Vera Magalhães
O Globo
Depois de período de leve autocontenção, Supremo volta a lançar mão do expediente de forma indiscriminada, e em questões controversas
Num mesmo dia, duas notícias envolvendo decisões monocráticas de ministros do STF em casos controversos expuseram a falta de qualquer comedimento por parte da mais alta corte de Justiça do país em lançar mão do expediente, depois de um (breve) período de (leve) autocontenção, durante a passagem de Rosa Weber pela presidência.
Dias Toffoli estendeu ao ex-marqueteiro João Santana e sua mulher, Monica Moura, as anulações em série que tem promovido e anulou o uso de provas decorrentes do acordo de leniência da Odebrecht em três ações a que a dupla responde na Justiça do Distrito Federal.
TERRA ARRASADA – Acontece que a leniência da Odebrecht, em si, não foi anulada, e continua sendo discutida numa outra ação, que tem o ministro André Mendonça como relator e que está em fase de discussão de um acordo entre as partes, envolvendo também a União, em torno dos termos e dos valores.
Todos parecem não saber que, na cadeira ao lado, Toffoli está fazendo terra arrasada de uma série de processos derivados da leniência.
E ignoram a pergunta óbvia: se as provas que sustentaram o acordo são nulas, como ele pode ainda estar em vigor? E para que, exatemente, ele vale e para o que não vale?
SÃO DELATORES – João Santana e Monica Moura são delatores na Lava Jato. Se beneficiaram, portanto, de redução de penas ao confessar uma série de crimes. Toffoli e o resto da corte também fingem não saber disso ao promover as anulações sucessivas tendo as revelações da Vaza Jato como justificativa.
Outra decisão para lá de questionável foi a do ministro Alexandre de Moraes determinando a censura de reportagens que citavam acusações de violência doméstica feitas pela ex-mulher do presidente da Câmara, Arthur Lira, Jullyene Lins, contra ele.
Lira nega todas as acusações. Se elas são mentirosas, o deputado tem à sua disposição uma série de tipos penais para processá-las. Mas a censura a reportagens extrapola esse direito. E mais: por que o caso está no STF, se o foro de prerrogativa de que Lira goza não abrange esse tipo de situação?
COBRANÇAS – O presidente do STF, Luis Roberto Barroso, tem sido cobrado pelas decisões questionadas por juristas tomadas de forma individual pelos ministros.
Uma das mais recentes defesas que ele fez da corte se deu em sua entrevista ao Roda Viva. Ele tem evitado comprar brigas internas e tem sido condescendente com os colegas.
Mas decisões como as que vieram a público nesta quarta-feira aumentam a exposição do Supremo e a pressão para que ele inste os ministros a levarem esses casos para serem chancelados ou revistos pelas Turmas ou pelo pleno.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Excelente análise de Vera Magalhães. Em poucas palavras, ela descreveu exatamente a situação. Gritaram “barata voa” e o Supremo virou uma esculhambação. Apenas isso. (C.N.)