Marcus André Melo
Folha
Os resultados eleitorais pífios do PT excluíram uma reflexão mais ampla sobre o seu significado. Uma das razões da perplexidade diz respeito ao chamado “efeito incumbência”, que foi praticamente nulo nas eleições. O que, registre-se, não aconteceu com o PSDB, em sua trajetória de declínio terminal. O número de prefeituras conquistadas pelo PT é irrisório; 4/5 delas estão em pequenos municípios no Nordeste.
Um município —Fortaleza— responde pela maior parte da população a ser governada, mas o prefeito eleito se filiou ao partido em 2023, após três mandatos pelo PDT.
EM DECLÍNIO – O fato de que Lula foi eleito em 2022 obscureceu o brutal enfraquecimento do partido no Congresso e na sociedade em geral.
O declínio do PT e do PSDB não interessa só porque vertebraram uma competição política por duas décadas: trata-se dos únicos partidos programáticos “presidenciáveis” do país. O percentual de votos combinados das duas siglas no primeiro turno foi de 44% (1989), 85% (1994 e 1998), 70% (2002), 90% (2006) e 80% (2010) e 75% (2014) .
Até 1998 ganharam centralidade no sistema partidário, que ganhou musculatura. Entre 1989 e 1998, os três maiores partidos expandiram sua participação no total das cadeiras de 46% a 56% do total; mas a partir deste ano caíram monotonamente: 48% (2002), 46% (2006), 42% (2010), 37% (2014) e 28% (2018).
MAIS PARTIDOS – Durante 13 anos o número efetivo de partidos políticos (NEPP) também declinou e depois explodiu: oscilou em torno de 8: 9,1 (1989), 8,1 (1994), 7,1 (1998), 8,4 (2002), sobe a 9,3 (2006), dispara para alcançar 13,4 (2014) e inacreditáveis 16,4 (2018).
Há vários fatores que explicam o declínio do PT e do PSDB, mas os escândalos de corrupção —mensalão, petrolão, JBS/Aécio— foram decisivos para esse resultado. O grau de visibilidade política proporcionada pela exposição pornográfica da corrupção no Petrolão —através de vídeos e gravações— tem alguns paralelos no mundo.
Tais escândalos não tiveram impacto sobre os demais partidos que foram membros das coalizões de governo e foram profundamente implicados, mas que se fortaleceram simultaneamente à fragmentação paulatina partidária a que se assistiu. Por que apenas os dois partidos programáticos foram afetados pelos escândalos de corrupção?
EXPLICAÇÃO S – Aqui há dois fatores explicativos, como – argumentamos em trabalho recente coautorado com Ivan Jucá (Cepesp-FGV).
O primeiro é que PT e PSDB ascenderam à Presidência, onde se concentraram a responsabilização política. O segundo é que foram os partidos programáticos que tiveram grande visibilidade à bandeira de governo limpa quando na oposição.
Há assim uma inconsistência dinâmica perversa no sistema político: os partidos programáticos têm sucumbido, enquanto os partidos fisiológicos que “gravitam em torno do Executivo” —independentemente de sua coloração ideológica—, dão suporte parlamentar e sobrevivem a presidentes minoritários.
CARTELIZAR – Mais do que isso, estes lograram cartelizar o sistema criando barreiras à entrada (leia-se fundos partidários/campanha bilionários) que criam vitórias fortíssimas pró-incumbente.
Contrariando as expectativas teóricas, esses partidos fisiológicos, como mostra Ivan Jucá, são fortemente centralizados, o que lhes garante o controle vertical sobre os fundos públicos turbinados.