
Data simboliza um ponto de inflexão moral e política
Pedro do Coutto
Na noite de 8 de maio de 1945, em Berlim, representantes do alto comando militar alemão colocaram um ponto final oficial na presença nazista no campo de batalha europeu. Com a assinatura da rendição incondicional, o Terceiro Reich reconheceu a derrota diante das forças aliadas ocidentais e do Exército Vermelho soviético. Assim, chegava ao fim um conflito iniciado quase seis anos antes, que devastou o continente.
A comunicação pública veio apenas no dia seguinte, quando a rádio alemã, ainda sob controle dos últimos remanescentes do regime, anunciou a rendição. A transmissão, carregada de formalidade militar, contrastava com o profundo impacto emocional vivido por milhões: alívio para os libertados, silêncio e vergonha para muitos dos vencidos.
AVANÇOS MILITARES – A trajetória que levou àquele desfecho teve início com os avanços militares relâmpago da Alemanha no início da guerra. A rápida ocupação de territórios como Polônia, França e Noruega deu à liderança nazista uma sensação ilusória de superioridade estratégica. Embalada por essas conquistas, a Alemanha lançou, em 1941, a invasão da União Soviética, numa operação de proporções colossais.
No início, a campanha oriental pareceu repetir o sucesso anterior: as tropas alemãs avançaram profundamente no território soviético, aproximando-se do Volga e cercando Stalingrado. Confiante, Hitler chegou a ironizar críticas internacionais, apostando que a cidade cairia em breve. No entanto, o cerco a Stalingrado acabou marcando uma reviravolta decisiva. Em fevereiro de 1943, o exército alemão que conduzia a ofensiva foi derrotado, e a esperança de uma vitória total começou a desmoronar.
Derrotas em múltiplas frentes se seguiram: a campanha no Norte da África foi perdida, e a abertura de um novo front com o desembarque aliado na Normandia, em 1944, acelerou o cerco à Alemanha. Nos meses seguintes, os soviéticos pressionaram pelo leste, enquanto os aliados avançavam pelo oeste.
RENDIÇÃO – Em meio ao colapso, Hitler se suicidou no subsolo da chancelaria em 30 de abril de 1945. Berlim, sitiada, capitulou dois dias depois. No entanto, os soviéticos exigiram uma rendição formal específica em sua zona de influência, o que levou à assinatura de um novo documento, no dia 8 de maio, em Karlshorst, distrito da capital alemã. A rendição foi chancelada por representantes das quatro grandes potências vencedoras: União Soviética, Reino Unido, Estados Unidos e França.
Mesmo após a rendição, a máquina de propaganda nazista tentou manter alguma aparência de controle. De Flensburg, onde Karl Dönitz – sucessor nomeado por Hitler – ainda exercia autoridade simbólica, foi ao ar o último boletim militar do regime, exaltando a resistência de combatentes isolados no front oriental.
Com o cessar-fogo, os horrores da guerra começaram a ser revelados em escala total. A destruição urbana, o saque ao patrimônio cultural europeu e, sobretudo, o massacre de milhões de vidas humanas expuseram a magnitude da tragédia. Estima-se que apenas na Europa, mais de 40 milhões de pessoas tenham perdido a vida durante o conflito.
TRIUNFO – A rendição da Alemanha nazista em 8 de maio de 1945 não representou apenas o encerramento de uma guerra, mas o colapso de um projeto totalitário construído sobre a negação da dignidade humana, o militarismo agressivo e a manipulação ideológica em escala inédita. A data marca o triunfo das forças que resistiram ao autoritarismo e, ao mesmo tempo, expõe a fragilidade das democracias quando subestimam ameaças emergentes.
O episódio oferece uma advertência clara: a expansão rápida de regimes baseados no culto à força, no desprezo às instituições e na desinformação pode ser inicialmente sedutora, mas invariavelmente conduz à destruição. O entusiasmo inicial que permitiu a ascensão do Terceiro Reich foi alimentado por vitórias militares aparentes e por uma retórica nacionalista que silenciou a crítica e perseguiu a diversidade. Ao fim, custou à Europa dezenas de milhões de vidas e um trauma coletivo cuja reconstrução levou décadas.
Mais do que um evento militar, o 8 de maio simboliza um ponto de inflexão moral e política. É um lembrete permanente de que a paz não é apenas a ausência de guerra, mas a presença de instituições fortes, memória histórica ativa e vigilância constante diante de discursos de ódio, autoritarismo e exclusão. Aprender com esse marco significa reconhecer que a liberdade e os direitos humanos nunca são conquistas definitivas — são compromissos que precisam ser reafirmados a cada geração.