Decisões de Toffoli são suspeitas e sem base jurídica, afirma Hübner Mendes

Hübner Mendes: “As decisões de Toffoli são equivocadas”

Rubens Anater
Estadão

O jurista Conrado Hübner Mendes, professor de Direito Constitucional na Universidade de São Paulo (USP), considera “profundamente equivocadas e inapropriadas” as decisões do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, que suspenderam as multas bilionárias dos acordos de leniência das empresas Novonor (antiga Odebrecht) e J&F.

Para o professor, o problema começa no fato de o ministro ter agido por meio de uma decisão monocrática, sem manifestação imediata do plenário do STF, a despeito do impacto e da relevância do tema. A situação piora pelo fato de sua mulher, a advogada Roberta Rangel, prestar assessoria jurídica para a J&F. “O reconhecimento de conflito de interesse é uma regra muito elementar do judiciário civilizado e o Toffoli ignorou isso”, afirmou o professor, em entrevista exclusiva ao Estadão.

Mas no âmago da questão está a fundamentação jurídica do ministro, que Hübner Mendes classificou como “árida e abstrata”, basicamente” composta por “lugares-comuns” e críticas à Lava Jato.

Como o senhor avalia as decisões do ministro Dias Toffoli que suspenderam o pagamento das multas dos acordos de leniência da J&F e da Novonor (Odebrecht)?
Eu avalio como profundamente equivocadas e inapropriadas por uma série de razões. A primeira é que são decisões sérias e impactantes demais para serem tomadas de forma monocrática sem que o plenário se manifeste imediatamente. Isso é muito grave, ainda mais em casos de tamanha repercussão para o País. O segundo problema é que a fundamentação jurídica é árida e abstrata. Basicamente uma série de lugares-comuns sobre a Lava Jato, de que ela violou garantias e prerrogativas, abalou a democracia e a economia do País. As frases genéricas dizem o óbvio, mas não são fundamentação jurídica. A Lava Jato é um edifício multifacetado, que também promoveu negociações e acordos de leniência, termos de ajuste de conduta, pagamento de multas, revelação de práticas confessas de corrupção. Essa parcela da Lava Jato não pode ser anulada numa canetada, como se todo esse edifício estivesse contaminado pela mesma ilegalidade

E a suspeição de Toffoli?
O terceiro problema diz respeito à total indiferença de ministros do STF a seus conflitos de interesse, conduta que é muito prejudicial à instituição do STF. É sabido que esposas, filhos e irmãos de ministros são advogados que atuam no Supremo, e, no caso específico do Toffoli, a esposa dele advoga para a J&F. E aqui não é questão de lançar desconfiança sobre a integridade do ministro, mas ter uma preocupação objetiva de que, ao aceitar julgar um caso de uma empresa para quem sua esposa advoga, ele nos autoriza a desconfiar de que ele não está sendo imparcial.

É válido o argumento usado por Toffoli de que houve falta de voluntariedade das empresas ao fechar os acordos de leniência?
Esse é um conceito do Direito Penal e Administrativo que basicamente pede que o investigado que está negociando uma sanção esteja no uso das suas faculdades intelectuais e morais, da sua autonomia. É diferente a situação dos maiores empresários do País, com os advogados mais caros, sentando à mesa para negociar. Um pouco forçado dizer que não há voluntariedade.

O que podemos esperar dos recursos do procurador-geral da República, Paulo Gonet, que questionam a suspensão das multas?
É importante observar o tipo de recurso que o PGR interpôs. Ele entrou com um agravo que dá a discricionariedade para o Toffoli, relator, levar a plenário quando quiser. Não há nenhum tipo de constrangimento para ele levar ao plenário. Que o próprio Toffoli, que tomou a decisão agora enfrentada por um recurso, possa decidir quando esse recurso será julgado, é mais um vício procedimental nas praxes do STF.

