Gigantismo estatal causa a crise que destrói a própria democracia

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Charge da Érica Aves (Arquivo Goggle)

João Pereira Coutinho
Folha

Hora da confissão: sempre que escuto a palavra “polarização” sinto vontade de puxar o revólver. E, quando escuto as explicações para essa polarização, a vontade é sacar a bazuca.

Sim, mil vezes sim: a desigualdade econômica, imigração, redes sociais e seus capangas digitais… tudo isso agravou o tom e o estilo da discussão pública. Mas democracias livres são, por definição, polarizadoras. E é bom que sejam. A nostalgia da unidade é o sonho molhado dos tiranos.

ÓDIO EXISTENCIAL – O ódio que hoje corre solto tem razões mais fundas: é um ódio existencial, como se cada eleição pusesse em risco a própria sobrevivência de metade do país. Haverá explicação para esse surto psicótico? Talvez — e mais racional do que se imagina.

O diplomata britânico David Frost, escrevendo no Daily Telegraph, oferece a hipótese mais convincente que conheço para o pensamento binário que domina a espécie: globalistas contra nacionalistas; “fascistas” contra “comunistas”; e, no contexto britânico, partidários da União Europeia contra defensores do brexit.

É o Estado, estúpido! Houve um tempo em que o governo se ocupava das funções soberanas (justiça, ordem interna, defesa), tentando ainda fornecer serviços básicos à população. O Estado não estava em todo lugar, mas tentava estar onde deveria. Isso deixava algum oxigênio para os indivíduos, que podiam tocar suas vidas sem a sombra permanente do Leviatã.

ESTADO TENTACULAR – Não mais. Vivemos em “Estados totalizantes” (não confundir com totalitários), que se expandem muito além de suas funções específicas. Não é só justiça ou segurança. Não é apenas saúde ou aposentadoria.

É economia, cultura, educação, costumes, vida privada, pensamentos íntimos —nada escapa ao Leviatã e seu desejo de controle social. O oxigênio se foi e ficou a sensação permanente de asfixia.

Moral da história? Quando tudo depende do Estado, tudo depende do acesso ao poder. Isso significa que tudo é político — até onde a política estatal tradicionalmente não entrava. Como conclui David Frost, o que está em jogo é importante demais para você não ser tragado pelo vórtice.

TESE FORTE – É uma tese forte, admito, que os números e a história reforçam. Nos últimos 150 anos, os gastos públicos no Ocidente só caminharam numa direção —para cima. Parte se explica por conjunturas (guerras, pandemias) ou por causas nobres (não pertenço à seita dos neoliberais, para quem o Estado de bem-estar é um dos cavaleiros do apocalipse).

Mas o gigantismo estatal não nasceu apenas de boas intenções. Depois da Primeira Guerra Mundial, entraram em cena os “Estados-projeto”, para usar o conceito do grande historiador Charles Maier: Estados ativistas que não se limitavam a administrar, mas se lançavam na tarefa de refazer a economia, a sociedade e a própria natureza humana de acordo com um plano ideológico.

No século 19, tivemos projetos de Estado —o Brasil pós-Independência ou a unificação alemã com Bismarck são exemplos clássicos dessa construção institucional.

DOMÍNIO TOTAL – O “Estado-projeto” é outra coisa: pressupõe a existência desses elementos (população, território, soberania, governo), mas vai muito além. Sua ambição é remodelar o cidadão com os instrumentos do Estado.

E, para desespero dos críticos, Maier lembrava: não é só coisa de ditadura. Democracias liberais também podem ser “Estados-projeto”, descontada a violência. O que define é a intenção: a decisão política de mobilizar o Estado para moldar o futuro.

De vez em quando escuto amigos reclamando da onipresença da política em suas vidas. Entendo o cansaço, a náusea mesmo, com a gritaria sem fim.

Mas essa gritaria não é tão irracional: a política, de fato, infiltra-se em tudo —até na intimidade. Quem zomba de progressistas (ou conservadores) que juram nunca namorar alguém do “outro lado” ignora que isso é apenas a consequência lógica do nosso tempo.

