Investigadores traçam calendário para condenar Bolsonaro à prisão pelo golpe

Agora é muito tarde, Bolsonaro, e Inês é morta | Metrópoles

Jair Bolsonaro somente será preso após ser processado

Rafael Moraes Moura e Malu Gaspar
O Globo

Enquanto Jair Bolsonaro se complica com a descoberta de sua visita clandestina à Embaixada da Hungria em Brasília, os investigadores que trabalham no inquérito sobre a trama golpista instalada na cúpula de seu governo para impedir a posse de Lula trabalham de olho no calendário que eles mesmos estabeleceram, desde a conclusão da apuração até o julgamento.

Pelo cronograma que os policiais desenharam para o caso, o ex-presidente da República poderia ser condenado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) ainda no fim deste ano, em dezembro.

RELATÓRIO – Segundo fontes que acompanham de perto os desdobramentos do caso, até julho deve ser concluído o relatório em que a Polícia Federal deve indiciar Bolsonaro por crimes como golpe de Estado, abolição violenta do Estado democrático de direito e associação criminosa.

O ex-presidente já havia sido alvo de pedidos de indiciamento por esses mesmos crimes no âmbito da CPI do 8 de Janeiro, que se encerrou em outubro do ano passado no Congresso Nacional.

Uma vez concluído o indiciamento, a expectativa na PF é de que a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresente a denúncia contra Bolsonaro com rapidez, apesar da proximidade do calendário eleitoral. Nesse caso, o Supremo poderia receber a denúncia e transformar o ex-presidente em réu em agosto, logo após o fim do recesso do meio do ano.

SEM SIGILO – No último dia 15, o relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, determinou o levantamento do sigilo de uma série de depoimentos – como os dos ex-comandantes Marco Antônio Freire Gomes, do Exército, e Carlos de Almeida Baptista Júnior, da Aeronáutica – que implicaram ainda mais Bolsonaro e o seu candidato a vice, Walter Braga Netto.

Neles, os ex-comandantes afirmaram ter resistido a propostas golpistas em reuniões com o próprio Bolsonaro e com o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira.

Para ministros do STF, os relatos são graves e serviram para aprofundar as investigações da trama golpista.

PRISÃO DE MORAES – A apuração já mostrou que o ex-presidente conhecia a minuta golpista e até encomendou mudanças na redação, retirando do texto a previsão de prisão do ministro do STF Gilmar Mendes e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) – mas mantendo o encarceramento de Moraes, considerado inimigo público número 1 pela militância bolsonarista.

No Supremo, não há dúvidas de que existe maioria para receber a denúncia da PGR, abrir a ação penal contra Bolsonaro e, por fim, condená-lo. A Corte foi a sede de poder mais vilipendiada pelos extremistas de 8 de Janeiro e alvo preferencial dos ataques do ex-presidente durante o período em que ele ocupou o Palácio do Planalto.

Pelos cálculos de investigadores, essa última etapa (a condenação de Bolsonaro) ocorreria em dezembro deste ano, considerando o prazo médio de quatro meses entre a abertura das ações penais e a condenação de outros acusados dos atos golpistas de 8 de Janeiro.

ENQUADRAMENTO – Investigadores que acompanham de perto a apuração já veem elementos para enquadrar Bolsonaro nos crimes de abolição do Estado Democrático de Direito (com pena de 4 a 8 anos de prisão) e golpe de Estado voltado para tentar depor um governo legitimamente constituído (4 a 12 anos), ambos previstos no Código Penal, respectivamente nos artigos 359-L e 359-M.

Também avaliam que o ex-presidente integrava uma organização criminosa, o que poderia levar a uma condenação de 3 a 8 anos por esse crime. A pena total, portanto, poderia chegar a 28 anos de prisão.

Até aliados de Bolsonaro consideram que as condenações impostas aos réus pelos atos golpistas prepararam o terreno para a punição do ex-presidente, que deve receber penas ainda mais altas que os manifestantes por conta do seu papel como incentivador e “mentor intelectual” do golpe.

Receio de golpe militar é patologia grave, da qual o Brasil não se livra

O general falastrão - PDT

Charge do Alpino (Yahoo Notíias)

Bruno Boghossian
Folha

O processo de transição pós-ditadura foi um baita negócio para as Forças Armadas no longo prazo. Além de obter a proteção de líderes e agentes da repressão, os militares conseguiram erguer um escudo institucional que se conserva há décadas.

Sessenta anos após o golpe, a caserna reivindica influência sobre a maneira como a história da ditadura deve ser contada. Quando não há almoços festivos para celebrar o que se chama de revolução ou notas internas que omitem as atrocidades do regime, algumas vezes a memória oficial é deturpada pela imposição de um silêncio disfarçado de cautela.

PATOLOGIA GRAVE – A ordem de Lula para que não sejam realizados atos oficiais marcando os 60 anos do golpe pode convencer os adeptos de um pragmatismo radical, que falam em evitar armadilhas nas relações entre a esquerda e os militares.

O melindre com o qual essa justificativa se manifesta, porém, revela uma patologia grave na saúde institucional do país.

Com ou sem passado ditatorial, as Forças Armadas não deveriam fazer parte de nenhum cálculo sobre as relações políticas de governos de esquerda ou de direita. As tradições e os currículos das escolas militares não escondem suas inclinações, mas não há nada na lei que autorize esses órgãos a levarem em conta preferências ideológicas na hora de cumprir suas missões.

RECEIO DE ATRITO – Essas linhas só ficaram embaçadas por causa de iniciativas tomadas por integrantes da cúpula das Forças nos últimos anos. Em 2018, o comandante do Exército divulgou uma ameaça pública e pouco discreta ao tribunal que julgava um candidato a presidente. Depois, os fardados experimentaram um retorno ao poder e flertaram com um novo golpe.

A razão pela qual os militares despertam no poder civil um receio de atrito com os quartéis é a mesma há 60 anos: o fato de que têm armas nas mãos e disposição de usar a força para fazer valer suas vontades.

Para que eles reconheçam que não têm esse direito, é preciso lembrar o passado, cobrar o respeito à lei e punir abusos cometidos com a farda.

Datafolha: 71% veem a democracia como melhor forma de governo

O novo levantamento foi realizado entre 19 e 20 de março

Pedro do Coutto

Pesquisa do Datafolha publicada na edição de ontem da Folha de S. Paulo revela que 71% da opinião pública do país, como era esperado, são favoraveis à democracia, 18% opinaram que tanto faz se o país vive sob o regime ou não, enquanto 7% acreditam que sob certas circunstâncias uma ditadura é preferível.

O panorama ficou bastante nítido com esses dados, uma vez que nos 18% citados inclui-se parte dos setores radicais que voltaram-se contra o governo Lula, mas que não se sentem à vontade em afirmar que ainda são favoráveis à ditadura.

DEMOCRACIA – O quadro apurado pelo Datafolha nos dias 19 e 20 de março mostra um país que defende majoritariamente o regime democrático no Brasil, mas que se vê apenas um pouco satisfeito com ele, o qual qualifica de problemático. O Datafolha ouviu 2.002 eleitores em 147 cidades brasileiras. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos para mais ou menos.

A pesquisa também questionou os entrevistados sobre o grau de satisfação e a avaliação acerca da democracia brasileira e traçou um paralelo com a última pesquisa com essas perguntas, feita em 2014. O número de pessoas satisfeitas com o regime democrático aumentou em 10 anos: eram 9% e hoje representam 18%. Já a quantidade de pessoas que se dizem pouco satisfeitas caiu de 59% (em 2014) para 53%. O número de insatisfeitos oscilou de 28% para 27%.

Os 71% são um índice que se mantém através do tempo em relação às pesquisas anteriores, com poucas variações. Os dados são importantes para o que está acontecendo, principalmente com o julgamento previsto para os que tentaram dar um golpe contra a democracia e insuflaram o vandalismo de 8 de janeiro. Basta ver as imagens da data para se confirmar o que significa um governo radical nessa faixa de percepção.  A pesquisa do Datafolha consolida assim o cenário atual, contribuindo para isolar ainda mais os radicais da direita.

Havia um jardim na casa do menino-poeta, e ele nunca esqueceu das flores

Menino Caminhando Gramado Florido fotos, imagens de © vvvita #182308876

Na frente da minha casa tinha um jardim…

Paulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, administrador de empresas e poeta carioca Evanir José Ribeiro da Fonseca (1955-2017), no poema “Jardim do Éden”, recorda sua infância e o jardim existente em frente à casa em que morava.

JARDIM DO ÉDEN
Evanir Fonseca

Na frente de minha casa tinha um jardim,
as flores nele cultivadas eram tão variadas
que pareciam travar uma grande batalha,
entre cores e perfumes que extasiavam as borboletas
que voavam, numa ida e volta frenéticas,
como se escolhessem as mais saborosas ou sedosas.

Na frente de minha casa tinha um jardim,
que eu, um garoto desbravador, perdia-me
por entre os galhos espinhosos das roseiras
e folhas imensas de tinhorão e murtas
que floriam lilases, brancas e mescladas
como se fossem várias em uma só enxertadas.

No jardim da minha casa havia caminhos feitos de cimento,
que nos garantiam acesso a todas as plantas,
inclusive a uma “dama da noite” peculiar no florir,
pois abria no anoitecer e fechava-se no amanhecer,
seu perfume, imperativo, exalava tomando toda atmosfera
que, ao entorno dela, pareciam inexistir rosas
que como envergonhadas, encantadas e inanimadas,
descansavam, ou dormiam, talvez enfeitiçadas,
diante da sobrevida que passava a imperar
no encantado jardim da minha casa!

Sérgio Moro começa a ser julgado no TRE com “presunção de culpa”

Julgamento no TRE-PR pode cassar mandato do senador Sérgio Moro (União-PR)

Acusação a Moro é ridícula, mas vale tudo na Justiça atual

Gabriel de Sousa e Zeca Ferreira
Estadão

O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) começa a julgar nesta segunda-feira, 1º, o senador Sérgio Moro (União-PR), acusado de abuso de poder econômico. O processo, que pode render a cassação do mandato e ainda deixar o ex-juiz da Lava Jato inelegível por oito anos, é encabeçado pelo PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, e pela Federação Brasil da Esperança, composta por PCdoB, PV e PT – sigla do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O julgamento terá o efeito de impactar todo o cenário político nacional, dadas as repercussões possíveis de um resultado ou outro, e por conta da relevância de Moro no contexto nacional nos últimos anos.

GASTOS DE CAMPANHA – O teor das ações que serão julgadas giram em torno de gastos pré-eleitorais de Sergio Moro entre 2021 e 2022, período em que ele se apresentava como pré-candidato à Presidência da República pelo Podemos.

As ações apontam que os gastos e a estrutura da pré-campanha à presidência foram “desproporcionais” e acabaram rendendo ao ex-juiz uma vantagem decisiva sobre qualquer outro candidato ao Senado no Paraná. Além disso, a soma dos gastos das pré-campanhas com a despesa que teve com candidatura a senador ultrapassariam o teto estipulado.

Em dezembro do ano passado, o Ministério Público Eleitoral (MPE) emitiu um parecer defendendo que o senador perca o mandato e fique inelegível até 2030. O TRE-PR é composto por sete magistrados. Caso quatro votem pela condenação, a chapa de Moro será cassada pelo tribunal regional, com recurso ao TSE.

NOVA ELEIÇÃO – Se a decisão do TSE for desfavorável a Moro, será convocada eleição suplementar para eleger um novo senador que represente o Paraná até 2030.

Ao Estadão, o desembargador Sigurd Roberto Bengtsson, que foi empossado na presidência do TRE-PR no início deste mês, disse que o julgamento de Moro não terá a Operação Lava Jato como pano de fundo.

De acordo com Bengtsson, os votos dos magistrados serão transparentes e “não há qualquer possibilidade de receio da sociedade” sobre uma eventual politização do processo.

PEDIDO DE VISTA – Há a expectativa para que o julgamento não termine nesta segunda-feira. Segundo o advogado Paulo Ferraz, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político a complexidade das acusações contra Moro deve motivar um pedido de vista por parte dos magistrados.

“Eu acho que é um parecer que tem muita força, mas não é um julgamento que vai terminar na primeira sessão. Pelo menos um pedido de vista terá, e pode ser que seja do novo juiz. Isso porque ele vai compor a Corte em um tempo muito exíguo para analisar um processo de mil páginas”, explica.

Segundo o regimento interno do TRE-PR, se um magistrado pedir a revisão dos autos, a apreciação do caso será suspensa por dez dias, com a pauta sendo inserida na sessão seguinte ao término do prazo. O pedido pode ser prorrogado por mais dez dias.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
As ações contra Moro são abjetas. Partem da tese da “presunção de culpa”, inexistente no Direito Universal, mas que serviu de justificativa para cassar Deltan Dallagnol, no criativo parecer de Benedito Gonçalves, aquele ministro denunciado na Lava Jato e que tem um filho também criativo, que gosta de exibir as joias e roupas de griffe… Desta vez, a “presunção de culpa” atinge Sérgio Moro, que teria se lançado candidato à Presidência apenas para receber mais verbas eleitorais e facilitar sua vitória para o Senado. Em suma, é a tese da acusação. E ainda chamam isso de justiça. (C.N.)

60 anos depois, Forças Armadas apoiaram novo golpe, mas se arrependeram a tempo

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Charge do João Montanaro (Folha)

Carlos Newton

Num país surrealista como o Brasil, que ainda está em fase de adolescência democrática, muito longe de alcançar um regime político e institucional garantido contra efeitos colaterais, as principais notícias sempre precisam de tradução simultânea, porque as aparências são altamente enganadoras.

A plantação de notícias se transformou no maior esporte nacional, com crescimento de fazer inveja à produção agrícola. Muitas vezes, o jornalista é inexperiente e se deixa levar por ardilosos informantes, que os levam por caminhos tristonhos, como dizia Ary Barroso.

UM BOM EXEMPLO – Desde o início do governo Lula da Silva, quando falhou o golpe que não houve, a mídia sempre publica “informações vazadas” sobre as Forças Armadas, e isso faz parte do novo normal.

Como diria o inesquecível Helio Fernandes, esses jornalistas amestrados não têm medo do ridículo, porque na cúpula das Forças Armadas praticamente não existe vazamento de informações.

Quando isso ocorre, provoca uma crise institucional, como aconteceu com o próprio Helio Fernandes, que foi preso no governo João Goulart por ter publicado um documento confidencial do Exército, que lhe fora entregue pelo general Cordeiro de Farias, mestre em conspiração.

TRADUÇÃO SIMULTÂNEA – Nesse ponto, nada mudou, os vazamentos praticamente não existem nas Forças Armadas, embora os jornalistas publiquem que os militares disseram isso ou aquilo.

Em tradução simultânea, porém, pode-se dizer que as Forças Armadas estão preocupadas com as investigações sobre o golpe. Entre Lula e Bolsonaro, preferiam a vitória do capitão, que lhes reajustou os salários, protegeu a Previdência, distribuiu 6 mil cargos públicos e fazia um governo paramilitar, digamos assim.

Em 2022, Bolsonaro informou aos comandos militares que a eleição poderia ser fraudada, porque o Congresso se recusava a votar a emenda constitucional da deputada Bia Kicis (PSL-DF) que instituiria o mesmo modelo de voto impresso pregado pelo presidente da República.

APOIO MILITAR – Os comandantes militares ficaram impressionados com a denúncia e lhe disseram que, se a eleição fosse fraudada, apoiariam a convocação de um novo pleito. Até aí morreu Neves, como se dizia antigamente, porque essa seria sempre a resposta legalista das Forças Armadas nesse tipo de situação, não importa quem estivesse na Presidência.

Bolsonaro, Braga Netto, Augusto Heleno e o núcleo duro do Planalto entenderam errado. Não houve tradução simultânea e todos achavam que o golpe teria respaldo.

Mas não foi assim. O governo não provou que houve fraude eleitoral e os militares recuaram. Mesmo assim, o núcleo duro do Planalto tentou levar adiante um golpe que se sabia destinado ao fracasso, porque só se concretiza com apoio militar.

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P.S. 1 –
Agora, as Forças Armadas estão de saia justa, porque não querem que se divulgue que apoiavam o golpe, embora apenas condicionalmente, se houvesse fraude eleitoral. Sabem que, se a investigação se aprofundar, tudo isso será revelado de forma negativa, embora tivessem chegado a admoestar Bolsonaro, ameaçando prendê-lo.

P.S. 2Tudo indica que a força-tarefa de Moraes no Supremo esteja instruída a proteger os militares, porque até hoje não fizeram nenhuma pergunta realmente direta sobre o envolvimento deles, uma realidade que está mais do que comprovada nas investigações.

P.S. 3O fato de o tenente-coronel Mauro Cid atuar como agente duplo, informando diariamente o então comandante do Exército, general Freire Gomes, sobre o andamento das articulações do golpe, é a ponta do iceberg da verdade sobre conspiração que não deu certo.  Depois voltaremos a tema, devido à sua enorme importância. (C.N.)

Lembrando 1964, é preciso garantir ao cidadão que haja justiça e segurança

Golpe de 1964: o que foi, contexto histórico, acontecimentos

Deixar de recordar 1964 é um erro que atinge a todos

Maria Hermínia Tavares
Folha

A recusa do governo federal de promover eventos pelo 60º aniversário do golpe de 1964 tem provocado um debate que gera antes calor do que luz. Gesto de pacificação dirigido aos militares, a interdição foi considerada um desastre que debilitaria a democracia brasileira. Impedir atos que avivem a memória de como começou o que viriam a ser 21 anos de ditadura seria uma chance perdida de rever o passado, uma evidência a mais da frouxidão com o que o Brasil de Brasília teria aplicado a chamada justiça de transição.

Ela diz respeito ao modo como nações que se democratizaram confrontaram o regime autoritário anterior com diferentes instrumentos: julgamentos de líderes autoritários e anistia — que não deixa de ser uma forma de reconhecer os crimes dos anos de chumbo—, comissões da verdade, expurgos de servidores da ordem anterior e reparações a suas vítimas, além de gestos simbólicos como a construção de memoriais ou novas designações de vias públicas.

RICA LITERATURA – Sobre o tema, existe hoje rica literatura internacional que permite situar a experiência brasileira em um quadro mais amplo. Textos de variadas embocaduras demonstraram que os países seguiram diferentes trajetos.

Desde aqueles que colocaram um ponto final de pedra sobre o que passou até os que esgotaram o repertório de medidas, implementadas em diversas sequências. Revela também como pode ser longo e tortuoso o processo de ajustar contas com o passado.

Na comparação, o Brasil está longe de ter-se saído mal. Sob pressão das organizações de defesa dos direitos humanos, o país aplicou ao longo do tempo vários dos instrumentos do arsenal da justiça de transição. Mesmo a anistia geral de 1979, que impediu o julgamento de responsáveis por delitos durante a ditadura, não foi uma peculiaridade nacional. Julgamentos ocorreram só nos casos em que houve colapso do autoritarismo. E muitas vezes foram seguidos de anistia.

DIREITOS AMPARADOS – Embora o reconhecimento das violências perpetradas e a reparação dos sofrimentos impostos às vítimas seja inescapável exigência ética, não está escrito nas estrelas que a justiça de transição deva ter efeitos significativos para o respeito aos direitos humanos ou para a solidez da democracia. Ambos dependem mais do que se faça para garanti-los.

Aqui e agora, tais direitos estarão amparados se o governo do presidente Lula for capaz de erigir uma política de segurança eficiente contra o crime e respeitosa da dignidade das pessoas.

E a democracia estará bem protegida se os civis e militares que planejaram o golpe em 2023 e os que autorizaram e financiaram o 8 de janeiro forem submetidos à Justiça.

Nos 60 anos do golpe de 64, Mourão diz que ”a nação se salvou a si mesma”

Presidente em exercício, Mourão convoca rede nacional de rádio e TV para  pronunciamento na véspera do ano novo - Brasil 247

Mourão é suspeito para falar, por ser defensor da tortura

Deu em O Globo

No dia em que se completam os 60 anos do golpe militar, o ex-vice-presidente e senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) afirmou que a “nação se salvou a si mesma”. Em 31 de março de 1964, uma investida militar foi às ruas para derrubar o governo do então presidente João Goulart e instaurar uma ditadura regida pela caserna no país.

“A história não se apaga e nem se reescreve, em 31 de março de 1964 a Nação se salvou a si mesma!”, afirmou o senador, que é general da reserva e presidiu o Clube Militar em 2018, em sua conta no X (antigo Twitter).

Em sinalização a integrantes das Forças Armadas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) optou por suspender todos os eventos institucionais em memória aos 60 anos do golpe, conforme mostrou O Globo. Nas últimas semanas, vinha dando sinalizações à caserna, com a proximidade da data, o que desagradou parte dos aliados do petista.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
O golpe militar de 1964 fez coisas boas e coisas ruins, a pretexto de salvar a democracia. Não se pode demonizar os militares pelo golpe, nem tampouco santificá-los. Se tivessem tratado os presos políticos como presos comuns, a imagem das Forças Armadas seria outra. Mas como justificar o assassinato de Rubens Paiva, um deputado-empresário que nada tinha de comunista? Ou o trucidamente de Stuart Angel Jones, um estudante de economia que era bicampeão como remador do Flamengo? Podem responder que era membro do grupo MR-8, que defendia a luta armada. E daí? Isso justificaria ser barbaramente torturado até à morte. Mourão é suspeitíssimo para falar, por ser um militar que defende a tortura, banida pela Convenção de Genebra. Não é preciso dizer mais nada, sob o signo da liberdade. (C.N.)

Lembrando Aarão Reis, um juiz federal que enfrentou os desmandos da ditadura 

Ao fundo, agachado, o juiz Aarão Reis, ao parar a demolição

Jorge Béja

Um outro juiz federal, titular da 3ª Vara do Rio, não pode ser esquecido. Chama-se Carlos David Santo Aarão Reis. Certa vez, em plena ditadura, ele ordenou que a Polícia Federal impedisse a ocupação e demolição do prédio da UNE (União Nacional de Estudantes) na Praia do Flamengo.

Sua decisão foi desrespeitada. Então, o Dr. Aarão Reis, junto com dois oficiais de justiça foi até o prédio que estava sendo ocupado e começava a ser demolido.

“EU SOU O JUIZ” – Ele subiu numa escada de madeira que partia da calçada para o prédio, sacou seu revólver 38 e gritou: “Eu sou o juiz”. E mostrou a carteira de magistrado.

Ele e os oficiais pararam um ônibus, os passageiros desceram, e todos os que estavam demolindo o prédio foram presos e levados para o prédio da Justiça Federal, na Av. Rio Branco 241.

Aarão Reis tomou os depoimentos e prendeu todos os envolvidos, inclusive militares. Isso foi por volta das 16 horas.

FOI SUSPENSO – No mesmo dia o extinto Tribunal Federal de Recursos (TFR) em Brasília, que deixou de existir com a Constituição de 1988, suspendeu por dois anos o juiz.

Fui advogado dele neste processo administrativo. Passados os dois anos de suspensão do exercício da magistratura, a lei permitia que ele pedisse a “reabilitação”. Foi quando perguntei se o Dr. Aarão Reis não iria pedir. E ele me respondeu:

“Dr. Béja, não posso pedir o que não perdi”. O tempo passou e o juiz abandonou a magistratura.

Veto a cerimônias sobre 1964 não apaga a realidade dos fatos e a memória viva

Golpe militar de 1964 foi em 31 de março ou em 1º de abril? | CNN Brasil

Tanque bloqueia o trânsito próximo ao Palácio Laranjeiras,

Dora Kramer
Folha

O veto a cerimônias oficiais pode até ser visto como sinal de conciliação, mas não apaga os fatos dos idos de março e o golpe em abril há 60 anos. Os militares sabem disso. Percebem que gestos não substituem a realidade.

E a verdade é que uma ruptura institucional efetivada e prolongada por 21 anos tem teor de gravidade bem maior que a recente tentativa frustrada de golpear as instituições. O tempo não as separa, antes exibe um traço de união a ser mantido no radar de todos.

INSPIRAÇÃO – Os golpistas de lá inspiraram os conspiradores de cá. A diferença é que estes se depararam com circunstâncias diversas, e para eles adversas, das que asseguraram o perverso êxito daqueles.

O empenho do presidente Luiz Inácio da Silva na defesa de sua posse e da democracia em geral realmente não combina com a proibição de que o governo promova atos em memória de episódio perverso da quadra brasileira, cuja história é vasta em episódios assemelhados durante o século 20.

Ocorre, porém, que o veto presidencial é aceno dirigido, não impede ninguém, grupo político ou social, de se manifestar individual e/ou coletivamente para marcar a data com a veemência que considerar adequada.

MEMÓRIA VIVA – É o que está acontecendo até em decorrência da decisão de Lula. A partir das críticas a ele, o debate em torno dos acontecimentos e consequências do golpe de 1964 ganhou dimensão correspondente à importância do marco.

Não há uma decisão de Estado que vede homenagens à memória. Não se exige da sociedade que se submeta a uma decisão de governo. Se a liderança tem suas razões para não liderar, os liderados que atuem sem exigências paternalistas.

Lula faz um movimento estratégico, enquanto militares de alta patente são alvos de investigação e prisão sob os ditames do regime civil. Algo inédito, cujo significado não deve ser subestimado, mas visto como resposta compatível com as nossas peculiaridades. Goste-se ou não, é como fazemos.

Sionismo e Israel são projetos coloniais, diz um importante historiador palestino

Writer Rashid Khalidi: 'As long as Israel starves and blocks Gaza, there will be violence' | International | EL PAÍS English

Rashid Khalidi explica o que pode acontecer em seguida

Diogo Bercito
Folha

O palestino Yusuf al-Khalidi escreveu em 1899 uma carta para Theodor Herzl, considerado o pai do sionismo moderno. Yusuf se opunha à criação de um Estado nacional judeu na Palestina. Dizia: é habitada por outras pessoas.

Seu sobrinho-trineto faz hoje um alerta semelhante. Em seu livro “Palestina”, Rashid Khalidi afirma que o sionismo e Israel são projetos coloniais que culminaram na alienação da população nativa palestina.

Khalidi, 75 anos, é um dos principais intelectuais palestinos desta geração. É de certo modo um herdeiro de Edward Said, autor do estudo clássico “Orientalismo”, publicado pela primeira vez em 1978. Assim como ele, leciona na Universidade Columbia, em Nova York.

O livro “Palestina” saiu em 2020 nos Estados Unidos, mas só chega agora ao Brasil, pela editora Todavia. Uma de suas teses centrais é a de que os palestinos são alvos de uma guerra há mais de cem anos. Isto é, desde antes de suas terras darem lugar a Israel, em 1948 — ou da campanha militar lançada na Faixa de Gaza por seu Exército em 7 de outubro passado.

O senhor publicou seu livro em 2020 falando em uma guerra de cem anos contra a Palestina. Há agora uma nova guerra acontecendo.
A tese central do livro se mantém. Temos que enxergar o que está acontecendo em Gaza dentro do contexto de uma guerra mais ampla, que é uma guerra para substituir uma população por outra, apagar a identidade de uma população nativa e tomar o máximo possível de terra.

O livro sugere que o sionismo foi desde o início um projeto colonial.
O sionismo sempre disse que é um projeto nacional, o que não é inteiramente falso. É um projeto nacional de judeus do Leste Europeu. Foi uma resposta à perseguição de judeus de lá, que levou à conclusão de que apenas uma entidade nacional poderia proteger os judeus. Nada disso é falso. Mas o sionismo é e sempre foi colonial e usou estratégias coloniais, incluindo a compra e a confiscação de terras e a eliminação da população original. São os métodos clássicos. Foi o que aconteceu na América portuguesa e espanhola, nas colônias britânicas e francesas. Não há diferença nos métodos. Isso sem contar o fato de que os líderes sionistas diziam isso de um modo explícito. Não tinham dúvida de que eram europeus tomando um país de sua população nativa.

É controverso dizer que o sionismo é um projeto colonial. Por quê?
Por causa de uma das campanhas de propaganda mais brilhantes da história que convenceu o mundo, em especial depois do Holocausto, de que a Europa tinha a obrigação de ajudar a criar esse refúgio para os judeus. Há também o argumento bíblico. Protestantes, como nos EUA, creem que há um mandamento divino para os judeus retornarem à terra.

É também controverso dizer que o sionismo é um projeto nacional?
É difícil para muitos aceitar que, com o tempo, uma identidade nacional se desenvolveu entre a população de colonos. É difícil para os palestinos dizerem: os israelenses são um povo e têm direitos, em especial porque esses direitos são exercidos em detrimento dos direitos dos palestinos.

Como essa situação —um projeto colonial e nacional — se resolve?
Há três possibilidades. A primeira é a eliminação da população nativa ou sua redução a um ponto em que podem ser desconsiderados politicamente, como na América do Norte, na Austrália e na Nova Zelândia. A outra possibilidade é a expulsão dos colonos, que aconteceu na Líbia e na Argélia. A terceira é que os colonos sejam aceitos como nativos ou vivam lado a lado com os nativos. É o que vemos na África do Sul — os colonos perderam sua hegemonia, mas permaneceram. Só que estamos longe disso. Ficamos ainda mais longe com o 7 de Outubro.

O seu livro começa em 1917. Por que o senhor escolheu essa data?
É a data da Declaração Balfour [em que o governo britânico apoiou a criação de um lar judaico na Palestina]. Foi quando tudo isso tomou forma. É a data da intrusão dos britânicos. Sem apoio internacional, Israel não teria sido criado. Até então, sionistas buscavam um patrono. Esse apoio mudou com o tempo. Desde os anos 1960, têm sido os EUA.

Qual papel os EUA têm no que acontece hoje em Gaza?
Os EUA são indispensáveis para o genocídio, para o uso da fome como arma, para a morte de milhares de crianças. Sem eles, nada disso estaria acontecendo. Esse apoio vai mudar agora? Não sei. Mas há uma mudança em curso na opinião pública. Israel nunca terá o apoio global que teve. Isso por conta das redes sociais e da mídia alternativa, em especial entre os mais jovens. O que não significa que a política vai mudar, porque aqueles que tomam decisões não mudaram.

Essa mudança tinha começado antes da guerra, o senhor não acha?
Sim. Tem a ver com a ascensão das redes sociais e o total desprezo pela imprensa tradicional. Há também uma nova geração de ativistas entre os palestinos e árabes. Há, ainda, uma sensação entre muitas pessoas de que a luta palestina é semelhante à deles. Afro-americanos e nativo-americanos se dão conta de que é parecido com o que seus avôs viveram: histórias de deslocamento, imigração forçada, discriminação. Reconhecemos uma opressão quando nos deparamos com ela, dizem.

Que papel o Brasil pode ter nesse contexto? Declarações como a do presidente Lula, que falou em genocídio, podem ter algum impacto?
É claro que sim. É necessário um esforço imenso [para alterar a situação]. Quanto mais países mudarem sua posição, haverá mais pressão em Israel e nos EUA. Pode não parecer muito, mas cada país que chama um genocídio de “genocídio” coloca mais pressão.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Excelente entrevista. Irretocável. (C.N.)

Juiz desafiou a ditadura e condenou a União pela morte de Vladimir Herzog

Márcio José de Moraes (à esq.), é um nome na História

Frederico Vasconcelos
Interesse Público

No dia em que o golpe militar de 1964 completa 60 anos, reproduzimos trechos da entrevista concedida, em 2005, pelo juiz federal Márcio José de Moraes sobre a decisão que condenou a União pelo assassinato do jornalista Vladimir Herzog no DOI-Codi .

“Dei a sentença com o AI-5 em vigor. Essa visão, eu me orgulho de ter tido. Seria uma reação, um grito de independência do Poder Judiciário. Já tinha formado a minha convicção, iria condenar a União. O gesto só teria valor, como uma espécie de grito político, de revolta contra a ditadura, se fosse dado sob o clima da ditadura, sob o AI-5”, Moraes afirmou ao editor deste blog.

Desinformado, eu ainda resistia a acreditar que havia tortura e morte. Eu ainda admitia que pudesse haver perseguição política. Mas, na verdade, a tortura e a morte eram coisas que eu tinha dificuldade em acreditar.

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MEMÓRIAS DE UM JUIZ DE VERDADE

(…)

Em 1975, eu estava no escritório de advocacia, compro o jornal e vejo que Vladimir Herzog morreu. Eu realmente fiquei chocadíssimo. Não só pela notícia em si. Mas porque ficou absolutamente claro, para mim, que, na verdade, ele morreu torturado. Não era possível que a pessoa tivesse entrado no DOI-Codi, de manhã, e estivesse morto à tarde.

(…)

Foi um choque pessoal. Caiu por terra a resistência que eu tinha em acreditar que a ditadura estava perseguindo, prendendo, matando prisioneiros políticos. Percebi claramente que tudo era verdade. Tive uma certa crise de consciência, por não ter participado politicamente para tentar evitar que aquilo acontecesse.

(…)

Uma semana depois da morte do Herzog, eu participei do culto ecumênico na praça da Sé. Mas ainda um tanto quanto receoso, porque depois que se deu aquela conscientização pessoal, política, em decorrência da morte do Herzog, eu ainda tinha uma certa dificuldade de me engajar.

(…)
Mas eu não fiquei dentro da igreja. Fiquei no lado, perto de uma pastelaria… Até mesmo, pensando comigo, veja só até onde ia a minha covardia política naquele momento: “Se a cavalaria da Polícia Militar invadir a praça da Sé, como se noticiava, eu me ponho aqui dentro da pastelaria e como um pastel”. Alegaria que estava comendo um pastel…

(…)

Imagine a minha surpresa, quando, três anos depois, em 1978, eu recebo o processo do caso Herzog para sentenciar. Naquele período, tudo podia acontecer. O AI-5 permitia cassar a cidadania, cassar os direitos políticos. O juiz poderia perder o cargo.

(…)

Depois, nem era tanto a aplicação do AI-5, que já dava respaldo à ditadura. Era o medo, na verdade, de que poderia acontecer [com o juiz] o que aconteceu com tantos outros: simplesmente de ser seqüestrado e torturado, como aconteceu com Herzog.

(…)

Mas, eu também tinha, a meu favor, a minha mocidade. Ou seja, essa volúpia no sentido de poder exercer a magistratura com todas as suas condições, apesar do regime militar. Fui advogado de banco e estudei muito o tema da responsabilidade civil do Estado. Sabia que, na sentença do caso Herzog, eu podia dar um passo muito importante na questão da responsabilidade civil.

(…)

Foi uma decisão solitária e muito difícil. Todos aqueles anos de alienação caíram sobre mim. Na verdade, foi a hora que eu cheguei para mim mesmo e disse que, politicamente, eu não poderia mais ficar comendo pastel.

(…)

O laudo era imprestável, assinado apenas por um perito. O perito-chefe assinou sem fazer a autópsia. O laudo, a principal prova da União, não tinha validade. As testemunhas disseram o que acontecia naquelas dependências. Alguns ouviram os gritos de Herzog. Isso foi prova suficiente para me convencer de que Herzog morreu por causa da tortura.

(…)

O Estado era responsável, independente de qualquer circunstância, porque tinha alguém sob sua guarda. Primeiro, eu anulei o laudo. Segundo, valorizei as provas para mostrar que havia tortura naquelas circunstâncias. Terceiro, determinei a abertura de Inquérito Policial Militar para verificar os responsáveis, todas as autoridades policiais e militares que se encontravam no local e que foram responsáveis pela tortura.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
– Márcio José de Moraes foi o primeiro juiz a enfrentar a ditadura. Seu exemplo deveria ser seguido por todos os magistrados brasileiros, mas o que se vê hoje é uma Justiça destrambelhada, que transforma em terroristas os cidadãos que deveriam ser julgados apenas por invasão de prédio público e vandalismo. E ainda chamam isso de Justiça. (C.N.)

Em 1964, o dia de hoje foi duro para Vernon Walters, o coronel diplomata

Walter garantiu o aval americano à Revolução de 1964

Vernon Walters garantiu aval americano à Revolução de 64

Elio Gaspari
O Globo/Folha

Na manhã de hoje, há 60 anos, o embaixador americano Lincoln Gordon chegou à sua sala por volta das 9h15. Ele sabia que o golpe estava por dias, mas não sabia que o general Olímpio Mourão Filho, comandante da Região Militar com sede em Juiz de Fora, havia resolvido se rebelar. Quem o avisou que a coisa havia começado foi seu adido militar, o coronel Vernon Walters, um homem corpulento, amigo de militares brasileiros desde a Segunda Guerra Mundial.

Walters ralou durante esse dia. No fim da tarde, achava-se que o general Castello Branco, seu colega de barraca na Itália e chefe do Estado-Maior do Exército, estava encurralado no Ministério da Guerra. (Falso, ele estava num aparelho na Zona Sul.)

Um marechal avisou-o de que uma tropa legalista da Vila Militar marchava para Minas Gerais. Às 19h05 seu prognóstico era sombrio: “A rebelião parece estar perdendo ímpeto”.

NA ESCURIDÃO – Naqueles dias, o Rio de Janeiro penava um racionamento de energia e bairros inteiros ficavam sem luz à noite. Perto das 23h, o marechal Lima Brayner, chefe do Estado-Maior da Força Expedicionária Brasileira durante a guerra, ouviu pancadas na entrada de serviço do seu apartamento de Copacabana, abriu o portinhola e viu, iluminado por uma vela, o coronel Walters.

Brayner disse-lhe: “O Kruel acaba de lançar um manifesto”. “Graças a Deus”, respondeu Walters, um católico devoto.

A adesão do general Amaury Kruel, comandante da guarnição de São Paulo, havia decidido a parada. O marechal Cordeiro de Farias, patriarca de todas as sublevações militares do período resumiria a questão: “O Exército foi dormir janguista e acordou revolucionário”.

No dia 2 de abril, Walters passou pela casa de Castello Branco, em Ipanema. No dia 4, de novo, e também na do ex-presidente, marechal Eurico Dutra (1946-1950). Eleito presidente, no primeiro dia de serviço, Castello convidou-o para um almoço no Palácio do Planalto. Walters presenteou-o com um abacaxi.

NA MITOLOGIA – O coronel Walters entrou na mitologia das intervenções militares americanas como se, com seus seus pés enormes, esmagasse governos. Teria ajudado a derrubar o rei Farouk no Egito (1952), o premiê Mossadegh no Irã (1953), os presidentes Manuel Prado no Peru e Arturo Frondizi na Argentina (1962), noves fora Jango. É um exagero.

Na vida real, ele foi mais que isso. Onde houve encrenca ou mistério, lá está ele. Conversas secretas com chineses e vietnamitas? Foi Walters quem bateu à porta de embaixada chinesa em Paris com um recado do presidente americano Richard Nixon.

Era em sua casa que Henry Kissinger se escondia para negociar com os vietnamitas do Norte. Escândalo do Watergate, que derrubou o presidente dos Estados Unidos? Ele era o vice-diretor da Central Intelligence Agency em 1972, quando a Casa Branca concebeu um estratagema para congelar as investigações do FBI. Walters e o diretor da CIA, Richard Helms, barraram a manobra.

HUMOR SARCÁSTICO – Walters alistou-se no Exército para derrotar o nazismo e continuou na carreira para derrotar o comunismo. Em 1989, ele era embaixador na Alemanha e de sua janela viu o fim do Muro de Berlim. Morreu em 2002, aos 85 anos.

Walters era um interlocutor direto, dotado de um humor sarcástico. Costumava dizer que falava outras sete línguas (francês, italiano, espanhol, português, alemão, russo e holandês), mas não pensava em nenhuma. Seu português tinha pouco sotaque, como o de Roberto Campos.

Quando Fidel Castro lhe disse que estudou com padres, cortou:

— Yo también, pero me quedé fidel.

APARTAMENTO NO RIO – Quando era acusado de saber tudo sobre o Brasil, respondia: “Se eu fosse isso tudo, não teria comprado um apartamento no Panorama Palace Hotel.” (Lançado no Rio nos anos 60, o Panorama foi um mico e hoje é chamado de Favela Hub.)

Walters alistou-se no Exército em 1941 antes mesmo que os Estados Unidos entrassem na guerra. Seu pai teve algum dinheiro, mas perdeu-o na Grande Depressão dos anos 30. Tinha talento para idiomas e lapidou-o na adolescência, como mensageiro de uma companhia de seguros da babel de Nova York. Achou que com isso teria uma boa posição mas, de saída, virou soldado raso.

Um ano depois era tenente, na área de informações, e um coronel mandou que aprendesse português. Em 1943, foi designado para acompanhar oficiais brasileiros nos Estados Unidos e, mais tarde, na Itália. Daí em diante foi intérprete das conversas de presidentes americanos com brasileiros, de Dutra a Médici, de Harry Truman a Richard Nixon. Teve dois padrinhos, o presidente Eisenhower e Averell Harriman, milionário, diplomata, ex-governador de Nova York e grão-duque do partido democrata.

VIROU FLAMENGUISTA – Depois de ter vivido alguns anos no Rio (e virar flamenguista), era adido militar em Roma em 1962, quando o embaixador Lincoln Gordon pediu ao presidente Kennedy que o removesse para o Rio, reforçando o dispositivo militar da embaixada. Walters moveu céus e terra para não sair de Roma, pensou em pedir passagem para a reserva. Em outubro, o coronel desceu no Rio e teve 13 generais para recebê-lo no aeroporto.

Na noite de 13 de março de 1964, ele viu o discurso de João Goulart na casa do general Castello Branco. (O alto da testa de Castello batia abaixo da base do queixo de Walters, que o descreveria assim: “Baixo, robusto. O pescoço muito curto e a grande cabeça dão a impressão de que é corcunda”.)

Walters deixou o Brasil em 1967 como general. Uma semana depois da edição do AI-5, quando havia pressão para que os EUA se afastassem da ditadura, ele escreveu ao secretário de Estado, Henry Kissinger, defendendo a aliança: “Se o Brasil se perder, não será outra Cuba. Será outra China”.

PORTAS ABERTAS – Walters foi adido militar em Paris, vice-diretor da CIA, embaixador nas Nações Unidas e em Berlim. Lá, pelo seu jeitão loquaz, o secretário de Estado, James Baker, evitava-o.

Em 1966, a Polícia Federal prendeu dois americanos com contrabando de minérios na Amazônia. Um poderoso senador foi ao secretário de Defesa e pediu por eles. Walters recebeu o seguinte telegrama: “Apreciamos seus francos comentários se há algo que possa ser feito nesse caso através de seus bons contatos com seus interlocutores militares brasileiros”.

Walters foi a Castello Branco dizendo-se envergonhado por encaminhar a gestão. Dias depois, as celas dos americanos amanheceram com as portas abertas e eles fugiram.

ELE E KISSINGER – O general Walters está no seu gabinete de adido militar na França e recebe uma mensagem de Washington informando que o avião que conduz o secretário de Estado Henry Kissinger para mais um encontro secreto com vietnamitas está sobre o Atlântico e será obrigado a descer no aeroporto de Frankfurt, na Alemanha. Missão: Trazer Kissinger, incógnito, a Paris.

Walters desceu, caminhou até o palácio presidencial e pediu para ser recebido imediatamente pelo presidente francês Georges Pompidou. Expôs o seu caso: precisava de um avião para buscar o secretário.

Quando Pompidou perguntou-lhe o que Kissinger vinha fazer em Paris, respondeu que a viagem envolvia uma senhora. Pompidou emprestou-lhe um jato militar, ele desceu em Frankfurt, atravessou a pista, mandou apagar os refletores e resgatou Kissinger. Seguindo a rotina, levou-o para seu apartamento, onde a empregada jamais soube quem era o hóspede.

Walters escreveu dois livros de memórias, o primeiro, “Missões Silenciosas” muito bom, tem edição em português.

Seis décadas do golpe atestam o compromisso da sociedade com a democracia

Tanques em Brasília no dia 1º de abril de 1964

Pedro do Coutto

A posição do governo Lula foi a mais adequada em relação ao dia 31 de março, data em que se completam seis décadas do golpe que derrubou o governo João Goulart. É  oportuno assinalar que o movimento começou na realidade em agosto de 1961, quando liderado por Carlos Lacerda a corrente militar que foi vitoriosa começou a se organizar. Jânio Quadros renunciou e João Goulart assumiu o governo, mas com a criação do parlamentarismo de ocasião, porque foi a solução naquele momento.

O abalo da renúncia de Jânios Quadros estendeu-se no tempo e foi a raiz do golpe de 64 que implantou a ditadura militar que durou 21 anos. A figura de João Goulart sempre inspirou resistências na extrema-direita, embora fosse ele  um homem de centro, como a composição do seu governo em 1961 indica. A luta pelo plebiscito de 1963 acirrou os ânimos e Goulart terminou sendo deposto no golpe em 31 de março de 1964.

RESISTÊNCIAS – Goulart sempre despertou resistências, embora fosse no fundo um moderado. Mas as contradições de seu governo se acentuaram. Jango decretou uma reforma agrária abrangendo terrenos às margens das rodovias, ferrovias e hidrovias. Estabeleceu as bases de uma reforma urbana com a venda dos imóveis aos inquilinos que pagariam através do aluguel o valor dos respectivos imóveis e moradias.

Decretou a estatização das refinarias particulares de petróleo e as medidas que realmente ultrapassaram os limites de um panorama de equilíbrio se transformaram nos fatores de sua queda, uma vez que a sua intervenção se verificava na economia. Mas o episódio marcante foi a reunião com os sargentos no dia 30 de março na sede do Automóvel Club, no Centro do Rio, que, como era previsível, acentuou forte reação de todo segmento militar.

Houve o episódio da prisão dos marinheiros que haviam se rebelado na Semana Santa em 1964 e que deveriam permanecer detidos nas unidades, mas que foram soltos repentinamente. Saíram inclusive em caminhada pelo Centro do Rio e a situação se tornou extremamente difícil, como ficou configurada na reunião de 28 de março no Clube Naval. Foi um episódio há mais de agravamento do universo político de então, formando uma reação militar que se tornou decisiva na queda de João Goulart.

MANIFESTO  – Goulart sempre foi visto com preocupação, desde o manifesto dos coronéis que levou Getúlio Vargas a demiti-lo do Ministério do Trabalho. São episódios que valem ser lembrados para uma compreensão melhor e uma visão mais ampla dos antecedentes da ditadura. Ela encontrou um panorama propício e terminou no golpe de 31 de março.

Passado o tempo, a democracia voltaria a ser objeto de ameaça pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. A vitória de Lula nas eleições de 2022 foi no fundo a vitória da democracia que enfrentou o vandalismo de 8 de janeiro que provava a insistência dos grupos radicais pela tomada do poder. Mas, a democracia alcançada nas urnas impediu a investida. Esse panorama deve ser objeto de observação e análise nos dias atuais. E assim será.

Lava Jato não morreu! Multinacional aceita pagar multa de US$ 127 milhões

Opera  o Lava Jato e parcelamento de sal rios em destaque nas charges -  Opera  o Lava Jato e parcelamento de sal rios em destaque nas charges -  Regi o - Jornal de Gramado

Charge do Sinovaldo (Jornal VS)

Deu no g1
Agência Reuters

A Trafigura, empresa suíça de negociação de commodities, declarou-se culpada à justiça dos Estados Unidos pelo pagamento de propina a autoridades brasileiras para garantir negócios com a Petrobras. A informação é do Departamento de Justiça (DoJ) norte-americano, que conduzia uma investigação sobre a conduta de ex-funcionários e agentes no Brasil há 10 anos ou mais. O órgão não divulgou quais executivos foram subornados.

Para fechar a investigação, a companhia concordou em pagar cerca de US$ 127 milhões pelas violações da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA, na sigla em inglês). O pagamento será feito pela Trafigura Beheer BV, empresa controladora do Grupo Trafigura durante o período, como parte do acordo de confissão.

NA LAVA JATO – O esquema foi inicialmente revelado no âmbito da Operação Lava Jato. O nome da empresa surgiu ao lado de Vitol e Glencore na 57ª fase da investigação, que apurava o pagamento de propinas a funcionários da Petrobras por empresas que atuavam na compra e venda de petróleo e derivados — atividade conhecida como trading.

De acordo com documentos obtidos pelo Departamento de Justiça dos EUA, a Trafigura mantinha relações comerciais com a Petrobras entre 2003 e 2014. Em 2009, informa o DoJ, a Trafigura acertou um esquema de suborno que pagava até US$ 0,20 por barril de produtos petrolíferos comprados ou vendidos da Petrobras.

Os pagamentos eram ocultados por empresas de fachada, direcionados a contas bancárias offshore para os funcionários da Petrobras no Brasil. De acordo com o DoJ, a Trafigura lucrou aproximadamente US$ 61 milhões com o esquema.

RÉ CONFESSA – “A declaração de culpa destaca que quando empresas pagam propinas e minam o estado de direito, elas enfrentarão penalidades significativas”, disse em nota Nicole M. Argentieri, chefe da Divisão Criminal do Departamento de Justiça.

Em dezembro, a Trafigura já havia anunciado a reserva de US$ 127 milhões para cobrir uma possível multa do Departamento de Justiça dos Estados Unidos para encerrar uma investigação sobre “pagamentos indevidos” feitos pela empresa no Brasil.

O Departamento de Justiça dos Estados Unidos cita apenas um nome na minuta do acordo de confissão feito entre a Trafigura e o órgão: Rodrigo Berkowitz. A identidade dos demais envolvidos foi preservada pelo DoJ.

CORRUPTO BRASILEIRO – Berkowitz é brasileiro e trabalhou como trader de combustíveis para a Petrobras no Rio de Janeiro e em Houston, no Texas. Segundo o acordo de confissão, ele foi uma das pessoas que recebeu propina da Trafigura para garantir contratos da empresa com a estatal brasileira.

Berkowitz já havia sido acusado por esses crimes em 2023 e já tinha se declarado culpado de uma acusação de conspiração para lavagem de dinheiro em 2019.

O caso estava sendo investigado nos Estados Unidos por conta da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA, na sigla em inglês). A norma permite que a Justiça norte-americana investigue e condene quaisquer pessoas que tenham cometido um ato de corrupção envolvendo uma empresa estabelecida nos Estados Unidos e que tenha ações negociadas nas bolsas de valores do país.

IMPROBIDADE – Em 2020, o Ministério Público Federal (MPF) propôs uma ação civil pública por improbidade administrativa contra empresas ligadas à Trafigura, executivos do grupo e ex-funcionários da Petrobras pelo pagamento de propinas.

O MPF apurava crimes que ocorreram entre maio de 2012 e outubro de 2013, em 31 operações de compra e venda internacional de petróleo e derivados, conhecida como trading.

Além da Trafigura, eram investigadas na 57ª fase da Lava Jato a Vitol e a Glencore. Juntas, elas seriam responsáveis por US$ 15 milhões em propinas. Os pagamentos estão relacionados a mais de 160 operações de compra e venda de derivados de petróleo e aluguel de tanques para estocagem.

ESQUEMA DE PROPINAS – Segundo o MPF, as provas mostram um esquema em que as empresas investigadas pagavam propina para ter mais facilidades nos negócios, como preços mais vantajosos e contratos mais frequentes.

De acordo com a investigação, a atividade criminosa permitia que as empresas conseguissem ganhos acima dos praticados pelo mercado. Também foram identificados indícios de irregularidades no aluguel de tanques de armazenagem da Petrobras pelas empresas investigadas, e no afretamento de navios.

A diretoria de Abastecimento da Petrobras, que foi comandada por Paulo Roberto Costa, era responsável pelo setor onde foram identificados os crimes investigados nessa fase.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
A Lava Jato é aquela cobra de vidro, que você corta e ela renasce. Houve alguns excessos, mas os brasileiros deveriam se orgulhar da Lava Jato, apesar da permanente campanha da imprensa amestrada e dos ministros amestrados do Supremo, que gostam de agradar a empreiteiros e políticos corruptos. É o que todos sabem e alguns tentam esconder. Quanto à corrupção na importação/exportação, temos um problema, Houston! É lá que está sediada a Petrobras América, que a Lava Jato não conseguiu investigar. (C.N.)

Nessa multidão boiada, caminhando a esmo com Dominguinhos e Gil

GILBERTO GIL & DOMINGUINHOS - LAMENTO SERTANEJO by GiorgiaSiqueira on  Smule: Social Singing Karaoke App

Dominguinhos e Gil, parceiros e amigos

Paulo Peres
Poemas & Canções

O instrumentista, cantor e compositor pernambucano José Domingos de Morais (1941-2013), o Dominguinhos, na letra de “Lamento Sertanejo”, em parceria com Gilberto Gil, inspirou-se na vida de tantos que partem do interior do país à procura de oportunidades melhores e, ao chegarem na cidade grande, deparam-se com uma realidade bem diferente, daquela conhecida em suas vidas. A música faz parte do LP Refazenda, gravado por Gilberto Gil, em 1975, pela WEA.

LAMENTO SERTANEJO
Gilberto Gil e Dominguinhos

Por ser de lá do Sertão,
Lá do Cerrado
Lá do interior do mato
Da Caatinga do roçado.

Eu quase não saio
Eu quase não tenho amigos
Eu quase que não consigo
Ficar na cidade
Sem viver contrariado.

Por ser de lá
Na certa por isso mesmo
Não gosto de cama mole
Não sei comer sem torresmo.

Eu quase não falo
Eu quase não sei de nada
Sou como rês desgarrada
Nessa multidão boiada
Caminhando a esmo.

Advogado de Daniel Silveira pede prisão de Moraes por desprezar as leis em vigor

Tribuna da Internet | Novas inconstitucionalidades baixadas por Moraes  causam protestos da OAB

Charge reproduzida do site Cariri é isso

Weslley Galzo
Portal Terra

A defesa do ex-deputado federal Daniel Silveira pediu à Procuradoria-Geral da República (PGR) que investigue e, posteriormente, encaminhe pedido de prisão imediata do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes pelo suposto crime de tortura.

Na denúncia encaminhada ao gabinete do procurador-geral da República, Paulo Gonet, nesta sexta-feira, 29, o advogado Paulo Faria acusa o magistrado de abuso de poder, prevaricação e tortura ao manter Silveira preso em regime fechado “200 dias além do prazo legal para progressão de regime”.

INICIATIVA – Paulo Faria disse que o ex-deputado não solicitou a ação contra Moraes e que a iniciativa partiu dele. O ministro foi procurado por meio da assessoria de comunicação do STF, mas não retornou até a publicação desta reportagem.

“Há, sem dúvida, conduta assídua e dolosa desse relator para impedir, ilegalmente, a progressão de regime a que (o réu) tem direito, inclusive com malabarismos e subterfúgios reprováveis e ilegais utilizados nas decisões, em claros constrangimentos ilegais que cerceiam o direito à liberdade”, diz o documento apresentado à PGR.

 “Ressalte-se que a tortura não é apenas física, mas principalmente, psicológica, impondo consequências nefastas à vítima”, disse o advogado na representação.

OUTRA IRREGULARIDADE – Faria alega que o atestado de pena a cumprir – documento que indica por quanto tempo o condenado seguirá preso – só foi anexado por Moraes ao processo no dia 19 de fevereiro, portanto, mais de um ano depois da condenação de Silveira. “Trata-se de um documento essencial para a defesa requerer todos os direitos legalmente previstos de quem cumpre pena”, afirmou.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determina que o documento deve ser expedido pelo juiz relator do caso no prazo de 60 dias a partir do início da execução da pena. Faria alega que a demora para Silveira obter o atestado é a prova de que há “perseguição”.

O advogado diz ter apresentado 22 pedidos de progressão de pena desde novembro de 2023 e sete habeas corpus entre os dias 21 de fevereiro e 30 de março deste ano.

PRAZER PESSOAL – “Tudo foi completamente ignorado pelo noticiado (Alexandre de Moraes), absolutamente tudo, e sem qualquer explicação lógica, senão por mero prazer em perseguir um desafeto pessoal”, disse Faria.

A Procuradoria não tem competência para apresentar pedido de prisão. O órgão é o titular da ação penal pública – ou seja, é o responsável por conduzir as investigações do caso e, na existência de provas, apresentar denúncia que pode transformar o investigado em réu.

Caso uma denúncia do tipo seja apresentada contra Moraes, os demais ministros do STF seriam os responsáveis por analisar a conduta do colega.

PENA RIGOROSA – Daniel Silveira foi preso pela Polícia Federal (PF) em fevereiro de 2023, exatamente um dia após perder o foro privilegiado de deputado federal.

A prisão foi decretada porque o ex-deputado descumpriu medidas cautelares impostas pelo STF, como o uso de tornozeleira eletrônica e a proibição de usar redes sociais, no processo em que ele foi condenado a oito anos e nove meses de prisão por ataques antidemocráticos.

Em maio do mesmo ano, o STF derrubou o perdão presidencial concedido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a Silveira. Naquele mesmo dia, Moraes determinou o início do cumprimento definitivo da pena.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
O advogado Paulo Faria tem toda razão. Nenhum juiz, não importa a instância, tem poderes para negar ao condenado o direito à progressão da pena, quando completa o cumprimento de um sexto do prazo. Sinceramente, existe algo de errado no comportamento do ministro Moraes, que descumpre as leis como se elas não existissem. Na história do Supremo, jamais aconteceu isso antes. O que diz sobre isso o presidente do Supremo? E os demais ministros? Pensem sobre isso. (C.N.)

60 anos de 64! No início, os militares prendiam, depois se acostumaram a matar…

Foto de Vladimir Herzog morto – Wikipédia, a enciclopédia livre

Vladimir Herzog foi suicidado na cela pelos militares

Bernardo Mello Franco
O Globo

A um mês de subir a rampa do Planalto, Ernesto Geisel recebeu seu futuro ministro do Exército, Dale Coutinho, para uma conversa no Rio. Os dois generais começaram tratando de amenidades. Depois chegaram ao que interessava: a repressão à esquerda armada, que havia chegado ao ápice no governo Emílio Médici.

— O negócio melhorou muito. Agora, melhorou, aqui entre nós, foi quando nós começamos a matar. Começamos a matar — sublinhou Coutinho.

— Porque antigamente você prendia o sujeito e ia lá para fora — emendou Geisel. — Ô Coutinho, esse troço de matar é uma barbaridade, mas acho que tem que ser — prosseguiu.

REGIME MATADOR – O diálogo, gravado em 16 de fevereiro de 1974, mostra como a ditadura militar transformou o extermínio de presos políticos em política de Estado. A conversa foi revelada pelo jornalista Elio Gaspari no livro “A ditadura derrotada”, de 2003. Vinte e um anos depois, o público poderá ouvi-la pela primeira vez em “A ditadura recontada: As vozes do golpe”, série original do Globoplay produzida pela CBN.

O podcast é baseado nos cinco volumes em que Gaspari narra a ascensão e o ocaso do regime dos generais. Para que a história pudesse ser contada em áudio, o colunista do Globo abriu seu valioso acervo, com mais de 300 horas de gravações inéditas.

