Diante de Musk, Bolsonaro ou Marçal, o Estado de direito não pode hesitar

Censura já é regra no Brasil - Diário Causa Operária

Reprodução do Diário da Causa Operária

Conrado Hübner Mendes
Folha

Aplicar a lei não é tarefa mecânica. Esse lugar-comum tem ao menos dois sentidos. Primeiro, o jurídico: não é mecânica porque normas precisam de interpretação (não admitem o vale-tudo, mas não se reduzem a um algoritmo). Segundo, o político: aplicar a lei a atores poderosos traz obstáculos para além da hermenêutica.

As garras da lei costumam ser inversamente proporcionais ao poder de indivíduos que a violam. Para Estado de direito digno do nome, ter leis justas importa, mas aplicar a lei de forma coerente e não seletiva importa ainda mais. Esta tarefa só pode ser desempenhada por tribunais e juízes com independência, imparcialidade e coragem

LEGAL E ILEGAL – A aliança entre magistocracia e advocacia lobista dilui essas premissas em favor de cultura jurídica patrimonialista. No livre mercado do argumento jurídico, a fronteira entre o legal e o ilegal se define em termos financeiros e relacionais.

Leva quem pode pagar mais, oferecer jantares, construir laços de mútuo interesse. Ou quem ameaça retaliação. Soa reducionista só até você olhar os corredores de cortes superiores.

Somente numa cultura jurídica assim se torna possível dizer que Bolsonaro, apesar da criminalidade serial, não deveria ser punido pelo caso da reunião com embaixadores, mas pelo caso das joias; que Pablo Marçal, apesar dos ilícitos, não deveria ser derrotado pela Justiça, mas pelas urnas; que direitos indígenas devem ser negociados em sala de tribunal com o agronegócio e a indústria da mineração, ao modo “bom para todas as partes” (enquanto ministro do STF vai a evento lobístico da mesma indústria para falar de segurança jurídica).

PUNIR MUSK – Somente num ambiente assim se pode afirmar que, para evitar o pior, não se deve sancionar Elon Musk. Musk decidiu que sua empresa pode operar no país sem respeitar ordens judiciais que desagradem. Invoca, em tom heroico, a liberdade.

Em resposta, alguns apontam desonestidade: ele passou a escolher países onde obedecer ou desobedecer a lei, conforme cálculo econômico, não a liberdade. Outros apontam cinismo jurídico: a lei impõe limites à liberdade de expressão.

Mas, além da dimensão empresarial, moral e jurídica, poucos observam um terceiro aspecto: plataformas digitais não são praça pública, onde todos podem falar e ser ouvidos.

UMA QUIMERA – O dono das redes controla o que pode ser dito, cria câmaras de eco artificiais e decide quem e o que é silenciado e escutado. Um debate sobre algoritmo e transparência. Nessa engrenagem opaca, liberdade de expressão é uma quimera.

Pode-se criticar Alexandre de Moraes pela extravagância imprevisível de suas medidas. Não se pode tolerar Elon Musk. É possível aperfeiçoar o modelo de atuação do STF. Não é possível fazer vista grossa para a delinquência política e o gangsterismo. Nem confundi-los com liberdade.

Diante da inércia do legislador e da omissão do PGR, cabe ao STF inovar com consistência e apuro jurídico. Inovação não é incompatível com segurança jurídica. A segurança democrática não dispensa segurança jurídica, mas depende dela. Millôr Fernandes disse que “imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados.” Poderia dizer que Estado de direito é fidelidade à lei, o resto é o grande bazar da confraria magistocrática.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG -. Interessante… Nenhuma palavra do constitucionalista sobre as ilegalidades de Moraes, as acusações pré-fabricadas, as ilegalidades a mancheias… Ao pregar censura aos adversários, esse professor de Direito mostra-se apto a pleitear vaga no atual Supremo, pois já está domesticado. (C.N.)

9 thoughts on “Diante de Musk, Bolsonaro ou Marçal, o Estado de direito não pode hesitar

    • Carlao…Carlão….(Born to writer)…
      Seu PS. “SIMPLESMENTE ” Magistral”.
      Com “juristas” deste tipo…(alguns não sabem nem quem foi Licurgo) o nosso judiciário jamais vai sair desta fossa em que se meteu desde de que dormiram as COLUNAS do Nosso judiciário.
      O Sr. Carlão…já delineou no seu PS O caráter degenerado e imoral desta desgraça cujo o olhar só é para o lado de quem lhe “paga” mais. Que Lástima .
      Às vezes me pergunto..Como uma desgraça como essa consegue TRAIR sua consciência e propor a não apregoar a VERDADES DOS FATOS…preferindo especular com a verdade…
      Miserável maldito…( é a minha resposta).
      saúde….À todos.

      YAH SEJA LOUVADO SEMPRE…

  1. Certo ou errado, Moraes venceu Musk. Ponto final.

    Amanhã, tudo poderá mudar. Mas aí será outro dia.

    Até o Lula, experto que é e talvez consciente de sua irrelevância externa, aproveitou hoje para ‘subir nos ombros de Moraes’ no seu pronunciamento de 7 de Setembro, numa clara tentativa de se apropriar do impactante feito internacional do juiz: “…O Brasil (…) não é um território sem lei e sem ordem.”

    • Esse deve viver no mundo do mágico de OZ..E nos dá sua a piada do ano…O Sr. Musk..foi derrotado. ( Há.Ha..Há….Royalties para HF….in memorian).
      que lástima.

  2. Análise correta do jurista.

    Mas é sempre assim, quando a opinião não bate com as convicções da pessoa (convicções são mais inimigas da verdade que as mentiras, segundo dizia alguém). ela está errada.

    No caso, contraria a extrema direita.

    • Eu também gostaria saber mais a respeito das ilegalidades praticadas pelo ministro, mas por uma fonte identificada e idónea, em relato do fato detalhado com conteúdo provatório suficiente para uma apreciação judicial
      Em tempo, o Antagonista noticiou que Bolsonaro teve que ser atendido em hospital antes de chegar na manifestação da Paulista e eu permiti-me comentar:
      É difícil de escolher pois a central de inteligência bolsonarista está lotada de mentes treinadas em narrativas e teorias da conspiração, mas hoje eu apostaria no Malacraia como responsável pela jogada do hospital, jogada de mestre para consolidar a pretendida imagem de vitima do Cupim da República. Como é que o Xandão se atreve a espalhar vírus da gripe em torno do Mito?

  3. O STF processando, julgando e condenando, gente que não tem direito a foro privilegiado e ainda sem direito a recurso, é isto estado de direito?
    Vigem Maria, onde isto vai bater?

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *