do Coutto

A recente revelação do esquema de fraudes em larga escala contra aposentados e pensionistas do INSS expõe, mais uma vez, a fragilidade estrutural da máquina pública brasileira. A dimensão das irregularidades não deixa dúvidas de que houve envolvimento de pessoas com acesso privilegiado ao sistema. Trata-se de um golpe que só pôde ser sustentado ao longo do tempo por meio da conivência, ou ao menos da complacência, de agentes públicos com conhecimento técnico e institucional.

A investigação aponta para uma rede criminosa profundamente enraizada não apenas na estrutura do INSS, mas também com possíveis vínculos em outras esferas da administração federal e, quiçá, estadual. Dada a complexidade do esquema e o volume financeiro desviado, é evidente que o sistema de controle interno falhou – ou foi deliberadamente sabotado. A repetição dos lançamentos ilegais, sem que fossem detectados por auditorias ou sistemas de monitoramento, levanta sérias dúvidas sobre a efetividade da fiscalização.

LINHA DURA – A postura do governo federal diante da gravidade do caso tem sido, até agora, tímida. Essa hesitação institucional é preocupante, pois transmite à sociedade a mensagem de que crimes contra o erário, mesmo quando atingem diretamente a população mais vulnerável, não são enfrentados com a devida prioridade.

Mais alarmante ainda é o indicativo de que parte da estrutura de fiscalização pode continuar contaminada ou inerte. Não há como justificar a ausência de respostas contundentes após o escândalo vir à tona. A demora em promover uma devassa completa no órgão, afastar os suspeitos e reforçar os mecanismos de controle mina a credibilidade da atual gestão e alimenta a sensação de impunidade.

A omissão histórica em relação às fraudes na Previdência é um traço crônico da administração pública. Porém, o momento exige mais que discursos e promessas de correção: é preciso responsabilização efetiva, reformas estruturais e transparência no andamento das investigações. Qualquer tentativa de proteger envolvidos ou minimizar o impacto político e institucional do caso será compreendida como cumplicidade.

SAQUE – Não é aceitável que o INSS, responsável por zelar pela dignidade de milhões de brasileiros que dependem de seus benefícios, continue sendo tratado como um território de saque institucionalizado. O rombo causado pelos desvios, além de moralmente inaceitável, gera impactos econômicos significativos e compromete a confiança da população no Estado.

Por fim, o caso revela a urgência de uma política de integridade mais robusta e autônoma dentro dos órgãos públicos. A corrupção, quando não combatida com firmeza, corrói a legitimidade das instituições e agrava o já profundo fosso entre o cidadão e o Estado. A sociedade brasileira, especialmente seus aposentados e pensionistas, exige respostas à altura da ofensa cometida – e o governo precisa decidir de que lado da história deseja estar.

Na caixa-preta dos descontos indevidos, por que complicar o que já está claro?

Caso Stefanutto expõe as fissuras na máquina previdenciária brasileira

Ex-presidente do INSS revela “susto” com operação da PF

Pedro do Coutto

A operação da Polícia Federal que investiga um esquema bilionário de desvios na folha de pagamento de aposentados e pensionistas do INSS não apenas abalou os alicerces da maior autarquia federal, como trouxe à tona mais uma crise política silenciosa — e sintomática. No centro do escândalo, o ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, que deixou o cargo em abril após ser afastado por ordem judicial, agora tenta se descolar do epicentro do furacão.

Em entrevista à CNN Brasil, Stefanutto adotou um discurso de surpresa e indignação. Disse ter sido acordado pela PF em uma cena “inesperada e difícil”, e garantiu que nunca havia se envolvido em qualquer investigação policial ao longo de sua carreira no serviço público. O tom, no entanto, pareceu mais de defesa do que de esclarecimento. Diante da gravidade dos fatos — e das cifras bilionárias em jogo —, o silêncio ou a surpresa não bastam.

DESCONTOS – A retórica do ex-presidente foca em medidas administrativas supostamente adotadas durante sua gestão para conter os chamados “descontos associativos” — um eufemismo, aliás, para a engrenagem de fraudes que agora se revela. Stefanutto faz questão de destacar que muitos dos mecanismos de segurança hoje utilizados foram criados por ele. Ainda assim, o escândalo estourou sob sua presidência, e a profundidade da suposta fraude levanta dúvidas incômodas sobre a real eficácia — ou seriedade — dessas medidas.

Seu afastamento e posterior demissão pelo presidente Lula da Silva foram lidos por muitos como uma tentativa do Planalto de conter o dano político antes que ele contaminasse o discurso de reconstrução institucional que o governo tenta sustentar. Stefanutto, por sua vez, parece ter entendido o gesto, afirmando que considera “natural” sua substituição diante do “desgaste”. Mas, como se sabe, em política, gestos raramente são apenas simbólicos.

CADERNOS – O caso ganhou contornos ainda mais delicados com a revelação, feita pelo jornal O Globo, da existência de cadernos apreendidos pela PF. Neles, constariam anotações que ligam Stefanutto a pagamentos indevidos — incluindo a enigmática menção “Stefa 5%”, supostamente uma alusão à sua parte no esquema. O ex-presidente preferiu não comentar, alegando que sua defesa ainda não teve acesso ao material. Uma resposta protocolar, mas que deixa no ar uma névoa de desconfiança.

A esta altura, o caso vai além da figura de Stefanutto. Ele escancara uma crise sistêmica no INSS, cujos processos internos parecem vulneráveis a esquemas que drenam recursos públicos enquanto milhões de brasileiros aguardam meses por um benefício. Mais do que uma operação da PF, o episódio é um retrato de como a combinação entre burocracia opaca e interesses corporativos pode abrir caminho para a corrupção — mesmo (ou especialmente) quando acompanhada de discursos sobre “legalidade e ordem jurídica”.

O caso Stefanutto é mais do que um episódio isolado de suspeita de corrupção; ele é sintomático de um problema estrutural que atravessa décadas na administração pública brasileira: a fragilidade dos mecanismos de controle interno, a captura institucional por interesses corporativos e a complacência do sistema político com zonas de opacidade administrativa. A folha de pagamentos do INSS, historicamente vulnerável, virou território fértil para esquemas que prosperam na conivência e na negligência.

DESAFIO – O governo Lula, embora tenha reagido com rapidez ao demitir Stefanutto, enfrenta agora o desafio de provar que há real intenção de reformar essas engrenagens corroídas. A substituição de nomes, por si só, não basta. O discurso anticorrupção só será crível se vier acompanhado de uma reforma técnica e profunda nos fluxos de auditoria, nos critérios de nomeações e no monitoramento de entidades conveniadas — muitas vezes operando à margem do interesse público.

Ao fim, o episódio revela o quão distante ainda estamos de um Estado verdadeiramente transparente, onde o zelo com o dinheiro público não dependa apenas da integridade pessoal de ocupantes de cargos-chave, mas de sistemas robustos, impessoais e fiscalizados com rigor. A pergunta que fica, portanto, não é apenas sobre a responsabilidade de Stefanutto — mas sobre o que será feito para que o próximo nome não repita, consciente ou inconscientemente, o mesmo roteiro.

Lembrando o colapso do Terceiro Reich e o fim da guerra na Europa

Data simboliza um ponto de inflexão moral e política

Pedro do Coutto

Na noite de 8 de maio de 1945, em Berlim, representantes do alto comando militar alemão colocaram um ponto final oficial na presença nazista no campo de batalha europeu. Com a assinatura da rendição incondicional, o Terceiro Reich reconheceu a derrota diante das forças aliadas ocidentais e do Exército Vermelho soviético. Assim, chegava ao fim um conflito iniciado quase seis anos antes, que devastou o continente.

A comunicação pública veio apenas no dia seguinte, quando a rádio alemã, ainda sob controle dos últimos remanescentes do regime, anunciou a rendição. A transmissão, carregada de formalidade militar, contrastava com o profundo impacto emocional vivido por milhões: alívio para os libertados, silêncio e vergonha para muitos dos vencidos.

AVANÇOS MILITARES – A trajetória que levou àquele desfecho teve início com os avanços militares relâmpago da Alemanha no início da guerra. A rápida ocupação de territórios como Polônia, França e Noruega deu à liderança nazista uma sensação ilusória de superioridade estratégica. Embalada por essas conquistas, a Alemanha lançou, em 1941, a invasão da União Soviética, numa operação de proporções colossais.

No início, a campanha oriental pareceu repetir o sucesso anterior: as tropas alemãs avançaram profundamente no território soviético, aproximando-se do Volga e cercando Stalingrado. Confiante, Hitler chegou a ironizar críticas internacionais, apostando que a cidade cairia em breve. No entanto, o cerco a Stalingrado acabou marcando uma reviravolta decisiva. Em fevereiro de 1943, o exército alemão que conduzia a ofensiva foi derrotado, e a esperança de uma vitória total começou a desmoronar.

Derrotas em múltiplas frentes se seguiram: a campanha no Norte da África foi perdida, e a abertura de um novo front com o desembarque aliado na Normandia, em 1944, acelerou o cerco à Alemanha. Nos meses seguintes, os soviéticos pressionaram pelo leste, enquanto os aliados avançavam pelo oeste.

RENDIÇÃO – Em meio ao colapso, Hitler se suicidou no subsolo da chancelaria em 30 de abril de 1945. Berlim, sitiada, capitulou dois dias depois. No entanto, os soviéticos exigiram uma rendição formal específica em sua zona de influência, o que levou à assinatura de um novo documento, no dia 8 de maio, em Karlshorst, distrito da capital alemã. A rendição foi chancelada por representantes das quatro grandes potências vencedoras: União Soviética, Reino Unido, Estados Unidos e França.

Mesmo após a rendição, a máquina de propaganda nazista tentou manter alguma aparência de controle. De Flensburg, onde Karl Dönitz – sucessor nomeado por Hitler – ainda exercia autoridade simbólica, foi ao ar o último boletim militar do regime, exaltando a resistência de combatentes isolados no front oriental.

