Um desesperado poema de Fagundes Varella, diante de seu amor impossível

Fagundes Varella, por Lula Palomanes

Paulo Peres
Poemas & Canções

O poeta Luís Nicolau Fagundes Varella (1841-1875), nascido em Rio Claro (RJ), implora “Deixa-me” agora repousar tranquilo, porque segui seus passos e dei-te sublimes versos numa vigília insana.

DEIXA-ME
Fagundes Varela

Quando cansado da vigília insana
declino a fronte num dormir profundo,
por que teu nome vem ferir-me o ouvido,
lembrar-me o tempo que passei no mundo?

Por que teu vulto se levanta airoso,
tremente em ânsias de volúpia infinda?
E as formas nuas, e ofegante o seio,
no meu retiro vens tentar-me ainda?

Por que me falas de venturas longas,
por que me apontas um porvir de amores?
E o lume pedes à fogueira extinta,
doces perfumes a polutas flores?

Não basta ainda essa existência escura,
página treda que a teus pés compus?
Nem essas fundas, perenais angústias,
dias sem crença e serões sem luz?

Não basta o quadro de meus verdes anos
manchado e roto, abandonado ao pó?
Nem este exílio, do rumor no centro,
onde pranteio desprezado e só?

Ah! não me lembres do passado as cenas,
nem essa jura desprendida a esmo!
Guardaste a tua? A quantos outros, dize,
a quantos outros não fizeste o mesmo?

A quantos outros, inda os lábios quentes
de ardentes beijos que eu te dera então,
não apertaste no vazio seio
entre promessas de eternal paixão?

Oh! fui um doido que segui teus passos,
que dei-te em versos de beleza a palma;
mas tudo foi-se, e esse passado negro
por que sem pena me despertas n’alma?

Deixa-me agora repousar tranquilo,
deixa-me agora dormitar em paz,
e com teus risos de infernal encanto,
em meu retiro não me tentes mais! 

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