André Roncaglia
Folha
Na mais rica cidade do país, mais de 2 milhões de pessoas ficaram sem energia elétrica na semana passada. Desde 2018, o fornecimento de eletricidade na cidade e em outros 23 municípios da região metropolitana de São Paulo é feito pela Enel, empresa de economia mista controlada pelo Estado italiano (23,8% do capital).
Apesar dos bilhões em investimentos anunciados pela empresa desde 2020, a qualidade relativa do atendimento ficou inalterada, de acordo com o ranking de continuidade de serviço da Aneel, cujo rigor deixa muito a desejar. Ademais, gastos insuficientes com redução de riscos e manutenção da rede de distribuição já levantavam dúvidas sobre a capacidade de resposta a emergências.
TUDO PELO DINHEIRO – Os cortes de 43% nos investimentos em manutenção no segundo trimestre de 2023 — e de 28%, em relação ao segundo trimestre de 2022 — ajudaram a engordar os lucros da monopolista Enel na Grande São Paulo. Os valores de R$ 1,4 bilhão em 2022 e de R$ 900 milhões, no primeiro semestre deste ano, poderiam ter sido destinados, em parte, a enterrar a fiação aérea. Como o contrato de concessão não exige esse investimento, o dinheiro vai parar nos cofres do governo italiano.
Sem controle social sobre os investimentos da empresa, é ofensiva a proposta do prefeito Ricardo Nunes de criar uma “taxa voluntária” para os bairros que quiserem enterrar seus fios. Por essa lógica neoliberal tacanha, os mais ricos serão protegidos enquanto os mais pobres continuarão vivendo sob risco de novos apagões, mero desdobramento do elitismo que marca a gestão do prefeito.
Premida pelas críticas, a empresa alegou — tragicomicamente — que a redução de 36% do quadro de funcionários desde 2019 não afetou sua capacidade de resposta ao evento. Será?
IRRESPONSABILIDADE TOTAL – Mesmo que a Enel consiga triplicar o pessoal colocado na rua para responder a uma emergência, a provável dependência de mão de obra terceirizada revela a visão curto-prazista da gestão.
A alta rotatividade e a menor qualificação desses trabalhadores limita a capacidade de avaliar e resolver problemas, como destacou ao UOL Eduardo Annunciato, presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo.
Essa perda de memória técnica da empresa é um problema crônico que afeta várias estatais privatizadas no setor; entre elas, a Eletrobras, que, como reportou a Folha, cortou quase metade do quadro de funcionários em preparação para a privatização lesa-pátria e ilegal da empresa.
FOCO NO LUCRO – Serviços de utilidade pública requerem uma visão integrada e de longo prazo. O foco no lucro adia —ou sacrifica— melhorias no atendimento. Não à toa, há uma onda da reestatização desses serviços em vários países.
Já se sabe que o neoliberalismo não cumpre suas promessas (“Neoliberalism: oversold?”, IMF, 2016). Desde a década de 1990, a privatização do setor elétrico promete maior eficiência do sistema, com menores custos e melhores serviços. O resultado foi um sistema fragilizado e um manicômio regulatório, que passaram a entregar a energia elétrica mais cara do mundo, se excluirmos os países afetados pela guerra entre Rússia e Otan.
As falhas de coordenação do setor elétrico vêm se avolumando e, com as mudanças climáticas, a frequência dos apagões tende a aumentar. Sob a pressão de maximizar o lucro dos acionistas, os cortes em investimentos e em quadro de pessoal implicam a socialização dos riscos e dos custos das falhas, onerando mais o orçamento dos mais pobres — além de graves acidentes de trabalho, muitos fatais. Parece aconselhável apagar as luzes do neoliberalismo antes que ele nos deixe no escuro permanentemente.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Mais um grande artigo do professor André Roncaglia, professor de Economia. Mostra que a Enel segue os passos da Light, que foi privatizada e os serviços pioraram absurdamente. Empresas privadas só visam ao lucro e não têm responsabilidade social. Apenas isso. Não tem nada a ver com ideologia. (C.N.)
