Malu Gaspar
O Globo
Um tema com potencial para complicar a vida de Jair Bolsonaro está no topo da lista de prioridades da Polícia Federal para os depoimentos que Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, vai prestar sobre os assuntos que não falou em sua delação premiada e que foram revelados na operação da semana passada sobre o ex-presidente, ex-ministros e militares que tramaram um golpe de Estado.
É o caso dos R$ 100 mil que Cid prometeu enviar para o major Rafael Martins de Oliveira levar pessoas a Brasília para dar apoio a manifestações.
NECESSIDADES ESSENCIAIS – Na troca de mensagens exposta pelo ministro Alexandre de Moraes na decisão que autorizou a operação, Cid diz que vai providenciar dinheiro para o envio das pessoas e pergunta se R$ 100 mil seriam suficientes. Martins então envia a Cid um intitulado “Copa 2022” com uma estimativa que ele diz ser das “necessidades essenciais”.
Esse é um dos assuntos sobre o qual Cid não disse nada na delação premiada à Polícia Federal e vai ser cobrado a falar agora se não quiser perder os benefícios do acordo – que permitiu a sua saída do batalhão do Exército em Goiás, onde ficou preso por quatro meses por ordem do ministro Alexandre de Moraes.
O episódio é considerado relevante pela PF por algumas razões. Uma delas é mostrar que Cid, então o braço-direito de Bolsonaro no Palácio do Planalto, ajudava a organizar e financiar manifestações que desdobraram em protestos e aglomerações golpistas nos quartéis, até redundar na invasão das sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro.
CONTA DE SUPRIMENTOS – Uma das hipóteses com as quais os investigadores trabalham é a de que a origem do dinheiro seria uma conta de suprimentos da própria Presidência da República. Se essa hipótese se confirmar, Bolsonaro vai ficar mais encrencado do que já está.
A Polícia Federal ainda quer saber se os R$ 100 mil foram efetivamente enviados e para qual conta. Os investigadores tem indícios de que o dinheiro serviria para custear a viagem de homens das Forças Especiais, os chamados “kids pretos”, para apoiar o plano golpista sobre o qual eles falavam em reuniões em prédios de apartamentos funcionais de militares em Brasília.
Mauro Cid não falou nada sobre isso nos diversos depoimentos que deu desde setembro. E também não contou da reunião de julho de 2022 que foi gravada em vídeo e encontrada em seu computador e nem das reuniões que Bolsonaro teve com o general Estevam Teophilo, que chefiava o Comando de Operações Terrestres (Coter) do Exército e que, de acordo com mensagens de Cid, teria prometido ao então presidente colocar tropas na rua para apoiar o golpe.
POUCO DISSE – Fontes da Polícia Federal dizem que Cid “pouco disse” em relação às tratativas para um golpe além de contar da reunião de 28 de novembro de 2022 em que foi discutida uma minuta de decreto golpista.
Por isso, o interrogatório do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro deve ser longo.
“Ele terá que esclarecer esses pontos se quiser continuar recebendo os benefícios da delação. A investigação não acabou ainda…”, comenta um policial federal enfronhado na operação.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Uma coisa é certa. Essa investigação merece o apelido de “inquérito do fim do mundo”. Realmente, parece que não vai acabar nunca. Já comprei pipocas para assistir hoje ao Jornal Nacional, que se tornou uma espécie de Agência Nacional modernizada. (C.N.)