Carlos Pereira
Estadão
O presidente no Brasil é um dos mais poderosos do mundo, para que seja capaz de governar em ambiente multipartidário. E para que houvesse equilíbrio entre os poderes, o legislador constituinte de 1988 também delegou amplos poderes ao Judiciário para que tivesse condições de controlá-lo. Essa escolha, no entanto, vem desagradando parte importante da sociedade representada no Legislativo.
O Supremo percebeu esses sinais de insatisfação e decidiu se autoconter por meio de uma reforma de seu regimento interno, liderada pela ex-ministra Rosa Weber em dezembro do ano passado, quando estabeleceu que decisões monocráticas poderiam ser apreciadas imediatamente pelos colegiados e também impôs prazos mais rígidos para a apreciação de pedidos de vista.
NÃO FOI SUFICIENTE – Essas iniciativas, entretanto, parecem não ter atendido a preferência da maioria do Senado, que acaba de aprovar uma PEC que restringe ainda mais o Supremo, ao proibir que Ministros tomem decisões monocráticas para suspender a eficácia de leis e atos dos Presidentes da República, do Congresso, do Senado e da Câmara dos Deputados.
A PEC permite decisões monocráticas apenas do Presidente do STF em períodos de recesso e em situações de grave urgência ou perigo de dano irreparável. Se aprovada pela Câmara, diminuirá a agilidade da Corte e aumentará os custos de coordenação ex ante dos ministros do Supremo para que decisões majoritárias no colegiado possam sustar decisões de outros poderes.
Naturalmente que decisões monocráticas nem sempre seriam motivadas para controle do Executivo. Pode acontecer justamente o inverso, de decisões individuais empoderarem ainda mais o presidente da República, ou serem utilizadas de forma abusiva e extemporânea. Mas esse é o preço que o Legislativo decidiu pagar, pelo menos até o momento, para ter quem controlasse um Executivo extremamente forte.
CRIOU-SE UM DILEMA – Ajustes sempre podem ser feitos, mas deve-se ponderar as suas consequências sistêmicas. É importante perceber que não existe saída ótima nesses dilemas.
Legisladores já restringiram alguns poderes do Presidente, com a alteração do rito das MPs e com o orçamento impositivo. Mas o efeito não antecipado foi a inflação dos custos de governabilidade e uso de emendas pouco republicanas.
Outro risco da PEC aprovada pelo Senado é o de que ela seja percebida pela sociedade como um enfraquecimento da Suprema Corte, bem como seja interpretada pelos legisladores como uma brecha para que novas reformas sejam implementadas que venham a diminuir, não apenas os poderes individuais dos seus ministros, mas também diminuir de fato os poderes da própria Suprema Corte.
Parece o “Cirque du Sem Lei”(Soleil), tentar reequilibrar poderes, que colocam país e povo à mingua e numa corda bamba!