Nada de novo no front. Aqui em Petrópolis-RJ pagamos nossos pecados com o péssimo atendimento da Enel. E o pior é que quando alguma questão é judicializada invariavelmente a “justiça” dá ganho a Enel contra o consumidor.
Tem a ver com a ideologia do lucro sem limites.
Em “limites”, lê-se: trabalho.
Matéria igual a esse deveria ser diária para esclarecer os iludidos com a direita liberal privatista.
As empresas privadas não têm compromisso como o social, seu compromisso é o lucro. A primeira medida que tomam é enxugar a máquina, isto é, demitindo em massa para diminuir a folha de pagamento e aumentar o lucro, e logo depois aumentar o preço do serviço, têm mais, se o negócio ficar ruim, é o governo que terá de socorrer.
Ainda tem uns alienados babacas que dizem vende tudo que na mão da iniciativa privada funciona melhor e com preços menor. Isso é próprio de quem tem complexo de vira lata.
Tudo de ruim que Bolsonaro fez foi com apoio do Congresso. Arthur Lira sabia do interesse de Lula em rever a Eletrobrás e disse: não vou aceitar quaisquer movimentos contra a privatização da Eletrobrás e acabar com a autonomia do Bacen.
Lira demostra ser o bolsonarista mais perigoso por ser presidente da Câmara. Lula vai suar com ele enquanto ele for presidente da Câmara
Perfeito, assino embaixo.
Excelente artigo.
Se fosse estatal em 24h teria resolvido o problema. Çei, uma piada do ano. Poder fiscalizador do estado onde fica, essa é a inoperancia poa privatização.
– estatal deixa consumidor sem luz: culpa do estado.
– empresa privada deixa consumidor sem luz: culpa também do estado. Kkkkkkkkkkk, pô, legal!!!!
Me explica aí, se as empresas privadas tão competentes, porque elas precisam ser fiscalizadas pelo incompetente governo?
Os estatais ( estabilidade e aposentadoria integral – coisa que os outros brasileiros não tem) ficam alegres com fracassos em privatizações. Mas as coisas não são tão simples assim. Se privatizar fosse bom, todas as empresas do sistema solar seriam privatizadas e se fosse ruim, nenhuma seria.
Privatizar não é uma cosia ruim, mas privatizar do jeito que se faz no Brasil é o mais do mesmo, se tira das mãos do Estado e se dá a outro mau prestador de serviço. E o por que disto? Simples, porque o monopólio continua, a empresa continua sem concorrência, aí dá no que deu. E o povo é que continua tomando na cabeça, não tem para onde correr. A solução é mais do que óbvia, abrir o mercado á livre concorrência, duvido que a Enel continuasse deitada em berço esplêndido caso tivesse outro concorrente na praça. Privatizar do jeito que se faz é uma estupidez, ou seria melhor dizer, uma safadeza?
E como funciona a concorrência nesse setor, por acaso vão ter duas tomadas em casa, um proveniente da empresa A e outra da empresa B a nossa livre disposição?
Até nos EUA a distribuição de energia fica a cargo dos Estados, privatizar setores chaves pro país e ainda por cima monopólios naturais é só pros países imbecis.
Estou com o jornalista Hélio Fernandes: “privatistas não; ENTREGUISTAS”.
PS: Na Inglaterra chamam estes senhores de “Fat Cat”.
PS: Investimento inicial ninguém faz. Querem tudo de mão beijada como foi o caso dos Gasodutos da Petrobrás.
Ou a Fronape, ou os navios da Vale. Tudo que garantido vai dar $$$$, eles avançam.
Não esqueço o investimento feito no Metro do RJ de bilhões de Reais e a “doação” por menos do que foi gasto.
A hora que a Transnordestina estiver concluida, um PG desta vida entrega por dois tostões.