E AS ELEIÇÕES? – Uma eleição tampouco é apenas uma eleição —um mecanismo pacífico de trocar governantes sem derramamento de sangue, como dizia o filósofo. É a hora em que recursos colossais e instrumentos tentaculares do Estado mudam de mãos. E, se isso não é uma ameaça existencial, o que é?

A polarização poderia ser saudável —se o Estado também fosse. Mas, para tanto, seria preciso devolver o Leviatã às suas funções próprias e limitadas, longe dos delírios dos “Estados-projeto”.

Caso contrário, marcharemos de eleição em eleição no ódio existencial — até chegarmos à última.

Malafaia convoca ato em Brasília para reagir à derrota da anistia

Novo ato quer evitar que “esquerda tenha última palavra”

Bela Megale
O Globo

Organizador das manifestações em torno de Jair Bolsonaro, Silas Malafaia foi um dos principais defensores da necessidade de realizar um ato para responder aos protestos que tomaram as capitais do Brasil no domingo (21), contra a anistia e a PEC da Blindagem.

Segundo o pastor, a caminhada convocada em Brasília para a próxima semana busca “não deixar a esquerda dar a última palavra”. Malafaia disse que, “no lugar de artistas, o ato terá familiares dos presos do 8 de janeiro”.

NA CORDA BAMBA – A necessidade de fazer um ato para responder às manifestações começou a ser debatida por aliados de Bolsonaro no dia seguinte às manifestações que enterraram a PEC da Blindagem e colocaram a anistia na corda bamba. Como informou a coluna, o tamanho dos protestos assustou os bolsonaristas.

A ideia de convocar uma caminhada em Brasília foi consolidada depois que Malafaia debateu com lideranças políticas da direita opções de datas. A avaliação foi que não haveria tempo para convocar o ato para 5 de outubro e que o dia 12 seria inviável por ser uma data religiosa em que se celebra Nossa Senhora de Aparecida.

Parte dos aliados do ex-presidente apresentou outro argumento para a realização de uma caminhada em defesa da anistia. Eles apontam que também existia o receio, por parte de um grupo, de que um novo ato com a bandeira da anistia em locais como a Avenida Paulista ou a Praia de Copacabana pudessem ser um tiro no pé, caso reunissem menos pessoas do que as manifestações do dia 21 de setembro.

Disputa por herança política de Bolsonaro acirra racha entre aliados

Ciro Nogueira e Valdemar são vistos como ‘aproveitadores’

Carlos Petrocilo
Danielle Brant
Folha

Aliados de Jair Bolsonaro (PL) têm manifestado internamente descontentamento com a postura de pessoas próximas em relação a supostas sinalizações dadas pelo ex-presidente, e afirmam ver tentativa de aproveitar a inacessibilidade dele para tentar alcançar interesses próprios.

Braço direito de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos, o influenciador Paulo Figueiredo colocou lenha na fogueira ao escrever em suas redes sociais que, hoje, o ex-presidente é um refém.

CIRO E VALDEMAR – Sob reserva, os aliados criticam especificamente o senador Ciro Nogueira (PP) e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, que veem como tentando orquestrar narrativas para tirar de vez o protagonismo do ex-presidente, a um ano das eleições.

Um ex-integrante do governo Bolsonaro avalia que Ciro está “hipnotizado” com a possibilidade de ser candidato a vice de Tarcísio de Freitas (Republicanos) caso ele decida disputar a Presidência em 2026, enquanto Valdemar tem como interesse os fundos partidário e eleitoral.

Outro aliado diz que caciques partidários aproveitaram o distanciamento entre Bolsonaro e Eduardo, conforme decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes, para deflagrar uma guerra de egos.

CONFUSÃO – Na avaliação dos bolsonaristas, as narrativas atribuídas ao ex-presidente servem para confundir a cabeça da militância. Eles lembram que, como ele está distante das redes sociais e suas visitas têm que passar pelo aval do Supremo, há muitas pessoas usando uma espécie de “liberdade poética” sobre conversas que teriam tido com Bolsonaro.

Com isso, acabam aparecendo em reportagens versões de conversas moldadas conforme o interesse do interlocutor, dizem. E Bolsonaro não tem como contraditar, o que cria uma crise de liderança, complementam.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOGEm tradução simultânea, a família Bolsonaro – especialmente Eduardo – está tumultuando a oposição a Lula. E o  governador Tarcísio de Freitas, o mais forte oposicionista, só aceita a candidatura se for consenso nas direitas. E assim Lula pode se mumificar no poder, igual a Lenin, falando em gravações as mesmas bobagens de sempre, até o final dos tempos. (C.N.)