Nas fitas, Geisel revela segredos da caserna, admite a tortura nos porões e fala sem reservas sobre os outros presidentes da ditadura. Castello Branco, seu aliado, é descrito como “corcunda”, “metido a literato” e “aluno mediano”. Costa e Silva, seu desafeto, desponta como “preguiçoso” e “doente”.

MÉDICI, O PREFERIDO – O general Médici, que chefiou o período mais brutal da repressão, é quem aparece melhor na fita. — Ele foi o único sujeito capaz de levar a revolução para o povo — elogia Geisel.

Referia-se à popularidade do antecessor, que estimulou o ufanismo, colheu os louros do “milagre brasileiro” e se beneficiou da censura à imprensa.

O primeiro capítulo da série estreou nesta quinta-feira nas principais plataformas de áudio. Trata da conspiração que culminou no golpe de 1964 e inaugurou um longo período de 21 anos de ditadura. A história é narrada nas vozes dos vencedores, como o governador Carlos Lacerda, e dos vencidos, como o presidente deposto João Goulart.

GOLPE DE ARAQUE – O episódio mostra que os militares se uniram para derrubar o governo, mas não combinaram sequer a data em que dariam o golpe. A ação foi precipitada pelo general Olympio Mourão Filho, que comandava uma guarnição modesta em Juiz de Fora. Ele deu as ordens pelo telefone, vestiu um roupão de seda vermelho e se recolheu para tirar uma sesta.

— Creio ter sido o único homem do mundo que desencadeou uma revolução de pijama — gabou-se, tempos depois.

A quartelada deu as primeiras pistas de que os generais não estavam tão organizados quanto gostariam de parecer.

— Eles participaram da deposição do Jango em nome do combate à esquerda e da disciplina militar. No dia da queda do Jango, essa disciplina começou a ser violentada — constata Gaspari, numa de suas participações no podcast.

O GRANDE IRMÃO – O jornalista também analisa a participação dos EUA no complô. Áudios liberados pela Casa Branca mostram que a hipótese de apoiar um golpe no Brasil já era cogitada desde julho de 1962. O presidente John Kennedy, que seria assassinado no ano seguinte, discutiu o tema duas vezes com o embaixador Lincoln Gordon.

— A participação dos americanos no golpe está envolvida numa névoa. Uma coisa é certa: o golpe prevaleceu sem a participação de um único militar americano. Agora, os americanos tinham interesse no golpe? Sem a menor dúvida — diz Gaspari, que classifica o 31 de março como um “acontecimento brasileiro”.

— O Lincoln Gordon é um dos personagens mais trágicos desses dias. Ele carregou pela vida toda a marca da participação no golpe. Morreu em 2009, aos 96 anos. E, no memorial fúnebre, a filha criticou sua participação no golpe no Brasil — acrescenta.

DITADURA FEROZ – Instalados no governo, os militares rasgaram a promessa de devolver o poder aos civis.

Cassaram mandatos, extinguiram os partidos políticos e sufocaram as liberdades civis com a edição do AI-5, que fechou o Congresso e impôs a censura prévia. Sem eleições diretas, os presidentes passaram a ser escolhidos em reuniões fechadas nos quartéis.

— Não existe um único documento que mostre de onde saiu a maioria para eleger o Médici. Ou seja: o povo não sabe votar, mas os generais também não — ironiza Gaspari.

ABERTURA LENTA – Empossado dez anos depois do golpe, Geisel deu a partida no lento processo de abertura, que só terminaria com a eleição indireta de Tancredo Neves, em 1985.

Em “A ditadura recontada”, Gaspari resume sua visão do que teria levado um dos arquitetos da ditadura a iniciar seu desmonte:

— O que o Geisel queria era acabar com a bagunça. Ele não cansava de repetir que não foi movido por vocação democrática. Era contra eleição direta para presidente e achava que o Congresso não deveria se meter no Orçamento. Agora, bagunça no quartel, de jeito nenhum.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
É isso que vai ficar na História, graças ao colossal trabalho de Elio Gaspari, não a versão disparatada que os clubes militares divulgaram essa semana, dando os militares golpistas de 64 como heróis. Um dia, os militares entenderão que a democracia é o único caminho. Mas isso ainda vai demorar muito. Basta ver os exemplos da Nicarágua, Cuba, Venezuela, China, Coreia do Norte e Rússia, sem falar em Afeganistão, Myanmar, Guiné Equatorial, Arábia Saudita e outros 36 países. Com todo respeito ao canídeo, melhor amigo do homem, ainda vivemos num mundo cão. (C.N.)

Mancada do PSOL acaba de enterrar a candidatura de Boulos, afirma Nikolas Ferreira

Partido de Boulos resolveu fazer piada com coisa séria

Deu no Poder360

O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) afirmou que a pré-candidatura de Guilherme Boulos (PSOL-SP) para a Prefeitura de São Paulo foi “enterrada”. Ele deu a declaração depois que o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) publicou na sexta-feira (29) uma montagem em que Jesus Cristo aparece crucificado com a frase “bandido bom é bandido morto”.

“Obrigado, MTST. Acabaram de enterrar a candidatura de Boulos”, disse Nikolas em seu perfil no X.

MUITAS CRÍTICAS – Boulos é filiado ao movimento e já foi um dos líderes do MTST. O post foi criticado por políticos e influenciadores mais alinhados à direita.

Para alguns da esquerda, a postagem foi vista como uma crítica social que lembra ações policiais recentes e frases frequentemente ditas por nomes de ideologia oposta.

O último levantamento do Paraná Pesquisas, divulgado em 19 de março, mostrou que o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), venceria Boulos no 2º turno das eleições municipais na capital. Num cenário de disputa direta entre os 2 políticos, Nunes levaria o pleito com 46%. Boulos teria 39,1%.

ENTENDA O CASO – O MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) publicou uma imagem em seu perfil no X (ex-Twitter) na sexta-feira (29) em que Jesus Cristo aparece sendo crucificado com a frase “bandido bom é bandido morto”.

A publicação recebeu repúdio por parte de políticos e influenciadores alinhados à direita. Por alguns da esquerda, foi vista como uma crítica social que lembra ações policiais recentes e frases frequentemente ditas por nomes de ideologia oposta.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Enviada por José Guilherme Schossland, a reportagem lembrar o mestre Ataulfo Alves, que diria: “A burrice desta gente é uma arte”. Guilherme Boulos está totalmente identificado com o MTST, o movimento que ele se empenhou em fortalecer, através da invasão de imóveis, que antes era um feudo político explorado pelo PcdoB quase com exclusividade. O jovem Nikolas Ferreira acertou em cheio. Essa bobagem derruba qualquer candidatura. Foi o que aconteceu com o brigadeiro Eduardo Gomes. Falou na campanha sobre os marmiteiros, sua frase foi alterada e manipulada, ele não soube reagir, perdeu muitos votos e largou a política. (C.N.)

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Vicente Limongi Netto

Tradição católica ensina e recomenda que não se deve comer carne na sexta-feira da Paixão. A bela e marcante data não faz restrições ao consumo de imensos e caros ovos de Páscoa, aos saborosos e variados pratos de bacalhau, peixes, camarões e lagostas.

Com direito a espumantes, vinhos, uísque e cervejas. Ao redor de amigos e famílias felizes. Com intermináveis selfes coloridas, beijos e abraços. Contentamento sem hora para acabar.  Afinal, ninguém é de ferro.

BRASIL REAL – Nessa linha, no Brasil real, dividido e vergonhoso, para perto de 8 milhões de brasileiros estão desempregados, cheios de dívidas, a mesa na sexta-feira da paixão permanece a mesma. 

Degradação completa. Pedaços de pão, legumes e frutas recolhidos nas latas de lixo. Crianças maltrapilhas. Frio e desencanto. Pais agoniados. Vida despedaçadas. Água e café ralo.

Ovo de Páscoa é piada infame. Agride, insulta e humilha. A miséria e a fome são implacáveis e permanentes.

SÓCRATES – A pergunta exigindo resposta: porque “Rua Doutor Sócrates”, na Vila Olímpica de Paris, homenageando o Brasil, nas olimpíadas? Sócrates nunca ganhou nada pela seleção brasileira. Ficou famoso jogando no Corinthians.

Nunca jogou na França, ao contrário do irmão dele, Rai, assim como Paulo Cesar Caju. Ambos jantaram com o presidente Emanuel Macron, na recente visita do francês ao Brasil. Estranha, imerecida, sem graça e injustificável homenagem a Sócrates. Francamente. É o fim da picada.