O procurador-geral poderia ter entrado com outro tipo de recurso?
O PGR poderia ter entrado com o recurso diretamente à presidência do STF porque o presidente da Corte, em certas situações graves em que considere a liminar viciada, pode intervir, caso seja provocado. E quem inventou, criativamente, esse poder da presidência do STF foi o próprio Toffoli, quando era presidente. Revogou liminar de Lewandowski que autorizava entrevista de Lula na cadeia. Podemos questionar esse poder, mas ele está aí. Que Toffoli o tenha inventado autoritariamente, na sua sanha lavajatista, é dessas ironias da história. Por que Gonet não pede a suspensão dessa liminar e prefere submeter ao voluntarismo de Toffoli?

O ministro Dias Toffoli já teve posições que foram vistas como favoráveis à Lava Jato. O que mudou para sua atuação atual?
O que mudou foi a conjuntura política. Claro que um ministro pode mudar de posição ao longo do tempo, isso não é prova de falta de integridade nem de despreparo intelectual. O problema é que Toffoli não tem sido capaz de formular qualquer argumento para explicar essas mudanças. Seus votos ao longo do tempo são um festival de incoerência. Nesse sentido, ele é um ministro que flutua conforme o vento da política.

Como o senhor avalia a participação da ONG Transparência Internacional nos acordos de leniência e a investigação aberta pelo ministro Toffoli sobre ela?
A única coisa que eu observaria é que por mais questionável que possa ter sido o apoio bastante vocal que essa organização deu no momento dos piores abusos da Lava Jato, ela já foi exposta, acusada, investigada, sofreu inquérito e já se sabe que, independentemente de todos os erros que possa ter cometido, ela não recebeu milhões de dólares para si. Então pode-se dizer que a abertura de um novo inquérito para investigar um fato já sabidamente falso é um gesto de intimidação. Isso não significa minimizar erros que a organização possa ter cometido no auge persecutório da Lava Jato. Atacá-la arbitrariamente consiste em neolavajatismo praticado por aqueles que dizem lutar contra arbitrariedades da Lava Jato

O senhor acredita que vivemos hoje um cenário de ‘antilavajatismo’?
Vivemos um momento em que as posições jurídicas que se denominam retoricamente de antilavajatistas tentam triunfar sobre qualquer argumento jurídico pelo simples fato de se denominarem antilavajatistas. Constróem artificialmente um embate bipolar, e como se enxergam do lado do bem e do progresso, curiosamente associados ao grande poder econômico, se consideram dispensadas de argumentar juridicamente. Suspender multas de bilhões obviamente gera honorários de muitos milhões. Melhor ainda se você puder fazer isso dentro de uma macro-narrativa de que todo o edifício multifacetado da Lava Jato, todas as suas sanções, provas produzidas, documentos, depoimentos, acordos etc., basicamente tudo, seria juridicamente nulo. Esforço argumentativo zero, recompensa em honorários máxima. Sem falar do desperdício de recursos públicos e energia institucional.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Com argumentos precisos e inquestionáveis, Hübner Mendes deixa Toffoli nu e tentando colocar a mão no bolso. (C.N.)

6 thoughts on “Decisões de Toffoli são suspeitas e sem base jurídica, afirma Hübner Mendes

  1. Senhor Rubens Anater (Estadão), os juízes do STF anularam e jogaram no lixo , todo trabalho multidisciplinares dos agentes públicos envolvidos na tal ” operação lava -jato” , sendo endossado e aprovada por toda cadeia jurídica envolvida , e do nada me aparece uma série de gravações ” clandestinas , criminosas e ilegais ” , e os ” MERETRISSIMOS ” juízes do STF , resolvem usa-las criminosamente por alegarem ” parcialidade ” de uma das parte , e tornar todo trabalho nulo e colocar seus agentes sob suspeita , um trabalho que contou pasmem com a participação ativa do próprio STF , no entanto usam e abusam no desrespeito a ” Lei da suspeição e conflito de interesse ” de magistrado num processo , além de tomarem decisões judiciais sem previsão legal , e o mais grave é que os parlamentares nada fizeram ou fazem para darem basta nesses crimes do juízes do STF , pelo fato de que boa parte dos congressistas te rabo preso e contas á prestarem a polícia e a justiça .

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