Bolsonaro corta especulação: Michelle será candidata ao Senado

Após polêmica, Michelle descarta Planalto

Malu Gaspar
O Globo

Deu problema em casa a entrevista de Michelle Bolsonaro ao jornal inglês The Telegraph em que ela afirmou que, se fosse necessário, se candidataria a presidente em 2026. Nas conversas que teve depois da publicação, Jair Bolsonaro não a citou, mas fez questão de mencionar que Michelle será sim candidata em 2026 – a senadora.

A reação fez com que interlocutores do ex-presidente entendessem que as declarações de Michelle são um não-assunto para ele. Desde antes da prisão, aliados de Bolsonaro relatam que ele já dizia que a mulher não deveria se candidatar à Presidência e sim ao Senado Federal pelo Distrito Federal, mesmo aparecendo bem colocada nas pesquisas de intenção de voto.

“VALORES CONSERVADORES” – Ao jornal, Michelle prometeu “se levantar como uma leoa para defender nossos valores conservadores”. O diário ressaltou que a ex-primeira-dama se posicionou “como potencial sucessora de seu marido” e “deu a entender” que estaria disposta a disputar a eleição presidencial do ano que vem.

No último sábado, (27), três dias depois da entrevista, Michelle disse a apoiadores em um evento do PL Mulher em Ji-Paraná (RO) que não quer ser presidente e sim primeira-dama. E explicou sua fala:

“Nós somos mulheres que acolhem, que alimentam, que ajudam, que cuidam e defendem os seus como leoa. Nós vamos defender a nossa família. O meu marido está dentro de casa, mas, se ele quiser, eu serei a voz dele nos quatro cantos dessa nação.”

MANIFESTAÇÃO – À equipe da coluna, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) disse que entende o comportamento de Michelle como manifestação de indignação e acha que ela não se colocou como candidata. “Que mulher não ficaria revoltada com o marido colocado em cativeiro, como meu pai?”.

Para Flávio, “não é hora” de discutir um eventual substituto para seu pai na chapa presidencial em 2026. “Nossa prioridade é restabelecer tudo o que Alexandre de Moraes tirou do Bolsonaro”, diz o filho 01.

Eduardo Bolsonaro usa carta de Trump para atacar STF e defender anistia ampla

Deputado diz que acusações motivam atenção dos EUA

Bruna Rocha
Estadão

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) utilizou as redes sociais nesta segunda-feira, 29, para comentar a carta do presidente americano Donald Trump, aproveitando a ocasião para criticar o projeto de lei da anistia. Segundo ele, a proposta de anistia, que acabou se transformando em uma dosimetria para reduzir as penas dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, não seria suficiente para encerrar o que classificou como uma “perseguição”.

No X (antigo Twitter), Eduardo Bolsonaro, que está morando nos Estados Unidos desde fevereiro deste ano, usou a carta enviada por Trump ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para criticar a Justiça brasileira.

CONTESTAÇÃO – Ele contestou a condenação do pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, sentenciado a 27 anos e 3 meses de prisão por liderar uma organização criminosa e tentar abolir o Estado Democrático de Direito após o resultado das eleições de 2022.

No documento datado de 9 de julho de 2025, Trump elogiou Jair Bolsonaro, chamando-o de líder “altamente respeitado” e criticou as acusações contra o ex-presidente, classificando o julgamento no STF como uma “caça às bruxas”. Trump também pediu a suspensão imediata do processo judicial e considerou o caso uma “vergonha internacional”

Usando esse argumento, Eduardo afirmou: “Este é o principal motivo que atrai a atenção dos EUA para o Brasil — daí decorrem também diversos outros fatores. A dosimetria, destaque-se, não conserta essa perseguição; a anistia, sim”, escreveu o deputado.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Eduardo Bolsonaro mais uma vez recorre ao discurso de vitimização para tentar blindar o pai e o bolsonarismo das consequências jurídicas de seus atos. Ao usar uma carta de Donald Trump para atacar a Justiça brasileira e pressionar pela anistia, o deputado reforça a narrativa de “perseguição” que ignora as provas e condenações já confirmadas no Supremo. Em vez de se posicionar como parlamentar comprometido com o Estado Democrático de Direito,  atua como porta-voz de uma estratégia de deslegitimação das instituições, apostando na polarização e no desgaste da democracia para obter dividendos políticos. (M.C.)