Com o cessar-fogo, os horrores da guerra começaram a ser revelados em escala total. A destruição urbana, o saque ao patrimônio cultural europeu e, sobretudo, o massacre de milhões de vidas humanas expuseram a magnitude da tragédia. Estima-se que apenas na Europa, mais de 40 milhões de pessoas tenham perdido a vida durante o conflito.

TRIUNFO – A rendição da Alemanha nazista em 8 de maio de 1945 não representou apenas o encerramento de uma guerra, mas o colapso de um projeto totalitário construído sobre a negação da dignidade humana, o militarismo agressivo e a manipulação ideológica em escala inédita. A data marca o triunfo das forças que resistiram ao autoritarismo e, ao mesmo tempo, expõe a fragilidade das democracias quando subestimam ameaças emergentes.

O episódio oferece uma advertência clara: a expansão rápida de regimes baseados no culto à força, no desprezo às instituições e na desinformação pode ser inicialmente sedutora, mas invariavelmente conduz à destruição. O entusiasmo inicial que permitiu a ascensão do Terceiro Reich foi alimentado por vitórias militares aparentes e por uma retórica nacionalista que silenciou a crítica e perseguiu a diversidade. Ao fim, custou à Europa dezenas de milhões de vidas e um trauma coletivo cuja reconstrução levou décadas.

Mais do que um evento militar, o 8 de maio simboliza um ponto de inflexão moral e política. É um lembrete permanente de que a paz não é apenas a ausência de guerra, mas a presença de instituições fortes, memória histórica ativa e vigilância constante diante de discursos de ódio, autoritarismo e exclusão. Aprender com esse marco significa reconhecer que a liberdade e os direitos humanos nunca são conquistas definitivas — são compromissos que precisam ser reafirmados a cada geração.

Inflação alta de abril surpreende e reforça a pressão sobre juros

Alimentação e saúde afetam IPCA de abril

Pedro do Coutto

A inflação brasileira voltou a ganhar fôlego em abril, com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrando avanço de 0,43%, conforme divulgado na última sexta-feira. O resultado, impulsionado principalmente pelos segmentos de alimentação, bebidas, saúde e cuidados pessoais, reacendeu o alerta sobre a trajetória dos preços e trouxe novas dúvidas quanto ao rumo da política monetária.

O que mais chamou a atenção dos analistas, porém, foi o comportamento dos chamados núcleos da inflação — indicadores que excluem itens voláteis para captar tendências mais duradouras. A média desses núcleos avançou 0,50% no mês, sinalizando uma inflação mais resistente do que o esperado.

DEMANDA  – Entre os destaques do período, figuram a aceleração nos preços de bens industrializados — puxada por vestuário — e o avanço no setor de serviços, especialmente alimentação fora do lar e serviços pessoais. Esses componentes são tradicionalmente mais sensíveis ao nível de atividade econômica e, portanto, indicam uma demanda ainda aquecida.

Desde o final de 2024, a inflação de serviços tem se mantido elevada, oscilando entre 7,5% e 8% em termos anuais. Essa persistência sugere que o mercado de trabalho segue forte, o que sustenta o consumo das famílias e dificulta o processo de desinflação. Já a alta nos preços de bens industrializados pode refletir tanto o ritmo mais robusto da economia quanto os efeitos residuais da desvalorização cambial observada no fim do ano passado.

Apesar de alguns alívios pontuais — como a queda nos preços das passagens aéreas e o recuo nos alimentos consumidos no domicílio, especialmente os in natura —, o IPCA acumulado em 12 meses subiu para 5,53%, reforçando a percepção de um cenário inflacionário ainda desafiador.

FLEXIBILIZAÇÃO MONETÁRIA – Diante desse panorama, economistas avaliam que o ciclo de flexibilização monetária pode ser interrompido. A expectativa majoritária do mercado aponta para uma elevação de 0,25 ponto percentual na taxa Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para 18 de junho.

Em um contexto de inflação resiliente e atividade econômica firme, os dados de abril reforçam a ideia de que o Banco Central poderá adotar uma postura mais cautelosa, adiando eventuais cortes de juros para o último trimestre do ano.

DIAGNÓSTICO – O desempenho do IPCA em abril reforça o diagnóstico de uma inflação estruturalmente mais resistente, em grande parte alimentada por um mercado de trabalho ainda aquecido e pela força do consumo em serviços. A combinação de núcleos inflacionários elevados, aceleração em bens industrializados e ausência de sinais claros de arrefecimento nos componentes cíclicos desenha um cenário que impõe desafios relevantes à condução da política monetária.

A leitura dos dados sugere que o espaço para cortes adicionais na taxa Selic se estreitou substancialmente. Em vez disso, o Banco Central poderá ser compelido a interromper o ciclo de afrouxamento — ou até mesmo reverter parte dele — caso a pressão inflacionária persista nos próximos meses.

A manutenção da credibilidade da autoridade monetária exigirá, neste momento, uma comunicação firme e decisões calibradas com base em dados, evitando alimentar expectativas de acomodação diante de uma inflação que ainda mostra resiliência preocupante.

Fraude no INSS expõe dilema fiscal e reforça responsabilização de associações

Copom eleva Selic a 14,75% e sinaliza cautela diante de incertezas fiscais e globais