Relator bolsonarista põe em xeque julgamento de Eduardo Bolsonaro

Antes de morrer com apenas 20 anos, o último pedido de Álvares de Azevedo

Feliz daquele que no livro d'alma não... Álvares de Azevedo - PensadorPaulo Peres
Poemas & Canções

O dramaturgo, ensaísta, contista e poeta paulista Manuel Antônio Álvares de Azevedo (1831-1852), no poema “Tristeza”, antes de morrer aos 20 anos, fez um último pedido para que escrevessem uma frase em sua sepultura.

TRISTEZA
Álvares de Azevedo

Eu deixo a vida como deixa o tédio
Do deserto o poento caminheiro;
Como as horas de um longo pesadelo,
Que se desfaz ao dobre de um sineiro;

Como um desterro de minha alma errante,
Onde fogo insensato a consumia…
Só levo um saudade – é um desses tempos
Que amorosa ilusão embelecia.

Só levo uma saudade – é dessas sombras
Que eu sentia velar nas noites minhas…
De ti, ó minha mãe, pobre coitada,
Que por minha tristeza te definhas!

Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz – e escrevam nela:
Foi poeta, sonhou e amou a vida

Moraes autoriza Daniel Silveira a cumprir pena em regime aberto com tornozeleira

Decisão reconhece cumprimento de requisitos legais

or Rayssa Motta
Estadão

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou o ex-deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) a cumprir o restante da pena do regime aberto. Ele terá que usar tornozeleira eletrônica, comparecer semanalmente no fórum, ficar fora das redes sociais e comprovar “atividade laborativa lícita”.

A defesa do ex-deputado pediu a progressão de regime e a Procuradoria-Geral da República (PGR) foi a favor. O ex-deputado preencheu os requisitos previstos na Lei de Execuções Penais para a progressão do regime de prisão, como o cumprimento de parte da condenação no sistema fechado e o bom comportamento.

REGIME PROGRESSIVO – Em sua decisão, Moraes justificou que a pena “deverá ser cumprida em regime progressivo, permitindo ao sentenciado, desde que presentes em sua integralidade os requisitos legais objetivos e subjetivos, o acesso aos regimes menos rigorosos”.

“Na presente hipótese, estão presentes todos os requisitos legais exigidos para a progressão do sentenciado ao regime aberto de cumprimento de sua pena privativa de liberdade”, escreveu o ministro.

O ex-deputado conseguiu a remissão de 389 dias da pena, abatidos a partir da comprovação de atividades de estudo e trabalho na cadeia, e também pagou a multa corrigida de R$ 271 mil por violar a tornozeleira eletrônica quando estava em prisão domiciliar.

ATAQUES – Daniel Silveira foi condenado pelo STF a oito anos e nove meses de prisão por defender pautas antidemocráticas, como a destituição de ministros do tribunal e a ditadura militar. Em um vídeo publicado nas redes sociais, em fevereiro de 2021, ele atacou e ofendeu ministros, falou em dar uma “surra” nos magistrados, defendeu o golpe militar de 1964 e o AI-5 (ato mais duro da ditadura).

O julgamento foi concluído em abril de 2022, mas Daniel Silveira não começou a cumprir a pena imediatamente porque o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) editou um decreto para perdoar a condenação. O indulto terminou anulado pelo STF. Até o dia 16 de setembro, data da emissão do atestado de pena mais recente, consta que o ex-deputado cumpriu quatro anos, um mês e 26 dias da pena.

Bolsonaro tranquiliza Tarcísio e diz que Eduardo não disputará Presidência

Tarcísio visita Bolsonaro, prega anistia e sinaliza união em 2026

Bolsonaro diz a Tarcísio que Eduardo tentará o Senado 

Luísa Marzullo
O Globo

No primeiro encontro com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. desde que foi condenado a 27 anos de prisão, Jair Bolsonaro afirmou que deseja manter a candidatura de Eduardo Bolsonaro ao Senado por São Paulo em 2026, descartando a possibilidade de que o filho seja lançado ao Planalto.

A reunião, um almoço, ocorreu no condomínio em que o ex-presidente cumpre prisão domiciliar, em Brasília, e contou também com a presença do senador Flávio Bolsonaro e do vereador Jair Renan.

FOI TAXATIVO – Segundo relatos de interlocutores, Bolsonaro foi taxativo ao defender Eduardo como nome da família na disputa paulista.

A leitura é que, embora a vaga não inviabilize outros aliados — como Guilherme Derrite, ex-secretário da Segurança de Tarcísio e hoje deputado pelo PP —, a ênfase no filho simboliza a tentativa do ex-presidente de preservar influência direta sobre o maior colégio eleitoral do país.

Eduardo, porém, está fora do Brasil desde fevereiro e enfrenta investigações que podem levá-lo à inelegibilidade, o que faz com que aliados já discutam alternativas para a chapa.

EDUARDO INSISTE – A posição de Bolsonaro contrasta com a do próprio Eduardo, que na semana passada declarou em entrevista ao Metrópoles que seria candidato à Presidência mesmo sem o apoio do pai.

— Eu sou, na impossibilidade de Jair Bolsonaro, candidato a presidente da República; por isso que o sistema corre e se apressa para tentar me condenar em algum colegiado, que seja na Primeira Turma do STF, para tentar me deixar inelegível — afirmou.

Entre aliados, cresce a avaliação de que, caso Eduardo permaneça fora do Brasil ou tenha sua situação jurídica agravada, não há como registrar a sua candidatura em 2026. A aposta de Bolsonaro no Senado funciona, nesse contexto, também como tentativa de blindagem, oferecendo ao filho uma plataforma eleitoral considerada por aliados como mais segura do que a retórica presidencial.

SEM VIABILIDADE – Já em relação ao Planalto, Bolsonaro teria dito a Tarcísio que não enxerga viabilidade em um projeto nacional de Eduardo. Ao contrário do que aliados próximos ventilam, trata a hipótese como recurso retórico, útil para manter o protagonismo da família no debate público e preservar a narrativa de perseguição que sustenta sua base.

O governador paulista, por sua vez, aproveitou o encontro para reafirmar que será candidato à reeleição, resistindo às pressões de setores do bolsonarismo que gostariam de vê-lo no Planalto.

A insistência na reeleição é lida por aliados como uma forma de dar uma “acalmada” nas especulações e ganhar tempo, até porque, em meio à indefinição sobre o futuro de Bolsonaro e à tramitação da anistia no Congresso, qualquer gesto antecipado poderia gerar ruído.

PRIMEIRO, ANISTIA – Na saída, Flávio Bolsonaro fez questão de elogiar o governador, mas condicionou o debate da sucessão à aprovação da anistia.

— Tarcísio é um dos principais ativos que a centro-direita tem. Tem feito um grande trabalho — disse o senador. E acrescentou: — Somente após esse processo legislativo da anistia e esse desenrolar final, não tem porque antecipar nome de nada.

No PL, dirigentes avaliam que a candidatura de Eduardo ao Senado era o caminho natural, mas que o cenário tende a se complicar. Valdemar Costa Neto, presidente da legenda, busca calibrar o discurso entre a lealdade à família Bolsonaro e a pressão do centrão por nomes com maior viabilidade. Um aliado direto de Valdemar afirmou que Eduardo já é tido como carta fora do baralho.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
– Como se vê, nada de novo no front ocidental. Eduardo Bolsonaro não tem apoio do pai e o PL não lhe dará legenda. Essa bagunça que está fazendo nos EUA é tiro no pé, porque prejudica a união da direita com o Centrão e fortalece o petista Lula, que até teria virado favorito, segundo essas ridículas pesquisas tentam espalhar. (C.N.)

Bolsonaro rejeita ‘anistia light’ e acordo do Congresso com Supremo

Ex-presidente rejeita endossar projeto de Paulinho da Força

Malu Gaspar
O Globo

Em conversa reservada com o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, Jair Bolsonaro deixou claro que não vai apoiar as articulações no Congresso para aprovar uma “anistia light” que diminua as penas dos investigados na intentona golpista que culminou com os ataques às sede dos três poderes em 8 de janeiro de 2023.

Para o ex-presidente, não dá para endossar publicamente um projeto cujo relator, na visão dele, foi “escolhido pelo STF” e atua “em dobradinha” com o Supremo – referindo-se ao deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), que é próximo dos ministros da Corte. Caberia, portanto, a Paulinho e ao STF assumirem o ônus por capitanear qualquer iniciativa nesse sentido.

RECUO – Segundo relatos obtidos pela equipe da coluna, a avaliação do ex-presidente é a de que, se o PL for a favor do projeto, isso não apenas seria interpretado como um recuo, mas também irritaria o núcleo duro da base bolsonarista, que insiste em uma anistia “ampla, geral e irrestrita”, como defende o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

Valdemar se encontrou com o ex-presidente na tarde da última quinta-feira (25) no condomínio Solar de Brasília, onde Bolsonaro cumpre prisão domiciliar desde 4 de agosto por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Conforme informou a colunista Bela Megale, Eduardo avisou ao líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), que qualquer alternativa à anistia só vai levar ao recrudescimento de sua atuação nos Estados Unidos por sanções contra autoridades brasileiras.

RECADO – A leitura de Bolsonaro é a de que uma eventual adesão do PL à iniciativa poderia passar para a militância bolsonarista o recado de que a sigla topou fazer parte do acordo – que ainda envolve o ex-presidente Michel Temer e o deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG). Além deles, também participaram os ministros do STF Moraes e Gilmar Mendes, que são próximos de Paulinho e deram aval às negociações.

A versão mais aceita do projeto em discussão nos bastidores poderia levar à redução em até 11 anos das penas dos condenados do 8 de Janeiro, conforme informou o blog. “Que tal ler a Constituição, Hugo Motta e Paulinho da Força? Dosimetria é uma ferramenta do Judiciário; anistia, do Legislativo; graça e indulto, da Presidência da República. Não inventem!”, escreveu na última quinta-feira (25) o senador e ex-secretário da Pesca de Bolsonaro Jorge Seif (PL-SC), integrante da tropa de choque bolsonarista na Casa

ANÁLISE – A depender do desfecho das negociações em torno do PL da Dosimetria, a pena imposta pelo Supremo a Bolsonaro por articular um golpe de Estado pode cair de 27 para 16 anos.

No entorno de Valdemar, há quem faça uma análise mais pragmática sobre a situação do ex-presidente, que tem 70 anos de idade e enfrenta uma série de problemas de saúde, com crises frequentes de soluços e vômitos após o atentado que sofreu nas eleições de 2018.

“27 anos de pena é quase uma sentença de morte, com a probabilidade alta de Bolsonaro morrer em regime fechado. Já com 16 anos, há a esperança de que ele possa progredir de regime num prazo bem menor. Isso dá uma expectativa de uma vida livre”, afirma um integrante do PL. “O PL da Dosimetria está longe de ter consenso, mas Bolsonaro não está em condições de endossar nada.”

PROPOSTA –  Entre as principais propostas em discussão nos bastidores da Câmara estão a de reduzir as penas dos crimes de golpe de Estado e a abolição violenta do Estado democrático de direito e definir que eles se absorvem, o que impediria que um mesmo réu fosse condenado por ambos.

Atualmente, a legislação brasileira, sancionada pelo próprio Bolsonaro em setembro de 2021, prevê pena de quatro a 12 anos de prisão para o crime de golpe de Estado – e de quatro a oito anos para quem tentar “com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”.

Com a redução, a pena para abolição do Estado democrático de direito poderia passar para entre dois e seis anos, e a de golpe de Estado entre dois e oito anos, mas a proposta final ainda não foi fechada.

Eduardo quer ser candidato em 2026, mesmo que destrua o pai Bolsonaro

PF: Eduardo quis continuar ação nos EUA e diz que Bolsonaro é "empecilho" | CNN Brasil

Líder de si mesmo, Eduardo diz que o pai é  um “empecilho”

Carlos Andreazza
Estadão

Eduardo Bolsonaro desenvolve o seu pós-Bolsonaro – pós-Jair, para não haver dúvida. Pós-pai. A superação político-eleitoral do pai. A constituição desse movimento está explícita. Eduardo propõe uma dissidência bolsonarista, que se organiza em função do monopólio (desafiado?) do acesso à Casa Branca e da imposição do que se tornaria a pauta única da direita brasileira: a anistia, tão difícil de alcançar quanto eficaz em interditar a ascensão de liderança que não da família.

Não tem negócio. Jair Bolsonaro inelegível, incontornavelmente inelegível, todo mundo se organizando em função dessa inelegibilidade – e o bolsonarismo eduardista sustentando a agenda, a da anistia “ampla, geral e irrestrita”, que engessa a direita e lhe garante poder e centralidade sobre o espólio de Jair. Tem método.

ALGUM BOLSONARO – “Em 2026 será Bolsonaro” – escreveu Paulo Figueiredo, a inteligência influente que formula e pauta Eduardo. Em 2026 será Bolsonaro. Não necessariamente Jair – interpreta o cronista.

O bolsonarismo eduardista considera Jair Bolsonaro um “refém”, donde impossibilitado de avaliar o cenário. Um frágil; manipulado, chantageado mesmo, para chancelar o “pacto republicano” em função de Tarcísio, encarnação da “direita permitida”.

O ex-presidente seria um incapaz – é o que se comunica. Daí a proposta eduardista de superação a Jair em defesa de Jair – em proteção a Jair. O filho que, pelo pai, não obedecerá (mais) o pai. Está dito.

A REBOQUE – Todo mundo quer encostar Jair – um ex-presidente passivo, a reboque, seja do bolsonarismo eduardista, seja do bolsonarismo de oportunidades de Ciro Nogueira.

Jair Bolsonaro seria refém sobretudo do bolsonarismo de oportunidades – assim denuncia o bolsonarismo eduardista. Refém de Valdemar e turma. O ex-presidente – este é o pressuposto – estaria sequestrado, homem doente, inepto para decidir. Inepto para liderar. Inepto para orientar.

Qualquer pesquisa nas redes bolsonaristas ligadas a Eduardo empilhará qualificações dessa natureza para o velho Jair, o verdadeiro coagido, em cuja goela querem – os aliados traidores – enfiar o acordão.

FIM DA DIREITA – A opção Tarcísio por futuro de um Jair livre representaria jogada para “exterminar a direita” – direita aqui entendida sob o modo totalitário bolsonarista. Eduardo pretende ser candidato a presidente com ou sem o apoio do pai; e reagiu dessa maneira, em entrevista ao Metrópoles, à possibilidade de também ele não poder concorrer. Apoiaria Tarcísio?

“Se eu estiver inelegível porque fui condenado pela minha atividade nos EUA, eu acho provável que os EUA não reconheçam a eleição do Brasil”.

Eduardo nos informa diariamente que o bolsonarismo eduardista, mais do que não reconhecer Tarcísio, não reconhecerá a legitimidade da eleição, a Magnitsky estacionada sobre o Brasil. Eduardo estará inelegível. Mais do que projetar candidatura, projeta a inevitabilidade da dissidência, projetada também a impossibilidade de controlá-la.

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Vaidade, mentira e egoísmo são hoje valores morais; ter filhos, não

A ilustração de Ricardo Cammarota foi executada em técnica pastel oleoso sobre papel, em tons monocromáticos esverdeados. Mostra duas figuras humanas estilizadas, uma de frente para a outra, cada qual segurando um celular com os braços estendidos. As cabeças são ovais, ocas, com grandes aberturas retangulares no lugar dos rostos, lembrando telas vazias. Ambas parecem mirar seus aparelhos, que se tocam no centro da composição. O fundo é preenchido com textura densa de traços verticais claros sobre superfície escura.

Ilustração de Ricardo Cammarota (Folha)

Luiz Felipe Pondé
Folha

Como podemos saber quais seriam os valores no século 21? A pergunta é rica em possíveis caminhos reflexivos e, por isso mesmo, muito interessante. Mas suspeito que qualquer reflexão mais consistente sobre esta questão não satisfaria as expectativas mais afeitas ao senso comum no que tange a temas que transitam por ética ou moral.

O sapiens parece tirar bastante prazer da ideia de que ele defina os valores em que acredita. Temo que não funcione assim, apesar de que eu estaria cometendo um pecado capital ao dizer isso.

DIZIA KANT – O grande filósofo Kant, no século 18, alimentava uma ideia semelhante, crendo que, uma vez provado que seria racional agir de forma x, agiríamos de forma x. Essa ideia ficou conhecida como imperativo categórico: “aja de forma tal em que sua ação seja erguida em norma universal de comportamento”.

Por exemplo, quando for fazer x, se pergunte se todo mundo poderia fazer x. Se não, não faça x. Busque outro curso de ação em relação ao problema em questão. Apesar da elegância da fórmula, e de reconhecer que seria uma ideia boa para o convívio em grupo, e que de fato ajuda quando viável, não creio que o sapiens seja capaz de agir assim só porque seria racional pensar no todo antes de fazer algo. E digamos de passagem que Kant não estava pensando exatamente em “valores” como hoje se costuma falar em qualquer propaganda de banco.

TABELA DE VALORES – O senso comum entende que respondemos à pergunta que fiz na abertura dessa coluna acima a partir de uma abordagem pedagógica, isto é, ensinando as pessoas, nossas empresas, nossa família, o que quer que esteja em jogo, os valores certos que devemos ter.

Muitos chegam mesmo a propor uma tabela de valores a serem seguidos ou tomados como “nosso DNA ético”. A fórmula chega mesmo ao cúmulo do ridículo, mas o século 21 é o mais ridículo desde o paleolítico superior.

Nesse movimento, normalmente, seguimos na direção de uma pedagogia moral —ou política, o que seria ainda mais canalha estruturalmente— que pregaria valores como integridade, humanidade, honestidade, transparência, generosidade, e por aí vai. A lista é tão bela que faria almas mais sensíveis derramar lágrimas de amor à humanidade e a quem afirma ter tantos valores perfeitos idealmente.

APENAS EM TEORIA – Arrisco dizer que para quem de fato gostaria de pensar acerca dos “valores no século 21”, a melhor abordagem seria um olhar sociológico sobre o que de fato valoramos, ou não atribuímos valor algum, em nosso cotidiano individual, social e político, porque, como sabemos, não existem valores —ou virtudes— teóricos, mas apenas práticos.

A ética é, sempre foi, e sempre será, como dizia o grande Aristóteles (384-322 a.C), uma ciência da prática.

Alguém já viu alguém ser corajoso em teoria? Generoso em teoria? Honesto em teoria? Evidentemente que não, a não ser que a pessoa em questão seja um político de carreira.

REINA A HIPOCRISIA – Um problema a priori que impacta toda reflexão sobre valores é que a hipocrisia é a substância da moral pública. Hoje, talvez, mais do que nunca, porque quase 100% da humanidade sinaliza virtude no Instagram. Valores hoje são objeto do marketing e do branding, ciências sociais aplicadas da mentira como método.

Aliás, o que podemos depreender dessas práticas listadas no parágrafo imediatamente acima? Podemos depreender que a vaidade moral —sinalizar virtude no Instagram— é algo que valoramos muito neste século 21, já que todo mundo reconhece na vaidade moral uma prática que agrega valor a sua marca pessoal ou da sua empresa.

Por outro lado, se as ciências máximas da mentira no século 21, a saber, o marketing e o branding, são aplicadas hoje em todos os níveis da atividade humana, tais como saúde mental, instituições escolares, religião, revoluções políticas, causas sociais e ética, podemos deduzir que um valor no século 21 é a mentira como ferramenta profissional.

COMO PROCEDER? – Entendeu como proceder para identificar um valor ou desvalor na prática social? Veja o que as pessoas acreditam que agrega valor a elas e, portanto, praticam de fato, e não o que elas dizem que valoram ou negam valor. Em resumo: não importa o que falam, mas o que fazem, aliás, uma ideia que até crianças conhecem, menos os “adultos” do século 21.

Outro exemplo: filhos são um não valor no século 21, porque caso fossem um valor, as pessoas os teriam, mas como não os têm, evidentemente veem a prática de pôr crianças no mundo como um não valor, logo, o valor que decorre dessa prática é não assumir responsabilidade por ninguém.

Enfim, resumindo: vaidade moral, mentir e egoísmo são valores no século 21. Ter filhos, não.